Acórdão nº 03209/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelEugénio Sequeira
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul: A. O Relatório.

  1. L ...Seguros, SA, identificada nos autos, dizendo-se inconformada com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa - 2.ª Unidade Orgânica – na parte que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem: A. A Recorrente foi objecto de fiscalização ao exercício de 2003 pela Direcção de Serviços de Inspecção Tributária, na qual foram apuradas retenções na fonte alegadamente em falta, de que resultou a liquidação adicional de IRC n.º 2006 6420001917 e Juros Compensatórios.

    1. Inconformada, em 06/11/2006 a Recorrente apresentou Impugnação Judicial onde alegou a invalidade das referidas liquidações de imposto e juros, também no que respeita aos pagamentos feitos a PABLO ROJAS e a L ...INTERNATIONAL HOLDINGS, INC. No que releva ao objecto deste recurso, alegou, em síntese, que as liquidações se fundam em condições e formalismos estabelecidos no artigo 90.º do Código do IRC (redacção em vigor a partir de 1 de Janeiro de 2003) e no Despacho Ministerial n.º 1170/2003 (redacção em “vigor" desde 1 de Agosto de 2003) não estabelecidos nas CDT's celebradas com a Suíça e com os EUA, que assim quedam violadas por actos normativos de hierarquia inferior (artigo 8.º, n.º 2 da CRP) com a consequente invalidade dos actos de liquidação fundados nesses actos normativos internos ilegais e mesmo inconstitucionais. Essas “condições e formalismos" estabelecidos praeter legem (i.e., da CDT) seriam, no que ao caso respeita, a activação da protecção das CDT's depender de um formulário (“RFI") a certificar pelas administrações tributárias estrangeiras E a restrição do reembolso de imposto eventualmente retido (ou mesmo liquidado adicionalmente pela Administração Tributária) a uma janela temporal de 2 anos contados do facto gerador do imposto (tudo estabelecido no artigo 90.º, n.ºs 3 a 5 do Código do IRC), BEM COMO a necessidade de certificação no formulário RFI do credor dos rendimentos ser seu beneficiário efectivo (estabelecido no Despacho Ministerial n.º 1170/2003). Subsidiariamente, a Recorrente alegou que a serem válidas essas obrigações estabelecidas pela ordem jurídica Portuguesa, sempre as liquidações seriam de anular mercê de estar em causa um benefício fiscal cuja demonstração dos pressupostos retroage à data da sua verificação (artigos 4.º, n.º2 e 11.º do EBF, na redacção à data) e da ora Recorrente ter feito prova, ainda que a posteriori, da verificação desses pressupostos de aplicação das CDT's. No que releva para este recurso a Recorrente juntou formulário RFI da L ...INTERNATIONAL HOLDINGS INC. emitido em 2005 mas certificando expressamente o exercício de 2003 para efeitos da CDT Portugal/EUA, e logrou provar pelo seu conhecimento pessoal que PABLO ROJAS era elegível para a CDT Portugal/Suíça, no que não foi contrariada pela Administração Tributária que, pelo contrário, corrobora-o expressamente (cfr. artigo 24.º da Informação dos Serviços de fls. 69), sendo certo que, perante a alegação da Recorrente, no caso de lhe subsitirem dúvidas podia e devia saná-las por meio de troca de informações com a sua congénere.

    2. Por Ofício n.º 032521, de 19/04/2007, o Representante da Fazenda Pública pugnou pela improcedência da Impugnação Judicial, sustentando em síntese que a liquidação posta em crise pela ora Recorrente. A ora Recorrente não foi notificada para apresentar as Alegações nos termos do artigo 120.º do CPPT.

    3. Em 12/12/2008 a ora Recorrente pediu a Aclaração da Sentença a quo, que foi todavia indeferida pelo Tribunal a quo em 09/02/2009. Em 13.03.2009 a Recorrente foi notificada do Despacho de Admissão deste Recurso da, aliás douta, Sentença aqui parcialmente sindicada, bem como da resposta do Serviço de Finanças de fls. 120 e segs. de onde nada se retira, pois para a Administração Tributária a liquidação sindicada continua totalmente válida.

    4. A questão a discutir nestes autos é a já “clássica" controvérsia respeitante à aplicação das CDT's em Portugal, agora na convivência simultânea do artigo 90.º do CIRC na redacção da lei 32-B/2002 de 30/12) com o Despacho Ministerial 11701/2003 que aprovou o formulário de modelo oficial (modelo 12 RFI), sendo a questão aqui pleiteada respeitante a factos tributários ocorridos em 2003, altura em que existiu uma grande oportunidade para pacificar a cada vez maior litigância a este respeito.

    5. Em 2003 não existia disposição similar ao artigo 90.º (hoje, artigo 90.º- A) do Código do IRC, mas antes Circulares da Administração Tributária (pontificando então a Circular 18/1999 da DGI) a regulamentar a aplicação das CDT's, insistindo a Administração Tributária em proceder a liquidações de imposto com fundamento no incumprimento dessas circulares, apesar das posições em sentido contrário dentro da própria Administração Tributária (vide Parecer n.º 136/01, da Direcção de Serviços Jurídicos e do Contencioso, emitido pelo jurista António Lima Guerreiro, tirado no Processo n.º 283/2001, e Despacho n.º 596/2001, de 28/12/2001, emitido pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais), bem como de grande parte da jurisprudência (cfr. a título meramente exemplificativo os Acórdãos do TCA Sul, de 02-10-2007 (processo n.º 01891/07), de 16/05/2006 (processo n.º 504/05) e de 26-06-2007 (processo n.º 1.730/07).

