Acórdão nº 1/08.0TBVNC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelFERNANDO FERNANDES FREITAS
Data da Resolução20 de Novembro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

- ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES -

  1. RELATÓRIO I.- “T.., AG”, pessoa colectiva com sede na Alemanha, instaurou a presente acção de anulação de deliberação social contra “D..,S.A., (DMP), pessoa colectiva com sede em Vila Nova de Cerveira, e “D.. ESPAÑA, S.A. (DME), com sede em Madrid, na Espanha, pedindo que: - se declare anulada a deliberação social que aprovou o relatório de gestão e as contas do exercício de 2006, relativas à 1ª. Ré; - a administração desta 1ª. Ré seja instada a fornecer-lhe (a ela, Autora) toda a informação que lhe foi solicitada e a responder sem limitações às perguntas que lhe foram colocadas por si (Autora) na assembleia geral de 27 de Novembro de 2007; - a 2ª. Ré, DME, seja condenada a pagar-lhe o valor indemnizatório que em função do tratamento dos dados solicitados vier a ser apurado em execução de sentença, e que corresponderá à diferença entre o valor que ela, Autora, recebeu a título de lucros pela sua participação e o que lhe caberia caso a respectiva contabilidade não tivesse sido alterada.

    Fundamenta alegando, em síntese, que é accionista minoritário de ambas as Rés pelo que não consegue controlar nem participar na sua gestão, e muito embora a Ré DMP tenha obtido resultados positivos, não lhe parece que eles correspondam ao volume de negócios efectivamente realizados, parecendo-lhe igualmente que a 2ª. Ré DME tem, comparativamente, auferido lucros bastante elevados.

    Pediu uma análise contabilística a uma empresa especializada, e, sendo de cerca de 88% as vendas da DMP à DME, verificou-se que a primeira contabilizou como custos de exercícios anteriores uma correcção de € 102.919,00 relativa a ajustamentos no âmbito da política de preços de transferências, relativo aos exercícios de 2005 e/ou anteriores.

    Solicitada à Ré DMP a justificação e detalhe destes ajustamentos, a informação foi recusada com o fundamento de a A. ser uma empresa que concorre directamente com os mesmos produtos e para os mesmos mercados.

    Está convencida, ela Autora, que a 1ª. Ré, DMP, pratica preços de transferência diferentes dos preços do mercado, nas relações comerciais com a 2ª. Ré, DME, com vantagens especiais para esta, do que resulta prejuízo para a Autora.

    Contestaram as Rés alegando, em síntese, que prestaram as informações e forneceram os elementos que lhes foram solicitados, à excepção da que se reporta aos preços de transferência por se tratar de matéria que não pode ser revelada, muito em especial a empresas concorrentes, posição em que se encontram a Autora e elas Rés, já que, de posse de informações sobre o processo de formação dos preços, facilmente conseguiria a primeira suplantar os preços das segundas, arrebatando-lhes as adjudicações nos concursos em que se apresentam a competir, causando-lhes graves prejuízos.

    Acresce que a prestação daquela informação viola os princípios e regras do direito da concorrência.

    Os autos prosseguiram os seus termos, e, na sequência da audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente por não provada, absolvendo as Rés dos pedidos que a Autora formulara.

    Inconformada, a Autora, através do presente recurso, impugna esta decisão, pretendendo vê-la revogada.

    As Rés contra-alegaram defendendo que se deve manter o decidido em 1ª. Instância.

    O recurso foi recebido como de apelação, com efeito meramente devolutivo.

    Foram colhidos os vistos legais.

    Cumpre, pois, apreciar e decidir.

    * II.- A Apelante funda o seu recurso nas seguintes conclusões: 1.- Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida no dia 20 de Julho de 2011, no âmbito do litígio que opôs a Autora, ora Recorrente, e as Rés DMP e DME, aqui Recorridas.

    1. - Andou mal o Tribunal a quo na interpretação, selecção e determinação dos meios de prova relevantes para a fixação do seu entendimento, assim se justificando as presentes alegações de recurso.

    2. - Na prática, o Tribunal valorou sobretudo o depoimento prestado pelo perito A.., arrolado como testemunha pela Ré DME, Recorrida, em detrimento de toda a prova testemunhal oferecida pela Recorrente.

    3. - Em suma, e salvo sempre o devido respeito que, naturalmente, lhe merece, entende a Recorrente que a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância e que ora se sindica não procedeu à correcta aplicação da lei e, muito menos, à adequada apreensão da factualidade em apreço e à certeira resposta à matéria de facto atentas as provas testemunhal e documental oferecidas pela Recorrente.

    4. - Começando pela alteração à matéria de facto, a propósito dos quesitos 10.º a 14.º da Base Instrutória, é imperioso sublinhar que várias foram as testemunhas arroladas pela Recorrente cujos depoimentos indiciam uma resposta contrária àquela que foi fixada pelo Tribunal a quo.

