Acórdão nº 2034/15.1T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Fevereiro de 2017
Magistrado Responsável | ANA CRISTINA DUARTE |
Data da Resolução | 23 de Fevereiro de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I.RELATÓRIO C deduziu ação de impugnação pauliana contra D, M, M, D e L, alegando ser credor dos 1.º e 2.ª réus e terem estes doado a suas filhas, restantes rés, um prédio de que eram proprietários e que corresponde à casa de morada da família, reservando para si o gozo do mesmo e apenas com o intuito de impedirem que o mesmo respondesse pelas dívidas contraídas perante a autora. Pede que se declare a ineficácia da doação do imóvel em relação à autora e que seja reconhecido a esta o direito de obter a satisfação integral do seu crédito à custa do identificado bem, podendo penhorá-lo e vendê-lo em sede de execução.
Contestou o réu D, por si e enquanto legal representante de suas filhas menores, alegando nada dever à autora e a doação do imóvel ter resultado do divórcio entre si e a segunda ré, não havendo qualquer intenção de o subtrair ao credor, tendo bens suficientes para o pagamento da pretensa dívida.
O MP foi citado e nada disse.
A autora respondeu.
Foi definido o objeto do litígio e fixados os temas da prova, com reclamação da autora, indeferida.
Teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou a ação improcedente, absolvendo os réus do pedido.
Discordando da sentença, dela interpôs recurso a autora, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes Conclusões: I. A sentença recorrida não deve manter-se pois não consagra a justa e correta aplicação das normas legais e dos princípios jurídicos aplicáveis.
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A Reclamante apresentou a presente ação de impugnação pauliana pelo montante de 12.497,50 € contra D (1º Réu), M (2ª Ré) e as filhas MS (3ª Ré), DS (4ª Ré) e LS (5ª Ré).
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O 1º e 2º Réus apresentam na presente ação a qualidade de Réus Devedores, enquanto que as 3ª, 4ª e 5ª Rés são demandadas na ação por serem as atuais proprietárias do bem em causa, sendo sujeitos passivos da doação do imóvel.
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No âmbito da presente ação, o 1º Réu e as 3ª, 4ª e 5ª Rés apresentaram a contestação, afirmando que o 1º Réu (e apenas este) nada deve à Recorrente.
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A Ré M não apresentou qualquer contestação.
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A douta sentença proferida no âmbito dos presentes autos absolveu os Réus do pedido com fundamento na falência do primeiro requisito do artigo 616, nº 2 do Cód. Proc. Civil, “ou seja, a existência de um crédito sobre o 1º Réu, pois que a factualidade relativa a tal matéria resultou não provada – cfr. pontos II.I a II.2 e II.32 a II.45” o que faz naufragar irremediavelmente a pretensão da Autora”.
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A Recorrente viu o seu crédito proveniente do contrato de mútuo nº … ser judicialmente declarado, tendo os 1º e 2º RR. sido condenado a pagar à Recorrente o montante de 5.490,12€, por sentença proferida no âmbito do processo nº 103/15.7YIPRT, que correu termos na Comarca de Braga – Inst. Local de Fafe – Secção Cível – J1 – sentença essa já transitada em julgado - cfr. sentença que se junta sob o doc. nº 1 e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
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Entendeu o tribunal a quo desvalorizar tanto a própria sentença proferida no âmbito de tal processo como o seu teor, para efeitos de produção de prova do crédito da Autora.
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No que à divida face à Recorrente decorrente do contratode mútuo nº …, a sentença em causa fazprova plena da existência da dívida.
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Carece, pois, de qualquer outra prova adicional.
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A sentença proferida no âmbito do processo nº103/15.7YIPRT, já transitada em julgado, tem força decaso julgado.
