Acórdão nº 499/14.8T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS SIM
Data da Resolução26 de Abril de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 499/14.8T8EVR.E1 I. Relatório (…) e mulher, (…), residentes na Av.ª Engenheiro (…), n.º 35-A, em Évora, instauraram acção declarativa de condenação, a seguir a forma única do processo comum, contra (…), com domicílio profissional na Rua (…), n.º 35, em Évora, pedindo a final que se declare a nulidade do arrendamento que tem por objecto o 1.º andar do prédio que identificaram, condenando-se o R. a restitui-lo livre e devoluto, e ainda no pagamento de indemnização pelos prejuízos causados pela ocupação ilícita do mesmo à razão de € 512,50 por mês e até à data da restituição, cujo montante liquidado, referente aos meses de Dezembro de 2011 a Dezembro de 2014, ascende já a € 18.450,00, acrescida dos juros legais. Alegaram para o efeito que são os donos do prédio composto de rés-do-chão, 1.º e 2.º andares sito na Rua (…), n.ºs 29, 31, 33, 33-A, 35 e 37 e n.ºs 6-A e 7 do Largo da (…) da actual União das Freguesias de Évora, cujo n.º 35, actual fracção E, foi dado de arrendamento ao réu por acordo celebrado em 27 de Maio de 1999, tendo outorgado como senhoria a então usufrutuária (…). Tal acordo é, porém, nulo por não ter observado a forma legalmente prescrita, donde ser ilícita a ocupação que o R. vem fazendo da referida fração. Mais alegaram que tendo o demandado deixado de pagar as rendas desde a morte da usufrutuária, em Novembro de 2011, interpelaram-no para proceder ao respectivo pagamento por carta de 27 de Junho de 2014, o que se recusou a fazer, permanecendo ilicitamente na fracção e causando aos demandantes um prejuízo equivalente às rendas que deixaram de auferir desde Dezembro de 2011 à razão de € 512,50 por mês, devendo ser condenado no ressarcimento do mesmo. * Regularmente citado, e aceitando convite que nesse sentido lhe foi endereçado, o réu apresentou a contestação aperfeiçoada de fls. 142 a 166, peça na qual reconheceu que não procedeu ao pagamento de qualquer quantia a título de rendas após a morte da usufrutuária, sendo certo que não teria de o fazer aos AA por não serem os proprietários da fracção locada, isto na sequência de acção de preferência instaurada por um outro arrendatário, na qual foram RR os ora demandantes e também a alienante, a dita (…), a qual reservara para si o usufruto, litígio que findou por sentença homologatória da transacção das partes. Têm ainda os AA conhecimento que o contestante celebrou com os preferentes naquela acção, os quais patrocinara como advogado, contrato promessa de compra e venda da actual fracção E por si ocupada, pelo que actuam em abuso de direito, o que sempre imporia a sua absolvição dos pedidos. Imputando aos demandantes ostensiva e notória má-fé, pediu ainda a sua condenação em multa e indemnização a seu favor de montante não inferior a € 10.000,00. Requereu ainda a intervenção provocada dos identificados preferentes, incidente que veio a ser indeferido por decisão transitada (cf. despacho de fls. 122 a 124). Os AA responderam à excepção do abuso de direito, negando conhecimento do negócio alegadamente celebrado entre o R. e os seus clientes na acção de preferência, concluindo pelo reconhecimento do seu direito. * Teve lugar audiência prévia e nela, sem reclamação das partes, foi fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova. Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo que da respectiva acta consta em cujo termo foi proferida sentença que, na procedência da acção: i. declarou a nulidade do contrato descrito no ponto 4) dos factos provados; ii. condenou o réu a restituir aos autores o imóvel descrito no ponto 1) dos factos provados livre e devoluto de pessoas e bens; iii. condenou o réu a pagar aos AA, a título de indemnização pela ocupação do imóvel, a quantia de € 18.450,00 referente ao período decorrido desde Dezembro de 2011 até Dezembro de 2014, acrescida dos montante de € 512,50 por cada mês até à data da restituição, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal vencidos, contados desde a data da citação, e vincendos até efectivo e integral pagamento; iv. absolveu AA. R. dos pedidos de litigância de má-fé. * Inconformado, apelou o R. e, tendo desenvolvido nas alegações os fundamentos da sua discordância com o decidido, formulou a final conclusões que se condensam nas seguintes proposições: i. O Tribunal deu como não provado o facto vertido em b) “Os AA tinham conhecimento do contrato mencionado em 9.” ii. Ao invés, em função do transcrito depoimento do réu e ainda em função das considerações tecidas pelo Tribunal em sede de “Questão prévia” por referência à “Motivação de facto”, deveria o mesmo facto ter sido dado por provado, o que se requer. iii. O R. só assumiu perante o Il. Mandatário dos AA, Dr. (…), ter assinado tal contrato com o Sr. (…) para justificar e explicitar o facto de só poder agir em nome próprio e no seu interesse. iv. Verifica-se contradição entre os fundamentos e