Acórdão nº 1966/11.0TBGMR-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Julho de 2012

Magistrado ResponsávelCATARINA GON
Data da Resolução03 de Julho de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I.

Nos autos de insolvência referentes a J.., o Administrador de Insolvência veio apresentar o seu parecer relativamente à qualificação da insolvência, propondo que a mesma seja qualificada como fortuita, sendo que idêntica posição foi adoptada pelo Ministério Público.

Por despacho de 18/11/2011, considerou-se que havia indícios de que agravamento culposo da situação da insolvência, o que determinaria a sua qualificação como culposa e, nessa medida, determinou-se a notificação do Administrador da Insolvência para prestar esclarecimentos, o que, efectivamente, sucedeu.

Na sequência desse facto, o Ministério Público veio emitir parecer no sentido de a insolvência ser qualificada como culposa em virtude de o Insolvente ter contraído novos empréstimos que agravaram o seu estado de insolvência.

O Insolvente – após citação – veio deduzir oposição, sustentando que a insolvência deve ser qualificada como fortuita.

Foi proferido despacho saneador e foi elaborada a selecção da matéria de facto assente e base instrutória.

Após realização da audiência de discussão e julgamento – onde apenas foi ouvido o Administrador da Insolvência – foi proferida decisão que qualificou a insolvência como culposa, decretando a inibição do Insolvente, J.., para o exercício do comércio, para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa durante um período de 5 (cinco) anos.

Inconformado com tal decisão, o Insolvente veio interpor o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: I. A douta sentença recorrida sofre do vício de erro de julgamento quanto à apreciação e valoração da prova, ferindo assim o disposto no art.º 712.º do Código do Processo Civil e a prova produzida é insuficiente para a matéria dada como provada e não provada.

  1. A douta sentença recorrida é nula porque deixa de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar - alínea d) do art.º 668.º do Código de Processo Civil.

  2. Entende, porém, o recorrente que a matéria de facto provada é insuficiente para aquele efeito, e daí o presente recurso.

  3. Em primeiro lugar, não resultou provada qualquer destruição, danificação, inutilização, ocultação ou desaparecimento no todo ou parte considerável do património das empresas em que o recorrente foi sócio - gerente (C.., Lda. e A.., Lda.

  4. O recorrente foi entre 28.09.2005 e 16.02.2011, sócio - gerente da C.., Lda.

  5. Mas, apesar de todas as condicionantes externas, constata-se que a actividade da gerência se pautou pela tentativa de satisfazer todas as obrigações assumidas, não havendo exploração deficitária ou em proveito alheio aos interesses da sociedade ou do recorrente.

  6. O recorrente aplicou os valores das dívidas contraídas, para manter a sociedade a laborar de forma a obviar o desemprego dos funcionários. O recorrente apenas assumiu nos créditos uma posição de garante.

  7. Não pode o Tribunal a quo ignorar que, as instituições financeiras credíveis como o são, seguramente fizeram um estudo prévio de capacidade do esforço financeiro da sociedade e dos avalistas, antes de lhe conceder o crédito, e concluíram que os mesmos eram capazes de cumprir a obrigação assumida, e como tal revelaram-se honestos nas suas declarações que entenderam por bem solicitar ás referidas instituições financeiras.

  8. O recorrente e a sociedade só não cumpriram alguns dos contratos financeiros assumidos, porque a sociedade não conseguia cobrar dos seus clientes, fruto da crise instalada.

  9. A crise não foi nem é imputável ao recorrente, nem pode ser usada como elemento que este tivesse de considerar, ainda mais porque a crise económica que o país e o mundo atravessam, era inimaginável que tivesse o alcance obtido.

  10. Apesar da crise, a sociedade está a cumprir acordos de pagamentos outorgados com algumas entidades financeiras.

  11. Também, não podia ignorar o Tribunal a quo, que os créditos são contraídos por quem não possui meios para pagar a "pronto" uma determinada obrigação, e que só o facto de ter contraído um crédito numa situação de incapacidade financeira, não significa que tenha actuado com culpa grave.

  12. No limite há culpa do lesado nos termos do art.º 570.º do Código Civil, o que desde logo elimina a culpa grave do recorrente, pois ao ter sido concedido o crédito, mesmo na qualidade de avalista, o Recorrente ficou impedido de considerar, do ponto de vista objectivo, critério de estima do Tribunal a quo, estava insolvente, excepção que se arguí para todos os efeitos legais.

  13. Também a douta decisão judicial, altera a posição inicial do parecer do Exmo. Administrador, que qualificou a insolvência de fortuita, em virtude da obrigação legal do pagamento da prestação alimentícia por parte do aqui recorrente.

  14. O recorrente é solteiro, maior, e pai de um filho menor.

  15. Não seria admissível prejudicar o filho do recorrente, por ter este sido declarado insolvente, sob pena de grande injustiça e desprotecção jurídica.

  16. É a obrigação geral de alimentos consignada no art.º 2009.º do Código Civil a que o art.º 93.º do C.I.R.E. se reporta, integrando-se a obrigação de sustento de filhos menores nos termos decorrentes das "Responsabilidades Parentais” na previsibilidade do art.º 239.º, n.º 3 al. b) i) do C.I.R.E.

  17. Estando fixada, por sentença proferida em autos de Regulação de Responsabilidades Parentais, do 4º juízo do Tribunal Judicial de Guimarães, no Processo nº .., que regulou as responsabilidades parentais referente ao filho menor do Apelante/insolvente, a prestação alimentícia mensal de € 450,00 euros, para o menor, entendemos que este valor deverá integrar-se no conceito de despesas de sustento do “agregado familiar”, nos termos do art.º 239º, nº 3 al. b) i) do C.I.R.E., tratando-se, ainda, de valor a cujo pagamento o insolvente se encontra adstrito, e que é prevalecente.

  18. Pelas razões aduzidas, entende o recorrente, que o Tribunal a quo, não podia nem devia considerar o valor da prestação alimentícia mensal de argumento para tentar provar a culpa do Apelante.

  19. De facto, o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 173/2009, publicado no D.R., I Série, de 04/05/2009, declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade do citado art.º 189.º, n.º 2, alínea b), por violação dos art.º 26.º e 18.º, n.º 2, da Constituição da República portuguesa.

  20. A verdade, porém, é que, tendo em atenção a fundamentação do referido acórdão - e não obstante a existência de opiniões discordantes (cfr. designadamente, a decisão sumária do Tribunal Constitucional n.º 651/07, proferida pelo Conselheiro João Cura Mariano) - não se vislumbra qualquer razão que justifique um tratamento diverso das demais pessoas que possam ser afectadas pela...

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