Acórdão nº 0764/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Março de 2010

Data01 Março 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência os juízes do Supremo Tribunal Administrativo (STA): I.RELATÓRIO No Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF) foi interposto recurso contencioso, no domínio da LPTA, em que “A…” impugnou a deliberação 965/99 da Câmara Municipal de Amarante (CMA) de 13 de Dezembro de 1999, através da qual foi negado à recorrente o direito de reversão que lhe pedira, assacando-lhe vício de violação de lei.

Foram indicados, e intervieram no recurso contencioso como contra-interessados, a Junta de Freguesia de … e B… e C….

Correndo o recurso seus termos foi proferida sentença a conceder provimento ao recurso com a consequente anulação do acto impugnado.

Dela recorreram a CMA e os referidos contra-interessados.

A Junta de Freguesia de … ao final da sua alegação formulou as seguintes CONCLUSÕES: “1ª – O Dec. Lei n.° 400/84, de 31/12 – bem como os dois diplomas legais que o antecederam na regulamentação dos loteamentos urbanos – é omisso em relação à formalização da transferência da propriedade e ao estatuto jurídico das parcelas de terreno cedidas em operações de loteamento urbano, daí se concluindo que era obrigatória a celebração de escritura pública para formalizar a transferência da respectiva propriedade e que essas parcelas ingressavam no domínio privado dos municípios.

  1. – No caso do lote 16 referido nos presentes autos, o mesmo não ingressou no domínio público municipal, mas sim no seu domínio privado; 3ª — o ingresso do referido lote 16 no domínio municipal não ocorreu nem por via do disposto na al. c) do art.° 42° do D.L. n.° 400/84, nem por via do alvará de loteamento n.° 10/93; 4ª — Mas antes e somente por via do contrato de direito privado livremente celebrado entre a ora recorrida e o município de Amarante que as partes crismaram “contrato de cedência”, que foi titulado por escritura pública junta aos autos e, com o estatuto de bem integrado no domínio privado municipal passou a figurar no registo predial.

  2. — O próprio projecto urbanístico proposto pela ora recorrida e aprovado pelo município titulado pelo já referido alvará n.° 10/93 – como também a planta de síntese e as “plantas confirmativas” – não prevêem para o local – e nomeadamente para o lote 16 – a implantação de qualquer equipamento público; 6ª — Antes para eles prevêem a implantação de uma moradia unifamiliar de cave, rés-do-chão e andar, finalidade essa que ficou expressamente consignada no n.°5.1 do referido alvará e nas já referidas planta de síntese e “confirmativas”.

  3. – O lote n.° 16 foi inscrito no registo predial a favor do município de Amarante como integrado no domínio privado municipal, do que decorre, nos termos do art.° 7° do C.R.P., a presunção de que direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define.

  4. – Todos os sinais ou elementos de interpretação indicados nas conclusões anteriores são incompatíveis com a integração desse lote no domínio público municipal, não sendo tal conclusão prejudicada pelo facto de o nº 7 do mesmo alvará conter uma referência à al. c) do art.° 42° do já referido diploma legal, que se ficou a dever a erro ou lapso.

  5. – Não só o lote não se integrou no domínio público municipal, como não houve qualquer desvio de fim pois o alvará no seu ponto n.° 5.1 – e ainda as plantas já mencionadas – assinalam àquele lote o fim ou destino de nele ser implantada uma moradia unifamiliar de cave, rés-do-chão e andar.

  6. – Decidindo, como decidiu, que o referido lote n.° 16 se integrou no domínio público municipal por efeito da al. c) do art.° 42° do Dec. Lei n.° 400/84 e que houve desvio de fins, para assim anular o acto recorrido, a douta sentença fez errada interpretação e aplicação do disposto no art.° 42°, al. c) do Dec. Lei 400/84, do nº. 3 do art.º 16 do Dec. Lei n.º 448/91, e do art.º 5º do C.E./91.

  7. – Mesmo que se tivesse verificado a integração do referido lote n.° 16 no domínio público municipal e se tivesse assistido a um desvio de fim, mesmo assim deveria ter-se julgado procedente a excepção de caducidade, o desvio de fim teria ocorrido com a deliberação municipal de 20/06/94 ou, pelo menos, com a escritura de 18/07/1997.

  8. – Como o requerimento de reversão só deu entrada na Câmara Municipal de Amarante em 13/09/1999, haviam já decorrido nesta última data o prazo de dois anos previsto no n.° 6 do art.° 5º do C.E./91.

  9. – Decidindo de forma diferente, a douta sentença sob recurso violou a referida norma legal.

  10. – O ingresso no domínio privado do município do lote nº 16 operou-se por via do contrato de cedência titulado por escritura pública junta aos autos.

  11. – A invocação do direito de reversão pela recorrida, ainda que existisse esse direito na sua esfera pública, constitui um manifesto abuso de direito na vertente do venire contra factum proprium que, aliás, é de conhecimento oficioso, e torna ilegítima a invocação de tal direito.

  12. – Decidindo de forma diferente, a douta sentença recorrida violou o disposto no art.° 6° - A do C.P.A. e o art.° 334° do Cód. Civil, pelo que deve ser revogada”.

Por seu lado, a Câmara Municipal de Amarante disse em CONCLUSÃO: “1. O pedido de licenciamento urbano do prédio da A…, deu entrada nos seus respectivos serviços da C.M.A., e aí registado em 17/02/92.

