Acórdão nº 01069/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1.

Relatório O MINISTÉRIO PÚBLICO inconformado com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul que, por extemporaneidade, rejeitou o RECURSO CONTENCIOSO DE ANULAÇÃO por si interposto da RESOLUÇÃO DO GOVERNO REGIONAL DOS AÇORES N.º 272/84, DE 5-12-84, e do DESPACHO DO SENHOR SECRETÁRIO REGIONAL DA ECONOMIA DOS AÇORES de 6-10-92, sendo contra-interessada a A…, SA.

Terminou as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. O douto acórdão recorrido rejeitou, considerando-o extemporâneo, o recurso contencioso interposto em 19.06.2001 pelo Ministério Público, face ao esgotamento do prazo de um ano fixado no artigo 28 n.° 1 alínea e) da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, contado a partir da publicação, da notificação ou do início de execução do acto.

  1. Isto, por haver considerado sancionáveis com a mera anulabilidade a Resolução do Governo Regional dos Açores n.° 272/84 de 05.12.84, e o Despacho do Secretário Regional da Economia dos Açores de 06.10.92.

  2. Todavia, aqueles actos (Resolução e Despacho) autorizaram/licenciaram na Reserva Natural da Lagoa do Fogo (Açores) grandes movimentos de terras, alterações ao relevo e ao coberto vegetal, bem como actividades perturbadoras do equilíbrio natural, e das condições de calma e silêncio — assim contrariando o disposto do Decreto Regional n.° 10/82/A de 18 de Junho que no artigo 50 alíneas c) e f) proíbe tais acções, e as declara no seu artigo 8° como “nulas e sem efeito”.

  3. Efectivamente, a grandeza e extensão das instalações da Central Geotérmica, bem como as actividades ali desenvolvidas, apresentam-se claramente susceptíveis de perturbar grave e irreversivelmente o ecossistema envolvente, conforme oportunamente sustentado pelo M.° P.° na petição de recurso contencioso, e resulta da documentação a ela anexa, designadamente dos documentos n.°s 2 (fls. 18, 19, 20 e 61), 4 e S.

  4. Deste modo resultando ofendido o conteúdo do direito fundamental ao ambiente e à qualidade de vida.

  5. Por conseguinte, os referidos Resolução e Despacho bem como os actos deles decorrentes são nulos e impugnáveis a todo o tempo, nos termos do disposto nos artigos 66 e 18 da C.R.P.; 133 n.° 2 alínea d) e 134 n.° 2 do C.P.A.: e 5 alíneas c) e fj e 8 do Decreto Regional (Açores) n.° 10/82/A de 18 de Junho.

  6. Neste contexto, ao rejeitar o recurso do M.P. com fundamento na sua extemporaneidade, incorreu o douto aresto recorrido em erro de julgamento, por violação dos preceitos atrás indicados.

    As entidades recorridas e a contra-interessada contra - alegaram pugnaram pela manutenção do acórdão recorrido.

    Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência. 2.

    Fundamentação 2.1.

    Matéria de Facto O acórdão recorrido deu como assente a seguinte matéria de facto 1 - Dentro da área da Reserva Natural da Lagoa do Fogo, na Ilha de S. Miguel - Açores - encontram-se instalados uma central geotérmica em funcionamento, e quatro furos geotérmicos a ela associados, através dos quais a recorrida particular – A…, SA - faz a exploração de recursos geotérmicos – documentos n° 1 e n° 2 (fls 67 a 69) juntos com a p.i., respectivamente a fls. 11-22 e 23-125 destes autos.

    2 - Os referidos furos ou poços, designados por CL1, CL2, CL3 e CL4, foram construídos, respectivamente: -de 88.11.16 a 89.02.27, -de 92.10.19 a 92.12.18, -de 93.05.24 a 93.07.16 e -de 93.11.22 a 94.02.03, tendo a central sido instalada na sequência dessa construção - doc. n°1 (fls. 1) e doc. n°3 (fls 2), este a fls. 126 e 127 dos autos.

    3 - A implantação da central e dos poços implicou perfurações no solo destinadas à abertura dos furos - o CL1, por exemplo, tem uma profundidade de 2029 metros - a construção de plataformas em cimento destinadas à central e aos furos, bem como a abertura de acesso às mesmas plataformas que levaram a movimentações de terras - escavações e terraplanagens - doc. n°2 - fls 18, 19 e 20 - e doc. n° 4, este a fls. 128 e 129 dos autos.

    4 - A construção dessas plataformas e dos seus acessos determinou alterações no relevo e no coberto vegetal.

    5 - As operações de perfuração do solo para a abertura dos poços geotérmicos foram determinantes de produção de ruídos de níveis elevados, tendo sido igualmente elevado o ruído produzido pela construção das plataformas e dos respectivos acessos - resultantes da movimentação e operação das máquinas utilizadas doc. n° 2 - fls 61.

    6 – Por outro lado, já na fase actual de exploração pela recorrida particular, em 97.11.21, foram efectuadas medições acústicas na envolvência da central geotérmica da Lagoa do Fogo, por uma equipa técnica da Direcção Regional de Ambiente da Região Autónoma dos Açores; os resultados foram os seguintes: - 1ª Medição - na chaminé - L50 = 90,4 dB(A).

    - 2ª Medição - a 50 metros da chaminé - L50 = 79,9 dB(A).

    - 3ª Medição - a 100 metros da chaminé - L50 = 73,4 dB(A).

    - 4ª Medição - a 150 metros da chaminé - L50 = 51,9 dB(A) Cfr. Doc. n°5, a fls. 130-134 dos autos.

    7 - A equipa técnica, interpretando estes resultados à luz do Regulamento Geral sobre o Ruído, aprovado pelo DL n° 251/87, de 24.06 (com as alterações introduzidas pelo DL n° 292/89, de 02.09), concluiu que a envolvente à central geotérmica da Lagoa do Fogo poderá ser caracterizada da seguinte forma: - Num raio de 50 metros a zona é considerada como muito ruidosa.

    - Até 100 metros da chaminé da central o local é considerado ruidoso.

    - Fora deste raio de acção a envolvente será considerada pouco ruidosa Cfr. Doc. n° 5.

    8 - Os actos recorridos, determinando o aproveitamento e a exploração dos recursos geotérmicos na área da Reserva Natural da Lagoa do Fogo, permitiram que fossem levadas a cabo actividades proibidas pelas referidas alíneas c) e f) do art° 5° ora citado.

    9 - Como decorre da Resolução n° 272/84, ora impugnada, em conformidade com orientação contida em anterior Resolução do Governo Regional dos Açores - a Resolução n° 17/83, que aprovara o programa geotérmico 1983/1987 - foram convidadas as empresas internacionais com credibilidade na matéria para apresentarem uma proposta de associação para aproveitamento dos recursos geotérmicos na Ilha de S. Miguel, na qual a Região participaria com 51% e as demais entidades com os restantes 49% - Doc. n° 6 e doc. n° 7, a fls. 135-138 e 139-140 dos autos.

    10 - Após análise de várias propostas de associação para aproveitamento dos recursos geotérmicos, o Governo Regional decidiu, pela Resolução n° 272/84: 1° - Aprovar a constituição de um consórcio com o objecto de aproveitar os recursos geotérmicos para a produção de energia eléctrica na ilha de S. Miguel.

    1. - Aprovar a participação da General Electric no consórcio, conjuntamente com as entidades por ela indicadas para...

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