Acórdão nº 620/13.3TTVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelEDUARDO AZEVEDO
Data da Resolução14 de Junho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Apelação 620/13.3TTVCT.G1 Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães Este processo especial emergente de acidente de trabalho foi proposto por AA…, sinistrado, contra BB…, entidade patronal.

Foi realizado exame singular e tentativa de conciliação na qual não se consideraram as partes conciliadas porque, designadamente, o R não aceitou a caracterização do acidente como de trabalho, “… ocorreu num domingo dia em que o acidentado iniciava o seu trabalho às 11,00 horas, sendo que o acidente tendo ocorrido já a meio do percurso se verificou fora do período de tempo habitualmente gasto na deslocação da casa do sinistrado para o trabalho, e assim sendo não aceita o nexo de causalidade, nem aceita a I.P. P. de 8,8600% arbitrada pelo G. M. L., nem qualquer responsabilidade pelo acidente dos autos”.

Pede a condenação no reconhecimento da existência de um acidente de trabalho e no pagamento de 2.966,14€ de indemnização pelas incapacidades temporárias, da pensão anual e vitalícia obrigatoriamente remível de 491,66€, de 20,00€ de despesas de deslocação a este tribunal e actos médicos, de 267,97€ de despesas com fisioterapia e de 821,71€ com despesas médicas e medicamentosas, consoante o caso com juros de mora, vencidos e vincendo, à taxa legal.

Alegou, em síntese: encontrava-se ao serviço do R no dia 30.12.2012, a conduzir veículo automóvel ligeiro de passageiros; deslocava-se da sua residência para o local de trabalho e sofreu acidente de viação; o R não tinha transferido a responsabilidade; em virtude do acidente foi sujeito a cirurgias e tratamentos, frequentando fisioterapia; por isso suportou despesas, encontrando-se por liquidar despesas hospitalares; esteve impedido de trabalhar durante vários meses, não tendo auferindo o vencimento nem “a baixa médica”; encontra-se desempregado em virtude da cessação do contrato; e sofre de sequelas incapacitantes.

Na contestação o R alegou, em súmula que o acidente não ocorreu em deslocação para o trabalho, pelo que é mero acidente de viação.

O Centro distrital de Viana do Castelo, do Instituto de Segurança Social, IP deduziu pedido de reembolso de prestações pagas pela Segurança Social em resultado do sinistro, a título de subsídio de doença, no montante de 1.748,95€, acrescido de juros de mora, por força da sub-rogação legal.

Proferiu-se despacho saneador, onde se procedeu à selecção da matéria fáctica (factos assentes e base instrutória).

Realizou-se audiência de discussão e julgamento, proferindo-se decisão da matéria de facto.

Proferiu-se sentença decidindo-se: “Julgar a presente acção totalmente improcedente, por não provada, e em consequência absolver o R. dos pedidos contra ele formulados.

(…) Julgar igualmente improcedente o pedido de reembolso formulado pelo CDVCISS, dele se absolvendo o R.” O A recorreu.

Conclusões: 1. Vem o presente recurso da sentença proferida nos autos, que julgou a presente acção totalmente improcedente, considerando que não foi feita prova que o autor, aquando o acidente de viação se deslocava diretamente para o trabalho, julgando-se como tal inexistir acidente de trabalho.

  1. Com interesse para a causa, deu-se como facto não provado que: “O horário de trabalho do A. tinha início às 9,30 horas”, não obstante entender-se que na data do acidente o autor deslocava-se da sua residência para Monção (onde fica o seu local de trabalho), sendo esse o trajecto que fazia quando ia trabalhar.

  2. No entanto, alcança o recorrente que o facto 1 quesitado (O horário de trabalho do A. tinha início às 9,30 horas) deveria ser dado por provado.

  3. Segundo o Tribunal a quo quanto à matéria provada, deu-se relevância ao depoimento de Paulo …, agente da GNR e Rosa … mãe do autor, no entanto, e quanto ao horário de trabalho entendeu o Mmº. Juiz a quo ser a testemunha Rosa … necessariamente parcial apenas por ser mãe do autor.

