Acórdão nº 574/07.5TBPFR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA EM PARTE Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL: ARTIGOS 217º Nº 2 E 595 Nº 1 ALÍNEA B); CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: ARTIGO 456º Sumário : I - Assumindo anterior sócio e gerente de determinadas sociedades o pagamento de dívidas por elas contraídas junto da aqui autora – o que ele fez mediante a entrega de cheques devolvidos ulteriormente por falta de provisão – e tendo parte dessas dívidas sido contraídas antes do registo de cessação das referidas funções de sócio e gerente, pode o Tribunal da Relação, no âmbito dos seus poderes de cognição em matéria de facto, concluir no sentido de que esse comportamento revela um inequívoco (art. 217.º, n.º 2, do CC) acordo constitutivo de contrato de assunção de dívida a que se refere o art. 595.º, n.º 1, al. b), do CC.

II - No entanto, provando-se que o valor em dívida era de montante inferior ao somatório constante dos cheques, é aquele o valor que deve ser considerado.

III - A afirmação por parte do réu, contrariamente à verdade, de que não foi sócio nem gerente dessas empresas, traduz negligência processual que não é de todo inócua considerando-se que um dos critérios de aferição da assunção da dívida está precisamente em saber se o assuntor tem ou não interesse próprio no pagamento, mas, ainda assim, pode aceitar-se que tal falta não passa de negligência pouco grave (ver art. 456.º do CPC), aceitando-se que a parte tinha em vista o momento da cessação das suas funções antes do respectivo registo e a própria facilidade probatória demonstrativa do erro de tal declaração.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA & C.ª Lda., com sede na Av. C… S…, S.., Paços de Ferreira, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum ordinário, contra BB e mulher, CC, residentes no L… P…, M…, P… F…, pedindo a condenação destes a pagar-lhe a quantia de 59.556,48€ (capital de 51.471,00€ e juros vencidos de 8.085,48€), acrescida de juros vincendos sobre o capital, à taxa legal, até integral pagamento.

  1. Alegou para tal que, no âmbito da sua actividade, forneceu madeiras e placas às sociedades DD, Lda. e “EE, Lda.”, nos termos discriminados nas facturas referidas nos arts. 5º e 6º da petição inicial corrigida, tendo a primeira sociedade entregue à A. para pagamento dos respectivos fornecimentos 3 letras e 18 cheques, que não vieram a ser pagos nas datas de vencimento nem posteriormente, sendo instaurada uma execução, no âmbito da qual foi fixada por acordo a quantia de 34.146,00€; entretanto, porque a segunda sociedade também não tinha pago os seus fornecimentos, a A. estava a diligenciar pela instauração da competente execução.

    Na sequência da referida situação, o R. marido contactou a A., pretendendo assumir o pagamento das dívidas daquelas duas empresas, explicando que o pretendia fazer porque os sócios e gerentes de tais empresas eram as suas filhas e os seus genros, sendo certo que o negócio de tais empresas era um negócio familiar, exercido realmente no interesse e por conta do R. marido, que até já fora sócio e gerente das duas empresas.

    Foi então celebrado um acordo entre a A. e o R. marido, em 18/02/2005, com o conhecimento e aprovação das filhas e do genro deste, no âmbito do qual foram fixadas as dívidas das duas sociedades em 34.146,00€ (da primeira) e 17.325,00€ (da segunda), no total de 51.471,00€, obrigando-se o R. marido a pagar tal quantia por intermédio dos dez cheques identificados no art. 2º da petição inicial, os quais vieram a ser todos devolvidos por falta de provisão, tendo a A. instaurado uma acção executiva, que veio a terminar por ter sido declarada a prescrição da obrigação cambiária.

    Os RR. são casados no regime de comunhão de adquiridos e sempre estiveram ligados à vida das duas sociedades, sendo o R. marido quem efectuava os contactos com a A. para o fornecimento das madeiras e sendo ambos quem recebia, por vezes, a mercadoria nas instalações das sociedades, tendo a R. mulher conhecimento da dívida e de que era da actividade destas empresas que o R. marido retirava lucros que aplicava no sustento do casal e tendo tido do mesmo modo conhecimento e dado o seu acordo a que o R. marido assumisse o pagamento da dívida perante a A.

