Acórdão nº 00848/04.7BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelDrº José Augusto Araújo Veloso
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: Relatório Por sentença datada de 17.01.2008, o Tribunal Administrativo e Fiscal [TAF] de Viseu julgou parcialmente procedente a acção comum em que T… demanda o Instituto de Estradas de Portugal [IEP] e, em conformidade, condenou este último a pagar ao autor a quantia de 13.004,92€ acrescida de juros moratórios, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

Descontentes com esta decisão, ambas as partes interpuseram dela recursos independentes, relativamente àquilo em que decaíram.

O autor, como recorrente, conclui assim as suas alegações: 1- O presente recurso vem interposto apenas da parte em que a sentença recorrida não condena o réu IEP a pagar ao autor o dano de privação de uso de veículo; 2- Por essa razão, o recurso é delimitado, nos termos do artigo 684º do CPC; 3- Na matéria de facto dada como provada, na fundamentação de facto, deu-se como assente que: “BB) O autor necessitava de uma viatura quer para se deslocar para o seu trabalho, quer para sua vida privada; CC) Conteúdo do documento nº9, que foi junto com a petição inicial, dado por reproduzido”; 4- Este documento nº9 refere que um veículo igual ao do autor, tem um custo diário de aluguer, que vai de 71,40€ a 95,00€ [ver o referido documento]; 5- O problema que se discute no presente recurso é a seguinte questão: deve ou não o réu ser condenado a pagar ao autor, também, o dano de privação de uso de veículo? 6- No nosso modesto entendimento, pensamos que sim, porque, como resulta dos artigos 483º e 562º do Código Civil [CC], os danos não se referem somente ao dano directo, mas também ao dano futuro, como a privação de uso de veículo; 7- No entendimento de Joel Timóteo Ramos Pereira, de Abrantes Geraldes e os Acórdãos dos Tribunais da Relação, parece também ser largamente aceite que o dano pela privação de uso do veículo, tanto é indemnizável, por danos patrimoniais, como por danos não patrimoniais; 8- A este respeito importa transcrever o que diz o Exmo. Juiz Joel Timóteo Pereira, no que respeita à indisponibilidade do veículo: "… 4. E o dano imediatamente ressarcível é precisamente a indisponibilidade do bem, qualquer que fosse a actividade [lucrativa, benemérita ou se simples lazer] a que o veículo estava afecto. A este propósito, o Tribunal da RC [AC de 26.11.2002, CJ, V, página 19] decidiu que “o uso de um veículo automóvel constitui uma vantagem susceptível de avaliação pecuniária, pelo que a sua privação consubstancia um dano patrimonial que deve, por si só, ser indemnizado com recurso a critérios de equidade. Por conseguinte, mesmo quando se trate de veículo em relação ao qual inexista prova de qualquer utilização lucrativa, não está afastada a ressarcibilidade dos danos tendo em conta a mera indisponibilidade do bem. …”; 9- Não restam pois dúvidas que, no presente caso, a Senhora Juíza a quo deveria ter condenado o réu a pagar ao autor a quantia de 10.600,00€, mais juros a partir da citação, pelo dano de privação de uso de veículo; 10- Ao não o ter feito, a Senhora Juíza a quo violou, por errada aplicação e interpretação, o disposto nos artigos 483º e 562º do CC, 4º alíneas a) e b) do nº1 e alínea c) do nº2 do DL nº237/99; 11- Devendo pois, a presente sentença ser revogada na parte que não condenou o réu a pagar ao autor os prejuízos pelo dano de privação de uso de veículo e substituída por outra que condene o réu a pagar ao autor a quantia de 10.600,00€, a esse título, mais juros a partir da citação.

O réu, como recorrido, apresentou contra-alegações, mas sem formular conclusões.

Todavia, enquanto recorrente, concluiu do seguinte modo: 1- Os elementos factuais dados como provados, nomeadamente a existência de uma corrente de água na estrada, não são causa adequada à produção do acidente, nem permitem estabelecer a relação de causa/efeito, de ligação entre a lesão e o dano; 2- Como vem decidindo o STA, não há o dever de indemnizar por ausência de nexo causal entre o facto ilícito e o dano, quando se não possa concluir – como acontece no caso presente – em face da prova coligida, que o acidente não teria ocorrido se não fosse a existência daquela corrente de água e a prática da manobra de condução que o condutor executou ou tenha sido obrigado a executar; 3- A presunção de culpa não se repercute sobre o ónus da prova do nexo de causalidade, entendido como relação de causa/efeito, de ligação positiva entre a lesão e o dano, através da previsibilidade deste em face daquele, a ponto de poder afirmar-se que o lesado não teria sofrido tal dano se não fosse a lesão [ver artigo 563º do CC]; 4- As águas pluviais não arrastam assim viatura em circulação, tudo tem a ver com a velocidade, com o fenómeno do aqua planing; 5- A presunção de culpa estabelecida no artigo 493º nº1 do CC é aplicável à responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos praticados no exercício de gestão pública. Neste caso, contudo, ao autor lesado cabe, primeiramente, o ónus de alegação e prova da base de presunção, ou seja, da ocorrência de facto causal dos danos; 6- A hidroplanagem tem uma influência particularmente dramática no contacto entre o pneu e a superfície da estrada em que o coeficiente de atrito estático [entre os pneus e a superfície da estrada] é determinado pela velocidade do veículo, que se ignora totalmente; 7- Na altura do acidente ocorriam águas pluviais intensas, e a recorrente procedia semanalmente à limpeza das valetas e sarjetas através do serviço próprio de vigilância e manutenção de que dispõe, e antes procedeu até a amplos trabalhos de desmatação e de limpeza das mesmas através de empresa especializada, a INTEVIAL; 8- Neste contexto, o entupimento das valetas e sargetas, surgiu de um momento para o outro, de forma fortuita e excepcional, devido a águas pluviais intensas, e a demandada não pode razoavelmente estar permanentemente em milhares e milhares de quilómetros de estrada procedendo à sua vigilância e fiscalização; 9- A sentença viola, entre outras, as disposições do artigo 493º nº1 e 563º do CC.

O autor, como recorrido, contra-alegou, concluindo assim: 1- As alegações da recorrente fazem uma interpretação substancial e formal desadequada ao caso concreto, apenas com o intuito de não assumir as consequências dos seus actos omissivos; 2- Existem factos, provados nas alíneas P a X da matéria provada na sentença recorrida, que demonstram claramente a responsabilidade omissiva da apelante, ao não ter mandado reparar as valetas; 3- Com essa omissão de não reparar as valetas todos os anos as águas eram atiradas para a estrada, indo danificar uma rua na povoação de Cidacos; 4- Apesar do conhecimento das autoridades Junta de Freguesia e Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis, e das suas promessas, as valetas nunca foram limpas pelo menos desde 1999 a 2003 [ver alíneas P a X da matéria dada como provada, constante de folha 5 da sentença]; 5- Existe assim, em função da matéria de facto...

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