Acórdão nº 544/09.9YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Data01 Março 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA Sumário : 1 – Em cirurgia estética se a obrigação contratual do médico pode não ser uma obrigação de resultado, com o médico a comprometer-se “em absoluto” com a melhoria estética desejada, prometida e acordada, é seguramente uma obrigação de quase resultado porque é uma obrigação em que “só o resultado vale a pena”.

2 – Aqui, em cirurgia estética, a ausência de resultado ou um resultado inteiramente desajustado são a evidência de um incumprimento ou de um cumprimento defeituoso da prestação por parte do médico devedor.

3 – Ao médico compete, por isso, em termos de responsabilidade contratual, o ónus da prova de que o resultado não cumprido ou cumprido defeituosamente não procede de culpa sua, tal como o impõe o nº1 do art.799º do CCivil.

4 – Ao médico não basta, para cumprir esse ónus, a prova de que o tipo de intervenção efectuada importa um determinado risco ( eventualmente aceite pelo paciente ); é necessário fazer a prova de que a sua conduta profissional, o seu rigoroso cumprimento das “leges artis”, foi de molde a poder colocar-se o concreto resultado dentro da margem de risco considerada e não dentro da percentagem em que normalmente a intervenção teria êxito.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA intentou, no Tribunal Cível de Lisboa, contra BB ( mas desistiu do pedido quanto a esta ré a fls.170, desistência que foi admitida ) CC acção ordinária, que recebeu o nº16/2000, da 5ª Vara, 1ª secção, pedindo « ser o R. condenado no pedido, pagando à A. a quantia de 8 000 000$00 a título de indemnização por danos morais e patrimoniais causados em virtude de cumprimento defeituoso do contrato ».

Alegou, em síntese: procurou a ré BB, a qual aconselhou o réu CC a realizar-lhe intervenção de cirurgia plástica; desconhecia que o réu CC não era especialista reconhecido em cirurgia plástica pela Ordem dos Médicos; o réu aconselhou-a a submeter-se a quatro intervenções cirúrgicas: lifting facial, introdução de próteses mamárias, lipoaspiração da anca e coxa e aumento do volume dos lábios; o lifting e a introdução de próteses mamárias foram feitas em 4/2/98; posteriormente, o réu fez o aumento do volume dos lábios; o preço acordado para as quatro intervenções foi de 1 000 contos, cujo pagamento foi efectuado por 4 cheques de 250 contos; depois o réu pediu mais 139 000$00 para pagamento das próteses mamárias, valor que já estava integrado no preço acordado; exigiu ainda o réu mais 270 000$00 para pagamento do “Artcol”, material utilizado no aumento dos lábios; o réu não fez qualquer análise ou diagnóstico que permitisse saber o tipo de prótese a realizar; as próteses que foram colocadas à A. não eram adequadas ao seu caso, não tendo o tamanho consentâneo com a sua compleição física; a intervenção resultou em dano estético que as fotografias demonstram, por encapsulamento mamário; além dos danos estéticos, teve ainda dores e sofrimento psicológico que lhe impediu a concentração nas suas actividades diárias, lhe alterou o humor, a incapacitou de descansar; consultou outros médicos especialistas que são unânimes sobre a necessidade de se submeter a nova intervenção cirúrgica de reparação.

Contestou ( fls.40 ) o réu CC alegando, em suma: tem a especialidade de cirurgia plástica reconstrutiva, que obteve na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e tem pendente a sua inscrição no Colégio da Especialidade de Cirurgia Plástica e Reconstrutiva da Ordem dos Médicos Portuguesa; acordou com a A. esta pagar 1 000 contos por duas intervenções - lifting cervico facial e aumento do volume mamário - preço que não incluía o preço das próteses; os 270 000$00 que a A. pagou posteriormente destinaram-se a pagar o material para aumento do volume dos lábios; por a A. ser muito magra, a sua constituição física aconselha a que se colocassem próteses retromusculares, que têm a seu favor um menor índice de contracção capsular, mas implicam cuidados importantes pós-operatório, designadamente a compressão nos pólos superiores das próteses para evitar deslizamento superior; a própria introdução de próteses apresenta um risco de encapsulamento de 8%, risco esse explicado à autora; os resultados finais, e que constam das fotografias juntas pela autora, só podem resultar de um deslizamento da prótese e da falta de cuidado da autora; e por um evidente encapsulamento, que é um risco próprio da intervenção e que foi aceite pela autora; o réu aplicou a próteses mamárias de modo correcto.

Do mesmo passo, requereu o réu, ao abrigo do disposto no art.325º do CPCivil, a intervenção principal de DD - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. para quem havia transferido a sua « responsabilidade profissional médica a coberto da apólice nº000000000».

A ré BB, Lda foi citada editalmente e não contestou.

A chamada DD, S.A. contestou ( fls.126 ) defendendo que a sua responsabilidade como seguradora está esclarecida, nos termos do art. 8º, al. c) das Condições Particulares do contrato de seguro, que prevê “… não estão compreendidos no seguro … os danos resultantes do exercício da actividade profissional para a qual o segurado ou os seus auxiliares não tenham a devida autorização legal” e, no mais, impugna a factualidade descrita pela autora.

Após uma audiência preliminar realizada a fls.170, foi elaborado despacho saneador, com alinhamento dos factos assentes e fixação da base...

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