Acórdão nº 1145/16.0T8TMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução28 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 1145/16.0T8TMR.E1 Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: I. Relatório BB, frustrada a fase conciliatória do processo, intentou, no Tribunal Judicial da Comarca de Santarém (Juízo do Trabalho de Tomar – Juiz 1) e com o patrocínio oficioso do Ministério Público, a presente acção especial, emergente de acidente de trabalho, contra CC, S.A., pedindo a condenação desta a pagar-lhe: a) a quantia de € 162,53, a título de indemnização em falta por incapacidade temporária absoluta; b) a quantia de € 28,00, a título de reembolso das despesas com transportes por duas deslocações obrigatórias já realizadas.

  1. A quantia que vier a despender com deslocações obrigatórias a este ao tribunal no âmbito dos autos.

Alegou, para o efeito e muito em síntese, que no dia 4 de Março de 2016, quando trabalhava, como analista de laboratório, sob as ordens, direcção e fiscalização de DD, S.A., procedendo à remoção de dispositivos de segurança, numa máquina húmida, sofreu uma compressão da perna direita.

Acrescentou que a responsabilidade infortunística-laboral se encontrava transferida para a aqui Ré (anteriormente Companhia de Seguros…) e como o acidente de trabalho lhe provocou um período de incapacidade, bem como despesas com deslocações ao tribunal, deve a Ré ser condenada no pagamento da indemnização em falta pelo período de incapacidade, bem como das despesas de deslocação.

Em contestação, a Ré seguradora, aceitando (i) a existência do acidente de trabalho, (ii) a existência de um contrato de seguro pelo qual a responsabilidade se encontrava transferida para si pela totalidade da retribuição (€ 18.536,56) e (iii) os períodos de incapacidades temporárias e cura do sinistrado sem qualquer desvalorização, sustentou, contudo, que o acidente deve ser descaracterizado por o sinistrado ter violado regras de segurança definidas pela empregadora e que ele conhecia (artigo 14.º, n.º 1, alínea a) da Lei n.º 98/2009, de 04-09, doravante LAT) – uma vez que, ao contrário do que fez o sinistrado que para retirar uma tranca se posicionou sobre a máquina, a retirada das trancas de segurança dos rolos superior devia ser realizada através de acesso pela plataforma – e também por negligência grosseira do sinistrado [alínea b) do referido n.º e artigo] – uma vez que ao realizar a tarefa nos termos em que realizou actou com negligência grosseira, tendo o acidente ocorrido apenas por esse motivo.

Em 21-12-2017 foi proferido saneador-sentença, cuja parte decisória, na parte aqui relevante, é do seguinte teor: «Pelo exposto, julgo a acção procedente e, em consequência, condeno a ré CC, S.A., a pagar ao autor BB a quantia de € 162,53 de diferenças devidas por indemnização resultante de incapacidade temporária, bem como a quantia de € 28 de despesas de transporte, acrescidas do pagamento de juros de mora até ao integral pagamento à taxa legal que estiver em vigor».

Inconformada com o assim decidido, a Ré seguradora interpôs recurso para este tribunal, tendo a terminar as alegações formulado as seguintes conclusões: «A. Emerge o presente recurso da sentença do tribunal “a quo” que, decidindo do mérito da causa nos termos do n.º 2 do artigo 61.º do C.P.T, julgou procedente o pedido, condenando a Recorrente no pagamento das prestações integrantes do direito de reparação do Autor, aqui Recorrido.

  1. A prolixa fundamentação da sentença começa desde logo por contraditar o teor da decisão, uma vez que procede a uma minuciosa análise do documento 2. Ora, se se entende que os factos alegados não são suficientes, porquê proceder à análise da prova documental? C. A contestação da Recorrente baseou-se, em primeira linha, na tese de que o acidente em causa decorreu da violação das regras de segurança por parte do Autor – o que consubstancia causa de descaracterização do acidente, nos termos do disposto na al. a) do n.º 1 do artigo 14.º da L.A.T.

  2. Para tal, foi expressamente alegado que o Autor se colocou em cima da máquina (acto), numa conduta que sabia proibida, por contrária às instruções da entidade empregadora.

  3. Não estamos perante omissão, na qual se poderiam eventualmente argumentar que a conduta poderia resultar de uma distracção.

  4. O que se alega é que o Autor levou a cabo, activamente, ao investir a sua energia numa conduta contrária às regras e condições de segurança.

  5. Esclarece-se ainda que foi este que optou, de forma consciente e voluntária, por colocar em perigo a sua integridade física.

  6. Mais foi invocado pela Recorrente a negligência grosseira enquanto causa de descaracterização, nos termos da al. b), n.º 1, do artigo 14.º da L.A.T..

    I. Tendo sido expressamente alegado que tal conduta grosseiramente negligente foi causa exclusiva do acidente.

  7. Não conhecendo a Recorrente o processo psicológico que levou o Autor a actua[r] da fo[rma] descrita, tais circunstâncias, configuradas na sentença, mais não consubstanciariam do que factos instrumentais (e não essenciais), que podiam resultar da instrução da causa, que poderiam ser considerados pelo Juiz a quo, nos termos da al. c), do n.º 2 do art. 5.º do C.P.C K. Por último, decisão do Tribunal tampouco deu cumprimento ao disposto no n.º 3 e 4 do CP.C. conforme impõe o artig 61.º, n.º 2, do C.P.T.

    L. Face ao exposto, dúvidas não sobram de que deverá ser revogada a sentença do Tribunal a quo, sendo substituída por uma outra que fixa as matérias de facto assente e pontos da base instrutória, correndo acção os seus ulteriores termos.

    Nestes termos, sempre com douto suprimento de Vs. Exa.s, deverá ser julgado procedente o presente recurso, sendo revogada a sentença do Tribunal a quo, e sendo substituída por uma decisão que ordene o prosseguimento dos autos, assim se fazendo a tão costumada Justiça!» Contra-alegou o recorrido, ainda com o patrocínio oficioso do Ministério Público, a pugnar pela improcedência do recurso, assim concluindo: «I A decisão surpresa que o art.º 3.º, n.º 3 do CPC proíbe é aquela envereda por “caminhos” que as partes não configuraram, quer do ponto de vista factual quer jurídico e, por isso, não se confunde “ com a suposição que as partes possam ter feito nem com a expectativa que elas possam ter acalentado quanto à decisão quer de facto quer de direito”.

    II Tendo o Tribunal “ a quo” considerado ( e bem) que o recorte factual trazido pelas partes já lhe permitia conhecer do mérito da causa, não tinha de as ouvir sobre uma possibilidade que a lei lhe confere – artigo 61.º, n.º 2 –parte final do C.P.T – ainda que a decisão antecipada sobre o mérito da causa não tivesse sido...

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