Acórdão nº 0583/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Março de 2010
Magistrado Responsável | LÚCIO BARBOSA |
Data da Resolução | 01 de Março de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. A…, identificada nos autos, impugnou judicialmente, junto do TAF de Coimbra, a liquidação de IRS do exercício de 2000.
O Mm. Juiz daquele Tribunal julgou a impugnação improcedente.
Inconformada, a impugnante trouxe recurso para este Supremo Tribunal. Formulou as seguintes conclusões nas respectivas alegações de recurso: 1. Do dever de actuação balizada pelos princípios da justiça e da imparcialidade, com concretização no art. 58º da LGT, decorre para a AF uma particular injunção normativa de actuação segundo “critérios de isenção na averiguação das situações fácticas, realizando todas as diligências que se afigurem necessárias para averiguar a verdade material, independentemente de os factos a averiguar serem contrários aos interesses patrimoniais que à administração tributária cabe defender”; 2. Por força dessa norma, a AF deve realizar todas as diligências que sejam objectivamente relevantes para a concreta averiguação da realidade factual em que a decisão do procedimento deve assentar, trazendo a essa instância todas as provas relativas à situação fáctico-material decidenda; 3. As regras e critérios do ónus da prova não interferem com a actuação do princípio do inquisitório, sendo que este actua funcionalmente antes de definida a matéria de facto, como dimensão aquisitiva dos elementos necessários à decisão, não podendo a AF valer-se das regras do artigo 74º da LGT, para deixar de realizar as diligências que sejam necessárias ao apuramento da verdade material.
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A actuação oficiosa da AF não pode ser afastada sob pretexto de pôr em risco a eficiência e a viabilidade do sistema, principaliter independentemente de um juízo de ponderação concreta sobre a actividade administrativa omitida, designadamente quanto aos meios administrativos necessários à sua prossecução.
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A AF não podia, ao abrigo do que lhe é exigido no artigo 58º da LGT, recusar a total irrelevância probatória endoprocedimental dos cheques entregues para pagamento de obras realizadas no imóvel alienado, sem previamente ter confirmado ou infirmado junto do sujeito em causa a realização das obras pagas por aqueles cheques e se a factura respectiva foi ou não emitida e porque não foi entregue à recorrente.
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Essa actuação não configura uma actividade susceptível de postergar o princípio da eficiência ou a viabilidade do sistema, reconduzindo-se a uma actividade cognoscitiva simples, possível e rapidamente realizável, não se vislumbrando como pode a mesma ser vista e entendida como a tradução de uma imposição desproporcionada aos agentes administrativos.
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Não podendo ignorar-se, em qualquer caso, que o imputado incumprimento de “obrigações declarativas e de documentação”, sempre terá na sua base uma actuação ilegal de um terceiro (não entrega/emissão da factura correspondente aos serviços prestados), sendo que, perante essa realidade, torna-se incompreensível que a administração deixe de actuar junto da fonte da inexistência dos elementos que considerou necessários à comprovação dos encargos, cuja efectiva realização material, apenas contestou por motivos formais, que indevidamente é deixada passar em claro face ao princípio da legalidade, da prossecução do interesse público, da justiça e da imparcialidade.
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Ao ter decidido como decidiu, o Tribunal violou abertamente a injunção tipificada no artigo 58° da LGT.
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E, ao interpretar a norma do artigo 58° da LGT, em conjugação com o artigo 74°, n. 1, do mesmo diploma, no sentido de que a actuação inquisitória administrativa está condicionada pelas regras do ónus da prova, aplicou norma contrária aos princípios da justiça, da imparcialidade e da boa fé, constitucionalmente tutelados no artigo 266° da norma normarum.
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Sendo essas normas (58º e 74°/1 LGT) inconstitucionais, por violação dos...
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