Acórdão nº 455/04.4TTLMG.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA REVISTA Sumário : 1. A responsabilidade do empregador relativamente aos acidentes de trabalho sofridos pelos seus trabalhadores não assenta no chamado risco profissional, mas sim no risco económico ou de autoridade.

  1. É a teoria do risco económico ou de autoridade que está subjacente ao conceito de acidente de trabalho contido no art.º 6.º, n.º 1, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro.

  2. O conceito de acidente de trabalho contido naquele normativo não exige a existência de um nexo de causalidade entre o acidente e a prestação do trabalho propriamente dita; apenas exige um nexo de causalidade entre o acidente e a relação laboral.

  3. Estando provado que ocorreu no local e no tempo de trabalho, deve ser considerado como sendo de trabalho o acidente de que resultou a morte do trabalhador, por asfixia provocada por dióxido de carbono existente no fundo de um silo de bagaço, quando ao desceu para tentar salvar um menor que aí tinha ido buscar uma bola e que ficara inanimado devido ao dito gás.

    Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório A presente acção emergente de acidente de trabalho que correu termos do Tribunal do Trabalho de Lamego prende-se com um sinistro, ocorrido cerca das 23h30 do dia 17 de Setembro de 2004, de que resultou a morte de AA, no dia 18.9.2004, quando este alegadamente trabalhava por conta da S.., C.R.L, com sede na Régua, que tinha a sua responsabilidade civil referente a acidentes de trabalho transferida para a R... S... – Companhia de Seguros de R... R..., S. A.

    Na fase conciliatória, o acordo frustrou-se pelo facto da seguradora e da entidade patronal não aceitarem a caracterização do acidente como sendo de trabalho.

    Por essa razão, o processo passou à fase contenciosa, tendo a autora BB demandado – por si, na qualidade de viúva do sinistrado, e em representação de CC, filha menor de ambos –, a S... e a R... S..., alegando, em resumo, o seguinte: - por contrato de trabalho verbal, o sinistrado foi admitido ao serviço da ré S..., C.R.L., para, subordinada e remuneradamente, trabalhar nos silos na Quinta do Valmor, sita em Folgosa do Douro, Armamar, operando com a garra que, através da ponte, transporta o bagaço; - no dia 17.8.2004, o sinistrado dirigiu-se, na companhia de DD, para o local de trabalho e, por ser o primeiro dia de trabalho para o sinistrado, ambos combinaram ir mais cedo, a fim de, com tempo, se prepararem para iniciar o turno às 00h00 do dia 18, tendo chegado ao local de trabalho, cerca das 23h30; - no local, o menor EE brincava com uma bola, na zona de descarga do bagaço para os silos e, tendo a bola caído a um silo, o menor desceu ao fundo do mesmo, para a recuperar e aí caiu inanimado; - o silo em causa tinha a profundidade de cerca de 7 metros e encontrava-se com algum bagaço (cerda de ¼ da sua capacidade) que permitia a descida; - o sinistrado, que acabava de chegar ao local, ao ver o menor inanimado tentou socorrê--lo, descendo ao fundo do silo e aí caiu também inanimado, falecendo por asfixia provocada pelo dióxido de carbono (CO2) concentrado no silo; - a ré Subvidouro tem por actividade a transformação de bagaço em produtos de origem vinícola; - no local, onde o acidente ocorreu, procede-se à armazenagem de bagaço em silos, construídos no solo, que posteriormente é usado como matéria-prima; - os silos têm cerca de 7 metros de profundidade, 6 metros de largura e 10 metros de comprimento e vão sendo cheios com a ajuda de uma máquina retroescavadora; - o pavilhão, onde se situam os silos, tem uma zona de circulação de veículos que transportam o bagaço que aí é descarregado; - da fermentação do álcool presente no bagaço resulta a produção de dióxido de carbono que, quando inspirado, provoca asfixia/perturbações de consciência; - o modo como os silos estão construídos, em profundidade, dificulta a renovação do ar e quando os mesmos se encontram parcialmente cheios, eleva-se a produção e concentração de CO2 no interior dos mesmos, criando o risco de morte por asfixia a quem desça ao fundo do silo; - a existência de restos de uvas no bagaço acumulado nos silos dá início ao processo natural de fermentação com produção de CO2; - não obstante os perigos e riscos causados pelo dióxido de carbono produzido nos silos, a ré não alertou os seus trabalhadores, nomeadamente o sinistrado, de tais perigos; - nem nos silos nem no pavilhão existia qualquer informação ou aviso sobre tais riscos e também não havia qualquer sinalização de segurança nem protecção junto dos mesmos nem na área circundante; - nem tão pouco estavam disponíveis quaisquer meios de socorro ou de emergência que poderiam ser utilizados para socorrer qualquer sinistrado, designadamente equipamentos de respiração autónoma; - o sinistro ocorreu devido às referidas faltas de informação, de sinalização, de protecção e de primeiros socorros, sendo imputável, por isso, a culpa da entidade empregadora, culpa essa que, aliás, se presume, por resultar da inobservância de preceitos legais e regulamentares respeitantes à higiene e segurança no trabalho; - a ré empregadora tinha a sua responsabilidade civil emergente de acidentes de trabalho transferida para a ré seguradora, com quem mantinha um contrato de seguros titulado pela apólice n.º ...; - as autoras sofrem e sofrerão a perda dolorosa do marido, amigo e pai dedicado.

    E, em consonância com o assim alegado, as autoras pediram que as rés fossem condenadas a pagar: - à autora mãe: a pensão anual e vitalícia, com início em 18.9.2004, no montante de € 3.815,51, bem como € 25,00 de despesas com deslocações a tribunal, € 2.924,80 de despesas de funeral e trasladação, € 25.000,00 de danos não patrimoniais próprios, € 50.000,00 pelo direito à vida do sinistrado e juros de mora; - à autora filha: a pensão anual e temporária de € 3.815,51, com início em 18.9.2004, € 20.000,00, a título de danos não patrimoniais próprios, e juros de mora; - a ambas e em partes iguais: a quantia de € 4.387,20, a título de subsídio por morte.

    E...

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