Acórdão nº 0471/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Março de 2010
Magistrado Responsável | MADEIRA DOS SANTOS |
Data da Resolução | 01 de Março de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: A…, interpôs recurso de revista do acórdão do TCA-Norte, de fls. 530 e ss., que confirmou a sentença em que o TAF do Porto, julgando procedente a excepção de caducidade do direito de accionar, proferiu uma decisão absolutória da instância no processo de contencioso pré-contratual que a aqui recorrente movera contra o Ministério da Educação e onde figura como contra-interessada a B….
A recorrente terminou a sua alegação de recurso enunciando as seguintes conclusões: Quanto à admissibilidade do recurso:
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De acordo com o artigo 101.º do CPTA, “Os processos do contencioso pré-contratual têm carácter urgente e devem ser intentados no prazo de um mês a contar da notificação dos interessados ou, não havendo lugar a notificação, da data do conhecimento do acto”.
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O Acórdão recorrido aplicou tal artigo à pretensão em causa nos autos: uma pretensão impugnatória de normas concursais.
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No entanto, a conformação legal do artigo 101.º não é suficientemente clara para suportar tal aplicação, avançando aliás, a totalidade das pistas que fornece, no sentido contrário.
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De facto, o artigo 101.º apenas se refere (e fá-lo de forma expressa) a actos e omite qualquer referência (sequer implícita) a normas concursais.
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Pelo que se o presente recurso versa sobre as seguintes questões: a. O prazo de impugnação de normas concursais (que são regulamentos) no contencioso pré-contratual urgente está disciplinado pela lei, designadamente no artigo 101.º do CPTA, do mesmo modo que o prazo de impugnação de actos? b. Decorre do artigo 101.º do CPTA que o prazo de impugnação de normas concursais é o mesmo da impugnação de actos praticados em procedimentos de formação de contratos? c. Acto administrativo e norma equiparam-se para estes efeitos, apesar de o artigo 101.º não dar qualquer indicação (literal ou outra) nesse sentido? F) Em suma, aquilo que importa tornar firme através deste recurso é o entendimento sobre se o prazo de impugnação previsto no artigo 101.º do CPTA deve, como defendido pelo Acórdão recorrido, aplicar-se às pretensões de impugnação de normas concursais apesar da sua expressa referência a actos e a da sua expressa omissão quanto a normas concursais e, em caso afirmativo, de que forma deve o mesmo prazo ser contado.
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O STA nunca se pronunciou sobre esta questão e a doutrina considera que a questão não está tratada na própria lei (PEDRO GONÇALVES) havendo mesmo quem defenda na doutrina que, por se tratar de uma norma, não existe prazo de impugnação (ANDRÉ SALGADO MATOS).
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A resposta a dar esta questão pelo STA é fundamental para a segurança e certeza jurídica das entidades que participam em procedimentos de contratação abrangidos pelo artigo 101.º do CPTA.
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O STA tem vindo a conferir uma relevância social de importância fundamental às questões relativas ao contencioso pré-contratual, nomeadamente por as mesmas terem dado lugar à Directiva 89/665/CEE, de que o contencioso pré-contratual é transposição.
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Estamos perante uma questão que se relaciona, de forma íntima e radical, com um direito fundamental constitucionalmente consagrado: o direito à tutela jurisdicional efectiva enquanto direito de acesso aos tribunais, porquanto aquilo que está em causa é a concreta definição, no que à sua caducidade diz respeito, da extensão do direito de impugnação de normas concursais enquanto direito comunitariamente imposto e legalmente previsto.
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Porque o artigo 101.º apenas se refere (a actos e omite qualquer referência a normas concursais, a sua aplicação às pretensões impugnatórias de normas concursais exige um conjunto de operações exegéticas destinadas a demonstrar que quando a lei, neste artigo e só neste artigo, utiliza a palavra “acto” quer também nela incluir a palavra “norma”.
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Tanto mais que a expressão “conhecimento do acto” ínsita no referido artigo 101.° remete para os casos de dispensa de notificação dos actos administrativos, razão pela qual não pode ser substituída, sem qualquer operação exegética, pela expressão “conhecimento da norma”.
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A inexistência de referência, no artigo 101.°, às normas concursais pode ser explicada e fundamentada nos princípios constitucionais que impedem a convalidação de regulamentos ilegais e sugerir por recurso ao princípio da impugnação unitária e à transposição das Directivas Comunitárias, a indicação de que as mesmas poderão ser impugnadas até ao momento em que terminar o último prazo de impugnação de um acto invalidante do procedimento, tradicionalmente o acto que lhe coloca termo.
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A presente questão ultrapassa os limites da situação singular, projectando-se na possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e que não está dependente da factualidade aqui apurada.
