Acórdão nº 1494/12.2TBBCL-F.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2014

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução10 de Julho de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: B...

Recorrido: F… e M… Tribunal Judicial de Barcelos – 1º Juízo Cível.

F… e M…, em sede de oposição ao pedido de declaração da insolvência contra eles formulado, requereram a exoneração do passivo restante, nos termos do artigo 235°, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

Para o efeito, declararam expressamente que preenchem todos os requisitos dos quais a lei faz depender a exoneração do passivo restante, nos termos do nº 3, do artigo 236°, do C.I.R.E. e que se obrigam a observar todas as condições que a exoneração do passivo restante envolve e as quais estão estabelecidas nos artigos 23º e seguintes do CIRE.

Na assembleia de apreciação do relatório, e relativamente ao pedido de exoneração do passivo restante, foi declarado:

  1. Pela Segurança Social nada ter a opor àquele, desde que, nos termos do disposto na alínea d), do nº 2, do artigo 245°, do CIRE, tal exoneração não afecte os seus créditos; b) Pelo requerente da insolvência A… que se opunha à exoneração do passivo restante pelos motivos exarados na petição inicial, que se enquadram no fundamento previsto no artigo 238°, nº 1, alínea d), do CIRE; c) Pela credora B… que se opunha ao pedido de exoneração do passivo restante, alegando que os insolventes foram alvo de vários processos ao longo do tempo, sendo que o mais antigo deles data de 2004.

    Todos perfazem um total de valores em dívida superior a € 254.378,58. Durante todo este tempo os executados viveram uma situação em que contraíram sucessivamente divida em valor muito superior às suas capacidades para pagar.

    Mais alegou que concedeu aos devedores, em 29 de Junho de 2007, um empréstimo no valor de € 20.000, tendo ficado acordado que tal quantia seria paga até ao dia 31 de Dezembro de 2007, o que não sucedeu.

    Aliás, concedeu até outro empréstimo aos devedores de igual valor, tendo ficado acordado que o total mutuado seria pago até 30 de Junho de 2008. Nessa altura, os devedores ocultaram a existência de diversos processos judiciais contra eles pendentes e as dificuldades porque passavam.

    Alega, ainda, que os devedores têm desenvolvido uma actividade idêntica à que sempre exerceram, mas em nome da filha e do cunhado, esquema que utilizam para continuar a obter rendimentos, sem que cumpram as obrigações que assumiram. Para o efeito, facultaram à filha os meios que eles próprios utilizavam no exercício dessa actividade, meios esses que fraudulentamente passaram para uma empresa criada para o efeito, a "X… Unipessoal, Ldª", detida pela filha de ambos.

    O Sr. Administrador da Insolvência emitiu parecer, pugnando pela aceitação da exoneração do passivo restante.

    Foram juntos aos autos os certificados do registo criminal dos insolventes (cfr. fls. 385vs e 388 vs).

    Por decisão proferida nos autos tudo o exposto, em razão da falta de fundamento da oposição, e por se entender inexistir qualquer motivo de indeferimento liminar, foi deferido o pedido de exoneração do passivo, determinando-se que durante os cinco anos do período de cessão, o rendimento disponível que os insolventes F… e M… venham a auferir se considere cedido ao fiduciário, cabendo-lhes, ainda, cumprir as obrigações previstas no n" 4, do artigo 239°, do CIRE, sob pena de cessação antecipada do respectivo procedimento.

    Inconformada com tal decisão, apela a credora B…, pugnando pela revogação da decisão, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: “1- A credora interpõe recurso do despacho inicial de exoneração do passivo restante, requerida pelos Insolventes em sede de oposição ao pedido de declaração de insolvência, e que foi concedida pelo tribunal a quo por considerar encontrarem-se reunidos todos os requisitos que prevê o artigo 237.º do CIRE.

