Acórdão nº 732/13.3TTVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelALDA MARTINS
Data da Resolução07 de Janeiro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães
  1. Relatório B.intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra C, Lda., pedindo a condenação desta no reconhecimento da justa causa da resolução do contrato de trabalho por si operada e no pagamento da quantia global de € 5.485,60, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa de 4%, até efectivo e integral pagamento.

    Alegou para tanto, em síntese: - o A., nos últimos meses em que prestou trabalho para a R., foi obrigado pela mesma a trabalhar diariamente 10 horas seguidas, não lhe tendo sido pago o trabalho suplementar prestado nos últimos 6 meses, à razão de duas horas por dia; - ao A. não foram pagos férias e subsídio de férias, assim como não lhe foi facultado o gozo integral das mesmas; - ao A. não foi paga à data da resolução do contrato de trabalho a retribuição do mês de Março de 2013; - o A., quando trabalhava aos domingos, não tinha folga entre a Segunda Feira e o Domingo seguintes; - desde o início de Dezembro de 2011 até Fevereiro de 2012, o A. trabalhou sempre 7 dias por semana, das 08:00 da manhã até às 22:00, sem folgas e sem que lhe fosse pago o trabalho suplementar; - os gerentes da sociedade, no último mês, humilhavam o A. perante os demais trabalhadores, afirmando perante os mesmos que ele era um incompetente, e obrigavam-no a lavar o chão da empresa de joelhos; - por tudo isto, o A. fez cessar o contrato de trabalho com justa causa, por carta enviada à R. no dia 09 de Abril de 2013.

    A R. apresentou contestação, impugnando os fundamentos da acção e formulando reconvenção, pedindo a condenação do A. a pagar-lhe a quantia de € 970,00.

    O A. apresentou resposta.

    Proferido o despacho saneador, realizou-se a audiência de julgamento, finda a qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto.

    Seguidamente, pelo Mmo. Juiz a quo foi proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo: «Assim, e face a tudo o exposto, decide-se: Julgar a presente acção parcialmente procedente, por provada, e em consequência, condenar a R. a pagar ao A. a quantia global ilíquida de € 788,67; Custas por A. e R., na proporção do respectivo decaimento.

    Julgar totalmente procedente o pedido reconvencional, condenando o A. a pagar à R. a quantia de € 970,00.

    Custas nesta parte pelo A.» O A., inconformado, veio arguir a nulidade da sentença e interpor recurso da mesma, formulando as seguintes conclusões: «*NULIDADES (invocadas no requerimento de interposição de recurso, mas por cautela de patrocínio expostas sucintamente também nas conclusões):* 1. Entende o Autor / recorrente que a sentença recorrida enferma de nulidades várias, pelo que, nos termos do art. 77.º do CPT as elencou e fundamentou expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso e que aqui se dão por reproduzidas.

  2. A sentença recorrida não diz quais os factos não provados, não indica a Motivação, fundamentos de facto ou de Direito, não sendo possível aferir com clareza os fundamentos que foram decisivos para a convicção do tribunal, nulidades que se invocam (assim cfr. alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC) e ACSTJ de 18/09/2013, proc.n.º 968/07.6JAPRT-A.S1 e ACSTJ de 27/11/1991, processo n.º 042163).

  3. O Tribunal a quo pretere uma versão da história em virtude de uma outra, pelo que deve fundamentar mais detalhadamente o porquê de tê-lo feito, para que as partes (e, até, a sociedade em geral) percebam as razões que levaram o tribunal a fazer justiça com base em determinados factos e não outros, e ao não o ter feito ficou tal fundamentação aquém do mínimo exigido, pelo que é nula a sentença recorrida.

  4. Inexiste na sentença recorrida uma fundamentação dos factos provados, da prova testemunhal, bem como não existe qualquer exame crítico ou fundamentado dos factos não provados, em suma não foi feita a obrigatória apreciação/exame crítico das provas, sendo a sentença nula, nulidade que se invoca (cfr. Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 30/06/2011 e de 11/01/2011, Acórdão da Relação do Porto, Acórdão de 12/01/2011).

  5. E o mesmo se aplica à prova testemunhal, pois da douta sentença a quo e decisão à matéria de facto, não retiramos o processo lógico-mental que serviu de suporte ao conteúdo.

  6. Assim, é nula a sentença recorrida pois não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, conforme impõe e dizem os arts. 607º e 615º nº1 b) do CPC.

  7. Entende o Autor ser a sentença nula por ser contraditória, obscura e ininteligível nos termos do disposto no art. 615º nº1 c) do CPC, nos termos supra expostos, nulidade que se invoca.

    *** DA REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO E DE DIREITO: 8. Conforme se demonstra a sentença recorrida merece censura nos seguintes aspectos: A – Erro na decisão da matéria de Facto e de Direito; B – Insuficiente exame crítico das provas e fundamentação da sentença; C – Erro de julgamento e erro na apreciação, valoração e interpretação da prova; D – Contradição entre factos provados, motivação, exame crítico e decisão; E – Inexistência de fundamentação e Motivação claras e especificadas na Sentença em violação do art. 607º e 615º do CPC, conforme arguido no requerimento de interposição do recurso.

