Acórdão nº 09A0682 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelAZEVEDO RAMOS
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: AGRAVO Decisão: NEGADO PROVIMENTO Sumário : I – A obrigação de prestação de alimentos a menor, assegurada pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, em substituição do devedor, nos termos previstos nos artigos 1º da Lei nº 75/98, de 19 de Novembro, e 2º e 4º, nº5, do Decreto-Lei nº 164/99, de 13 de Maio, só nasce com a decisão que julgue o incidente de incumprimento do devedor originário e a respectiva exigibilidade só ocorre no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal, não abrangendo quaisquer prestações anteriores. Decisão Texto Integral: Acordam, em plenário das Secções Cíveis, no Supremo Tribunal de Justiça: Por requerimento de 20 de Junho de 2007 (fls 121), AA, mãe do menor BB, veio instaurar o presente incidente de incumprimento de prestação alimentícia, alegando, em síntese, o seguinte: - por acordo exarado nos presentes autos e judicialmente homologado, CC, pai do referido menor, ficou obrigado a depositar, mensalmente, na conta bancária da requerente, até ao dia 8 de cada mês, a título de alimentos, a quantia de 110 euros, com início no mês de Dezembro de 2006; - o requerido nunca procedeu a qualquer depósito; - a requerente tem como única fonte de rendimento o seu salário, no valor de 450 euros por mês; - o seu agregado familiar é composto por duas pessoas.

Concluiu, pedindo: a) – Ao abrigo do disposto nos arts. 1º e 3º, nºs 1 e 2 da Lei nº 75/98, de 19 de Novembro e art. 3º do Dec-Lei nº 164/99, de 13 de Maio, se decida, com a devida urgência, que o Estado, através do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, deve prestar alimentos ao menor BB, em substituição do requerido, proferindo-se se necessário, decisão provisória; b) – Caso assim se não entenda, sejam tomadas as medidas necessárias e adequadas ao cumprimento coercivo dos alimentos vencidos e vincendos, de acordo com o estipulado no art. 189º do Dec-Lei nº 314/78, de 27 de Outubro; c) – Com base no art. 181º do citado Dec-Lei nº 314/78, se condene o requerido no pagamento ao menor de uma indemnização, em montante nunca inferior a 500 euros.

Cumprido o disposto no art. 181º, nº2, da OTM, o requerido veio dizer que não tem capacidade económica para pagar a prestação estipulada, pois encontra-se desempregado e não aufere qualquer subsídio de desemprego, garantindo a sua subsistência com a ajuda de sua mãe.

Após a realização das diligências julgadas convenientes para apuramento da situação económica do requerido, foi proferida a decisão de fls 147, ao abrigo do art. 3º, nº2, da Lei 75/98, de 19 de Novembro, que fixou em 110 euros mensais a prestação provisória a pagar pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social a favor do referido menor.

Oportunamente, foi proferida a decisão definitiva de fls 186 e segs, que fixou em 125 euros mensais a prestação devida pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, a favor do menor BB, desde a data da apresentação do pedido em apreço, sem prejuízo dos montantes já pagos a título provisório, sendo este montante actualizado anualmente, de acordo com o índice inflacionário que se houver verificado no ano anterior.

Inconformado, agravou o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, por considerar que os alimentos a cargo do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores não são devidos desde a data da apresentação do respectivo pedido, mas apenas a partir do mês seguinte ao da notificação da respectiva decisão judicial ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social.

A Relação de Guimarães, através do seu Acórdão de 4-12-08, concedeu provimento ao agravo e revogou a decisão recorrida, na parte em que condenou o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores a suportar as prestações vencidas desde a data da entrada do pedido, ficando o Fundo obrigado a pagar as prestações fixadas a partir do mês seguinte ao da notificação da decisão da 1ª instância.

Agora, foi o Ex.mo Magistrado do Ministério Público junto das Secções Cíveis da Relação de Guimarães que, com fundamento no art. 678º, nº4, do C.P.C., veio interpor recurso de agravo para este Supremo Tribunal de Justiça, por o Acórdão recorrido se encontrar em total oposição com o Acórdão da mesma Relação de 9-10-08, proferido no processo nº 1752/08, da 2ª Secção, no qual se julgou que tais prestações se vencem desde a data da formulação do respectivo pedido.

Pede que se proceda a agravo ampliado, para efeito de uniformização da jurisprudência, nos termos dos arts 732º-A e 762º, nº3, do Cód. Proc. Civil, atenta a jurisprudência divergente sobre a mesma questão de direito, proferida pelas Relações e pelo Supremo Tribunal de Justiça, propondo a fixação da seguinte jurisprudência: “As prestações de alimentos a menor fixadas pelo tribunal em substituição do devedor, asseguradas pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, cujo pagamento é efectuado pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, nos termos previstos no art. 1º da Lei nº 75/98, de 19 de Novembro, e 2º do Decreto-Lei nº 164/99, de 13 de Maio, são devidas a partir da entrada do requerimento nos respectivos autos de incumprimento”.

