Acórdão nº 2723/12.2TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Abril de 2017
Magistrado Responsável | HELENA MELO |
Data da Resolução | 20 de Abril de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório AA, S.A.
intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum ordinário, contra BB, S.A.
, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 450.000,00, acrescida de juros à taxa supletiva, contados desde 15-06-2009 (data da notificação para a constituição do tribunal arbitral) até efectivo e integral pagamento.
Alegou para tal que celebrou com a R., em 28.11.2015, um contrato de empreitada para a execução da obra de construção do Hotel Central de Viana do Castelo, em terreno sito no gaveto da Rua da Bandeira com a Av. Gaspar Castro, freguesia de Santa Maria Maior, Viana do Castelo, por preço global fixo (quanto aos trabalhos constantes da proposta de empreitada, no valor global de € 1.560.000,00), tendo sido ainda acordada a realização de outros trabalhos.
O prazo para a realização dos trabalhos da empreitada era de 180 dias, com início em 1 de Janeiro de 2006, não tendo porém sido facultado pela Ré à Autora as peças escritas ou desenhadas complementares ao projecto, necessárias para que esta pudesse proceder à execução da obra, bem como a licença da obra emitida pela Câmara Municipal de Viana do Castelo, nem o livro de obras.
Acrescentou que a obra apenas foi concluída e entregue em 30 de Maio de 2007 (334 dias após o prazo acordado), imputando o atraso à execução dos trabalhos a mais e a indefinições e omissões por parte da Ré, nomeadamente na elaboração e aprovação dos projectos necessários ao licenciamento e desenvolvimento da obra, na apresentação à autora das demais peças escritas e desenhadas complementares ao projecto e necessárias à execução da obra, na definição atempada de opções diversas do previsto executar, na falta de esclarecimento oportuno dos pormenores construtivos que em projecto lhe competiam evidenciar e na resolução de ocorrências contratualmente não previstas, como sucedeu por exemplo com a falta de soluções para debelar o nível freático e para as contenções periféricas, com a estacaria de fundações, com as infraestruturas eléctricas e com a indefinição quanto à implantação da obra.
Invocou, ainda, que estes atrasos da responsabilidade da Ré lhe causaram prejuízos com a afectação de recursos humanos e equipamentos, por um período de, pelo menos, 6 meses, cujo montante computa em € 450.000,00 * A R contestou, refutando a responsabilidade que lhe é imputada pela Autora pelo atraso na conclusão e entrega da obra, com excepção apenas do período de um mês, no tocante aos trabalhos de estacaria e contenção periférica, para cuja compensação considera suficiente a quantia de € 5.000,00. Pelo contrário, no que respeita aos trabalhos a mais (que foram pagos como tais), ao nível freático e à falta de licença de obra e de livro de obra, nenhuma destas situações inviabilizava a prossecução dos trabalhos decorrentes da empreitada inicial.
Alega, em oposição com o vertido na petição inicial, que tais atrasos na conclusão da obra (que deveria ter ficado pronta em 30-07-2006, contando com a prorrogação do prazo inicial por 30 dias, o que significa que o atraso se cifrou em 306 dias) se devem a culpa exclusiva da própria Autora, reclamando assim a aplicação da multa diária estabelecida contratualmente no valor de € 500,00, o que conduz a uma indemnização a este título que ascende a € 153.000,00.
Formulou, assim, um pedido reconvencional no montante de € 148.000,00 (operando a compensação com a quantia de € 5.000,00 que reconheceu dever à Autora), acrescido das custas de parte referentes ao processo que correu termos no Tribunal Arbitral de € 41.210,01 e dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos, contabilizando aqueles no valor de € 2.017,43 até à data da apresentação da reconvenção.
Concluiu, pedindo a improcedência da acção (com excepção da mencionada importância de € 5.000,00) e a procedência da reconvenção, com a condenação da Autora no pagamento da quantia de € 191.227,44, acrescida de juros de mora.
A Autora replicou, nos termos constantes de fls. 110 a 116 do processo físico, impugnando os novos factos alegados pela Ré na sua contestação-reconvenção e reiterando o que havia já alegado na petição inicial, no sentido da culpa exclusiva da Ré pelo atraso na conclusão e entrega da obra.
Quanto às custas reclamadas, defende que as mesmas deverão ser fixadas no próprio processo a que respeitam, não sendo esta a sede para apreciar o respectivo pedido. Mais alegou que a R. nunca deu cumprimento ao disposto na cláusula 21º, nº 3 do contrato de empreitada, não tendo nunca lhe remetido qualquer auto por aplicação de multas contratuais.
Terminou, pedindo a improcedência da reconvenção.
* A Ré treplicou, mantendo tudo o que havia alegado na contestação/reconvenção e impugnando a nova factualidade alegada pela Autora na réplica.
** Procedeu-se a uma audiência prévia.
** Antes da prolação do despacho saneador foi decidido não admitir a reconvenção deduzida pela Ré na sua contestação, na parte referente ao pagamento da quantia de € 43.227,44 (custas de parte relativas ao processo que correu termos no tribunal arbitral e de cuja decisão foi interposto recurso para este Tribunal da Relação), acrescida dos respectivos juros peticionados, tendo a mesma sido admitida quanto ao demais peticionado.