  8. Não se encontram elencados os factos dados como não provados na sentença recorrida, à revelia do disposto no art. 607º nº4 do CPC, pelo que não concorda o A. com a não procedência da acção por existir prova testemunhal e documental nos autos que a demonstra provada.

  9. Desconhece-se em que se fundou a sentença para decidir, já que a mesma o não diz, simplesmente concluindo que o Autor não logrou provar os factos que alega.

  10. A valoração dos depoimentos das testemunhas foi errónea, pois estas acabaram por confirmar as alegações do Autor, ou pelo menos parte delas, e não existe análise crítica da prova testemunhal, desconhecendo-se como o tribunal chegou à decisão.

  11. Confessa a Ré na sua contestação que é devido ao Autor: a. Vencimento correspondente a Abril, no valor de 112,00€; b. Subsídio de Alimentação, no valor de 30,00€; c. Indemnização de férias não gozadas, no valor de 264,60€; d. Segurança Social, a descontar, no valor de 30,00€; e. Sobretaxa de IRS 2013, no valor de 6,00€; f. Subsídio de férias, liquidado em duodécimos no valor de 33,29€; g. Subsídio de Natal, liquidado em duodécimos no valor de 20,21€; h. Segurança Social referente aos subsídios, no valor de 5,88€.

  12. O que perfaz o total de 501,98€ em dívida para com o Autor, sendo que desde logo se verifica que o Autor de facto tinha motivos para resolver o contrato de trabalho.

  13. Para além disso, e somente tendo em consideração os factos provados, verifica-se que o tribunal a quo considera que é também devido ao Autor: a. Pagamento de férias vencidas no dia 01/01/2013, no montante de €485,00 b. Proporcionais de férias referentes ao trabalho prestado no ano de cessação do contrato - €121,25.

    c. Duodécimos do mês de Abril - €40,42.

    d. Em conclusão, o A. Tem direito a receber da Ré a quantia global líquida de €788,67.

  14. Pelo que aos €788,67 que o tribunal a quo considera serem devidos ao Autor terão de ser acrescentados os valores que a Ré confessa e admite serem devidos ao Autor no valor de €501,98, o que perfaz o valor global de €1290,65.

  15. Somente os valores em dívida que o tribunal considerou provados são motivo para resolução do contrato de trabalho com justa causa por iniciativa do trabalhador nos termos do art. 394º nº2 als. a) a e); nº3 al.c) e nº5 do mesmo artigo do CT.

  16. Significa isto que a sentença recorrida é contraditória, logo nula, pois o próprio tribunal, não obstante julgar não provados (ao que parece, pois não o indica na sentença) outras alegações do Autor, acaba por omitir a confissão da Ré, não incluindo as remunerações que a mesma admite serem devidas ao Autor, dando até como provado em dívida outras retribuições em falta há mais de 60 dias, o que causa elevado transtorno na vida familiar do Autor.

  17. Autor e sua esposa foram forçados a pedir dinheiro emprestado à sogra e mãe, por várias vezes, conforme consta do depoimento da mesma (cfr. Depoimento da testemunha Rosa), para conseguirem pagar a renda de casa e fazer face às despesas com os filhos, pois a Ré não efectuava os pagamentos remuneratórios de forma atempada.

  18. O tribunal a quo julgou provado que estão em dívida “o Pagamento de férias vencidas no dia 01/01/2013, no montante de €485,00”, pelo que tendo o Autor remetido carta de despedimento com justa causa em 09 de Abril de 2013, tais valores se encontravam em dívida há mais de 60 dias, de forma culposa.

  19. Mesmo que assim não se considere, sempre terão de ser julgados, tais atrasos no pagamento das retribuições devidas (e considerando até somente as que foram dadas como provadas pelo tribunal a quo) ao Autor, como Falta não culposa de pagamento pontual da retribuição, de acordo com o art.394º nº3 al.c) do CT.

  20. O que implica a legalidade da resolução contratual invocando justa causa, devendo improceder, por não provada, a reconvenção (cfr. Ac. TRC, proc. 1022/09.1TTCBR.C1, de 10-02-2011; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proc. 178/09.8TTALM.L1-4, de 02-03-2011 e proc.633/12.2TTFUN.L1-4, de 30-04-2014).

  21. Acresce que não se exige uma descrição circunstanciada dos factos na missiva de resolução do contrato de trabalho por parte do trabalhador, como acontece na nota de culpa, sendo apenas necessário enunciar os fundamentos da resolução imediata do contrato de forma a permitir ao empregador a sua avaliação e, eventualmente, a apreciação judicial da justa causa, pelo que as considerações de insuficiente descrição dos factos que justificam a resolução do contrato de trabalho com base em justa causa se nos afiguram indevidas.

    * 23. Para além disto deverão ser dados outros factos como provados, que naturalmente implicam a legalidade da Resolução com Justa Causa por iniciativa do trabalhador, com a necessária reapreciação da prova testemunhal transcrita nas alegações e que se dá aqui por integralmente reproduzida.

  22. A Ré refutou as alegações do Autor.

  23. ...

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