Acórdão nº 114/19 de Tribunal Constitucional (Port, 19 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Claudio Monteiro
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 114/2019

Processo n.º 1402/17

1.ª Secção

Relator: Conselheiro Claudio Monteiro

Acordam, em confer ência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional,

I – Relatório

1. A., S.A. e Outros, vieram, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC), interpor recurso do acórdão proferido, em 12 de outubro de 2017, pelo Supremo Tribunal de Justiça, que indeferiu o pedido de retificação de erros materiais e a arguição de nulidade do acórdão proferido pelo mesmo tribunal, em 13 de julho de 2017 (cfr. fls. 3566).

2. No seu requerimento de interposição de recurso os Recorrentes apresentaram os seguintes fundamentos (cfr. fls. 3581 a 3585):

«A. SGPS, S.A. E OUTROS, recorrentes melhor identificados nos autos supra melhor identificados, notificada da decisão que incidiu sobre o pedido de retificação de erros materiais e arguição de nulidade do acórdão proferido, dele vem agora interpor recurso para o Venerando Tribunal Constitucional, em secção, nos termos e com os fundamentos que, sumariamente, se alegam:

1. Na presente lide, face ao douto acórdão de que ora se recorre, encontram-se esgotados todos os recursos ordinários que a lei permite e verdade é que a recorrente não se pode conformar com o decidido nas doutas instâncias que sobre a lide se têm pronunciado.

2. O presente recurso é interposto ao abrigo do disposto no art. 70° n° 1 al. b) e n.º 2 e ainda no art. 75°-A nºs 1 e 2 da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro, com as alterações introduzidas pelas leis nºs 85/89, de 7 de Setembro e 13°-A/98, de 26 de Setembro.

3. Com efeito, nas suas alegações de recurso para o Venerando Supremo Tribunal de Justiça o recorrente, reiterou que a interpretação que o Tribunal de Primeira Instância e o Tribunal da Relação fazem do disposto no art. 816.° e 814.° do CPC, concretamente no que diz respeito à limitação da utilização da figura da compensação em sede de oposição à execução é manifestamente inconstitucional. 4. Desde logo, viola clara e inequivocamente o princípio de acesso à justiça.

5. Os princípios gerais estruturantes do processo civil, em qualquer das suas fases, deverão essencialmente representar um desenvolvimento, concretização e densificação do princípio constitucional do acesso à justiça.

6. Na verdade, tal princípio não se reduz à mera consagração constitucional do direito de ação judicial, da faculdade de qualquer cidadão propor ações em tribunal, implicando, desde logo, como, aliás, a doutrina vem referindo, que a todos seja assegurado, através dos tribunais, o direito a uma protecção jurídica eficaz e temporalmente adequada.

7. O direito de acesso aos tribunais envolverá identicamente a eliminação de todos os obstáculos injustificados à obtenção de uma decisão de mérito, que opere a justa e definitiva composição do litígio, privilegiando-se assim claramente a decisão de fundo sobre a mera decisão de forma.

8. De facto, a argumentação plasmada na sentença proferida pela MM. Juiz a quo e no Acórdão no sentido de que admitir a compensação em sede de oposição à execução sem que o crédito peticionado em sede de compensação seja dotado, ele próprio, de força executória é manifestamente contrário à lei, constituindo um obstáculo claro e injustificado à obtenção de uma decisão de mérito.

9. A celeridade que indubitavelmente deve presidir às ações executivas não deve ser confundida com atropelos jurídicos que configuram verdadeiras denegações de justiça.

10. A interpretação restritiva que fazem faz do disposto nos artigos 814º e 816º CPC, (aplicáveis à data) , hoje na sua nova redacção artigos 729º e 731º do actual CPC , chegando mesmo a equiparar as situações em que o título executivo é uma sentença e quando o título executivo é um título cambiário é manifestamente desprovida de fundamento.

11. O legislador ao autonomizar as situações em que o título executivo que serve de base à execução é uma sentença das demais, quis indubitavelmente circunscrever os fundamentos da oposição à execução unicamente nos casos em que o título é uma sentença, já que nos demais é inequívoco que podem servir de fundamentos à oposição à execução quaisquer outros que possam ser invocados no processo declarativo - veja-se n02 do art. 816.° do CPC, hoje 73l.° do CPC.

12. Pelo que não podem os ora recorrentes conformar-se com a interpretação do Acórdão que para além de manifestamente contrária à lei configura uma limitação crassa de acesso à justiça, princípio constitucionalmente consagrado, na medida em que impede os aqui recorrentes de fazer valer um crédito que detém sobre o aqui recorrido.

13. Crédito esse que ainda para mais é dado como provado em sede do presente processo mas que, ainda assim, não pode ser considerado para efeitos de uma compensação de créditos atenta a interpretação ora apresentada.

14. Paralelamente constitui a interpretação supra explanada uma crassa violação do princípio do contraditório.

15. No âmbito de uma oposição à execução, que funciona, como supra se alegou como uma ação de contra-crédito, ao ser coartada ao executado/opoente a possibilidade de fazer valer um crédito que dispõe sobre o exequente, está claramente a ser violado o princípio do contraditório, bem como o princípio de acesso à justiça já supra alegado.

16. A oposição à execução, nos termos do disposto nos art. 814° e 816º do CPC (hoje na sua nova redacção artigos 729º e 73l.° do actual CPC) pode consistir na alegação de factos que conduzem à modificação ou extinção da obrigação inerente, mormente através da compensação de créditos.

17. Sendo vedada essa mesma possibilitada o contraditório do executado está a ser manifestamente restringido e, nesses mesmos termos, violado.

18. Nestes termos e noutros de Direito que V. Exa. doutamente suprirá, invoca-se a inconstitucionalidade das normas dos artigos 814° e 816º do CPC, hoje na sua nova redacção artigos 729.° e 731.° do actual CPC, na interpretação formulada pelo Acórdão em crise, ou seja da inadmissibilidade da utilização da figura da compensação.

19. A inconstitucionalidade ainda é mais gritante no caso em apreço nestes autos atenta a caução validamente prestada.

20. Como consta dos autos está prestada uma caução nos autos de execução através de garantias bancárias on first demando

21. Não obstante os aqui recorrentes entenderem que sempre e de todo o modo deveria ser admitida a compensação de créditos em sede de oposição à execução, nos casos em que está validamente prestada caução, nunca e em momento algum poderia tal compensação não ser admitida.

22. Por si só, o facto de estar validamente prestada caução idónea que garante a totalidade do crédito exequendo, bem como as custas e juros inerentes ao mesmo, deveria ser suficiente para a admissibilidade da compensação e para uma interpretação distinta da realizada pelo Acórdão.

23. De facto, não é razoável que perante uma situação em que está manifestamente garantida a cobrança efetiva do crédito, obviamente na eventualidade dos executados virem a ser condenados, seja o direito ao contraditório dos mesmos francamente restringido como na interpretação plasmada nestes autos.

24. Pelo que, ainda mais nestes casos, falecem totalmente os argumentos deduzidos pela MMa Juiz a Quo e Acórdão, que, para aquela, fundamentam a indamissiblidade da compensação em sede de oposição à execução.

25. Nada na lei prevê tal restrição, motivo pelo qual, sob pena de violação do princípio da legalidade, de acesso à justiça e do contraditório, e ainda com maior ênfase nas situações em que a acção executiva possui caução valida e definitiva, devem os artigos 8140 e 8160 do CPC, (hoje na sua nova redacção artigos 729º e 731º do actual CPC) na interpretação dada pela MM. Juiz a quo no sentido de não ser admissível a compensação no âmbito da oposição à execução er julgada inconstitucional com as demais consequências legais,

26. É nestes termos que se reputa de toda a legalidade e utilidade prática o presente recurso, tudo nos termos das disposições combinadas dos artigos 70° n° 1, al. b) e n.º 2 desse mesmo preceito e, ainda, o art. 75°-A, nºs 1 e 2, todos da Lei n° 28/82, de 15 de Novembro, fundamentos legais com que o mesmo recurso é interposto, o qual deverá ser recebido e processado, como vem prescrito no art. 69° da referida lei, nos próprios autos e com efeito suspensivo - art. 78°, n" 3 e 4 daquele mesmo diploma legal.»

3. Pela Decisão Sumária n.º 289/2018 decidiu-se não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto pelos Recorrentes, com a seguinte fundamentação:

«

i) Decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi, da norma...

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