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No que respeita à prova do crédito da Recorrente,encontram-se preenchidos os requisitos exigíveis nostermos e para os efeitos do artigo 580º, nºs 1 e 2 e 581ºdo Cód. Civil, isto é, identidade de sujeitos sob o ponto devista jurídico (devedores), identidade do pedido(reconhecimento da dívida) e identidade da causa depedir (existência do crédito da Recorrente), podendo adecisão atingir terceiros XIII. Ainda que se entendesse não relevar a sentença dereconhecimento da dívida enquanto exceção de casojulgado, pelo terá de ser considerada sempre para efeitosde produção de prova, pela autoridade própria dasentença.
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Ainda que se não verifique o concurso dos requisitos oupressupostos para que exista a exceção de caso julgado(exceptio rei judicatae), está em causa o prestígio dostribunais ou a certeza ou segurança jurídica das decisõesjudiciais porque a douta sentença recorrida veio disporem sentido diverso sobre o mesmo objeto da decisãoanterior transitada em julgado, abalando assim aautoridade desta.
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A referida sentença (proferida em 1º lugar) contémexpressas declarações de testemunhas que viram o Réua assinar tais documentos, que contactaram com elepara mobilização dos depósitos a prazo, etc.
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Se a Recorrente já viu reconhecido o seu crédito porsentença transitada em julgado, tendo já sido produzidatoda a prova do respetivo crédito naqueles autos, nãopoderá o tribunal a quo pretender repetir o julgamentonesta parte e, bem assim, decidir em sentido diverso.
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Fica, pois, abalada tanto a autoridade do tribunal queproferiu a sentença como a certeza e segurança jurídicasda decisão judicial transitada em julgado.
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Em face de todo o exposto, quanto à titularidade dadívida supra mencionada, nada mais carece de prova pelaRecorrente, ficando, pois, o litigio prejudicado nestaquestão, uma vez que parte crédito da Recorrenteencontra-se titulado por sentença, que já foi mesmoobjeto de ação executiva não contestada.
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Acresce que a 2ª Ré não contestou a presente ação e,muito menos, negou a titularidade das dívidas junto daRecorrente.
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Se é verdade que a confissão dos factos apenas operaface à 2ª Ré, a verdade é que a respetiva dívida tambémtem um cariz pessoal, não podendo o tribunal a quoentender que carece de prova a existência do crédito daRecorrente perante a 2ª Ré, já que o mesmo não foiimpugnado, em momento algum, por qualquer um dosRéus e a própria não contestou.
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Não obstante a livre apreciação de prova que assistia aotribunal a quo, a verdade é que existe uma sentençajudicial a reconhecer o crédito da Recorrente face aosRéus e, bem assim, o crédito da 1ª Ré não foi posto emcausa.
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Em sede de contestação, os Recorridos não colocam emcausa nem o facto de a transmissão ter ocorrido atravésde doação, nem colocam em causa a existência do créditoface à 1ª Ré, sendo certo que a 2ª Ré, devedora, nãocontestou, o que tem valor legal de confissão de dívida.
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Com efeito e relativamente à boa fé, dispõe o nº 1 doartigo 612º C. Civil que: se o ato for gratuito, aimpugnação procede, ainda que um e outro agissem deboa fé.
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Considerando que estamos perante uma doação, aimpugnação teria sempre que ser procedente,independentemente de existir boa fé ou não, uma vezque resulta provado o locupletamento de bens por partedos Réus e a anterioridade do crédito da Recorrente faceà 1ª Ré.
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Não sendo necessária qualquer produção de provaquanto a este ponto.
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A natureza jurídica de uma ação de impugnação paulianaé pessoal e obrigacional, visando restituir ao credor, namedida do seu interesse, os bens com que ele contavapara garantir o seu crédito, conferindo-lhe, assim, trêsdireitos: a) o direito à restituição na medida do interessedo credor, (b) o direito a praticar os atos de conservaçãoda garantia patrimonial autorizados por lei e c) o direitode execução no património do obrigado à restituição.
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A própria sentença recorrida refere-se expressamenteque não ficou provada a existência do crédito face ao 1ºRéu, sendo certo que tal não poderá resultar naabsolvição do pedido.
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Não podendo, pois, concluir-se pela absolvição do pedidoem face da...
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