Acórdão nº 81/14.0TBORQ.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 22 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução22 de Março de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de Évora I. Relatório.

  1. AA, BB, CC, e marido DD, e EE, melhor identificados nos autos, intentaram a presente ação declarativa de simples apreciação positiva, sob a forma de processo comum, contra FF, e mulher GG, HH e II, com os sinais dos autos, requerendo a declaração de nulidade dos atos praticados pelos Réus na repartição de Finanças e na Conservatória do Registo Predial que determinaram que a totalidade do prédio urbano, composto por edifício de rés-do-chão, sótão e quintal, destinado a habitação, situado na Rua D. …, n.º …, em Santana da Serra, Ourique, com a área total de 312 m2, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Santana da Serra sob o artigo número …, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Ourique sob o n.º …, ficasse registado a favor do Réu FF, mediante um primeiro registo a seu favor de ½ do prédio, e mais tarde com o registo da outra ½. Nessa sequência, requerem que também seja ordenada a retificação dos registos efetuados. Pediram ainda a condenação dos réus a entregar aos Autores ½ do referido prédio, livre de ónus e encargos e a reconhecerem o seu direito de propriedade sobre a referida metade. Mais requereram que seja anulada a desanexação do prédio operada através da Ap. 05/990225, da qual resultaram dois prédios distintos. Por fim, a título subsidiário, requerem a condenação dos Réus, em solidariedade, no pagamento aos Autores de uma indemnização no valor de 49737,28 € pelo dano da privação do uso do terreno e pela apropriação de ½ do prédio.

    Alegaram, para tanto, que o prédio urbano n.º … foi deixado por testamento de JJ aos seus dois sobrinhos LL e MM, em partes iguais, sendo os Autores herdeiros legítimos de MM, e o Réu FF herdeiro de LL. Mais alegaram que após a morte de LL, o Réu FF foi habilitado por escritura notarial como o único herdeiro deste, tendo de seguida procedido ao registo a seu favor de ½ do prédio n.º …, por via da aquisição por sucessão “mortis causa”. Acontece que, cerca de 10 anos mais tarde, o mesmo Réu requereu à Conservatória do Registo Predial que fosse registado a seu favor a outra ½ do prédio n.º …, alegando que no primeiro registo foi cometido um lapso por apenas ter sido registado a seu favor ½ do prédio em vez da sua totalidade. A Conservatória atendeu ao pedido e registou a favor do Réu a outra metade do prédio n.º …, com base no mesmo título da sucessão “mortis causa”. Desta forma, todo o prédio ficou registado a favor do Réu FF.

    Pela conduta descrita, os Autores acusam o Réu FF de se ter apropriado indevidamente de ½ do prédio, porquanto sabia que a mesma pertencia aos Autores, atuando assim com manifesta má-fé. Alegam, por fim, que após este segundo registo, uma parte do prédio foi desanexada (dando origem a um novo prédio) e depois vendida à Ré HH que, por sua vez, depois o vendeu à Ré II, sendo que todos eles sabiam ½ do prédio n.º … pertencia aos Autores por sucessão “mortis causa” de MM.

  2. Regularmente citados, os Réus II e FF e mulher GG apresentaram as respetivas contestações.

    A Ré II defendeu ter comprado validamente o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo n.º … (prédio que resultou da desanexação do prédio n.º …) e de as nulidades arguidas pelos Autores não poderem afetar a sua compra por força da proteção conferida pelo art. 291.º do Código Civil a terceiros adquirentes de boa-fé.

    Os Réus FF e mulher GG também contestaram a ação, excecionando a ilegitimidade dos Autores por a ação não ter sido intentada pela herança jacente, como devia ter sido no presente caso. Negam que se tenham apropriado ilicitamente do prédio n.º … pois o imóvel sempre pertenceu a LL, pai do Réu FF.