Alegando no agravo, o Ex.mo Magistrado do Ministério Público, resumidamente, conclui: 1- Excluídas as prestações alimentícias vencidas e não pagas pela pessoa judicialmente obrigada, importa determinar o momento a partir do qual o Fundo se encontra obrigado, avançando-se, em regra, duas posições: a partir da entrada do requerimento para a intervenção do Fundo ou a partir da data da notificação da decisão judicial.

2- Salvo melhor opinião, entendemos mais justa e consentânea com o espírito da lei a tese que faz retroagir os efeitos da decisão de intervenção do Fundo à data da entrada do respectivo requerimento.

3 – O art. 4º, nº5, do Decreto-Lei nº 164/99, de 13 de Maio, que estabelece que o Centro Regional de Segurança Social inicia o pagamento das prestações, por conta do Fundo, no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal, não baliza o momento em que nasce a obrigação do Fundo, apenas se reportando ao momento em que o C.R.S.S. está obrigado a cumprir a decisão do tribunal.

4 – A verificação dos pressupostos da intervenção do Fundo pode implicar uma demorada tramitação processual, não se compreendendo que o menor, durante esse lapso de tempo, que pode ser longo, não beneficie da prestação alimentar.

5 – Tanto a Lei nº 75/98, de 19 de Novembro, com o Decreto-Lei nº 164/99, de 13 de Maio, são omissos sobre o momento a partir do qual as prestações alimentares são devidas.

6 – Verifica-se uma lacuna da lei, que exige a aplicação, pela via da analogia, do art. 2006º do Código Civil, uma vez que procedem aqui as razões justificativas da regulamentação prevista para os alimentos naquele dispositivo, que diz que os alimentos são devidos desde a data da propositura da acção.

7 – Assim, o momento em que as prestações se começam a vencer só poderá ser o definido no art. 2006º do Código Civil, ou seja, desde a data da entrada da acção em juízo, que, neste caso, é desde a data da entrada em juízo do requerimento para a intervenção do Fundo.

8 – Considera violados os arts. 1º da Lei 75/98, de 19 de Novembro, 3º, 4º e 5º do Decreto-Lei nº 164/99, de 13 de Maio, 2006º do Código Civil, 401º, nº1, do Código do Processo Civil, e 24º, nº1 e 69º, nºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa.

Não houve contra-alegações.

O Ex.mo Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça determinou o julgamento ampliado do agravo, para efeito de uniformização de jurisprudência, nos termos dos arts 732º-A e 762º, nº3, do C.P.C.

O Ex.mo Procurador Geral-Adjunto neste Supremo Tribunal, considerando ser o Ministério Público o recorrente, com posição processualmente bem definida quanto ao objecto do recurso, teve por prejudicada a emissão de parecer prevista no art. 732º-B, nº1, do C.P.C.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

A Relação considerou provados os factos seguintes: 1- Mediante acordo, homologado por sentença, o menor BB foi confiado à guarda da sua mãe, AA.

2 – Mais foi determinado que o pai, CC, pagasse a título de alimentos, ao mesmo menor, a quantia mensal de 110 euros, até ao dia 8 de cada mês, mediante depósito bancário, quantia esta actualizável anualmente de acordo com os índices da inflação registados.

3 – O requerido nunca pagou a referida prestação de alimentos.

4 – Esporadicamente, atribuiu algum dinheiro ao menor para aquisição de peças de vestuário e compra de medicamentos.

5 – O requerido integra o agregado familiar de sua mãe, viúva, reformada, 6 – Está inactivo há cerca de três anos.

7 – Esporadicamente, trabalha na construção civil, auferindo cerca de 35 euros por dia.

8 – Por vezes, faz trabalhos ocasionais no sector têxtil, auferindo cerca de 3,50 euros, por hora.

9 – Beneficia do apoio dos irmãos, amigos e namoradas.

10 – Não se sente motivado para o exercício de uma actividade profissional.

11 – O menor reside com a progenitora em casa pertencente aos pais desta.

12 – Frequenta o sexto ano de escolaridade, na Escola C+ S de Manhente.

13 – Na sequência de uma tentativa de suicídio, o menor é acompanhado pelo Departamento de Psiquiatria e Saúde Mental do Hospital de S. Marcos.

14 – A mãe do menor, que trabalha como operária têxtil, encontra-se actualmente desempregada .

15 – Aufere um salário de desemprego, no valor de 407 euros.

16 – Apresenta problemas de saúde do foro psiquiátrico, sendo acompanhada pelo Departamento de Psiquiatria e Saúde Mental do Hospital de S. Marços e pelo Grupo de Acção Social Cristã.

17 - A mãe do menor despende mensalmente 100 euros na prestação da sua viatura, 80 euros em água, luz e gás e 26 euros em medicação.

A única questão a apreciar consiste em saber se as prestações alimentares a cargo do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores são devidas desde a data da entrada em juízo do requerimento para a intervenção do Fundo ou a partir da notificação da decisão judicial que julgue o...

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