Acórdão nº 939/16.1T8OLH-D.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução24 de Maio de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 939/16.1T8OLH-D.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro[1] *****Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]: I - RELATÓRIO 1.

AA – Unipessoal, Ld.ª, apresentou-se em 6 de Julho de 2015 ao Processo Especial de Revitalização (PER) previsto nos artigos 17.º-A e seguintes do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas[3], tendo sido proferido o despacho a que alude o n.º 4 do artigo 17°-C, a declarar iniciado aquele processo e a nomear a Administradora Judicial Provisória.

2.

Seguindo o processo os seus termos, foi apresentada a lista provisória de credores, à qual foi deduzida 1 impugnação, que não foi admitida por ter sido declarada intempestiva, nos termos do despacho proferido em 17-09-2015, que logo determinou a conversão em definitiva da lista provisória de créditos.

Nessa lista, para o que importa ao presente recurso, constavam identificados como credores: i) O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. com um crédito no montante de 42.173,23€, classificado como comum; ii) A Autoridade Tributária e Aduaneira, Estado Português, com um crédito no montante de 25.000,00€, classificado como comum.

3.

Decorrido o período de negociações previsto no artigo 17.º-D, n.º 5, do CIRE, o plano de recuperação conducente à revitalização da devedora foi submetido a votação, tendo em 17-02-2016 sido proferida decisão que não homologou tal plano com o fundamento de que «o mesmo não obteve votação favorável por mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos (nos moldes exigidos pela alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-F do CIRE), nem obteve votação favorável por mais de metade da totalidade dos créditos relacionados com direito de voto (nos moldes previstos na alínea b) do n.º 3 do artigo 17.º-F do CIRE)».

Desta decisão foi interposto recurso interlocutório, o qual foi admitido e veio a ser provido, por acórdão deste Tribunal proferido em 12-01-2017, que considerou haver quorum de aprovação do plano, e expressamente salientou: «apenas ficando aqui já resolvida a problemática do quorum de aprovação – que constituía o objecto do recurso apresentado em face da decisão então tomada».

4.

Entretanto, tendo o recurso efeito meramente devolutivo, a Senhora Administradora Judicial Provisória requereu a declaração de insolvência da devedora, que veio a ser decretada por sentença proferida em 26-01-2017, no apenso C.

Desta decisão foi igualmente interposto recurso, o qual foi julgado procedente, por decisão sumária proferida pelo Relator, em 22-02-2018, que revogou a sentença que declarou a insolvência da devedora.

5.

Por sentença proferida nestes autos em 18-02-2017, julgou-se verificada a existência de quorum deliberativo, concluindo-se, seguidamente que «encontram-se reunidos os pressupostos legais de aprovação do plano de recuperação da devedora», e decidindo-se julgar «homologado por sentença o plano de recuperação tendente à revitalização da devedora AA – Unipessoal, Ld.ª».

6.

Inconformado com a sentença de homologação do plano, o Instituto da Segurança Social IP, - Centro Distrital de Faro, credor reclamante, apelou, terminando a sua minuta recursória, com as seguintes conclusões: «

  1. A proposta de plano ora homologado, implica a modificação dos créditos da segurança social sem que esta tenha dado o seu consentimento.

  2. O plano de revitalização ora em apreço, não se harmoniza com o grau de disponibilidade dos créditos públicos, violando por isso, as normas aplicáveis, em matéria de regularização de dívida ao Estado, bem como contraria o disposto no artigo 190.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (adiante designado por CRCSPSS).

  3. Quer a doutrina, quer a jurisprudência têm vindo a entender que, as contribuições devidas à Segurança Social, devem considerar-se como verdadeiros impostos. Logo, as dívidas provenientes de contribuições para a segurança social assumem natureza tributária e, como tal, é-lhes também aplicável a LGT para todos os efeitos que não se encontrem regulados por lei especial, de acordo com o disposto no seu artigo 3º n.º3.

  4. Com efeito, o artigo 30.º n.º 2 da Lei Geral Tributária dispõe que: “O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito ao princípio da igualdade e da legalidade tributária”.

  5. O artigo 125.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12 que remete para o n.º 3 do artigo 30.º da LGT, veio por fim, estipular que o crédito tributário é também indisponível no âmbito dos processos de insolvência, o que será também aplicável aos processos de revitalização por força do preceituado no artigo 17.º F n.º 5 do CIRE no que respeita a regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX.

  6. O n.º 3 do artigo 30.º da LGT na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, realça e reforça assim, a natureza indisponível dos créditos tributários ao referir que tal indisponibilidade prevalece sobre qualquer legislação especial.

  7. Nos termos do artigo 36.º n.º da LGT, na redacção introduzida pelo diploma supra citado refere: “a administração não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previsto na lei.