a decisão, nos termos do consignado na al. c) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, invocando-se a nulidade da sentença; v. No que respeita à invocada nulidade do contrato celebrado entre o R. e a usufrutuária (…), o recorrente sufraga na íntegra o entendimento perfilhado por (…), que aqui se dá por reproduzido, pelo que em circunstância alguma se deveria ter considerado o contrato nulo por falta de forma. vi. Ainda assim, por mera cautela e dever de patrocínio, a figura do abuso de direito na modalidade de “venire contra factum proprium”, por preenchimento dos seus pressupostos, terá aqui plena e cabal aplicação. vii. Acresce que os AA assumiram expressamente nos presentes autos que reconheceram o direito de preferência de (…) e (…) sobre os n.ºs 33, 33-A e 35 da Rua (…), conforme transacção celebrada no processo n.º 615/2001. viii. O reconhecimento do direito de preferência tem efeito retroactivo ao momento da alienação, sendo o adquirente substituído pelo preferente com eficácia ex tunc. ix. As partes obrigaram-se a encetar procedimentos e a desenvolverem as diligências adequadas à constituição do prédio urbano em propriedade horizontal. x. O que, entretanto, foi levado a cabo, concretamente em 27 de Julho de 2013. xi. A constituição do prédio em propriedade horizontal constituiu um mero desenvolvimento ou consequência do estabelecido em sede de transacção judicial. xii. Os legítimos proprietários e possuidores da actual fracção E são os referidos (…) e (…), atento o teor da transacção judicial. xiii. O entendimento acolhido pelo Tribunal coloca em crise a autoridade do caso julgado, por referência ao acordo homologatório do Proc. 615/01. XIV. Os AA deverão ser condenados em multa a arbitrar, considerando a conduta dolosa assumida nos autos. XV. Reclamando o R. a condenação dos AA em indemnização de montante não inferior a € 10.000,00, nos termos do disposto no art.º 543.º do CPC. xvi. A sentença é nula nos termos do disposto na al. e) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, porquanto, tendo os AA peticionado a restituição do imóvel ocupado pelo R. após o trânsito em julgado da decisão, é a mesma omissa quanto ao assim peticionado. xvii. A taxa de justiça fixada pelo Tribunal é ostensivamente exagerada e sem suporte legal, devendo ser alterada nos termos que forem reputados adequados. Indicou como violados os “preceitos legais invocados na [presente] peça recursiva”. * Assente que pelo teor das conclusões se fixa e delimita o objecto do recurso, são as seguintes as questões que pelo apelante foram submetidas à apreciação deste Tribunal: i. das nulidades imputadas à sentença recorrida; ii. do erro de julgamento quanto ao facto não provado sob a al. b); iii. da violação da “autoridade do caso julgado”; iv. da nulidade do contrato e do abuso de direito na sua invocação. * i. das nulidades da sentença O R. apelante imputou à sentença recorrida o vício extremo da nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão por, ao que se depreende do alegado, o Tribunal ter decidido pelo aproveitamento das declarações de parte por si prestadas mas não ter dado por assente quanto consta da al. b), e ainda por não ter observado o pedido formulado. As causas de nulidades da sentença são as taxativamente elencadas no n.º 1 do art.º 615.º do CPC, nelas se incluindo a contradição entre os fundamentos e a decisão (cf. al. c). Conforme vem sendo reiteradamente afirmado pelos nossos Tribunais[1], e na esteira do entendimento defendido a propósito da antes vigente alínea c) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC, com conteúdo idêntico à al. c) do n.º 1 do art.º 615.º em vigor, para que ocorra a contradição aqui prevista é necessário que se verifique uma real contradição entre a parte dispositiva da sentença ou do acórdão e os respectivos fundamentos. A nulidade em causa “...pressupõe um erro lógico na ponta final da argumentação jurídica: os fundamentos invocados apontam num sentido, e, inesperadamente, contra a conclusão decisória que dos mesmos, e dentro da linha de raciocínio adoptada, se esperava, veio-se a optar afinal pela solução adversa”[2]. Deste modo, a circunstância de, conforme o recorrente alega, a Mm.ª juíza ter considerado válidas as declarações de parte pelo próprio prestadas, tendo depois dado como não provado facto a que depôs, para além de não encerrar, em nosso entender, qualquer contradição – bem podendo acontecer que apesar da validade das declarações e até da credibilidade que o declarante pudesse ter merecido, o Tribunal viesse a concluir pela insuficiência de tal meio probatório para dar como assente determinada factualidade – a verdade é que eventual indevida desconsideração de meio de prova, podendo consubstanciar erro de julgamento, não inquina o valor formal da sentença. No que se refere à nulidade prevista na al. e), reporta-se o apelante ao segmento da decisão que não incorporou o pedido formulado no sentido da obrigação de...

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