Acórdão nº 1227/15.6T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 01 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelHIGINA ORVALHO CASTELO
Data da Resolução01 de Junho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães*: I. Relatório AA – SEGUROS GERAIS, S.A.

, ré na ação declarativa indicada à margem que lhe foi movida por BB, notificada da sentença de 18/09/2016 que a condenou a pagar à autora a quantia de € 15.299,06, acrescida de juros de mora contados desde a data da citação, e com ela não se conformando, interpõe o presente recurso.

A autora BB tinha intentado a ação contra a réAA alegando, em síntese, que indemnizou um seu segurado pelos prejuízos causados por um acidente de viação da responsabilidade de um segurado da ré. Pediu a condenação da ré na quantia em causa e que corresponde à da condenação.

A ré contestou impugnando praticamente todos os factos.

Após julgamento, a ação foi julgada totalmente procedente.

Com ela não se conformou a ré que conclui as suas alegações de recurso da seguinte forma: «(…) 3. A Recorrente não se conforma, assim, com a decisão proferida ao dar como provados os factos 8., 12., 13., 14. e 15., bem como ao dar como não provados os seguintes factos: “o condutor do QD prosseguia completamente alheado dos demais utentes da via; O QD circulava a uma velocidade não superior a 50 km/h; quando se aproximou do local onde se deu o acidente, o condutor do QD foi surpreendido pelo PBB, que invadiu repentinamente a sua via de trânsito; O condutor do PBB prosseguia completamente distraído, sem prestar qualquer atenção ao que se passava na estrada e ao trânsito que se fazia sentir e com total falta de habilidade e destreza; chegado ao entroncamento, o condutor do PBB não parou o seu veículo em cumprimento do sinal vertical B2 (STOP) aposto no local para quem pretendesse seguir no sentido de Bragança, não verificando se circulava ou não qualquer veículo na EN15 que impedisse a manobra que pretendia realizar; mudou de direção à esquerda, invadindo súbita e repentinamente a via por onde circulava o QD, obstruindo a passagem a este; o QD era bem visível para o PBB a, pelo menos, 25 metros de distância.”. Isto por não ser o que resulta da prova produzida, a prova ser manifestamente insuficiente e/ou até não ter valor bastante para o efeito, consoante os casos. Daí a razão de ser do presente recurso, na expectativa de que lhe seja feita Justiça.

  1. O facto provado 8. versa sobre a manobra realizada pelo condutor do veículo PBB (manobra de mudança de direção à esquerda em entroncamento com sinal STOP aposto na via de onde provinha). Manobra essa, dizemos nós, que é crucial para o apuramento da responsabilidade pelo deflagrar do sinistro subjudice.

  2. Ora, apesar de na motivação da sentença quanto a este ponto se dizer que, quanto à prova testemunhal, foi fundamentalmente considerado o depoimento prestado pela testemunha CC (Guarda da GNR), entendemos que tal afirmação não é compatível com a matéria dada como provada e não provada na sentença, nomeadamente se confrontarmos tal depoimento com o realizado pela testemunha DD, condutor do veículo PBB (que, curiosamente, a Mma. Juíza considerou atendível por ser consentâneo com o depoimento da testemunha CC; e que o era particularmente na parte em que explicou que parou no sinal STOP, que não avistou do seu lado direito qualquer veículo, o que explica pela existência da tal lomba no pavimento).

  3. Salvo o devido respeito, considera a Recorrente que não se pode dar como provada a parte por nós assinalada como (a) e (b) do ponto 8 dos factos provados, precisamente por estar em contradição com o depoimento de CC, e demais prova dos autos. Testemunho esse que a Mma. Juíza considerou “absolutamente sério e isento” e que “revela a experiência do seu autor e a perceção que teve com base nos dados objetivos que colheu”.

  4. A testemunha CC, Cabo da GNR que tomou conta da ocorrência e compareceu no local do sinistro após o mesmo, elaborando a participação de acidente de viação junta aos autos com a P.I., declarou que conhecia bem o local do sinistro e que na reta da EN15, a uma distância de 50 a 100 metros do entroncamento, existe uma ligeira (“light, levezinha”) lomba (elevação do pavimento), localizada do lado direito tendo em conta a posição do veículo PBB, e que o local tem iluminação. Tendo, assim, quem vem do entroncamento, boa visibilidade para o lado direito. (vide depoimento que se encontra gravado no sistema de gravação digital deste Tribunal – Ata audiência julgamento de 29.04.2016, das 11:22:53 até às 11:56:58 – minuto 03:34 ao minuto 05:37 e 06:24 ao minuto 07:20).

  5. Isto mesmo foi o que a Mma. Juíza transpôs, grosso modo, para a motivação da sentença, ou seja, que CC pouco se recordava do acidente, confirmando, no entanto, o teor da participação de acidente e as características do local.

  6. Ora, tendo em conta esta configuração do local, qualquer condutor diligente, que tivesse efetivamente parado no STOP, teria perfeita visibilidade para o lado direito da faixa de rodagem onde pretendia ingressar, sentido de onde provinha o QD (ainda mais se considerarmos que o QD não vinha a circular o mais à direita da sua via de trânsito, ou seja, estaria numa posição mais próxima do eixo da faixa de rodagem – cfr. facto provado n.º 9, logo mais visível para o condutor do PBB).