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Estamos pois perante um recurso que deve ser admitido porquanto estamos perante a interpretação e aplicação de uma norma que (i) neste âmbito, não foi ainda tratada pelo STA, (ii) não oferece uma resposta unívoca, (iii) os tribunais são chamados a aplicar com frequência, conferindo-lhe uma diferente relevância, (iv) envolve a concreta definição da extensão do direito de acesso ao direito, (v) implica com a aplicação de Directivas comunitárias e (vi) extravasa o caso dos autos.
Quanto às questões a decidir: P) A pretensão da Recorrente constitui uma pretensão impugnatória de normas, admitidas, sob forma urgente, no contencioso pré-contratual, nos termos do artigo 100º., n.° 2 do CPTA.
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O artigo 100.º do CPTA é muito claro no sentido de encontrar diferenças no tratamento processual a dar às várias pretensões que podem correr sob o processo urgente de contencioso pré-contratual.
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O artigo 100º, n.° 1, por cotejo com o artigo 100.°, n.° 2 demonstra que o CPTA estabeleceu que o regime relativo à impugnação de actos administrativos só pode servir de auxiliar interpretativo quando estivermos perante pretensões que digam respeito a impugnação de actos administrativos pré-contratuais.
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Tal opção é perfeitamente entendível tendo em conta que o regime relativo à impugnação de actos administrativos assenta nos pressupostos da notificação e publicitação, provindos de um desígnio constitucional, vertido no artigo 268°, n.°3 da Constituição da República Portuguesa, que não têm qualquer cabimento nem aplicação no âmbito das normas concursais.
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O n.° 3 do artigo 100.°, por cotejo com o artigo 100°, n.° 2, demonstra que o CPTA não equipara, para os efeitos do disposto na secção relativa ao contencioso pré-contratual, os actos administrativos impugnados a normas concursais impugnadas, limitando-se, e de forma expressa, a equiparar a actos administrativos os actos dirigidos à celebração de contratos do tipo previsto no n.° 1 do artigo 100.º que sejam praticados por sujeitos privados no âmbito de um procedimento pré-contratual de direito público.
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Assim, o CPTA não autoriza a que palavras e expressões como “norma”, “programa do concurso” ou “caderno de encargos” possam ser lidas como “actos”, pelo que quando o CPTA se refere, no contencioso pré-contratual, a actos administrativos, não pode presumir-se que está a referir-se também a normas concursais.
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Estas precisões do artigo 100.º têm que ver com a diversa natureza das duas pretensões e em nada contrariam a vontade comunitária e nacional de colocar as pretensões impugnatórias de normas concursais sob um mesmo regime célere e eficaz pelo que não autorizam a que, por força da unificação do meio processual urgente em que ambas se inserem, se considere que todas as normas do processo urgente se aplicam, de igual forma e com igual extensão, às pretensões em causa.
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Estas precisões do artigo 100.º obrigam a ler o artigo 101.º do CPTA tendo em conta aquilo que lá vem escrito e tendo em mente as distinções expressamente plasmadas no artigo 100.º.
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Não decorre do artigo 101.º do CPTA que o prazo de impugnação de normas concursais é o mesmo da impugnação de actos praticados em procedimentos de formação de contratos porquanto tal artigo não se refere, sequer implicitamente, a normas.
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Ao procurar lidar com esta omissão, o Acórdão recorrido optou por equiparar o conceito de “norma” ao conceito de ‘acto” ínsito na letra do artigo 101.° do CPTA, esquecendo que o próprio artigo 100.º se encarregara de proibir tal equiparação, promovendo uma interpretação contra legem.
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Ainda a procurar lidar com aquela omissão, o Acórdão recorrido optou por aplicar, de forma subsidiária, o regime relativo à impugnação de actos administrativos, esquecendo também aqui que o próprio artigo 100.º se encarregara de proibir tal equiparação, promovendo uma interpretação contra legem.
A
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Não se diga que a utilização da expressão “acto” e não da expressão “acto administrativo” permite concluir por um conceito lato de “acto” onde caberão também as normas, porque essa não é a sistemática do CPTA e tal equiparação não resistiria a um cotejo com as restantes disposições do diploma. Se assim fosse, por exemplo, teríamos que concluir que o artigo 58.° do CPTA, manifestamente relativo aos prazos de impugnação de actos administrativos, abrangeria também a impugnação de normas uma vez que o mesmo se refere apenas a “actos” e não a “actos administrativos”...
BB) A substituição, proposta pelo Acórdão recorrido, da expressão “conhecimento do acto” por “conhecimento da norma”, assim aplicando o artigo 101.º ao caso dos autos não está autorizada porquanto: a. teria por efeito equiparar actos administrativos a normas concursais, contrariando as precisas e...
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