    5. - Em primeiro lugar, e quanto à prova testemunhal, no depoimento prestado por H.. (Audiência de Julgamento de 02.02.2011), face à pergunta se não seria o preço o elemento de desempate, a testemunha foi clara em sustentar que o preço não é o elemento decisivo, mas sim as especificações técnicas do produto, como o peso, o rendimento técnico e os materiais.

    6. - Seguindo o depoimento prestado por esta testemunha - à semelhança do depoimento prestado por T.. e A.. (Audiência de Julgamento de 02,02.2011) existem situações em que num concurso lançado por um OEM, o contrato é adjudicado a uma proposta de preço superior devido à superioridade técnica do produto, o que demonstra que o preço não é efectivamente o elemento essencial de desempate.

    7. - Face ao exposto, deverá a resposta dada pelo Tribunal a quo ao quesito 10.º da Base Instrutória ser alterada, assim se concluindo como "Não Provado", por duas ordens de razão: em primeiro lugar, pela não igualdade entre os produtos que concorrem entre si nos concursos lançados pelos OEM; em segundo lugar, porque das declarações das aludidas testemunhas resulta que o preço não é afinal o único elemento de decisão entre propostas e que, de entre os vários elementos, não é o que tem mais peso na decisão de adjudicação de um contrato por um OEM.

    8. - Quanto aos quesitos 11.º e 12.º da Base Instrutória, T.. e A.. (Audiência de Julgamento de 02.02.2011) foram bastante claros ao asseverar que o acesso ao dossier de preços de transferência não permite conhecer a estrutura dos custos de produção uma vez que os preços finais dependem de uma multiplicidade de factores variáveis aos quais acrescem custos adicionais que permanecem desconhecidos.

    9. - Por essa mesma razão, e conforme foi explicado pelas testemunhas T.., A.. e P.., tal acesso não permite colocá-la numa posição de vantagem nos concursos para a adjudicação de encomendas junto dos OEM, ainda mais tratando-se de uma informação antiga que já tem pelo menos três anos.

    10. - Dito isto, deverão os quesitos 11.º e 12.º da Base Instrutória ser considerados como "Não Provados".

    11. - No que concerne aos quesitos 13.º e 14.º da Base Instrutória, importa ter em consideração o seguinte: A Recorrente admite considerar-se provado o quesito 13.º, quanto ao facto de a prática da política de preços de transferência pelas Recorridas segundo o método do custo majorado ("net cost plus") ser seguida desde 2004.

    12. - É no entanto falso que a Recorrente tivesse tido conhecimento dessa política de preços de transferência, o que foi, no entanto, considerado provado no quesito 14.º.

    13. - Ora, conforme, resulta das declarações de P.., o facto de que a Recorrida DMP ou todo o grupo DM praticam a política de preços de transferência segundo o método do custo majorado não transparece das respectivas demonstrações financeiras, sendo certo que ele próprio só teve conhecimento desse facto nas curtas respostas oferecidas no âmbito da Assembleia Geral de 27 de Novembro de 2007.

    14. - Em suma, atendendo ao supra exposto e aos depoimentos contraditórios prestados durante a audiência de discussão e julgamento os quesitos 10.º a 14.º deverão ser dados como "Não provados".

    15. - No que concerne à Apreciação Jurídica da Decisão em crise, importa esclarecer que mal andou o Tribunal ao considerar legítima a recusa da Ré DMP em facultar o dossier de preços de transferência à Recorrente, considerando, assim, não existir uma violação do seu direito à informação que determine a anulabilidade da deliberação em causa 17.- Com efeito, a recusa em prestar as informações solicitadas não pode ser justificada pelo alegado conteúdo confidencial do dossier sobre preços de transferência, já que, a ser essa a verdadeira razão da recusa, poderia o mesmo ter sido entregue ocultando à Recorrida apenas os referidos dados .

    16. - A informação solicitada pela Recorrente era imprescindível para que a Recorrente pudesse exercer de forma consciente o seu direito de voto na Assembleia-Geral de 27 de Novembro de 2007 e essencial para que possa apurar se está a ser ludibriada pelas Recorridas, ou seja, se a Recorrida DMP se encontra a praticar preços abaixo dos de mercado nas suas relações com a Recorrida DME.

    17. - O Tribunal a quo, por sua vez, considerou que a Recorrida DMP cumpriu o seu dever de informação ao disponibilizar à ora Recorrente um relatório de uma consultora independente, que concluiu pela regularidade e legalidade da política de preços de transferência aplicada no grupo DM.

    18. - No entanto, não pode a Recorrente concordar com tal entendimento, pois considera que tal regularidade não ficou de todo esclarecida com o aludido "relatório" da KPMG disponibilizado pela Recorrida DMP, razão pela qual propôs às Recorridas que a sua política de preços de transferência fosse revista por um auditor independente a fim de esclarecer se os referidos preços de transferência se ajustavam às condições de mercado.

    19. - Não obstante se ter oferecido para assumir os honorários do auditor nomeado e proposto que este se limitasse a declarar se os preços de transferência estavam, ou não, a ser aplicados em condições de mercado, sem necessidade de os revelar, as condições que lhe foram impostas pela Ré DMP foram de tal forma abusivas e...

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