Acórdão nº 1065/03.9TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução26 de Abril de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães: I – RELATÓRIO.

Recorrente(s): João e esposa Maria.

Recorrido(s): Fernando.

Tribunal Judicial de Braga – Vara Mista.

Fernando, divorciado, reformado, com residência na Travessa Dr. Francisco Machado Owen, 79, Braga, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra João e mulher Maria, residentes no lugar de ..., Palmeira, Braga.

Como fundamento e, em síntese, alega que os RR. são os únicos sócios da sociedade “Esteves…, Lda.” com sede em Braga, sendo a Ré mulher a única gerente.

Mais alega que por contrato promessa de cessão de quotas outorgado no dia 27 de Março de 2001, os RR. prometeram ceder ao autor, livres de ónus ou encargos, as quotas que têm no capital social da referida sociedade, pelo preço de 50.000.000$00 (cinquenta milhões de escudos), hoje equivalente a 249.398,95€ (duzentos e quarenta e nove mil, trezentos e noventa e oito euros e noventa e cinco cêntimos).

Como clausulado no contrato, os RR. receberam na data da assinatura do contrato a quantia de 38.000.000$00, hoje equivalente a 189.543,20€, a título de sinal e princípio de pagamento. Ficou convencionado que a parte restante do preço seria paga na data da celebração da escritura definitiva, em data e cartório a indicar pelo A.

Consignou-se que, em caso de incumprimento, ao contraente não faltoso assistia o direito a recorrer à execução específica.

Sucede que, após convocação feita pelo A., os RR. não compareceram no cartório a fim de outorgarem escritura pública. Voltou o autor a notificar os RR. para cumprirem as obrigações assumidas, em novo prazo de oito dias, sob pena de se considerar definitivamente incumprido o contrato e os RR. não manifestaram qualquer intenção de honrar os compromissos assumidos.

Aliás, mantiveram um comportamento revelador da intenção de não cumprir o contrato, pois, encetaram diligências tendentes à cessão de quotas que constituem o objecto do negócio celebrado com o autor ou à transmissão da concessão de uma ou mais carreiras de que a empresa é concessionária ou à venda de veículos de passageiros.

Este comportamento dos RR. motivou a instauração, pelo autor, de procedimento cautelar, que veio a ser deferido.

Mais alegou que pretende, agora, obter sentença judicial que supra a falta de declaração de vontade dos réus.

Concluiu, pedindo que se declare transmitida para o A. a propriedade e titularidade das quotas sociais que compõem o capital social da sociedade comercial “Esteves…, Lda.”, matriculada na Conservatória do Registo Comercial sob o n.º 337, com sede em Braga e com o capital social de 249.398,95€, sem prejuízo do pagamento do preço em dívida.

Dada notícia nos autos do falecimento do A., foram habilitados como seus sucessores António, Rui, Fátima e Helena.

Na contestação, os RR. impugnaram a matéria alegada na petição inicial, sustentando que a R. Maria nunca assinou o contrato promessa de cessão de quotas, sendo grosseiramente falsificada a sua assinatura, nem tinha conhecimento do mesmo.

Mais alegaram que o contrato em causa foi simulado por ter sido elaborado com a única finalidade de obter um financiamento elevado junto do Sr. Francisco, para assim melhor o convencer de que o autor tinha uma situação económica que lhe permitia pagar desafogadamente o mútuo. Assegurou o A. ao R. João que o documento seria destruído na presença de ambos logo que obtido o empréstimo.

Além disso, o A. não pagou aos RR. um centavo, a título de sinal, pela aquisição das quotas.

Invocaram que, pressuposto que o alegado pelo A. fosse verdadeiro, sempre o negócio seria nulo, por ter sido falsificada a assinatura da R. mulher, além de ser usurário, nos termos dos artigos 280.º e 282.º do Código Civil.

Sustentaram que o A. litiga de má-fé, com o propósito de locupletar à custa alheia.

Concluíram pela improcedência da acção, requerendo, ainda, a condenação do A. ou sucessores, por litigância de má-fé, em multa e indemnização não inferior a 2.500€.

Na réplica os habilitados AA. mantiveram o alegado na petição inicial, invocando que os RR. fazem um uso reprovável do processo.

Concluíram como na petição inicial e requereram a condenação dos RR., por litigância de má-fé, em multa e indemnização condigna.

Realizada audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, no qual, após se ter afirmado a validade e regularidade da instância, se procedeu à organização da matéria de facto assente e a base instrutória, que não sofreu qualquer reclamação.

Realizado o julgamento, foi elaborado despacho que respondeu à matéria de facto controvertida, que não mereceu qualquer censura, sendo proferida sentença que julgou a acção procedente, declarando-se transmitida para os autores a titularidade das quotas que compõem o capital social da sociedade comercial “Esteves…Lda.”, com sede em Braga e com o capital social de 249.398,95€, matriculada na Conservatória do Registo Comercial sob o n.º 337, pelo preço de 249.398,95€, estando já pago o valor de 189.543,20€, e mediante o pagamento da quantia remanescente.

