Acórdão nº 01438/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

A… e outros intentaram, neste STA, recurso contencioso de anulação do despacho do Sr. Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, de 11/4/03, que indeferiu o pedido de reversão da parcela de terreno identificada sob o n.º 14 da Declaração de Utilidade Pública proferida pelo Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas, em 18/3/80, alegando que essa parcela foi aplicada em finalidade diversa da que motivou a sua expropriação já que, tendo esta sido justificada pela necessidade da construção de equipamentos públicos, essa finalidade foi desrespeitada, uma vez que essa parcela foi submetida a uma operação de loteamento e parte dos lotes foi vendida para a construção de prédios de habitação e comércio.

Tal recurso foi julgado procedente e, em consequência, o despacho impugnado foi anulado.

A Câmara Municipal da Batalha pediu a revisão desse Acórdão anulatório alegando que não foi citada como contra interessada, como devia, já que, tendo sido a beneficiária da expropriação da referida parcela, será afectada pela decisão a proferir nestes autos.

Esse recurso de revisão foi provido o que determinou a anulação de parte do processado - mantendo-se contudo a citação e a resposta da entidade recorrida - e a notificação dos Recorrentes para que estes corrigissem a sua petição inicial.

O que eles fizeram apresentando uma nova petição.

A CM da Batalha respondeu não só para invocar a caducidade do direito de reversão como para impugnar que o bem expropriado tivesse sido aplicado a finalidade diversa da que motivou a sua expropriação.

As partes foram notificadas para alegar.

Os Recorrentes formularam as seguintes conclusões: 1.Todos os elementos - fácticos e de direito - aduzidos pela contra-interessada na contestação, constam da informação técnica n.º 19, datada de 03-03-03, elaborada pela jurista da Direcção-Geral das Autarquias e que serviu de fundamento per relatione à decisão proferida - ademais, os factos constantes dessa informação técnica foram dados como reproduzidos nos presentes autos no aresto proferido em 27/10/2004.

  1. Os únicos argumentos jurídicos "novos" prendem-se com o conteúdo do pedido formulado nos autos e a invocação da Lei dos Solos para justificar que uma entidade pública pode expropriar para vender terrenos no comércio privado, funcionando assim como agente imobiliário.

  2. Pelo que, todos os restantes argumentos jurídicos e factos insertos na contestação da contra-interessada já constavam na informação técnica supra referida e foram devidamente levados em linha de conta na decisão jurisdicional anteriormente proferida nos autos, senão vejamos: 1. - O histórico procedimental da célula B e argumentação de que a expropriação visava esse fim público, consta da informação técnica que fundamentou o acto recorrido - nomeadamente, nos pontos 19 a 37 da resposta apresenta pelo Presidente da Câmara da Batalha.

  3. - O suposto conhecimento dos recorrentes sobre o destino dos terrenos expropriados - facto falso e que não se extrai dos documentos juntos aos autos - consta da informação técnica que fundamentou o acto recorrido, nomeadamente, nos pontos 38 a 44 da resposta apresenta pelo Presidente da Câmara da Batalha.

  4. - A caducidade do direito de reversão já foi objecto de análise e reanálise administrativa, bem como de múltiplas decisões judiciais e recursos jurisdicionais durante quase 15 anos e, como tal, todos os possíveis e imaginários argumentos já foram ponderados nos autos.

  5. Face ao conteúdo da contestação apresentada pela contra-interessada, não olvidando, ainda, que já foram anteriormente proferidas alegações nos presentes autos, vêm os recorrentes dar, nesta sede, como reproduzida a matéria de facto e de direito constante na petição inicial e alegações produzidas nos autos, o que se revela fundamental para extrair um "conteúdo positivo" quanto ao cumprimento dos requisitos que alicerçam o direito de reversão.

  6. Falece de qualquer sentido (sendo assim improcedente) a questão prévia suscitada pelo Município, na medida em que, por um lado, no cabeçalho se refere estritamente que se pretende a anulação do acto que não decretou a reversão e, por outro lado, se refere no pedido que se pretende (também estritamente) a anulação do mesmo acto - sendo que tudo o resto, mormente o reconhecimento da reversão, seu conteúdo e limites, tem a ver com uma eventual execução de sentença ou com a eventual acção a intentar nos Tribunais Administrativos com vista à concretização do conteúdo da reversão dos bens expropriados.

  7. “A autoridade expropriante não demonstrou que os terrenos expropriados foram afectos ao fim expropriativo, em termos do art. 342.°, n.º 2, do C. Civil." - cfr. Ac. STA de 4/6/02, proferido no proc. n.º 37650 e Ac. STA de 24-05-2000, proferido no proc. n.º 039505.

