Acórdão nº 763/05.7TVLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelHELDER ROQUE
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE Sumário : I - Extinto o contrato de concessão comercial, por acto válido de denúncia do concedente, não se pode considerar que o mesmo se tenha renovado, como um “contrato de concessão informal”, designadamente, por falta de documento escrito, que constitui um formalidade ad substantiam, necessária para a própria existência da declaração, cuja falta acarreta a sua inexistência, e não apenas, e de modo não absoluto, para a prova do negócio, não assumindo, assim, qualquer significado jurídico a declaração de resolução formulada pelo concessionário, quatro anos depois.

II - Não se verificando a violação da regra da exclusividade de que gozava o concessionário e tendo as partes convencionado o livre exercício do direito de denúncia, a partir de certa data, aquele não goza do direito de indemnização, por incumprimento contratual, quer pelo dano de confiança, resultante de lesão do interesse contratual negativo, quer pelo dano do cumprimento, proveniente da lesão do interesse contratual positivo, em virtude de o contrato ter deixado de existir.

III - A indemnização de clientela constitui uma manifestação do direito à retribuição, que se projecta para além da cessação do contrato, de modo a compensar o concessionário dos proveitos que, a partir de então, o concedente poderá continuar a usufruir, em resultado da actividade que aquele desenvolveu, com a correspondente perda de retribuição para o concessionário.

IV - Só a verificação do duplo condicionalismo segundo o qual a concessão pressupõe que o concessionário tenha sido um factor relevante de atracção de clientela, e de que seja previsível que esta venha a beneficiar o concedente, repercutindo-se, directamente, no futuro, em seu benefício, permite dar guarida ao requisito da continuidade de clientela, pressuposto indispensável da atribuição da respectiva indemnização.

V - Tendo o autor invocado, apenas, o lucro, não referindo que é o lucro líquido ou o lucro bruto de que se trata, tem de se entender que é ao primeiro que está a aludir, porquanto o pedido deve ser interpretado, no contexto da causa de pedir, que se encontra conexionada com o referido conceito de “remuneração” e se reporta, consequentemente, a matéria de facto, quando fixa o montante do “lucro” do autor ao lucro líquido.

Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: “AA – Sociedade de Revestimentos, Ldª” propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra “BB, AB”, e “BB – Produtos Internacionais, SA”, pedindo que, na sua procedência, as rés sejam condenadas a pagar à autora a quantia global de €694.461,40, acrescida de juros, desde a citação até efectivo e integral cumprimento, bem como as despesas tidas por força do presente processo, a liquidar em execução de sentença, alegando, para tanto, e, em síntese, que celebrou com a ré “BB, AB” um contrato de distribuição, nos termos do qual se obrigou a assegurar a comercialização, em seu nome e por sua conta, de todos os produtos, marca BB, do catálogo comercial da referida ré, obrigando-se esta, por seu turno, a vender-lhe os referidos produtos, em exclusivo, para que a autora os revendesse.

Este contrato tinha a duração, até 31 de Dezembro e 1999, considerando-se, automaticamente, renovado, por sucessivos períodos de cinco anos, caso nenhuma das partes o denunciasse, mediante comunicação escrita, com uma antecedência mínima de seis meses sobre o termo do respectivo período.

A autora foi responsável pela colocação dos produtos, objecto do contrato, no mercado português, bem como pela construção da imagem da marca, tendo, para o efeito, levado a cabo um esforço e investimento para fazer prospecção de mercado, seleccionar e angariar clientes, divulgar e promover os produtos, tendo feito, igualmente, avultados investimentos publicitários, dando como resultado que a marca BB passou a gozar de óptima reputação no mercado nacional, sendo líder de mercado de revestimentos vinílicos para pavimentos.

No início de 2000, a autora foi informada que a ré “BB, AB” pretendia criar uma filial em Portugal, tendo a ré “BB, SA”, a partir de 2000, passado a intermediar as relações comerciais entre a autora e aquela ré e assumido, expressamente, todos os deveres e obrigações desta, não obstante a ré “BB, SA” sempre ter reconhecido a autora como distribuidora exclusiva dos produtos BB.

A criação desta filial em Portugal fazia parte da estratégia da ré “BB, AB” para iniciar vendas directas em Portugal, afastando a autora da rede de distribuidores BB, retirando-lhe gamas de produtos e não lhe atribuindo novas gamas, entretanto, introduzidas e acabando mesmo por lhe retirar a possibilidade de revenda de todos os produtos, o que determinou uma descida acentuada nas vendas da autora, tendo perdido um número significativo de clientela.

Em 6 de Agosto de 2004, a autora enviou às rés cartas registadas, com aviso de recepção, notificando-as para deixarem de proceder a vendas directas ou através de terceiros que não a autora, e como estas não tivessem acatado a notificação, a autora resolveu, com justa causa, o contrato de distribuição, por carta registada datada de 9 de Setembro de 2004.