    6. O legislador do Orçamento de Estado para 2003 optou por introduzir o artigo 90.º e posteriormente o Despacho Ministerial criou os formulários RFI, restringindo por lei interna as condições de aplicação das CDT's, o que traduz uma violação do pacta sunt servanta (no mesmo sentido, vide Alberto Xavier, ob. cit., pág. 541).

    7. Quanto ao RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO, cumpre especificar nos pontos 6 e 7 da Sentença que o Modelo 12 RFI da L ...International Holdings INC junto como documento 2 junto à Audição Prévia é datado de 02.12.2005 mas refere-se expressamente ao “Tax year 2003" o que não consta do ponto 7. da Fundamentação de facto da Sentença.

      I. Acresce que não foi dado como provado que o Formulário 12 RFI exige a certificação da qualidade de Beneficiário Efectivo, o que é matéria de facto relevante para as várias soluções plausíveis da questão de direito controvertida (mormente para a propugnada da Recorrente), o que também deveria ter sido especificado, pelo que se requer a alteração em conformidade do ponto 7 da Fundamentação de Facto, nos termos conjugados do artigo 123.º, n.º2 do CPPT com os artigos 511.º, n.º1 e 712.º do CPC.

    8. Requer-se ainda o aditamento de seguinte facto à Fundamentação de Facto: “12. O formulário Modelo 12-RFI aprovado pelo Despacho Ministerial 1170/2003 consagra a necessidade de certificar que o beneficiário do rendimento é beneficiário efectivo".

    9. Quanto ao RECURSO DE DIREITO, alegam-se vários erros de julgamento, devendo tomar-se em consideração os seguintes dispositivos legais, com aplicação ao caso em apreço: artigo 7.º da CDT celebrada com os EUA e com a Suiça, n.ºs 2, 3, 4 e 5 do artigo 90.º do CIRC (redacção da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro), artigo 90.º-A, n.ºs 5 e 6 do Código do CIRC, na redacção dada pela Lei n.º 67-A/2007 de 31 de Dezembro, artigos 8.º, 103.º e 112.º da CRP e, bem assim, artigos 4.º e 11.º do EBF, na redacção conferida pelo Decreto-Lei 198/2001, de 3 de Julho.

      L. A Sentença em crise concluiu que para a Recorrente poder pagar os rendimentos à L ...INTERNATIONAL HOLDINGS INC e a PABLO ROJAS a partir de 1 de Agosto de 2003 necessitaria, por força do disposto no artigo 90.º, n.ºs 3 e 4 do Código do IRC, que estes lhe entregassem até ao “termo do prazo para entrega do imposto" formulários 12 RFI (aprovados pelo Despacho Ministerial 11701/2003) já certificados pelas Administrações Tributárias dos EUA e Suíça, respectivamente, sendo decidido na Sentença que os formulários RFI são um requisito formal imposto por lei, que se destina à “regulamentação dos aspectos probatórios relativos às CDT, em nada se revelando contrário às mesmas, nem se prevendo nenhum novo requisito substancial" que, não sendo obtidos oportunamente, “não podia, em consequência, ser reconhecido o direito à isenção de retenção".

    10. Seguidamente concluiu a douta sentença que fica “o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto" e que isso “não viola as referidas convenções internacionais", nem os artigos 8.º e 103.º da CRP, e muito menos os artigos 4.º e 11.º do EBF, pois as medidas para evitar a dupla tributação económica internacional e interna não são benefícios fiscais mas sim desagravamentos fiscais (exclusões fiscais ou situações de não sujeição tributária)". De modo a sustentar a sua tese a Sentença em análise considera relevante e oportuno aderir “sem reserva" à doutrina do douto Acórdão do STA de 31.01.2008 (processo 0888/07), transcrito no artigo 10.º deste Recurso.

    11. A Recorrente entende que a douta Sentença a quo andou mal porque as CDT's com os EUA e a Suíça prevalecem sobre a legislação interna (artigos 8.º, n.º 2 e 112.º da Constituição da República Portuguesa), não condicionando a aplicação dos benefícios nelas previstos ao cumprimento de qualquer requisito de ordem formal interna, bastando para sua aplicação (quanto a rendimentos derivados da prestação de serviços a entidades não residentes em Portugal, como in casu) que seja demonstrado à entidade pagadora Portuguesa que os beneficiários dos rendimentos de prestação de serviços são residentes fiscais no outro estado contratante.

    12. Assim, o artigo 90.º, n.ºs 3, 4 e 5, do Código do IRC viola os artigos 7.º das CDT's quando prescreve um formalismo para essa demonstração, consistente na certificação pelas Administrações Tributárias estrangeiras dos formulários aprovados pelo Despacho Ministerial número 11701/2003 de 28 de Maio de 2003 (exigíveis a partir de 1 de Agosto de 2003), sob pena...

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