Acórdão nº 180/07.4JABRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Abril de 2017

Data24 Abril 2017

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

(Secção Penal) Relatora: Fátima Furtado; adjunta: Elsa Paixão.

  1. RELATÓRIO No processo comum coletivo nº 180/07.4JABRG, da instância central de Braga, 1ª secção criminal, juiz 2, da comarca de Braga, em que são arguidos M. L. e outros, com os demais sinais dos autos, iniciada a audiência de julgamento foi proferido o seguinte despacho: «No dia 11 de outubro de 2016, aberta a audiência de julgamento, a arguida M. L. requereu a declaração da inexistência da acusação datada de 24 de fevereiro de 2015, proferida a fls. 3502/3528 – vol. 9- dos presentes autos.

Alegou, para o efeito e em síntese, que o Ministério Público, na sequência do encerramento do inquérito, deduziu acusação datada de 21 de janeiro de 2014, a qual lhe foi notificada, precludindo-se, desta forma, qualquer hipótese de ser dada continuidade àquela fase processual, designadamente com a prolação de acusação com conteúdo diverso, como veio a suceder, que substituiu a primeira, declarada nula pelo Digno Procurador Coordenador, sem que tenha sido apresentado um único fundamento legal que possa sustentar tal procedimento, sendo que tal despacho que decretou a nulidade nem sequer foi notificado aos arguidos.

Concluiu, assim, que a “segunda” acusação está ferida do mais grave dos vícios que podem afetar um ato jurídico, a inexistência, não podendo subsistir.

Apesar da separação de processos determinada no dia 11 de outubro de 2016, o arguido J. A. pronunciou-se, invocando que não tem nada a opor ou a requerer sobre a questão em causa – cfr. fls. 4322.

O Ministério Público respondeu ao requerimento apresentado, seguindo e adotando orientações superiores, pugnando, em suma, pela validade da acusação datada de 24 de fevereiro de 2015 – fls. 4327/4333. Invocou, em síntese, que a acusação datada de 21 de janeiro de 2014 é nula, nos termos do art. 283º, nº 3, al. b) do C.P.P, não podendo jamais ser recebida na fase de julgamento e, como tal, o Ministério Público, de forma preventiva, reparou essa nulidade mediante a prolação de uma segunda acusação, depois de ter declarado nula a primeira, repondo a legalidade processual penal. Por fim, alegou que a falta de fundamentação do despacho que declarou a nulidade da primeira das acusações deduzidas ou da sua notificação aos arguidos consubstanciam meras irregularidades já sanadas, nos termos do art. 123º, nº 1, do C.P.P.

O arguido P. M. respondeu, defendendo, em síntese, o caráter irretratável da acusação e a impossibilidade legal de alterar ou substituir este ato decisório, nomeadamente, quando este tiver saído da esfera “do processo” e sido notificada aos arguidos. Invocou, assim, a inexistência jurídica da segunda das acusações deduzidas, tanto mais que, comparando as duas acusações, verifica-se uma substituição integral – de facto e de direito – do conteúdo de uma pela outra. Concluiu, peticionando a declaração da inexistência do despacho de acusação datado de 24 de fevereiro de 2015 e consequentemente pela absolvição dos arguidos – fls. 4334/4342.

A demandante civil Agência Para o Desenvolvimento e Coesão, I.P não apresentou qualquer resposta.

Cumpre, pois, apreciar e decidir.

Compulsados os autos, verifica-se: . Na sequência da declaração de encerramento do inquérito, o Ministério Público deduziu acusação datada de 21 de janeiro de 2014, contra os arguidos J. A., M. L. e P. M., imputando-lhes a prática, como coautores, em concurso real, de um crime de fraude na obtenção de subsídio, um crime de desvio de subsídio e de um crime de fraude fiscal agravada, na forma continuada, previsto e puníveis, pelos arts. 36º, nºs 1, 2 e 5, al. a), 37º, nºs 1 e 3, do DL nº 28/84, de 20.01 e arts. 103º, nº 1, al. a) e 3 e 104º, nº 2, al. a) e b) e 3, do RGIT – fls. 2657/2777 – vol. 7; . A arguida M. L. foi notificada da acusação no dia 01 de fevereiro de 2014, tendo sido advertida de que dispunha do prazo de 20 dias para, querendo, requerer a abertura da instrução, nos termos e para os efeitos do art. 287º, do C.P.P. – fls. 2787/2788 – vol. 7; . O arguido P. M. foi notificado da acusação no dia 13 de fevereiro de 2014, tendo sido advertido de que dispunha do prazo de 20 dias para, querendo, requerer a abertura da instrução, nos termos e para os efeitos do art. 287º, do C.P.P. – fls. 2802 – vol. 7; . Os ilustres defensores dos arguidos foram notificados da acusação, por via postal registada, remetida no dia 24 de fevereiro de 2014 – fls. 2814, 2815 e 2816 – vol. 7; . O arguido P. M. requereu a prorrogação do prazo para abertura da instrução, nos termos do art. 107º, nº 6, do C.P.P (fls. 2824 – vol. 7), o que lhe foi indeferido por despacho datado de 13 de março de 2014 (fls. 2839 – vol. 7), notificado por via postal registada na pessoa do seu Ilustre defensor (fls. 2840 – vol. 7); . Por despacho datado de 15 de julho de 2014, o Digno Procurador da República Coordenador proferiu o seguinte despacho: “De acordo com a decisão da Exmª Senhora Procuradora Geral Distrital do Porto e pelos motivos constantes do ofício nº 57005/14, de 8-7 da Procuradoria-Geral Distrital do Porto, que junto para todos os efeitos legais, declaro nula a acusação constante de folhas 2657 a 2777 dos autos. A Magistrada titular do processo procederá à reformulação da acusação, deduzindo nova acusação, nos termos previstos no art. 283º, do C.P.P e deduzirá o respetivo pedido de indemnização civil” – fls. 2900 – vol. 8; . O ofício nº 57005/14, de 8-7 não foi junto aos autos; . O despacho datado de 15 de julho de 2014 não foi notificado aos arguidos ou a qualquer outro sujeito processual; . Na sequência do decidido pelo Digno Procurador da República Coordenador, a Magistrada do Ministério Público titular do inquérito realizou novas diligências – fls. 2906, 2909, 2910, 2912/2913, 3057, 3060, 3062/3064, 3068 e 3197 – vol. 8-, 3414/3415 – vol. 9; . No dia 24 de fevereiro de 2015, o Ministério Público, “em conformidade com o superiormente determinado no despacho de fls. 2900 dos autos” proferiu despacho de arquivamento, nos termos do art. 277º, nº 2, do C.P.P, relativamente a factos que poderiam consubstanciar crimes de corrupção ativa, de tráfico de influência e desvio de subsídio; determinou a extração de certidão com vista à instauração de inquérito para investigação de eventual prática de um crime de fraude qualificada por parte de duas sociedades; e deduziu acusação contra os arguidos J. A., M. L., P. M., pela prática, em coautoria material, em concurso efetivo, de dois crimes de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção, previsto e puníveis pelos arts. 21º, 36º, nº 1, al. a), 2 e 5, al. a) e 8 e 39º do DL nº 28/84, de 20 de janeiro, e contra a A... – ...(...) (... Portugal) imputando-lhe a prática, como autora material, de dois crimes de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção, previsto e puníveis pelos arts. 3º, 7º, 21º, 36º, nº 1, al. a), 2 e 5, al. a) e 8 e 39º do DL nº 28/84, de 20 de janeiro – fls. 3494/3528 – vol. 9; . Os arguidos M. L. e P. M., bem como os respetivos defensores, foram notificados dos despachos de arquivamento e de acusação proferidos datados de 24 de fevereiro de 2015, tendo sido advertidos de que dispunham do prazo de 20 dias, para, querendo, requerem a abertura da instrução – fls. 3533/3534, 3535, 3536/3537, 3538, 3553 e 3554 – vol. 9; . Por despacho datado de 09 de junho de 2015, foi determinada a remessa dos autos à distribuição, com a menção de que a A... – ...(...) (... Portugal) não tinha prestado TIR nos autos, pese embora tivessem sido realizadas diversas diligências nesse sentido – fls. 3640 – vol. 9; . Os autos foram remetidos à distribuição sem que o arguido J. A. tenha sido notificado de qualquer uma das acusações deduzidas nos autos, conforme ficou explanado no despacho proferido na fase de julgamento a fls. 3707/3708 – vol. 10; . Por despacho datado de 15 de julho de 2015, foi julgada extinta a responsabilidade criminal e extinto o procedimento criminal instaurado contra a A... – ...(...) (... Portugal), atendendo à declaração judicial da sua extinção; . E, consignando-se que não existiam outras questões prévias ou incidentais que obstassem à apreciação do mérito da causa e que cumprisse conhecer, foi recebida, nos seus precisos termos, a acusação deduzida pelo Ministério Público a fls. 3502/3527, contra os arguidos J. A., M. L. e P. M., quer pelos factos aí enunciados, quer pelas disposições penais indicadas, designando-se data para a realização da audiência de julgamento – fls. 3660/3662 – vol. 10; . O despacho datado de 15 de julho de 2015 foi notificado, designadamente aos Ilustres defensores dos arguidos, bem como aos arguidos P. L. e M. L. – fls. 3667, 3668, 3682/3683, 3684/3685, 3693 e 3695 – vol. 10; . No dia 19 de novembro de 2015, o arguido P. L. deduziu contestação, arrolou testemunhas e requereu um exame pericial – fls. 3702/3705 – vol. 10; . Por despacho datado de 24 de novembro de 2015, ordenou-se a notificação pessoal do arguido J. A., por carta rogatória a enviar para o Brasil, quer da acusação de fls. 3502/3527, com a advertência expressa de que poderia requerer a abertura da instrução no prazo aludido no art. 287º, do C.P.P, bem como do despacho que recebeu esta acusação e designou dia para a realização da audiência de julgamento – fls. 3707/3708 – vol. 10; . No dia 18 de maio de 2016, foram dadas sem efeito as datas designadas para a realização da audiência de julgamento, na sequência da promoção do Ministério Público e sem oposição dos arguidos, uma vez que se encontravam em curso diligências no Brasil para apurar o paradeiro do arguido J. A. e consequentemente tendentes à notificação das peças processuais indicadas na carta rogatória enviada àquele país; nessa ocasião, foram designadas novas datas para a realização da audiência de julgamento e determinado aditamento à carta rogatória – fls. 3960/3962 – vol. 10; . A carta rogatória foi devolvida, sem cumprimento, por impossibilidade de notificar o arguido J. A. –...

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