Acórdão nº 43/16.2T8FAL-F.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução13 de Setembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de Évora I. Relatório.

BB, residente na Rua …, … e …, Ferreira do Alentejo, veio, por apenso ao processo de insolvência com o n.º 43/16.2T8FAL, intentar a presente ação declarativa comum contra a MASSA INSOLVENTE DE CC e DD, aqui representada pela sua AI; bem contra os devedores CC e DD, residentes na Estrada …, … em Ferreira do Alentejo, e bem assim os CREDORES destes, pedindo: a) que seja reconhecida a existência e validade do contrato de arrendamento que permite ao Autor a titularidade da posse, reiterada, pública e pacífica sobre o imóvel supra indicado, contrato esse de arrendamento habitacional sem prazo; b) seja declarada ineficaz em relação ao Autor, a comunicação da Sra. Administradora de Insolvência, que considera que o contrato caducou, devendo a mesma abster-se de tomar qualquer medida ou diligência de entrega do prédio enquanto a presente ação não for decidida; c) seja reconhecida a existência de contrato de arrendamento com as legais consequências nomeadamente para efeito de venda no âmbito da insolvência, e respeitado por futuro adquirente, durante o prazo do contrato de arrendamento; d) seja declarado que o Autor não pode ser perturbado nem impedido do exercício de direitos inerentes à sua qualidade de arrendatário, sem qualquer perturbação ou transtorno.

Para o efeito alegou, em síntese, que o prédio urbano destinado a habitação, inscrito na matriz predial urbana da freguesia e concelho de Ferreira do Alentejo sob o artigo … e, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ferreira do Alentejo, sob o n.º … da freguesia e Concelho de Ferreira do Alentejo, sito na Rua …, … e … constituído por r/ch e 1.ºandar, se encontra na sua posse, a qual lhe foi atribuída por contrato de arrendamento celebrado com o insolvente e que o tem utilizado como casa de morada de família. No dia 14 de Junho de 2017 recebeu uma carta enviada pela Sra. Administradora Judicial de Insolvência, com o intuito de o informar da situação de insolvência de CC e DD, notificando-o para exercer o seu direito de preferência, uma vez que o imóvel em questão foi apreendido para a massa insolvente, que não exerceu por ausência de meios financeiros. Mais alegou que o contrato de arrendamento não caducou por força da insolvência do locador e que o mesmo está em vigor.

Citados os réus, o credor Banco EE, S.A e a massa insolvente de CC e DD defenderam-se por exceção, alegando a caducidade do contrato de arrendamento com a venda judicial, bem como a invalidade desse contrato, sendo que a massa insolvente de CC e DD também deduziu, em caso de improcedência das invocadas exceções, pedido reconvencional, alegando a ilegitimidade do senhorio para, só por si, dar de arrendamento o imóvel em causa, sendo portanto o mesmo anulável. Ambos se defenderam por impugnação.

Foi concedido realizada tentativa de conciliação e as partes não se opuseram, sobre a possibilidade de ser proferida decisão de mérito, após o que foi prolatado o saneador sentença cujo dispositivo se transcreve: “De acordo com o supra exposto e de harmonia com o disposto nos preceitos legais citados, o Juízo de Competência Genérica de Ferreira do Alentejo julga a exceção de caducidade invocada pelos réus totalmente procedente e, em consequência:

  1. Declara eficaz a comunicação da Senhora administradora da insolvência em relação ao autor BB, comunicando-lhe a caducidade do contrato de arrendamento, devendo este proceder à entrega do imóvel em causa nos autos livre e devoluto de pessoas e bens, nos termos, condições e no prazo que a Senhora administradora lhe conceder para o efeito, após o trânsito em julgado da presente sentença.

  2. Absolve os réus Banco EE S.A. e Massa Insolvente de CC e DD de todo o mais peticionado e consigna a não ocorrência de abuso de direito por banda dos mesmos.

  3. Consigna-se que, atenta a procedência da exceção de caducidade alegada pelos Réus Banco EE S.A. e Massa Insolvente de CC e DD, fica prejudicado o conhecimento do pedido reconvencional deduzido pela Ré Massa Insolvente de CC e DD, deduzido em alternativa”.

Desta sentença veio Autor interpor o presente recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. Foi reconhecida a existência e validade do contrato de arrendamento quer pela massa insolvente quer pelo credor hipotecário.

  1. A questão está em saber se o contrato de arrendamento persiste não obstante a alienação do direito com base no qual o contrato foi celebrado.

  2. Defende a decisão que, tendo em conta a jurisprudência e as decisões que consideram que o contrato de arrendamento tem contornos de um direito real e por isso, tais direitos caducam com a venda.

  3. A douta decisão recorrida, refere que o entendimento perfilhado, penaliza o recorrente, mas os interesses do Credor hipotecário devem ser suplantados em relação aos do A.

