Acórdão nº 3072/10.6TBVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Julho de 2012

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução11 de Julho de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Recorrente (s): Augusto… Portela e mulher Maria… Portela (RR.); Recorrido (s): Maria… Faria e marido Mário Gonçalves (AA).

***** Pedido: Os autores demandaram os réus, pedindo: 1. Que seja declarada nula e sem qualquer efeito a escritura de justificação notarial a favor do Réu marido, celebrada no 2º Cartório Notarial de Viana do Castelo, em 22 de Março de 1982; 2. Que se ordene o cancelamento da inscrição a favor do Réu lavrada na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo através da Ap. 11 de 1982.06.07; 3. E a condenação destes a retirar/encerrar todas as construções que fizeram ilegalmente e violam o direito de propriedade dos Autores, nomeadamente a demolição do portão e do depósito das botijas de gás que colocaram no terreno dos Autores, o encerramento de todas as janelas e portas que deitam sobre o prédio dos Autores, bem como a recuarem o prolongamento do beiral do telhado efectuado do lado sul do anexo.

Causa de pedir: Em 1982, o primeiro Réu celebrou uma escritura de justificação notarial na qual afirmou ter comprado no ano de 1956 um prédio sito no lugar de Costeira, freguesia de Alvarães, concelho de Viana do Castelo, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo 9…º, prédio esse que os vendedores haviam adquirido por usucapião. Esse invocado prédio corresponde a um anexo existente no logradouro do prédio dos Autores, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 6…º Urbano. Ora, nunca o Réu marido comprou esse anexo aos pais da Autora como é referido nessa escritura e só por tolerância dos Autores é que os Réus se mantiveram nesse anexo.

Há cerca de três anos, os Réus levaram a cabo no anexo uma série de obras e, aproveitando o facto de os Autores residirem em França, sem nada lhes comunicarem, procederam à colocação de um portão do lado norte de uma passagem existente entre a residência dos Autores e o referido anexo, bem como construíram, do lado sul da mesma, uma construção de cimento para colocação de botijas de gás, construções essas que impedem totalmente a circulação dos Autores à volta da sua residência. Procederam ainda à abertura de três janelas e duas portas no referido anexo que deitam directamente para a casa dos Autores, tendo ainda procedido à ampliação do beiral do telhado do anexo.

Realizada a audiência de discussão e julgamento e fixada a matéria de facto, foi proferida sentença em que se decidiu: a) Declarar inexistir o direito justificado notarialmente pelo Réu, Augusto… Portela, na escritura pública celebrada em 22 de Março de 1982 no Cartório Notarial de Viana do Castelo e incidente sobre o prédio composto por uma casa de rés-do-chão com logradouro, situado no lugar da Costeira, da aludida freguesia de Alvarães, a confrontar do norte com Manuel Alves Brandão, do sul com António da Silva Martins, do nascente com o caminho público e do poente com Joaquim Coutinho, e inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia de Alvarães, em nome do justificante marido sob o artigo 9…º; b) Ordenar o cancelamento da inscrição a favor dos Réus da propriedade do referido prédio, realizada na referida Conservatória através da apresentação 11 de 1982/06/07, tendo por referência o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo, sob o nº 1…; c) Condenar os Réus a retirarem o portão colocado na parte em que a parcela de terreno que se encontra entre a residência dos Autores e a residência dos Réus confina com a Rua do Estaleiro; d) Condenar os Réus a retirarem/demolirem o depósito das botijas de gás que construíram no lado sul da sua residência; e) Condenar os Réus a encerrarem todas as janelas e portas que deitam sobre a residência dos Autores; f) Condenar os Réus a recuarem o prolongamento do beiral do telhado efectuado do lado sul do anexo.

Inconformados com tal decisão, dela interpuseram os réus o presente recurso, em cuja alegação formulam, em súmula, as seguintes conclusões: 1. Deve a decisão recorrida ser revogada, ao nível da alínea l) dos factos provados, dando-se como não provado que “Os Autores, em virtude dos laços familiares que têm com os Réus, toleraram tais factos” (al. l) dos factos provados), uma vez que, tendo provado os elementos integrantes do “corpus” da posse sobre o “prédio justificado, como decorre do teor das als. i) a q) dos factos provados, presumia-se o “animus”.

Presumindo-se o “animus”, incumbia sobre os AA. a prova de que a posse dos RR. era precária.