    2- A exoneração traduz-se num benefício que constitui, para os insolventes pessoas singulares, uma medida de protecção capaz de se materializar no perdão de dívidas, exonerando-os dos seus débitos, com a contrapartida, para os credores, da perda correspondente dos seus créditos.

    3- A concessão desse benefício pressupõe, da parte do devedor insolvente, uma conduta recta, cumpridora e de boa-fé, quer no período anterior à insolvência, cuja inexistência conduzirá ao indeferimento liminar do pedido por verificação de qualquer uma das situações a que alude o art. 238.º, quer no período posterior e, designadamente, nos cinco anos subsequentes ao encerramento do processo de insolvência, por força das obrigações impostas pelo art. 239.º e cujo incumprimento conduzirá à recusa da exoneração, nos termos do art. 243.º.

    4- A exoneração só deve ser concedida ao devedor que preencha determinados requisitos, particularmente que tenha tido um comportamento anterior pautado pela licitude, honestidade, transparência e boa-fé, no que respeita à sua situação económica e aos deveres associados ao processo de insolvência, reveladores de que a pessoa em causa se afigura merecedora de uma nova oportunidade, “fresh start”.

    5- É necessário um especial cuidado e rigor na apreciação da conduta dos insolventes, já que a mesma deve apresentar-se transparente e sem qualquer indício de má-fé.

    6- Ora, no caso sub judice, o comportamento dos insolventes em tudo aponta para a existência de culpa no agravamento da situação de insolvência, o que apenas poderia ter resultado no indeferimento do pedido de exoneração do passivo restante. Não obstante, 7- A Mma. Juiz do tribunal a quo considerou verificarem-se todas as condições de que depende a concessão da exoneração do passivo restante, tendo decidido pela cessão ao fiduciário do rendimento disponível que os insolventes venham a auferir ao longo dos cinco anos posteriores ao encerramento do processo, com excepção do correspondente a um salário mínimo nacional, por cada um dos insolventes.

    8- Com isto, todavia, não considerou estar a retirar aos credores todas as hipóteses de verem os seus créditos satisfeitos, já que a diferença que será cedida ao fiduciário nunca será suficiente para cobrir todos aqueles créditos, tendo em conta que o insolvente Francisco se encontra desempregado e a insolvente Maria Amélia aufere apenas cerca de € 650,00 (aos quais se subtrai o valor correspondente ao salário mínimo).

    9- Existe, assim, uma contradição entre a fundamentação e a própria decisão do tribunal, pois, se por um lado a Mma. Juiz se baseou nas poucas possibilidades económicas dos insolventes para lhes conceder a exoneração, por outro considerou que o atraso (ou neste caso, a falta!) na apresentação dos devedores à insolvência não causou prejuízos aos credores.

    10- Entende a Recorrente que os insolventes, embora não estando obrigados a se apresentar à insolvência, sabiam ou não podiam ignorar que, ao não o fazer, iriam causar prejuízo aos seus credores, pois não existia qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica. O que deveria ter sido dado como provado.

    11- Na verdade, os rendimentos mensais do casal (€ 650,00!) tornam notório que já há vários anos os insolventes não tinham qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica. E, aproveitando-se da falta de apresentação à insolvência, utilizaram esse circunstancialismo para obter mais créditos junto de terceiros para obter financiamento, como foi o caso da ora Recorrente, a qual jamais aceitaria emprestar o que quer que fosse se conhecesse a situação de insolvência.

    12- Atente-se que as datas dos créditos bem demonstram que os insolventes incumpriram com o dever de apresentação à insolvência — nem quando estavam em situação de insolvência nem no semestre seguinte.

    13- Os insolventes sempre ocultaram a existência de diversos processos judiciais contra eles pendentes e as dificuldades financeiras porque passavam. Sempre viveram numa situação em que contraíram sucessivamente dívidas em valor muito superior às suas capacidades para pagar, agindo como se nada fosse, contraindo cada vez mais dívidas.

    14- Além disso, sabendo da sua incapacidade para...

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