Acórdão nº 2/12.4PEBRG.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelAUSENDA GON
Data da Resolução09 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães: No âmbito do processo comum colectivo nº 2/12.4PEBRG da Instância Central, 1ª Secção Criminal, da Comarca de Braga, por decisão de 4/07/2012, transitada em julgado em 10/09/2012, o arguido Fernando J.

foi condenado, pela prática, em Novembro e Dezembro de 2011, de oito crimes de roubo, na pena única de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período, com regime de prova e na condição de o arguido retomar o acompanhamento nas consultas de pedopsiquiatria e de se inscrever e frequentar no ano lectivo seguinte um curso de formação profissional ou o 6º ano de escolaridade, ou curso que a tal desse equivalência.

Entretanto, por decisão proferida em 11/07/2016, essa suspensão foi revogada, com fundamento em o comportamento posteriormente assumido pelo arguido, tendo em vista as “sucessivas condenações” que sofreu, relativas a factos ocorridos durante o período da mesma e abarcando diversos tipos de crime, levar a concluir pela infirmação do anterior juízo de prognose favorável à suspensão e pelo fracasso das finalidades que estiveram na sua base.

Inconformado com a referida decisão, o arguido interpôs recurso, formulando na sua motivação as seguintes conclusões: «(…) II. O despacho recorrido, de revogação da suspensão da execução da pena, padece de nulidade, por violação do direito ao exercício do contraditório.

  1. O despacho recorrido que revogou a suspensão da execução da pena ao recorrente, sem previamente ter sido notificado para comparecer presencialmente perante o tribunal, para ser ouvido, por considerar desnecessária a audição presencial, incorreu na nulidade insanável enunciada no art.119.º, alínea c) do CPP, que desde já invoca.

  2. Porquanto, o art.495.°, n° 2, do CPP exige que, no exercício do contraditório, o arguido seja ouvido presencialmente e não por escrito.

  3. De acordo com o art. 495.º, n.º 2 do CPP, «O tribunal decide por despacho, depois de recolhida a prova, obtido parecer do Ministério Público e ouvido o condenado na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão, bem como, sempre que necessário, ouvida a vítima, mesmo que não se tenha constituído assistente.».

  4. O Tribunal a quo deve procurar, por todos os meios, ouvir presencialmente o condenado, quando a suspensão tenha sido subordinada a condições sujeitas a apoio e/ou fiscalização dos serviços de reinserção social, para efeitos de modificação dos deveres impostos, sujeição a tratamento médico ou a cura, aplicação de sanções e revogação da suspensão, sob pena de violação do disposto no art.495.º do CPP.

  5. Deveria ter sido designada data para audição do arguido, o que deveria ter ocorrido na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão. Mas não sucedeu.

  6. O Prof. Paulo Pinto de Albuquerque vai mais longe relativamente aos casos de aplicação do art.495.º, n.º 2 do C.P.P., ao considerar que «O arguido deve ser ouvido pessoal e presencialmente, sendo irrelevante o motivo da revogação da suspensão, sob pena da nulidade do artigo 119.º, al. c), uma vez que a lei não relaciona a audição do arguido com nenhum motivo especial.», ou seja, o cumprimento do n.º 2 do art.495.º do C.P.P. parece impor-se, no seu entender, não só por força do incumprimento dos deveres ou as regras de conduta impostos ou do plano de reinserção social ( art.56.º, n.º1, al. a) do C.P.), mas ainda por força do cometimento de crime no decurso da suspensão pelo qual venha a ser condenado (art.56.º, n.º1, al. b) do C.P.), pois também neste caso se justificará a oportunidade dada ao arguido para ser ouvido.

  7. A jurisprudência tem – se afirmado que quando a suspensão foi sujeita a regime de prova, imposição de deveres e/ou regras de conduta, se exige obrigatoriamente a audição presencial do condenado e na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão, antes da prolação do despacho que decide o incidente de revogação da suspensão da execução da pena de prisão.

  8. É a posição sufragada, entre outros, nos acórdãos deste Tribunal da Relação, de 30 de Outubro de 2013 (proc. n.º 707/08.4PBAVR.C1), de 2 de Abril de 2014 (proc. n.º 883/07.3TACBR.C1) e de 4 de Novembro de 2015 (proc. n.º 9/05.8GALSA.C1).

  9. Acresce que, o art. 61.º, n.º 1 do CPP dispõe que que o arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo e salvas as excepções da lei, dos direitos de: «a) Estar presente aos actos processuais que directamente lhe disserem respeito; b) Ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte».

  10. O alcance gizado pela lei foi o de definir o direito de presença do arguido quanto a actos de produção probatória, excluindo todos os restantes actos do processo, e, dentro destes actos, apenas haverá que considerar aqueles que visarem a produção de prova que possa ter relevo para o apuramento e a definição do ilícito pelo qual possa ser responsabilizado o arguido de cuja presença se trate.