  4. Ora, não se justifica a falta de credibilidade da testemunha por razões de imediação e oralidade. Apenas se descredibiliza o depoimento da testemunha porque se trata da mãe do autor, não sendo apresentada na sentença a quo qualquer outra justificação. Por tal motivo, e salvo opinião contrária, padece neste ponto a sentença de falta de fundamentação, nos termos da alínea c) do número 1 do artigo 615º do CPC.

  5. Por outro lado, há prova nos autos que demonstra que o recorrente se dirigia para o trabalho directamente, o que justifica uma alteração da matéria de facto nos termos do 662º do CPC: o depoimento da Rosa … [depoimento com referência em acta do dia 18/10/2016, início às 10:16:18 e fim às 10:21:02], do Paulo …, Guarda Principal nº 565 [depoimento com referência em acta do dia 18/10/2016, início às 10:10:12 e fim às 10:15:42], que afirma ter sido isso que o autor lhe disse logo após o acidente de viação, e do José … [depoimento com referência em acta do dia 29/11/2016, início às 09:46:44 e fim às 09:52:03], que afirma que em conversa logo após o acidente com o recorrido nunca o mesmo pôs em causa que o recorrente não se dirigia para o trabalho, ou que o seu horário não fosse às 09:30, fazendo ainda seguro de trabalho em benefício do recorrente imediatamente após o acidente.

  6. Quanto à testemunha José … [depoimento com referência em acta do dia 02/11/2016, início às 09:55:04 e fim às 10:10:38], referido na fundamentação da decisão da matéria de facto, entende-se ter apresentado uma versão dos factos incompatível com as regras da experiência, devendo este sim ser visto como um depoimento parcial, uma vez que a testemunha trabalha por conta e ordem do recorrido. Ao demais importa referir que a testemunha já não trabalhava com o recorrente há um ano, não sabendo qual o seu horário de trabalho à data do acidente.

  7. Assim, e sem prejuízo do alegado, ou seja que deverá ser dado por provado que o autor entrava ao serviço às 09:30 tendo por base a prova transcrita, mesmo sendo tal facto não provado, ter-se-ia que caracterizar o acidente como sendo de trabalho.

  8. Qualifica-se um acidente in itinere (também designado de trajeto ou de percurso) como acidente de trabalho se ocorrer no trajeto normalmente utilizado de ida e regresso entre o local de trabalho e o local de refeição, durante o período ininterrupto habitualmente gasto pelo trabalhador, mesmo quando esse trajeto tenha sofrido interrupções ou desvios determinados pela satisfação de necessidades atendíveis do trabalhador, conforme a Lei n.º 98/2009 (LAT), artigo 9º número 1 alínea a), número 2, 2 alínea e) e número 3. Tal posição já era a adoptada pelo Tribunal da Relação de Évora em acórdão de 11/10/2011, pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 05/12/2012, entre outros (in www.dgsi.pt).

  9. O autor fez o percurso que faz diariamente, percurso que necessariamente tem que fazer para dirigir-se ao trabalho. Não assumiu nenhuma postura que agrave o risco ao empregador pelo acidente. O trajecto onde se deu o acidente é o trajecto que o autor passa necessariamente para ir para o seu local de trabalho. Não é um trajecto de desvio. Assim sendo, entrando o autor às 09:30 ou às 10:30, teria que passar por aquele trecho, como passava, todos os dias, a caminho do trabalho.

  10. Moldes pelos quais, deverá classificar-se o acidente de viação descrito nos autos como acidente de trabalho, devendo ser dada a acção como totalmente procedente.

Contra-alegou-se.

Conclusões: 1 - A sentença, na parte ora recorrida, é de manter na medida em que julgou com acerto e perfeita observância dos factos, meios probatórios e da lei aplicável, mostrando-se consequente a decisão.

2 - Com efeito, a questão controvertida cinge-se em saber se o ora Recorrente se deslocava, aquando do acidente de viação em causa, directamente para o local de trabalho.

3 - Ora, da prova testemunhal produzida e documental junta aos autos, resulta claramente que o Recorrente não lograr provar tal desiderato, não conseguindo provar que o seu horário de trabalho tinha início às 9h30.Pelo contrário, ficou claramente demonstrado que o seu horário de trabalho tinha início às 11h.

4 - Assim, bem esteve o Juiz “a quo” ao dar como não provado o facto 1 da Base Instrutória, e...

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