Acórdão nº 125/13.2TCGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 29 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelPAULO DUARTE BARRETO
Data da Resolução29 de Setembro de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível (2.ª) do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório Na presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, que Banco…, S.A. move ao Município de…, pede o Autor que, pela sua procedência, se condene o Réu a pagar-lhe o montante de capital de € 423.958,48, acrescido de juros de mora, no valor de € 90.469,62 e de imposto de selo no montante de € 3.618,78, assim como os juros vincendos, até efectivo e integral pagamento.

Para tanto, e em síntese, alega que, em 10 de Outubro de 2008, celebrou com a sociedade I…, Lda. um contrato de factoring, no âmbito do qual esta, na qualidade de aderente, se comprometeu a ceder àquele a totalidade ou parte dos créditos de curto prazo sobre os seus devedores, obrigando-se o Banco a aceitar as cessões, desde que cumpridos os pressupostos previstos no acordo celebrado.

No âmbito desse acordo, o banco Autor adiantou ao aderente as quantias de € 270.575,72 e € 153.382,76, respeitantes às facturas com os n.ºs 58 e 69, com vencimento, respectivamente, em 12-09-2010 e 15-10-2010, emitidas pelo aderente ao Município de…, em função de serviços prestados à dita autarquia.

Sucedeu que o aderente não liquidou os valores acima referidos ao Autor, vindo a ser judicialmente declarado insolvente, pelo que o Autor interpelou o Réu para proceder a tal pagamento.

O Réu, porém, apesar de reconhecer a obrigação de pagar a dívida, não o fez, justificando-se o recurso a esta acção para que seja reconhecido o seu direito de receber as ditas quantias pecuniárias, acrescidas dos juros vencidos – ascendendo estes já à quantia de € 90.469,62 – e vincendos, bem como o imposto de selo no valor de € 3.618,78.

O Réu, na contestação, bateu-se pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

Assim, começou por invocar desconhecer se o Autor adiantou, de facto, ao aderente o valor de € 423.958,51 a que este alude na petição inicial e referiu que não lhe pode ser imputada, à luz do direito aplicável, a responsabilidade pelo não pagamento dos valores peticionados na acção.

Na verdade, segundo o Réu, nos termos do contrato de factoring subjacente aos autos, o aderente assumiu integralmente o risco de não pagamento, total ou parcial, dos créditos cedidos, pelo que seria sobre ele e não sobre outra entidade – designadamente, o contestante – que recairia em exclusivo a obrigação de pagamento dos créditos peticionados pelo Autor.

Acresce que este último, perante a falta de pagamento dos valores respeitantes a juros do contrato de factoring celebrado, declarou resolver esse contrato. Essa resolução tem, nos termos da lei, efeitos retroactivos, pelo, quanto ao Réu, tudo se passa como se o contrato nunca tivesse chegado a ser celebrado, pois que nenhuma prestação foi por si efectuada, não recaindo sobre si qualquer obrigação de pagamento no quadro de um contrato que deixou de existir.

Por outro lado, nos termos do contrato de factoring celebrado, foi acordada a possibilidade de o Autor fazer retroceder à I… dos créditos cedidos, longo que os mesmos não se encontrassem pagos. Desconhece-se, porém, se o Autor o fez.

Acresce, ainda, que o Autor preencheu uma livrança emitida pelos avalistas da sociedade aderente, tendo ele, por isso, um meio expedito para ver ressarcidos os seus créditos sobre a I…. Assim, o seu comportamento ao resolver o contrato de factoring, ao preencher as livranças entregues pelos avalistas e, simultaneamente, ao instaurar esta acção, configura um claro abuso de direito.

Finalmente, alega que nunca o contestante poderia ser responsabilizado pelo pagamento do imposto de selo peticionado pelo Autor, por se tratar de imposto referente a contrato no qual não interveio.

Conclui, assim, pela improcedência da acção Proferida a sentença, foi a acção julgada procedente e, consequentemente, condenado o Réu a pagar ao Autor o montante de capital de € 423.958,48, acrescido de juros de mora, no valor de € 90.469,62 e imposto de selo no montante de € 3.618,78, assim como os juros vincendos, até efectivo e integral pagamento.

* .Não se conformando com tal decisão, dela recorreu o Réu, tendo formulado as seguintes conclusões: “ I. Encontra-se documentado nos autos o envio de cartas à I… e aos avalistas, juntas a fls. 42 a 44; II. Das quais resulta que o contrato de factoring celebrado não só foi resolvido, como foi preenchida a livrança entregue pelos avalistas; III. Facto que, por não ter sido impugnado pelo Réu, se considera assente por acordo; IV. O tribunal não se pronunciou sobre esse facto, nem o incluiu na matéria de facto provada, o que se impõe, dado tratar-se de facto essencial à justa composição do litígio; V. Atenta a modalidade de factoring contratualizada – factoring com recurso -, factoring que entretanto foi resolvido pelo Autor, não pode considerar-se ser o Autor o titular do direito de crédito em questão; VI. O Réu não pode ser considerado um res inter alios acta em relação ao contrato em causa nos presentes autos; VII. A partir do momento em que a cessão de créditos é notificada ao devedor, este deixa de ser um terceiro alheio à relação contratual subjacente àquele contrato; VIII. No caso de contratos de factoring com recurso, quando o devedor não paga, o factor deverá exigir o pagamento directamente à sociedade facturizada; IX. O próprio Autor parece reconhecer isso já que apenas veio exigir do aqui Réu depois de a sociedade facturizada não ter pago os montantes em dívida; X. Tendo sido acordada entre as partes a retransmissão dos créditos em caso de incumprimento da obrigação de pagamento, os créditos consideram-se retransmitidos para a sociedade facturizada; XI. Passando novamente a titularidade do direito de crédito sobre o aqui Recorrente para a aderente; XII. O contrato de factoring foi resolvido pelo Autor; XIII. Tudo se passando em relação ao Recorrente como se o contrato nunca tivesse sido celebrado; XIV. Não se encontrando, assim, o Recorrente obrigado a efectuar qualquer pagamento no âmbito de um contrato que deixou de existir na ordem jurídica; XV. Ainda que a resolução não abranja as cessões de crédito operadas, a sociedade facturizada mantém-se adstrita ao cumprimento do dever pós-contratual de reembolso dos valores adiantados; XVI. Obtendo o Autor a satisfação dos...

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