  7. Considerando ainda o facto de o rasto de travagem do veículo QD ser de apenas 25 metros (cfr. facto provado n.º 11), bem como o tempo estar bom nessa noite (cfr. facto provado n.º 6), recorrendo às regras da experiência comum e do normal acontecer, entendemos que a Mma. Juíza a quo só poderia concluir que o condutor do veículo PBB prestou falsas declarações, pois que nas circunstâncias descritas, qualquer condutor médio, se tivesse parado (não apenas abrandado, mas parado efetivamente no STOP como prescreve a lei) e verificado se circulava algum veículo na faixa onde pretendia ingressar que impedisse ou dificultasse a realização da sua manobra com os devidos cuidados, teria necessariamente notado a presença do veículo QD provindo do seu lado direito.

  8. Ou seja, mostra-se manifesto que o condutor do PBB circulava com desatenção, falta de cuidado e imprevidência quando ingressou na EN 15.

  9. Constatamos, portanto, que a Mma. Juíza não atendeu, tal como devia, a qualquer destes dados objetivos e também os factos relatados por CC para aferir da idoneidade do depoimento do condutor do veículo PBB, não existindo qualquer outra testemunha presencial do sinistro além do condutor do QD. Deste modo, o facto provado n.º 8, na parte a) e b) por nós sublinhada, e para a qual se remete, deveria ter sido dado como não provado, o que se pede.

  10. Quanto à parte c) do facto provado n.º 8, isto é, que o veículo PBB já se encontrava na via direita da E.N.15, no sentido Rebordãos-Bragança, quando é embatido pelo QD, diga-se, desde logo, que a testemunha CC foi bastante exaustiva no que toca à descrição dos procedimentos que levam a cabo ao tomar conta de uma ocorrência e o que era aposto no respetivo auto. De facto, entendemos que a configuração do local e dados objetivos recolhidos pelas autoridades, e que constam da respetiva participação de acidente de viação, falam por si.

  11. Da análise das declarações transcritas, verificamos mais uma vez que o condutor do PBB não disse a verdade quando referiu que os veículos ainda estavam no local do embate quando as autoridades chegaram, já que a testemunha CC confirmou por várias vezes que os veículos, para não constarem do croqui, já tinham de ter sido retirados do local pelos respetivos condutores (vide transcrições e depoimento gravado ao minuto 02:58 ao minuto 03:34, e minuto 15:40 ao minuto 15:58).

  12. Atentemos agora na questão dos rastos de travagem e medidas apostas no croqui, nomeadamente no que toca à largura total da faixa de rodagem e distância do ponto fixo inalterável (sinal J1, direção de via de saída, visível no Doc. n.º 2 e 6 junto com a Contestação da Recorrente) ao local provável de embate. A faixa de rodagem da E.N. 15 tem de largura total, naquele local, 6,80 metros (cfr. facto provado n.º 5), o que quer dizer que cada uma das vias de trânsito ocupa 3,40 metros.

  13. Os rastos de travagem do veículo QD medem 25 metros, assumindo a direção direita-esquerda, terminam no local indicado como local provável do embate (o que é da mais elementar lógica, pois os rastos de travagem terminam no local onde o veículo que os faz encontra um obstáculo, no caso, o outro veículo interveniente), sendo que esse local fica na zona em frente ao ponto fixo inalterável considerado pela testemunha CC. Do LPE ao PFI distam 4 metros, sendo certo, porém, que essa largura total comporta também uma berma. Bermaessa onde a testemunha CC referiu até ser possível pararem o veículo de patrulha da GNR aquando da realização de fiscalizações. O mesmo se pode retirar das fotografias do local juntas com a Contestação (vide transcrições e depoimento gravado do minuto 19:23 ao minuto 20:12, minuto 20:41 ao minuto 21:03).

  14. Esta testemunha disse ainda que o local provável do embate indicado no croqui, dada a ausência dos veículos do local, se baseou nos vestígios verificados no local, como pedaços de plástico, vidros e lama, sendo tal local onde existe a maior concentração desses vestígios, o que é igualmente consentâneo com o local onde terminam os rastos de travagem (estes, sem dúvida alguma, que não podem ser alterados pela testemunha ou intervenientes, nem estão dependentes de qualquer perspetiva subjetiva) – tudo conforme transcrições e depoimento gravado minuto 08:16 ao minuto 09:09, minuto 16:07 ao minuto 16:45, minuto 18:13 ao minuto 19:09.

  15. O condutor do veículo PBB, por sua vez, referiu que já tinha percorrido 20 a 30 metros desde o Stop até ao local onde foi embatido. Aqui, mais uma vez, a testemunha CC contrariou o declarado pelo condutor do PBB ao dizer que naquele local não era possível encaixar 20 a 30 metros de distância (vide transcrições e depoimento gravado do minuto 22:34 ao minuto 23:05).

  16. Os danos nos veículos, descritos na participação, estão localizados na parte traseira esquerda para o veículo PBB e na frente direita...

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