  11. Quando o n.º 2 do art.495.º do CPP prevê uma diligência que decorre de forma oral e contraditória perante o Juiz, com a presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão, e em que se vai averiguar se as condições da suspensão da execução da pena foram ou não cumpridas e, em caso afirmativo, as razões do incumprimento, é também fundamental a presença do arguido/condenado.

  12. No caso concreto, antes de ser proferida a decisão de revogação da suspensão da execução da pena de prisão não foram envidados todos os esforços necessários à audição presencial do arguido e assim este não foi ouvido na presença do técnico que fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão, e como tal entendemos que o despacho de revogação incorre na nulidade prevista no art.119.º, al. c), do CPP.

  13. No caso de o arguido, notificado para comparecer nos termos e para os efeitos do disposto no art. 495.º, n.º 2, do CPP, faltasse à diligência, sem qualquer justificação, e não se mostrasse possível assim a sua audição por razões a si imputáveis, cremos que o princípio a seguir seria o que se mostra estabelecido no n.º 4 do art.185.º da Lei n.º 115/2009, de 12 de Outubro, para o incidente de incumprimento da liberdade condicional, numa situação em que se exige a audição presencial: « A falta injustificada do condenado vale como efectiva audição para todos os efeitos legais.».

  14. Na doutrina, André Lamas Leite defende que « …, a exigência constitucional do exercício do contraditório (art. 32º, nº 2, in fine) e as previsões normativas dos artigos 61º, nº 1, al. b), e 495, nº 2, ambos do CPP, só admitem a conclusão de que é obrigatório que o tribunal, antes de determinar a revogação da suspensão de execução da pena privativa de liberdade, envide todos os esforços necessários à audição do condenado.».

  15. Também a jurisprudência tem entendido que tendo sido envidados todos os esforços necessários à audição presencial do arguido e não sendo possível obter a sua comparência à diligência, a jurisprudência tem decidido que o contraditório imposto no art.495.º, n.º2 do C.P.P. se tem como cumprido com a notificação do defensor do arguido.

  16. Não se tratou do caso sub judice.

  17. O recorrente alega que, ainda que tenha praticado um crime durante o período de suspensão, pode não justificar a revogação da suspensão e no caso em concreto o Tribunal a quo errou na aplicação do n.º1, al. b) do art. 56.º do CP.

  18. O tribunal a quo não podia revogar a suspensão da execução da pena sem ter em conta o Relatório Final de Execução social (Suspensão da Execução da Pena) que o próprio solicitou, de fls. 1441 a 1444.

  19. E também o facto de a condenação pelo ultimo crime, de ofensa a integridade física qualificada, cuja sentença transitou em julgado em 25 de Janeiro de 2016, ter ficado suspensa na sua execução por igual período.

  20. A revogação não opera de forma automática e o tribunal esqueceu-se de todo o conteúdo do relatório social.

  21. O Prof. Figueiredo Dias defendia que «a revogação automática só terá lugar se o delinquente vier a ser punido com pena de prisão efectiva.(…). Se apesar da primeira condenação, o tribunal da segunda condenação foi capaz de emitir um prognóstico favorável que o conduziu à suspensão, tanto basta para mostrar que não considerou ainda esgotadas as possibilidades de uma socialização em liberdade.”.

  22. Saliente-se o entendimento dos Cons. Leal-Henriques e Simas Santos, que “As causas de revogação não devem, pois, ser entendidas com um critério formalista, mas antes como demonstrativas das falhas do condenado no decurso do período da suspensão. O arguido deve ter demonstrado com o seu comportamento que não se cumpriram as expectativas que motivaram a concessão da suspensão da pena”.

  23. Para grande parte da doutrina, a nova condenação, em pena efectiva, é que é fundamento para a revogação da suspensão da pena, pois que a condenação numa pena de multa ou numa pena de substituição, como a pena suspensa, mostram que o Tribunal da nova condenação fez ainda um juízo de prognose favorável ao arguido XXVI. É o caso do Prof. Paulo Pinto de Albuquerque que considera que «Só a condenação em pena de prisão efectiva pode revelar que as finalidades que estiveram na base de uma decisão prévia de suspensão não puderam ser alcançadas, pois a condenação em multa ou em pena substitutiva supõe um juízo de prognose ainda ao agente pelo tribunal da segunda condenação.».

  24. Existe jurisprudência, no Tribunal da Relação, designadamente os acórdãos de 28/03/2012 (proc. n.º 29/09.3GAAVZ-A.C1) e de 10/7/2013 (proc. n.º 862/11.6PEAVR.C1), sustentando que revela incongruência ou contra indicação, revogar-se a suspensão da execução da pena ao abrigo da alínea b), n.º1, do art.56.º do CP se na última condenação foi de novo feito um juízo de prognose favorável e, por via disso, voltou a suspender-se a execução da pena de prisão.

  25. A posição aqui exposta vai...

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