  1. Deve ser alterada a redacção do ponto r) dos factos provados e que dê como provada a matéria de facto contida no art. 22.º da contestação, dando àquela alínea dos factos provados a seguinte redacção: “Os Réus tomam conta da dependência/anexo, com o comportamento descrito, sem interrupção temporal, à vista de toda a gente, com a convicção de que exercem, como direito próprio, os poderes inerentes ao direito de propriedade, até aos dias de hoje.” 3. A prova que os Autores se limitaram a fazer sobre a matéria dos supra citados pontos da matéria de facto controvertida resume-se, no essencial, aos depoimentos de Camilo Gomes da Silva e de Mário Martins Morgado.

  2. Mas ainda que assim não fosse, a prova produzida pelos RR. a este respeito foi ampla e abundante e permitiu, pelo contrário, extrair a conclusão oposta: a de que a posse dos RR. se revestia e reveste do corpus e do animus.

  3. Para que haja um mínimo de coerência na Douta Decisão recorrida, deve ser outra a redacção dada alíneas i), m), p) e r) dos factos provados.

  4. Com efeito, se está assente que existe o prédio referido na alínea d) dos factos provados e que os RR. nele construíram uma moradia unifamiliar, é contraditório fazer-se referências a “dependência/anexo) – al. i) -, “dependência” – al. m) -, “anexo” – al. n) -, “anexo” – al. p) – e “dependência/anexo” – al. r).

  5. Essas referências constantes das als. i), m), n), p) e r) dos factos provados deverão, pois, sob pena de contradição insanável entre essas alíneas e a al. d) dos factos provados, ser substituídas pela expressão “moradia unifamiliar existente no prédio referido na al. d) dos factos provados”.

  6. Os RR. não põem em causa que fizeram, há cerca de 07 anos, as obras referenciadas na al. n) dos factos provados.

  7. Não obstante, foram essas as únicas obras que fizeram nesse período, já que todas as outras são anteriores a 1988.

  8. Face à absoluta ausência de prova sobre esta matéria por parte dos AA. e à prova produzida pelos RR., dar-se como provado que a abertura de janelas e o prolongamento do beiral são obras recentes mais não foi do que conferir à produção de prova um alcance que ela manifestamente não teve.

  9. A ausência de prova sobre a matéria das als. o) e p) dos factos provados e a prova de sentido contrário produzida pelos RR. deveria ter levado o Tribunal recorrido a dar como provado que essas obras foram, de facto, realizadas, mas nunca após o ano de 1988.

  10. Por força da violação das regras de repartição do ónus da prova e da desconsideração da presunção prevista no n.º 2 do art. 1252.º do Cód. Civil, o Tribunal recorrido partiu de um falso pressuposto que acabou por inquinar toda a sentença: o de que ambos os prédios em referência nos autos pertencem aos AA.

  11. A ausência de prova sobre a propriedade dessa faixa de terreno não poderia ter levado o Tribunal recorrido a dar como provado que as janelas e porta deitam directamente para a casa dos Autores.

  12. Quando muito, deveria ter sido dado como provado que essa porta e janelas deitam directamente para uma faixa de terreno existente entre os dois prédios identificados nos autos.

  13. Em face do exposto, deverá alterar-se a resposta às als. o) e p) dos factos provados, dando-se-lhes a seguinte redacção: - al. o) – em data não posterior a 1988 os RR. procederam à abertura de três janelas e uma porta na moradia unifamiliar por eles construídas no prédio identificado no ponto d) dos factos provados; - al. p) – tendo ainda procedido, nunca após 1988, à ampliação do beiral do anexo.

  14. Os factos contidos nos arts. 33.º a 36.º da contestação foram amplamente demonstrados por todas as testemunhas arroladas pelos RR., que, demonstrando conhecimento directo desses factos, puderam esclarecer o Tribunal que há mais de 20 anos que mais ninguém, a não ser os RR., usa a parcela de terreno existente entre os prédios de ambas as partes.

  15. Acima de tudo, essa matéria de facto não foi objecto de qualquer contraprova por parte das testemunhas arroladas pelos AA., que nada souberam dizer sobre a utilização desse espaço, a não ser o que se passava há mais de 20 anos.

  16. Deverá alterar-se a resposta a esses artigos da contestação, dando-se como provada a matéria de facto neles vertida.

  17. A procedência do recurso da matéria de facto, em especial, na parte em que respeita à natureza da posse exercida pelos RR. sobre o “prédio justificado” permitirá, sem mais, concluir que os RR. adquiriram, por usucapião, o direito de propriedade...

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