  2. Os RR. contestaram, nos termos de fls. 24 a 32 e 201 a 204, referindo desconhecer de que forma os cheques em causa estavam na posse da A., impugnando a existência e montante da dívida, a assunção da mesma pelo R. marido, bem como a responsabilidade da R. mulher pelo seu pagamento, e alegando ainda que a A. invocou nesta acção factos diferentes dos alegados na execução, pois que no requerimento executivo desta alegou que os cheques se destinaram a servir de meio de pagamento do preço de mercadorias que tinha fornecido ao próprio ora R., e que o R. marido nunca foi, nem de direito nem de facto, sócio e gerente das duas empresas em causa, explicitando na nova contestação apresentada na sequência da petição inicial corrigida que esta alegação pretendia reportar-se à circunstância de que todos os fornecimentos efectuados pela A. em causa nos presentes autos são posteriores à renúncia do R. marido à qualidade de sócio gerente das referidas sociedades.

  3. Após a contestação de fls. 24 a 32 e antes do despacho de fls. 80 a 82, que determinou a apresentação de petição inicial corrigida, a A., pelo facto de os RR. terem alegado que o R. marido nunca fora sócio ou gerente das duas sociedades, pediu a condenação do R. marido como litigante de má fé, em multa e indemnização.

  4. Factos provados: 1) A A. é uma sociedade comercial por quotas, que se dedica com intuito lucrativo à venda por grosso de madeiras e contraplacados de madeira, para a indústria de mobiliário de madeira [A) da matéria de facto assente]; 2) A sociedade “DD, Lda.” dedica-se ao fabrico e comércio de estofos e artigos de decoração [B) da matéria de facto assente]; 3) A sociedade “EE, Lda.” dedica-se à indústria e comércio de mobiliário de madeira [C) da matéria assente]; 4) A A. emitiu as seguintes facturas, nelas referindo o fornecimento de madeiras e placas, nas quantidades discriminadas, à “DD”: - Factura nº 036778, datada de 10/05/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 09/06/2002, no valor de € 413.41; - Factura nº 036779, datada de 10/05/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 09/06/2002, no valor de € 132,70; - Factura nº 036824, datada de 17/05/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 16/06/2002, no valor de € 39,25; - Factura nº 036868, datada de 24/05/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 23/06/2002, no valor de € 78,66; - Factura nº 036869, datada de 24/05/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 23/06/2002, no valor de € 212,58; - Factura nº 036921, datada de 29/05/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 28/06/2002, no valor de € 12,44; - Factura nº 036982, datada de 05/06/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 05/07/2002, no valor de € 716,74; - Factura nº 037013, datada de 07/06/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 07/07/2002, no valor de € 91,12; - Factura nº 037061, datada de 14/06/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 14/07/2002, no valor de € 197,36; - Factura nº 037062, datada de 14/06/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 14/07/2002, no valor de € 111,00; - Factura nº 037105, datada de 21/06/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 21/07/2002, no valor de € 79,75; - Factura nº 037137, datada de 27/06/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 27/07/2002, no valor de € 92,47; - Factura nº 037138, datada de 27/06/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 27/07/2002, no valor de € 132,20; - Factura nº 037215, datada de 05/07/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 04/08/2002, no valor de € 139,24; - Factura nº 037216, datada de 05/07/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 04/08/2002, no valor de € 174,14; - Factura nº 037275, datada de 12/07/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 11/08/2002, no valor de € 617,53; - Factura nº 037331, datada de 19/07/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 18/08/2002, no valor de € 179,52; - Factura nº 037332, datada de 19/07/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 18/08/2002, no valor de € 108,85; - Factura nº 037378, datada de 25/07/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 24/08/2002, no valor de € 117,56; - Factura nº 037404, datada de 26/07/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 25/08/2002, no valor de € 282,59; - Factura nº 037455, datada de 02/08/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 01/09/2002, o valor de € 548,79; - Factura nº 037456, datada de 02/08/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 01/09/2002, no valor de € 186,58; - Factura nº 037433, datada de 31/07/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 30/08/2002, no valor de € 126,96; - Factura nº 037434, datada de 31/07/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 30/08/2002, no valor de € 45,80; - Factura nº 037484, datada de 09/08/2002, com vencimento da obrigação de pagamento do preço em 08/09/2002, no valor de...

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