  1. O regime dos loteamentos urbanos era então regulado pelo DL. 400/84 que nada dispunha sobre o direito de reversão.

  2. A A… não optou pelo regime do DL. 448/91 onde pela primeira vez foi estabelecido o direito de reversão, como lhe permitia o n°. 2 do artº. 71° do mesmo DL. 448/91.

  3. Daí ser de concluir que a A… não quis prevalecer-se do direito de reversão, se a ele houvesse lugar.

  4. Assim, tudo o relacionado com o loteamento da A… foi regulado pelo disposto naquele DL. 400/84, como dispunha o n°.2 daquele art°. 71º.

  5. O lote 16 estava integrado no conjunto dos lotes 1 a 31, acrescido de mais 6, licenciados à A… para construção de moradias familiares.

  6. O lote 16 foi cedido para integrar a propriedade privada do Município de Amarante; pois se assim não fosse: a) Não seria celebrado o contrato de cedência do mesmo entre a A… e a C.M.A., que é um contrato bilateral de direito privado; b) Nunca a C.M.A. teria pedido a sua descrição e inscrição em seu nome na Conservatória do Registo Predial de Amarante, nem o respectivo Conservador lavrava a sua descrição nem as sucessivas inscrições em nome da C.M.A., Junta de Freguesia de … e do Recorrido particular; c) A A… teria optado pelo regime do DL. 448/91; d) O cedido não seria o lote 16, “encravado” entre os demais lotes mas sim outro com situação mais ampla e desafogada que permitisse melhor desempenho do fim social a que se destinasse; e) Era indispensável que fosse indicado qual o equipamento público a que se destinaria; f) Nem a CMA o doaria; g) A A… tinha atempadamente pedido a sua reversão e não só passados mais de 6 anos, como o fez.

  7. Significa renúncia ao direito de reversão (a entender-se assistir esse direito à A…): a) O não ter optado pela aplicação do regime estabelecido no DL. 448/91; b) O não ter sido acordado entre a A… e a CMA o exercício do direito de reversão; c) O só passado mais de 6 anos vir requerer o direito de reversão.

  8. O alvará de licenciamento urbano da A… foi emitido em 11/08/93.

  9. Em reunião de 20/06/94 a C.M.A. deliberou doar o mesmo lote à Junta de Freguesia de … e que formalizou pela escritura pública de 18/07/97.

  10. Assim, na pior das hipóteses, o prazo para a A… requer e reversão do lote 16, completava-se em 18/07/99.

  11. Mas só em 13/09/99 é que a A… veio requer a reversão do mesmo lote.

  12. Nesta data já tinha caducado o prazo de dois anos que assistia à A… para requerer essa reversão.

  13. A venda do lote ao terceiro, Recorrido particular, não tem qualquer relevância jurídica, nem aproveita à A… pois, nessa data já tinha caducado o alegado direito de reversão.

  14. A deliberação camarária recorrida não sofre do vício que lhe é imputado na douta sentença pois, nessa ocasião, já se tinha extinguido o direito de reversão que por ventura assistisse à A….

  15. O Recorrido particular, a quem foi transmitido o lote 16 é terceiro, com o lote registado em seu nome, pelo que o pedido de reversão não lhe é aplicável.

  16. A invocação no nº. 7 do alvará de loteamento, da alínea c) do art°. 42° do DL. 400/84, deve-se a equívoco de redacção e que não é o único como mostra o expendido no texto das alegações.

  17. A douta sentença recorrida violou o disposto nos n°s. 3 e 5 do art°. 16°, os nºs. 2 e 3 do art°. 71°, todos do DL. 448/91, o n°. 6 do art°. 5° do CE/91 e artº. 7° do C. R. Predial”.

    Os recorrentes B… e C… formularam as seguintes CONCLUSÕES: “1. No caso em apreço não existe direito de reversão por não estar expressamente consagrado no Decreto-Lei n° 400/84; 2. A recorrida, a Câmara Municipal e a Junta de Freguesia não acautelaram os seus eventuais interesses através do registo predial, já que do registo não consta qualquer ónus ou encargo ou direito de reversão, sendo certo que podiam fazê-lo; 3. A autorização de loteamento estava sujeita a registo predial; 4. Os ora Recorrentes pagaram o respectivo preço; 5. Como terceiros que são em relação à Recorrida estão de boa fé, pelo que a conduta da Requerida sempre será abusiva do direito, aproveitando-se de uma situação ilegítima que estimulou e criou; 6. O disposto no artigo 16°, n.°3 do Decreto-Lei n°448/91 será mesmo inconstitucional, face ao entendimento que lhe é dado pelo Tribunal “a quo’; 7. Violou a aliás douta sentença o disposto nos artigos 16°, n.°s 3 e 5 e 71°, n°s 2 e 3 do Decreto-Lei n°448/91, artigo 5°, n.° 6, do CE/91, artigos 2°, n.° 1, al. d) e 7° do Código de Registo Predial e artigos 18° e 62° da Constituição da República Portuguesa.” A recorrente contenciosa contra-alegou formulando as seguintes Conclusões: “A. Em face da sobeja clareza dos factos dados como provados pelo Tribunal a quo e da sua correcta subsunção ao Direito aplicável, o presente recurso constitui simples expediente dilatório dos ora Recorrentes, aliás, bem...

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