  4. Não podemos aceitar este entendimento antes de mais por que se há interesse a prevalecer é o A. por configurar o respeito pelo direito á habitação, e por ser o mais fraco em relação ao credor hipotecário deve prevalecer, até por está constitucionalmente consagrado.

  5. O anúncio de venda na insolvência anunciava a existência do contrato de arrendamento.

  6. A declaração de insolvência não faz caducar o contrato de arrendamento nem suspende a sua execução - Artº 109 nº 1 do CIRE.

  7. O bem ainda não foi vendido.

  8. A adjudicação em processo de venda no processo de insolvência não faz caducar o contrato de arrendamento.

  9. O arrendamento não foi feito nos dois anos antes da declaração de insolvência.

  10. Não se pode falar de prejuízo de credores motivado pelo arrendamento, dada distância temporal entre a data da celebração do contrato e a data da declaração de insolvência, sendo certo que na data em que o contrato foi celebrado nem sequer era previsível a insolvência.

  11. A validade do contrato de arrendamento não depende da autorização do credor hipotecário.

  12. A única consequência contratual da celebração do contrato de arrendamento sem conhecimento ou consentimento do Banco credor, é o vencimento da totalidade do credito.

  13. A proibição de arrendamento de prédio hipotecado sem o consentimento do credor hipotecário, significaria uma limitação inaceitável ao direito de propriedade.

  14. A hipoteca sendo um direito real de garantia, só confere ao credor o direito de receber o seu credito com prioridade em relação aos demais. Mas não proíbe nem pode proibir o proprietário de livre administração do bem como é o caso de poder arrendar o prédio.

  15. A não ser assim, a hipoteca seria uma intolerável limitação ao direito de administração do bem.

  16. O artigo 695.º do C. Civil, expressa a nulidade da convenção que proíba o respetivo dono de alienar ou onerar os bens hipotecados, embora seja lícito convencionar que o crédito hipotecário se vencerá logo que esses bens sejam alienados ou onerados.

  17. Mas não resulta daí que os ónus obrigacionais caduquem.

  18. Se o legislador quisesse que o contrato caducasse com a declaração de insolvência, teria expressamente escrito essa vontade no artigo 109 do CIRE.

  19. Como o anúncio da venda na insolvência anunciava a existência de um contrato de arrendamento, significava que a venda era feita com esse ónus obrigacional.

  20. Não foi anunciado que a venda era feita livre de ónus e encargos e de pessoas e bens, e sem o ónus constante do anúncio.

  21. A menção da existência do contrato de arrendamento ditou também o preço dos proponentes e a vontade de adquirir nessas condições.

  22. Só porque foi o Banco, credor hipotecário, que fez a melhor proposta, e porque pretende o prédio livre, é que a Srª Administradora pretende o prédio livre mesmo antes de concretizar a venda.

  23. A possibilidade de vir a ser arrendado um prédio hipotecado faz parte dos riscos do contrato de credito, daí que se convencione que o credito de vença se o arrendamento for feito sem o conhecimento e consentimento do credor hipotecário.

  24. Acresce ainda que no caso concreto a hipoteca não era para garantir o crédito para aquisição de habitação, mas um crédito concedido no âmbito de uma operação comercial normal, (com garantia de terceiro) aonde mais se justifica não existir limitação ao arrendamento.

  25. A insolvência é uma execução universal em benefício de todos os credores e não em benefício exclusivo do credor hipotecário.

  26. O benefício do credor banco hipotecário, é ver o seu crédito graduado em primeiro lugar pelo valor de venda do prédio hipotecado.

  27. O exequente aqui não é o banco, e a venda não é em seu benefício.

  28. A venda é feita pela e para a massa insolvente, e caso existam empregados dos insolventes em que esse bem seja o local de trabalho nem sequer o credor hipotecário é o credor preferencial.

  29. Pelo que não se pode falar em eficácia ou ineficácia do contrato em relação ao credor hipotecário.

  30. O direito do banco será o que vier a ser reconhecido na sentença de graduação de créditos e não antes disso.

  31. O contrato de arrendamento para a habitação própria não tem caracter real, devendo ser respeito o direito á habitação conferido pelo contrato de arrendamento que não colide com o direito do credor hipotecário sobretudo quando a venda foi anunciada com esse ónus.

  32. Fez-se incorreta aplicação dos artigos 824 nº 2, 1037 nº 2, 1057, do C. Civil e 109 do CIRE.

    Termos em que deve ser dado provimento ao recurso revogando-se a decisão recorrida.

    *** Contra alegaram a Massa Insolvente e o Credor Banco EE, S.A (EE), defendendo a improcedência do recurso e a manutenção da decisão recorrida.

    O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo.

    Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    ***II – Âmbito do Recurso.

    Perante o teor das conclusões formuladas pelo recorrente – as quais (excetuando...

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