As rés continuaram a beneficiar da clientela angariada pela autora, razão pela qual esta tem direito à atribuição de uma indemnização por clientela, para além da indemnização por incumprimento contratual, quantificando aquela, em €176.467,40, e esta, em €518.000,00, respectivamente.

Na contestação, as rés alegam que foi a ré “BB, AB” quem pôs fim ao contrato de distribuição, e não a autora, através de uma comunicação, datada de 11 de Junho de 1999, em que dava a conhecer a esta que punha termo ao contrato, a partir de 31 de Dezembro de 1999.

Não obstante a cessação do contrato de distribuição, a ré “BB, SA” acedeu em encetar um novo e diverso ciclo de relacionamento comercial com a autora, tendo-lhe garantido a exclusividade de determinados artigos que anunciou, mas, apenas, para o ano de 2000, e o mesmo acontecendo, nos anos de 2001 e 2002, sendo certo que, tão-só, no termo do período de 2003, aquela comunicou à autora que não mais lhe garantia a exclusividade de quaisquer produtos.

Na réplica, a autora conclui como na petição inicial.

A sentença julgou a acção improcedente, por não provada, e, em consequência, absolveu as rés do pedido.

Desta sentença, a autora interpôs recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado, parcialmente, procedente a apelação e, em consequência, revogou a sentença e condenou a ré “BB, AB” no pagamento à autora da quantia de €25.000,00 e a ré “BB, SA” no pagamento à autora da quantia de €20.000,00, ambas com juros de mora, desde a citação e até ao cumprimento.

Do acórdão da Relação de Lisboa, a mesma autora e as rés interpuseram recurso de revista, terminando a primeira as alegações com o pedido da sua revogação e substituição por outro que condene as rés no pagamento de €683301,00, acrescido de juros de mora, contados desde a citação e até integral e efectivo pagamento, formulando as seguintes conclusões, que se transcrevem: 1ª – O presente recurso vem interposto do Acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, o qual decidiu (i) julgar parcialmente procedente a apelação da recorrente e, em consequência, condenar a 1.a R. e a 2.a R. a pagar à recorrente, a título de indemnização de clientela, os montantes de, respectivamente €25.000,00 e €20.000,00, ambos acrescidos de juros de mora desde a citação, até integral cumprimento e (ii) manter a sentença proferida pela 1a Instância na parte em que julgou improcedente o pedido de condenação das RR. recorridas no pagamento à A. recorrente de uma indemnização decorrente do incumprimento contratual por parte daquelas.

  1. - A recorrente não se conforma com o montante fixado para as indemnizações de clientela a pagar pelas recorridas, discordando, por outro lado, da decisão proferida no que tange à improcedência do pedido de indemnização por incumprimento contratual.

  2. - Após concluir pela extinção do contrato celebrado entre a recorrente a 1.a recorrida, em 31.12.1999 - na sequência de denúncia efectuada pela última – a Veneranda Relação de Lisboa considera ser "ilegítima a invocação de um direito de indemnização reportada à violação de um contrato que se encontrava extinto".

  3. - Contudo, e não obstante ter resultado provado que a 1a recorrida pôs termo ao contrato celebrado com a recorrente em 1995, também resultou provado que o relacionamento comercial entre as partes se manteve muito para além de tal resolução contratual, pelo menos até 2003.

  4. - As partes protelaram, por um extenso período temporal, o fim da relação comercial que entre si existia.

  5. - Quanto a este aspecto, a Veneranda Relação de Lisboa considerou que "a distribuição de produtos que a A. fez, a partir de 1.10.2000 até 2003 inclusive (...) deixou de ter por referência a 1a R., passando a ser reportada à 2.aR.".

  6. - Sempre guardado o devido respeito, também resultou da matéria de facto dada como provada, a confusão, na mesma entidade, da 1.a e da 2ª R., designadamente no que se refere ao relacionamento comercial estabelecido entre as mesmas e a recorrente.

  7. - Com efeito, decorre da alínea O) da matéria assente (cfr. § 30 do douto Acórdão recorrido) que, até 2003, ambas as recorridas forneceram à recorrente uma gama de produtos BB - a gama Óptima.

  8. - Por outro lado, ficou provado que a 1.a ré detém uma participação maioritária no capital social da 2.a ré, o que mais contribui para que convirjam os interesses de ambas e para que, perante terceiros, a sua actuação e imagem profissional se confundam.

  9. - Assim, as relações comerciais entre as partes mantiveram-se pelo menos até 2003, com a especificidade de a 1.a ré ter retirado à recorrente várias das gamas de produtos por si inicialmente comercializados.

  10. - Tem aqui total aplicação o art.° 27.° n.° 2 do D.L. n.° 178/86, de 3 de Julho, alterado pelo...

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