Após, foi elaborado despacho saneador, na sequência do qual se procedeu à selecção da matéria de facto assente e da base instrutória.
Procedeu-se seguidamente a julgamento e a final foi proferida sentença com o seguinte teor decisório, no que ao caso interessa: “– Por tudo o exposto, decide-se: a) julgar parcialmente procedente a acção e, em consequência 1. reconhecer que a Autora é titular de um crédito sobre a Ré, no valor de € 15.000,00; 2. absolver a R. do restante pedido; b) julgar parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência: 1. reconhecer que a Ré é titular de um crédito sobre a Autora, no valor de € 152.000,00; 2. considerar extinto o crédito supra indicado em a) 1., por compensação; 3. operando a compensação entre os créditos referidos em a) 1. e b) 1., condenar a Autora a pagar à Ré a quantia de € 137.000,00, correspondente à diferença entre o crédito da Autora e o crédito da Ré, acrescida de juros de mora desde a data da notificação do pedido reconvencional até integral pagamento, às taxas legais em cada momento em vigor para as operações comerciais, nos termos da Portaria nº 597/2005, de 19/07. “ A A. não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, no qual concluiu do seguinte modo: 1- O Tribunal a quo apoia-se unicamente no facto dado como provadon.º 20 para aplicar à recorrente multas contratualmente previstas poratraso na execução dos trabalhos contratuais.
2- Não existe facto provado que demonstre o cumprimento do dispostona cláusula 21ª, n.º 3 (“A aplicação de multas contratuais, seráprecedida de auto lavrado pela fiscalização, do qual o dono da obraenviará uma cópia ao empreiteiro, notificando-o para, no prazo deuma semana, deduzir a sua defesa.
”) do contrato de empreitada - até porque tal jamais foi alegado nos art.s 152º a art. 167º dacontestação.
3- As multas contratuais por atraso na conclusão na empreitadadesignam-se na doutrina por cláusulas penais moratórias, que cessama sua razão de ser uma vez terminada e entregue a obra, o que sucedeu– vd. facto dado como provado n.º 13.
4- Devem ser aplicadas no decurso da empreitada da formacontratualmente prevista para o fazer – ou de acordo com a tramitaçãolegal para o efeito, por remissão contratualmente determinada para oDecreto-Lei n.º 59/99.
5- As penalidades contratuais não podem ser aplicadas após a conclusãoda empreitada, não podem ser aplicadas judicialmente em momentoposterior nem podem ser aplicadas prescindindo da sua tramitaçãoformal e sem conceder ao empreiteiro defesa quanto à aplicação dasmesmas.
6- A recorrente nunca foi notificada, nem no decorrer da obra nemdepois, da aplicação de multas contratuais, o que aliás foi alegado noart. 24º da réplica e que, portanto, integra a base factual a julgar peloTribunal a quo, não tendo sido, aliás, produzida sequer prova docontrário (vd. art. 324º, n.º 1 CCiv..) 7- A aplicação de multas contratuais pelo Tribunal a quo é ilícitaporquanto nula e deve, nessa mesma medida, ser revogada, conformejurisprudência abundante e citada.
8- Por outro lado, a sentença a quo considera não serem devidos €450.000,00 a título de custos de estaleiro conforme peticionados pelaautora (vd. art. 144º PI) pelo atraso da obra e pela permanência dosseus meios na mesma entre 31/06/2006 e 30/05/2007.
9- A sentença a quo considera que apenas deve ser consideradoimputado à ré um atraso de 30 dias e que este atraso deve serindemnizado à razão da multa contratual fixada para o atraso naconclusão da obra por parte do empreiteiro.
10- A sentença a quo faz errada apreciação de prova e consequentementeerrada aplicação do direito aos autos. Vejamos.
11- Conforme facto dado como provado n.º 29, a licença de obra apenasfoi entregue à autora em 26 de Maio de 2006.
12- A recorrente não poderia iniciar a construção da obra sem dispor dalicença por imperativo legal, razão pela qual e desde logo, apenas apartir da data da obtenção da licença deveria iniciar-se a contagem doprazo de execução da empreitada contratualmente previsto, implicadoper se a falta de licença de obra um atraso de 118 dias - veja-se, aliás,o depoimento da testemunha CC,gravado em audiência de julgamento de 4 de Abril de 2016, entre as15:09 e as 17:02, com continuação na audiência de julgamento de 09de Maio de 2016 entre as 15h24m e as 17h38m, minuto 5:11.
13- As sobrelarguras foram tardiamente executadas, sendo que nos termosda cláusula 2ª, n.º 3, estão excluídas do contrato de empreitada – vd. Odepoimento do mesmo CC – apenas tendo sido apresentadauma solução para o problema depois de 17 de Março, 76 dias após oinício da empreitada.
14- Nos termos da cláusula 28ª, n.º 2, competia à recorrente obter alicença de obra e de uso de...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO