Acórdão nº 2555/15.6T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelALDA MARTINS
Data da Resolução11 de Julho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães
  1. Relatório JX, Unipessoal, Lda.

    intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra O. Sousa, pedindo a condenação do R. no pagamento à A. da quantia de € 35.000,00 a título de indemnização pelos prejuízos causados pela violação do dever de não concorrência, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação e dos vincendos, até integral pagamento.

    A R. contestou, pedindo a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.

    Procedeu-se a julgamento, findo o qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto.

    Seguidamente, pelo Mmo. Juiz a quo foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «Assim, e face a tudo o exposto, decide-se: Julgar a presente acção totalmente improcedente, absolvendo-se o R. dos pedidos contra si formulados.

    Custas pela A.» A A., inconformada, interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões: «I. O presente recurso vem interposto da sentença que julgou totalmente improcedente o pedido formulado pela Autora, aqui Recorrente, e com a qual não se conforma.

    1. Na óptica do Tribunal a quo a procedência do pedido sempre dependeria da existência de ajuste prévio entre as partes, Autora e Réu - outrora Entidade Empregadora e Trabalhador no âmbito de contrato de trabalho entre ambas celebrado - de cláusula de não concorrência e/ou de confidencialidade, já que – na óptica do Tribunal recorrido – tal pedido não poderia ter por fundamento a invocação de um dever geral de lealdade com eficácia pós contratual.

    2. Todavia, o Tribunal a quo não ponderou devidamente as circunstâncias concretas apuradas no âmbito dos presentes autos, as quais, por apelo a outros princípios com aquele conflituantes - em especial, o Princípio da Boa Fé – e no propósito de realização da justiça material, sempre obrigariam à prolação de sentença que julgasse o pedido procedente.

      IV.

      Já com amplo tratamento Doutrinário e Jurisprudencial, é hoje comummente aceite na disciplina contratual a existência de uma série de deveres [contratuais], ainda que secundários, acessórios ou de mera conduta, que poderão perdurar além da cessação do vínculo contratual, fenómeno habitualmente designado de pós-eficácia obrigacional ou de responsabilidade post pactum finitum.

      V.

      Do indicado tipo de responsabilidade pode emergir um dever de indemnização derivado da conduta de uma das partes depois da referida extinção do contrato, tal como indica o Prof. Mário Júlio de Almeida Costa.

      VI.

      Como sustentam vários Autores, o indicado tipo de responsabilidade tem também aplicação no domínio juslaboral, podendo ser assacada tanto à (ex-)Entidade Patronal, como, doutra parte, poderá configurar-se em relação ao (Ex-)Trabalhador ao serviço daquela.

      VII.

      No que concerne aos Ex-Trabalhadores, assume-se que, em determinadas circunstâncias, independentemente de previsão contratual expressa, essa poderá advir da violação do dever de lealdade, nas suas vertentes do dever de não concorrência e no dever de sigilo, podendo, quando tal suceda, fazer recair sobre aquele um dever de indemnizar o(a) exempregador(a).

      VIII.

      De todo o modo, tal sempre representará a excepção à regra, que vai precisamente no sentido de apenas admitir a pós-eficácia obrigacional nos casos em que esta mesma resulte de ajuste prévio entre as partes e segundo o formalismo legalmente exigível, normalmente, pela previsão no contrato de trabalho de cláusula que verse sobre a obrigação de não concorrência e de sigilo… IX.

      De resto, só o entendimento de que tal dever [pós-eficaz] de lealdade subsistiria sempre, e fossem quais fossem as circunstâncias concretas, após a cessação de qualquer contrato de trabalho, se revela inconstitucional, por limitação indevida à Liberdade de Trabalho; e que não é, de todo, a posição da Recorrente.

      X.

      A verdade é que o Princípio da Boa Fé poderá afirmar-se como fundamento para uma limitação legítima ao dito direito da Liberdade de Trabalho, quando do exercício deste resulte uma insustentável ofensa ao dever de lealdade e, por consequência - como seu referente - ao aludido princípio da Boa Fé, sob pena de, caso tal não sucedesse, se rejeitar a própria ideia de justiça.

    3. Como decorre da matéria provada, a conduta do Réu é reprovável e censurável, em muito se distanciando do exercício lícito do seu direito, já que não se limitou a pôr em prática os conhecimentos que apreendeu ao longo da sua carreira profissional e, em especial, enquanto foi Trabalhador ao serviço da Recorrente.

    4. Com efeito, o Réu prevaleceu-se de informação com carácter sigiloso, não apenas quanto aos Clientes, mas quanto às obras para cuja realização a Autora havia apresentado orçamento e respectivos valores, apresentando preços marginalmente rebaixados, em relação aos apresentados pela Autora, procurando assim sabotar a actividade desta, aqui Recorrente, do que resultou demonstrado prejuízo.

      XIII.

      Ou seja, aceitar-se-ia que o Réu passasse a integrar entidade que desenvolve actividade concorrente com a Autora, beneficiando do conhecimento do mercado, usando das mesmas técnicas de orçamentação, e todo o know-how por si adquirido ao longo do seu percurso profissional, mas já não que se haja prevalecido de informação privilegiada que adquiriu ao serviço da Recorrente, nomeadamente, no âmbito de negociações em que teve intervenção, para logo após a cessação do contrato de trabalho, vir procurar arruinar, tenho-o logrado, essas mesmas negociações.

    5. Acompanhando-se de perto a Jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal de Justiça – Ac. STJ de 09/04/2003, Proc. 03S2424, disponível em www.dgsi.pt – crê-se que as circunstâncias...

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