Acórdão nº 0154/11.0BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida em processo de impugnação judicial 1. RELATÓRIO 1.1 O acima identificado Recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, julgando procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade supra identificada como Recorrida, anulou os actos de liquidação de taxas de ocupação da via pública, referentes ao ano de 2006.

1.2 Admitido o recurso, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, o Recorrente apresentou as alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «A. A questão de direito aqui em causa é de simples e precisa delimitação, prendendo-se com saber se a partir da entrada em vigor da Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, a aplicação da Taxa Municipal de Direitos de Passagem (TMPD), prevista no artigo 106.º afasta a aplicação da taxa municipal de ocupação do domínio público.

B. Censura-se a sentença do Tribunal a quo por esta ter acolhido o entendimento de que a entrada em vigor do aludido diploma, com o estabelecimento de um tipo de taxa específico para determinadas situações de ocupação de bens de domínio público (a TMDP) implicou o afastamento, por revogação tácita, da aplicabilidade de normas regulamentares que prevejam tributação para a mesma situação, na parte abrangida pelo diploma legislativo, como aquelas em que se fundou a emissão das liquidações em crise.

C. A autonomia financeira das autarquias locais, na vertente da arrecadação de receitas próprias obrigatórias – tais como sejam as provenientes da criação e cobrança de taxas municipais pelo aproveitamento de bens do domínio público municipal por parte dos particulares – não pode, de modo algum, ser coarctada ou restringida ilegalmente.

D. Por isso, censura-se o entendimento de que o aproveitamento do espaço público, no caso em concreto (em 2006) só podia ser cobrado através da TMDP e que não se tratava apenas de uma opção a favor dos municípios, o que impede a ora Recorrente, relativamente ao ano de 2006 e mediante a existência de incidência tributária efectiva, de liquidar a taxa de ocupação de via pública que é sua receita própria e obrigatória, é inconstitucional por ofender os termos do artigo 238.º, n.º 3 da Constituição.

E. Sendo que o erro de direito em que a sentença a quo incorre nesta sede se deve ao facto de ter aderido ao argumento falacioso de que o município não podia liquidar outra taxa que não a TMDP em virtude da Lei n.º 5/2005, de 10 de Fevereiro, por não ter tido em conta o poder tributário dos municípios e o próprio enquadramento Comunitário e Nacional da TMDP então vigente, o qual claramente não impunha que a tributação do benefício em causa pudesse ocorrer apenas por via da TMDP.

F. Em 2006 a lei vigente em momento algum impunha que a tributação do tipo de realidades aqui subjacentes tivesse que ser feita por via da TMDP, implicando a revogação tácita das taxas constantes de outras normas regulamentares, mormente da taxa de ocupação da via pública aqui em causa.

G. É manifesto ter incorrido a sentença a quo em erro de direito, razão pela qual deverá ser revogada mantendo-se o acto de liquidação da taxa de ocupação da via pública relativo a 2006.

H. A apreciação da questão de direito preconizada pelo Tribunal a quo começou a incorrer em erro a partir do momento em que não atendeu devidamente ao enquadramento das taxas de ocupação da via pública que levaram à emissão das liquidações subjacentes, bem como da TMDP no âmbito dos poderes tributários das Autarquias Locais.

I. Uma vez que, nos termos do “Regulamento e Normas de Cobrança e Tabela de Taxas e Outras Receitas Municipais da Câmara de Cascais para 2006”, pelo licenciamento aqui em causa era devida uma taxa de ocupação da via pública, aplicável por armário de distribuição instalado e a qual variava entre € 72,50 e € 124,50 consoante a dimensão do equipamento, nos termos do disposto no artigo 60.º, n.º 2.1, alíneas a) a d) da “Tabela de Taxas e Outras Receitas Municipais da Câmara de Cascais para 2006”.

J. Procedendo ao devido enquadramento do poder tributário do município, comece-se por referir que, de acordo com o estabelecido no artigo 4.º, n.º 2 da LGT e 19.º, alínea c) da LFL´98, a taxa de ocupação da via pública, tal como a sua denominação indicia, constitui a contrapartida do aproveitamento pela “ A ……., S.A.” do espaço público municipal na prossecução da sua actividade económica particular.

K. O momento de tributação foi também o correcto de acordo com o estabelecido no artigo 23.º, n.º 1, 2.ª parte do “Regulamento e Normas de Cobrança das Taxas e Outras Receitas Municipais da Câmara Municipal de Cascais para 2006”, pelo que a taxa de ocupação da via pública referente ao ano de 2006 é devida pela “A…….., S.A.” e foi correctamente liquidada.

L. Pelo que estando as normas regulamentares em causa legitimadas ao abrigo da então vigente LFL´98, sempre se terá que admitir que a cobrança das taxas foi legal, atento o facto de nada existir na Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro no ano 2005 que restringisse os comandos estabelecidos pela LFL, tendo a Lei em questão de forçosamente ser conjugada com esta última.

M. Por outro lado, com a aprovação da Directiva 2002/20/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002 (Directiva-Autorização), transposta para o ordenamento português com a aprovação da Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro (Lei das Comunicações Electrónicas), pretendeu-se instaurar um mercado comunitário de serviços e redes de comunicações electrónicas através da harmonização e simplificação das regras e condições de autorização da respectiva oferta.

N. Todavia, a Directiva-Autorização e a Lei das Comunicações Electrónicas, ao criar a TMDP, não impõem aos Estados-Membros a criação de uma taxa de determinado modelo ou com determinada estrutura; aliás, não impõem sequer a criação de qualquer taxa, antes permitindo a sua criação aos municípios.

O. Como tal, é claro que diplomas não obrigavam à tributação, por parte dos municípios, da utilização do domínio público com a instalação de estruturas e equipamentos de comunicações electrónicas única e exclusivamente por meio da TMDP, de molde que, optando os municípios por não aprovar/liquidar/cobrar a TMDP, nada impedia, no período a que se reportam as liquidações em causa, a tributação da mesma realidade através de outra taxa municipal.

P. A opção por parte dos municípios em lançar mão das taxas que já haviam sido criadas para efeitos da tributação da ocupação da via pública não poderia apenas implicar a dupla tributação da mesma realidade com recurso simultaneamente à TMDP e a outra taxa municipal – o que, efectivamente, nunca sucedeu in casu como se provou.

Q. O município nunca liquidou nem cobrou simultaneamente a TMDP e a taxa de ocupação da via pública a nenhuma entidade e, por isso, também não o fez à “A……, S.A.”.

R. Perante o enquadramento legal em vigor à data dos factos – i.e.

, em 2006 – é cabalmente claro que a cobrança da TMDP era opcional e podia ser preterida em favor de uma outra taxa municipal pré-existente, razão pela qual o município liquidou a taxa de ocupação da via pública e apenas esta.

S. Só essa actuação pode ser considerada consentânea com o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários consagrado no artigo 30.º, n.º 2 da L...

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