  8. Aliás, tendo uma parcela de terreno sido expropriada com a finalidade da sua integração num plano urbanístico e nele também se prever a construção para habitação, comércio e serviços tal não autoriza que, consumada a expropriação, a parte da parcela que não foi integrada na implantação de equipamentos públicos que justificou a sua expropriação possa ser loteada e vendida em hasta pública para ser integrada no comércio privado de construção. – cfr. Ac. do STA de 27/10/04, proferido no âmbito deste processo e Ac. do TP de 17/10/01, proferido no processo n.º 039204.

  9. O pedido de socorro lançado à Lei dos Solos também nada vale posto que, para além de não se tratar de criar um aglomerado urbano ou de se tratar da expansão ou desenvolvimento de aglomerados com mais de 25.000 habitantes, a Recorrida esqueceu-se de citar a seguinte norma da Lei dos Solos:Art.º 6.º1. Na execução de qualquer plano de expansão, desenvolvimento ou renovação urbanas, ou de novos aglomerados, serão sempre fixados os números ou percentagens dos fogos a construir, sujeitos a fixação ou controle dos valores das rendas ou dos preços de venda, além dos destinados a habitação social.

  10. As características técnicas e os valores máximos do custo de construção, das rendas ou dos valores de venda da habitação social serão fixados, segundo as características, mediante portaria do Ministro da Habitação, Urbanismo e Construção.

  11. Ou seja, para além de na declaração de utilidade pública não constar qualquer alusão à Lei dos Solos e, como tal, não ter sido ao abrigo destas normas que se procedeu à expropriação, podemos ver claramente que este dispositivo legal apenas reitera que é necessário sempre existir um fim público, mesmo quando se leva a cabo o desenvolvimento de um aglomerado urbano o que, repita-se, não foi o caso.

  12. Aliás, se norma existisse no nosso ordenamento jurídico que dissesse o oposto a mesma seria claramente inconstitucional por, sem razão suficiente e que no caso não foi minimamente demonstrada, enquadrar uma afronta evidente aos princípios da igualdade, necessidade e proporcionalidade e da propriedade privada. - art.ºs 13 e 62 da CRP.

  13. Os requerimentos e missivas transcritos pela autarquia relativos ao ano de 1982, ocorreram no âmbito ou na esperança de a indemnização devida pela expropriação poder ser, em transacção judicial ou extrajudicial, concretizada na possibilidade de os AA. ainda assim poderem construir nos seus terrenos expropriados e desta forma limitarem a enorme diferença (que se veio a verificar) entre o preço por m2 da expropriação e o preço por m2 de venda dos solos (800$00 para 60.000$00).

  14. A Exposição ao Sr. Provedor de Justiça junta aos autos é de 2003 e não de 1989 sendo que a autarquia não transcreveu nos autos a totalidade do requerimento, mas apenas a parte que seria tendente a alicerçar a sua tese, tendo olvidado os termos finais desse requerimento em que os recorrentes se insurgem contra a legalidade da expropriação e exprimem toda a sua indignação pelo facto de estarem a ser expropriados para fins que entendiam nunca poder ter qualquer vinculação ao interesse público - serviços e comércio.

  15. Atentos os pressupostos de que depende o venire contra factum proprium, importa concluir que nunca o comportamento dos recorrentes foi apto a gerar confiança no espírito da autarquia em como os mesmos se conformaram com o uso dos seus solos para fins privados, tendo, isso sim, lutado de diversas formas para que tal se não concretizasse - cfr. corpo do Ac. STJ 18/12/08, proferido no proc. n.º 08A3673.

  16. Os Recorrentes nunca se conformaram com o uso comercial e para serviços dos seus solos, o que se alega sem detrimento do que foi dito no sentido de que, quanto à habitação, os Recorrentes sabiam que poderiam agir no mercado sem limites, enquanto sabiam ou intuíam que a autarquia não poderia (como não pode) assim agir, devendo, aquando da alienação dos solos, ter concretizado alguma vinculação dessa alienação a interesses sociais.

  17. Sendo assim que - também atentos os pressupostos de que depende o abuso de direito e face à circunstância de os recorrentes nunca se terem conformado com o facto de a autarquia estar a expropriar bens para agir no mercado como se fosse promotora imobiliária, lucrando com isso como qualquer particular o faria - não parece de todo em todo poder concluir-se que foram manifestamente ou clamorosamente ofendidos os fins do direito de reversão que proíbe este tipo de comportamentos por parte do Estado - cfr. corpo do Ac. STJ 18/12/08, proferido no proc. n.º 08A3673.

  18. Aliás, dos documentos juntos aos autos podemos verificar que, desde o início do procedimento expropriativo, os recorrentes aceitavam que parte dos seus terrenos servisse para a construção de equipamentos públicos; todavia, sempre se manifestaram no sentido de pretender edificar nas parcelas que seriam aptas a desenvolver construção para fins privados.

  19. Pelo que, face à intransigência da contra-interessada em deixar os recorrentes desenvolverem um projecto imobiliário na parte dos terrenos que se destinaria a fins privados, assumiram que o Município da Batalha construísse habitações para fins sociais.

  20. No que toca à contagem do prazo...

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