Da referida sentença foi interposto recurso de apelação que foi julgado procedente, determinando-se a anulação da decisão da matéria de facto, no que respeita aos artigos 1.º a 5.º da base instrutória e da sentença, mais se determinando a formulação de novo quesito e a realização de novo julgamento.

Formulou-se novo quesito da base instrutória (32.º).

Realizado o novo julgamento, foi dada resposta aos quesitos formulados que não foi objecto de qualquer reclamação.

Inconformados com tal decisão, dela interpuseram os RR. o presente recurso, em cuja alegação formularam, em suma, as seguintes conclusões: “I- Nenhuma testemunha referiu que acompanhou quaisquer negociações ou contrato de cessão de quotas, pelo que nenhuma prova foi produzida para que se tivesse considerado que a recorrente mulher interveio no contrato, por pretender ceder a sua quota, conjuntamente com seu marido, o Réu João: II- Nenhuma testemunha referiu, nem uma só vez, que a Recorrente Maria reuniu, com quem quer que fosse ou tivesse assinado, também, o que quer que fosse; III- Na verdade, a Recorrente Maria nunca assinou qualquer contrato promessa de cessão de quotas, a favor do primitivo autor ou a favor de outrem, desde a data que adquiriu tais quotas, até ao presente; IV- Nunca a Recorrente, Maria, prometeu ceder aquela sua quota ao A. ou a outrem; V- Alegou que a assinatura aposta no dito contrato é grosseiramente falsa e falsificada; VI- Alegou que essa assinatura, aposta nesse contrato, não foi efectuada pelo seu punho; VII- Na verdade, tal assinatura não tem qualquer semelhança ou parecença com a assinatura própria da recorrente Maria, por não ter sido feita pelo seu punho, como resulta, aliás, de simples comparação com as assinaturas por ela, efectivamente, apostas na carta de condução antiga e actual e nos bilhetes de identidade antigo e actual, juntos a dita providência, apensa aos presentes autos; VIII- Ora, tendo a ré impugnado toda a matéria factual inerente as negociações e contratação e tendo invocado a falsidade da sua assinatura e não tendo sido realizada qualquer perícia, é obvio que o tribunal não podia dar como provado, nem pode continuar dar como provado, sem qualquer factualidade que sustente e fundamente que a assinatura aposta no contrato promessa, junto aos autos e a que os mesmos se reportam, era da recorrente e foi desenhada e aposta pelo seu punho, considerando que da prova produzida nem uma só testemunha sustenta tal factualidade, quer na primeira audiência, quer na repetição, por a mesma ser falsa e, como se disse, não existir qualquer suporte factual ou documental, para tal; IX- Como é consabido, competia aos autores provar, e não provaram, que a assinatura era da ora recorrente, Maria, nos termos do disposto nos artigos 342 e 374 do c. Civil e 544 do c. P. Civil; X- Como resulta da prova produzida na primeira audiência de julgamento e da sua repetição, toda gravada, dos depoimentos das testemunhas arroladas pelo A. e habilitados, ouvidas nessas sessões, ressalta que se tratou de contrato para garantir o pagamento de uma divida do recorrente João, pelo que, com o devido respeito, não podia o tribunal decidir que os recorrentes quiseram vender as quotas que adquiriram há um ror de anos, por mais de um milhão de euros, por uma quarta parte do valor (249.398,95 €), o tribunal ter considerado o que considerou, com base nos depoimentos de marido e enteada da A., os quais nem sequer conheciam a esposa do R. João, como flui dos depoimentos das testemunhas – Serafim - aos quesitos 1 a 5 e 32 a minutos “4.59, 6.32, 10.12, 18.30 a 18.40, 22.52 a 23,00, 23, 13 a 23,17, 23.44, 35.23 a 35.35, 38.02, 42.39 a 42.47” - Claudino - aos quesitos 1 a 5 e 32 “3.27 a 3.42, 4.53 a 5.21, 6.47 a 6.57, 7.30 a 7.34, 8.02 a 8.00, 8.41 a 8.44, 11.12 a 13.53” e - ora Cristina- aos quesitos 1 a 5 e 32 "8.56 a 9.25, 9.32, 22.21 a 22.28., 26.14 a 26.25,38.31 a 38.41,39.54 a 39.59”; XI- como se disse, da prova produzida, quer na primeira audiência de julgamento, quer na repetição, ressalta, inequivocamente, que aquele contrato promessa de cessão de quotas, objecto dos presentes autos, servia, apenas, de garantia do pagamento de uma dívida do R. João ao primitivo A., Fernando, como o referiu, pelo menos, quatro vezes, a testemunha dos AA., Claudino Castelbranco, leal servidor do falecido Fernando, designadamente a minutos 14.20 a14.43 e 15.04 a 15.07 da primeira audiência e a minutos 13.53 a 15.04 da repetição; XII- como é óbvio, nunca o recorrente João venderia ou cederia a sua quota, tão pouco, por aquele valor do contrato, considerando o preço de aquisição das quotas, como se disse, superior a um milhão de euros, como, aliás, resulta da certidão comercial junta aos autos, matéria assente e depoimento das testemunhas inquiridas; XIII- de todo o modo, pressuposto que o recorrente João tivesse querido ceder a sua quota, o que se não admite, nem concede, como ressalta, aliás...

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