  8. Verifica-se pois, em conjugação com o artigo 190.º do CRSPSS, que possibilidade do pagamento da dívida em prestações não deixa de ter carácter de excepcionalidade, aplicável somente nos casos previstos na lei e requer sempre autorização, conforme plasmado no n.º 6 do mesmo artigo.

  9. Ora, no plano em apreço, prevê-se o pagamento integral da dívida contudo ao plano ora homologado, não foi concedida autorização nos termos e para os efeitos do artigo 190.º do CRCSPSS.

  10. Deste modo, ao ser homologado um plano, sem o consentimento do recorrente, verifica-se que o mesmo é nulo em relação aos mesmos, sendo ilegal a decisão que o homologou, por violação de normas imperativas.

  11. O ora recorrente, não consentiu na forma de pagamento dos seus créditos, nem emitiu qualquer autorização expressa para se iniciar o pagamento da dívida em prestações.

  12. Pelo que, a homologação do plano sem o consentimento do recorrente, é ilegal por violação da norma que exige o consentimento do credor. (cfr. Segunda parte do n.º 2 do artigo 192.º do CIRE) M) Por outro lado, se interpretarmos o artigo 192.º do CIRE por forma a permitir a disponibilidade de créditos fiscais, isto é, deixar-se ao livre arbítrio dos credores presentes numa assembleia a decisão sobre o modo de pagamento de créditos tributários, que nem sequer são partes na relação jurídico tributaria, tal enquadramento legal é organicamente inconstitucional por violação directa do princípio de reserva absoluta de lei formal, consagrado no artigo 165.º n.º 1 alínea i) da CRP.

  13. Do mesmo modo, as normas constante do Título IX do CIRE, designadamente os artigo 194.º n.º 1, 195.º, n.º 1 e 2 106.º n.º 1 alínea a) e d) e 197.º se foram interpretadas no sentido de permitirem que os credores aprovem um plano de revitalização que defina os prazos de pagamento dos créditos fiscais e alterem as respectivas condições de cobrança, sem o consentimento do órgão competente para o efeito, são também organicamente inconstitucionais por violação do principio da legalidade tributária e indisponibilidade dos créditos fiscais e de normas constitucionais.

  14. A sentença que homologou o plano de revitalização violou o disposto no n.º 3 do artigo 30.º da Lei Geral Tributária, o artigo 125.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, o artigo 190.º n.º 1 e n.º 2 al. a) e n.º 6 do CRCSPSS.

  15. Assim, a homologação do plano de revitalização é ilegal, porque para tal, foram aplicadas normas que conduzem a uma interpretação inconstitucional, pois que de acordo com a interpretação que serviu de base à homologação do plano tais normas violam directamente os princípios da legalidade tributária e da reserva absoluta de lei formal constante dos artigo 103.º n.º 2 e 3 e 165.º n.º 1 al. I) do CRP.

  16. Mas ainda que se entenda que a homologação do Plano de revitalização é válida, o que não se concede, ainda assim, esta homologação não deverá produzir efeitos em relação ao Recorrente, que não aderiu às medidas constantes do mesmo, sob pena de violação da lei, devendo ser-lhe considerado ineficaz, no seguimento do que foi decidido no Acórdão da Relação de Coimbra de 20-11-2007, 13/01/2015, na sentença proferida no Processo n.º628/07.8TYLSB, publicada no DR, 2ª Série, nº 69, de 8-04-2008, Acórdão da Relação de Évora de 28/05/2015».

    7.

    Também inconformado com a sentença que homologou o plano de revitalização, o Ministério Público, em representação da Fazenda Nacional, interpôs recurso de apelação formulando as seguintes conclusões: «1- Por sentença homologatória do plano de recuperação apresentado no PER da requerente, a sociedade AA Unipessoal, Lda, decidiu a Mma. Juiz quanto à sua substância que “no caso em apreço, não resulta dos autos que tenha ocorrido uma violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, nos termos previstos no art.º 215.º do CIRE”.

    2- Sucede que tal plano não pode obter a nossa concordância porque infringe normas imperativas, quer ao estabelecer uma moratória de 30 dias para o pagamento dos créditos fiscais, quer ao reduzir a dívida através da exclusão dos juros vencidos e ainda ao negar a possibilidade de se constituírem garantias de pagamento dos créditos.

    3- O tempo de pagamento dos créditos tributários previsto no plano é ilegal, nos termos dos artigos 36º da Lei Geral Tributária e 85º, 196º e 199º do Cód. De Procedimento e Processo Tributário, na medida em que iria ocorrer apenas trinta dias após o trânsito da sentença homologatória.

    4- De igual modo, o perdão parcial dos créditos (juros vencidos) também viola o disposto no artigo 30º da LGT, que dispõe que o crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se as condições para a sua redução ou extinção com observância dos princípios da...

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