    Os Réus FF e mulher GG também deduziram reconvenção, pedindo a condenação dos Autores/Reconvindos no reconhecimento do seu direito de propriedade, pleno e exclusivo, sobre o prédio urbano n.º …, bem como a condenação dos mesmos a absterem-se de praticar qualquer ato que possa violar o seu direito de propriedade. Alegam, para tanto, que o referido prédio adveio à posse e titularidade dos Réus/Reconvintes por sucessão “mortis causa” de LL, falecido em 1969, e que desde há mais de 50 anos que, por si e por intermédio dos seus ante possuidores, andam na posse do mencionado prédio, sem oposição de ninguém e ininterruptamente, pelo que o adquiriram por usucapião, e que os Réus nunca exerceram quaisquer atos de posse sobre o referido prédio.

    Concluíram pugnando pela improcedência da ação e pela procedência da reconvenção.

  3. Os Autores/Reconvindos responderam à matéria das exceções e da reconvenção deduzidas pelos Réus FF e mulher GG.

  4. Findos os articulados, foi designada data para uma tentativa de conciliação, e após o aperfeiçoamento da petição inicial, foi designada data para a audiência prévia.

  5. Após foi proferido despacho saneador, no qual se decidiu “declarar a incompetência, em razão da matéria, do Juízo de Competência Genérica de Ourique para a apreciação da presente ação e, em consequência, decido absolver todos os Réus da instância (art. 278.º, n.º 1, al. c) do CPC)”.

  6. Inconformados com esta decisão, vieram os Autores interpor o presente recurso, terminando as suas alegações com as conclusões seguintes: 1. Os AA. peticionaram a declaração de nulidade dos atos praticados pelos RR na Rep. de Finanças e do registo efetuado na CRP.

  7. O registo da propriedade da segunda metade do prédio com base num título que apenas conferia direito à parte já registada consubstancia uma nulidade do art. 16.º b) do CRP.

  8. Não se trata pois de simples desconformidade entre o título e o registo, mas sim de título insuficiente pelo que constitui nulidade.

  9. Teremos pois de atender ao disposto no art. 17.º do CRP que impõe a declaração de nulidade por decisão judicial transitada.

  10. Mas ainda que assim não fosse sempre estaríamos em presença de uma questão prejudicial a resolver nos termos dos arts. 92.º n.º 1 e n.º 2 do CPC.

  11. Atirar o processo “às urtigas” depois de todo o caminho percorrido e de tudo o processado, é um ato inútil, proibido pela lei processual e violador dos direitos conferidos aos AA. pela lei substantiva, processual e constitucional pois todos têm direito à boa administração da justiça! 7. A douta decisão viola o disposto nos arts. 16.º, 17.º, e 121 e segts. do CRP, art. 92.º e demais do CPC, e bem assim a Constituição da República que garante o direito à boa administração de justiça! Terminam pedindo a revogação da decisão, ordenando-se o prosseguimento dos autos.

    *** Não foram juntas contra-alegações.

    O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.

    Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    ***II – Âmbito do Recurso.

    Perante o teor das conclusões formuladas pelo recorrente – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso - arts. 608.º, nº2, 609º, 620º, 635º, nº3, 639.º/1, todos do C. P. Civil -, constata-se que a questão essencial decidenda consiste em saber se Juízo de Competência Genérica de Ourique é, ou não, incompetente, em razão da matéria, para conhecer a presente ação.

    *** III – Fundamentação fáctico-jurídica.

  12. A matéria de facto a considerar é a que consta do antecedente relatório.

  13. Vejamos pois, qual a resposta à questão colocada.

    No despacho recorrido exarou-se a seguinte fundamentação: “Os Autores vieram peticionar, a título principal, a declaração de nulidade dos atos praticados pelos Réus na repartição de Finanças e na Conservatória do Registo Predial que determinaram que a totalidade do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo número …, ficasse registado a favor do Réu FF, mediante um primeiro registo a seu favor de ½...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT