Acórdão nº 995/12.1TTVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelANTERO VEIGA
Data da Resolução14 de Maio de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

Manuel..., intentou a presente ação de processo comum contra: “Empresa, S.A.”, pedindo a condenação da R.: - a reconhecer que não tem eficácia jurídica o documento intitulado de “rescisão de contrato individual de trabalho por mútuo acordo” datado de 31/5/2002; - a reconhecer que o vínculo que uniu o A. e a R. desde 1985 até 30 de abril de 2012 foi sempre um vínculo de índole laboral; - a reconhecer que se tratou de um despedimento ilícito a cessação desse contrato de trabalho promovida pela R. em 30/4/2012; - a pagar-lhe a quantia de €17.617,60 de indemnização pelo despedimento ilícito; - a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao transito em julgado da sentença; - a pagar-lhe a quantia de €23.427,66 a título de compensação pelo não gozo de férias desde 2007; - a pagar-lhe a quantia de €23.684,06 a título de subsídio de alimentação não pago desde 1/6/2002; - a pagar-lhe a quantia de €3.968,80 a título de férias e respetivo subsídio, vencidos em 1/1/2012; - a pagar-lhe a quantia de €1.484,40 a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal correspondente ao ano de 2012; - a pagar-lhe a quantia de €26.747,04 de subsídio de férias e de Natal desde 2003 a 2011; - a pagar-lhe a quantia de €995,87 de proporcional de subsídio de Natal do ano de 1991; - a pagar-lhe a quantia de €2.742,20 por formação profissional não prestada; - a pagar-lhe os respetivos juros de mora, à taxa legal.

Alega para tanto e em resumo, que desempenhou a sua atividade profissional para a R. inicialmente através de contrato de trabalho, posteriormente, continuou a desempenhar aquela atividade mediante contrato designado como prestação de serviços; as condições em que executava a sua atividade eram as de um típico trabalhador por conta de outrem; a R. procedeu à denúncia do contrato, que configura despedimento ilícito.

A R. contestou alegando em resumo que o A. prestou para si serviços como enfermeiro, mas, desde que ocorreu a rescisão do contrato de trabalho, não se encontrava numa situação de subordinação equivalente aos seus restantes trabalhadores; não existia, assim, qualquer relação laboral, pelo que não podem proceder os pedidos contra si formulados.

Realizado o julgamento foi proferida decisão julgando a ação improcedente.

O autor inconformado interpôs recurso apresentando as seguintes conclusões: (…) O Exmº PGP deu parecer no sentido da procedência.

Colhidos os vistos dos Ex.mos Srs. Adjuntos há que conhecer do recurso.

*** Factualidade: – Em 1985, o A. foi admitido ao serviço da R. para, sob as suas ordens, direção e fiscalização, exercer a sua atividade de enfermeiro no “Posto Médico” da empresa, integrado numa equipa de enfermeiros que assegurava o funcionamento desse posto.

2 – O A. estava obrigado a cumprir o seu horário de trabalho, o qual era fixado e controlado pela R.

3 – O A. auferia uma retribuição mensal, acrescida de subsídio de alimentação, subsídio de férias e de Natal, gozando o período de férias anual remunerado.

4 – Em 2002, a R. projetou reorganizar aquele seu “Posto Médico” de forma a que os profissionais enfermeiros que ali prestavam funções deixassem de fazer parte do seu quadro de funcionários.

5 – O seu objetivo era que o referido posto médico continuasse a funcionar 365/366 dias por ano, 24 horas por dia, sendo esse serviço assegurado por uma equipa de enfermeiros por si escolhidos, com “externalização desses serviços”.

6 – Na sequência deste projeto, a R. propôs ao A. a cessação do seu contrato de trabalho mediante o pagamento da quantia de €32.210,00., acrescido dos créditos laborais vencidos à data da cessação.

7 – Assim, com data de 31 de maio de 2002, A. e R. subscreveram o documento de fls. 49 – verso (cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido), denominado “rescisão do contrato de trabalho por mútuo acordo”, aí se estabelecendo que a relação laboral terminava no dia 31 de maio de 2002.

8 – O A. recebeu da R. as quantias referidas nesse documento.

9 – No dia 28 de maio de 2001 e para que o A. continuasse a prestar a sua atividade de enfermeiro para a R., ambas as partes já haviam subscrito um documento denominado “contrato de prestação de serviços” (documento de fls. 50 que aqui se dá por integralmente reproduzido), no qual se fixava o dia 1 de junho de 2002 como data do seu início.

10 - A partir desta data, o A. continuou a desempenhar a sua atividade de enfermeiro no “posto médico” da R., conjuntamente com outros enfermeiros que subscreveram documentos similares.

11 – Alterado: Um enfermeiro ficou com a obrigação de coordenar a prestação da atividade de todos os restantes profissionais/enfermeiros que ali desempenhavam funções.

12 – Cada um dos enfermeiros, incluindo o A., desempenhava aquela atividade por um período de oito horas por dia.

13 – alterado: Competia ao “enfermeiro/coordenador”, auscultando as disponibilidades de cada um – pois que todos, incluindo o A., prestavam a sua atividade também para outras entidades – estabelecer os turnos de oito horas que cada um devia cumprir, o que era feito primeiro de forma mensal e depois semanalmente.

14 – Esta organização/mapa dos turnos era comunicada aos órgãos competentes da R. para efeitos de pagamento das horas de atividade efetivamente desempenhadas por cada um dos enfermeiros.

15 – A R. não interferia na definição concreta dos turnos, sendo-lhe indiferente qual o enfermeiro escolhido pelo “coordenador” para prestar um concreto horário; dava, porém, orientações no sentido de ser respeitada a equidade na distribuição dos turnos entre os diversos enfermeiros e de que não deveriam prestar dois turnos seguidos.

16 – Quando um dos enfermeiros, por razões próprias, se via impossibilitado de cumprir o seu “turno”, acordava a sua substituição com um colega e/ou com o “coordenador”.

17 – Nestes casos, a R. processava o pagamento de acordo com o mapa referido em 14), sendo o “acerto de contas” (normalmente por troca) efetuado entre os enfermeiros, sem interferência da R.

18 – O A. e demais enfermeiros utilizavam um cartão de acesso às instalações da empresa para efeitos de controlo de entrada e permanência naquelas instalações; os registos assim efetuados não eram processados pelo departamento de recursos humanos da empresa para efeitos de assiduidade.

19 - O A. passou a receber da R. a quantia de €9,35/hora, à qual acresceria 50% se efetuasse uma prestação de atividade superior a oito/horas dia; este montante era processado mensalmente.

20 – A R. procedeu à atualização daquele valor/hora de acordo com a percentagem do aumento atribuído anualmente aos seus trabalhadores.

21 – Mais ficou estabelecido que o A. ficava desobrigado de prestar os seus serviços durante um período correspondente a trinta dias seguidos de calendário civil, a título de férias, com marcação prévia até 31 de março ou antecedência mínima de sessenta dias.

22 – Este período de “férias” era objeto de acerto entre os enfermeiros e o seu coordenador, sem interferência da R.

23 – A R. deixou de pagar qualquer quantia a título de subsídio de alimentação, subsídio de férias e de Natal e deixou de proporcionar ao A. o período de férias anual remunerado.

24 - O A. e os restantes enfermeiros desenvolviam a sua atividade profissional no “posto médico” da R., no local por esta indicado e utilizando exclusivamente os instrumentos que eram propriedade desta e por esta postos à sua disposição com essa finalidade.

25 – O A. e os restantes enfermeiros tinham que dirigir requisições á Direção de Recursos Humanos (DRH) da R. sempre que precisassem de substituir os bens consumíveis ou de adquirir qualquer outro tipo de bem que entendessem necessário para o desempenho da sua atividade.

26 – A DRH dava instruções ao “posto médico” no sentido de procederem ao agendamento e marcação dos diversos exames de saúde que os trabalhadores da R. tinham que efetuar.

27 – Ao A. e seus colegas competia preencher, de acordo com as instruções da R., um impresso relativo à justificação das ausências dos trabalhadores desta (doentes ou sinistrados) e de que tinham depois que enviar uma cópia ao DRH.

28 – Estas comunicações de ausência, por doença ou acidente, tinham também que ser enviadas ao Departamento de Higiene e Segurança da R. e aos responsáveis das secções a que esses trabalhadores pertenciam.

29 – Ao A. e seus colegas competia também realizar testes de alcoolemia aos trabalhadores da R. e outros que tivessem que estar dentro das suas instalações, de acordo com as solicitações da DRH, procedendo ao preenchimento de impressos entregues por esta DRH e ao seu subsequente envio, sendo que em caso de resultado positivo, tinham instruções para os enviar igualmente ao superior hierárquico do trabalhador em causa.

30 – Aquando da epidemia da “gripe A”, a R. solicitou ao A. e demais enfermeiros que fizessem um trabalho escrito sobre os cuidados a ter relativamente á prevenção dessa doença e que o apresentassem (verbalmente) nas diversas secções da R.

31 – O A. prestou as seguintes horas de trabalho para a R. e recebeu desta as seguintes quantias: - em 2002 (após 1 de junho) – 803 horas, tendo recebido €7.515,08; - em 2003 – 1312 horas, tendo recebido €12.054,24; - em 2004 – 1840 horas, tendo recebido €17.586,24; - em 2005 – 1796 horas, tendo recebido €19.111,15; - em 2006 – 1712 horas, tendo recebido €18.019,15; - em 2007 – 1736 horas, tendo recebido €18.753,36; - em 2008 – 1640 horas, tendo recebido €18.342,72; - em 2009 – 1648 horas, tendo recebido €20.191,52; - em 2010 – 1624 horas, tendo recebido €18.497,36; - em 20011 – 1552 horas, tendo recebido €17.925,60; - em 2012 – 520 horas, tendo recebido €6.006,00.

32 – No dia 29 de fevereiro de 2012, a R. enviou ao A. uma carta na qual lhe comunicava a denúncia do “contrato” referido em 9), com efeitos a partir do dia 30 de abril de 2012.

33 – A R. tem a modalidade de serviços internos de segurança, higiene e saúde no trabalho.

34 – A...

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