Acórdão nº 59/14.3T8BGC-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA PURIFICA
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

- Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães – I.

RELATÓRIO Oponente/recorrentes: A, P E M, executadas nos autos acima referenciados.

Oponido/recorrido: B, exequente nos autos acima referenciados.

Nos autos supra identificados apresentaram as executadas oposição à execução que lhes foi movida pelo exequente B, pugnando pela extinção da execução, dizendo em síntese que a exequente poderia solicitar aos restantes mutuários a liquidação da quota parte em divida do insolvente mas nunca poderia onerá-los com o vencimento global do crédito que se encontra em dia. Não obstante a insolvência de um dos mutuários nunca os contratos de mútuo estiveram em divida.

Mais alegam que mesmo que tal incumprimento se verificasse sempre deveria ser dado às executadas por um lado um prazo razoável para cumprimento da obrigação ou por outro lado direito de preferência na aquisição da quota parte do mutuário insolvente.

O que não foi feito pelo que existe manifesto Abuso de Direito pela exequente.

Acresce que a exequente não cumpriu com as lides económicas - bancárias diárias uma vez que não lhes assegurou prazo de interpelação para pagamento, não lhes respondeu às várias missivas que enviaram e telefonemas feitos com vista a negociações ou reestruturação do crédito.

Já o Banco sustenta a legitimidade da acção executiva, tal qual foi interposta. Defendendo que a exequente não podia deixar de considerar vencida a divida porque um dos efeitos da insolvência é precisamente o vencimento imediato das dividas, a quota parte do insolvente foi apreendida para a massa insolvente e a conta bancária foi bloqueada.

A exequente interpelou para o pagamento as executadas por cartas que junta, respondeu às executadas por carta de 12.12.2012 e como os pagamentos que fizeram e que foram levados em conta não liquidaram a divida daí que tenha sido intentada a presente execução.

Seguiu-se despacho que designou dia para audiência preliminar com os seguintes objectivos: Considerando o que está em causa nos presentes autos, por um lado, e, por outro, a invocada vontade de cumprir por banda das opoentes, por outro, cremos que se justifica uma tentativa de conciliação. Para o caso de esta se gorar, haverá lugar a audiência prévia, com a finalidade de analisar se os autos contêm todos os elementos necessários à decisão de mérito, ainda que eventualmente parcial, ou se deve prosseguir para fase de julgamento, e nesse caso, com identificação do objecto do litígio e dos temas da prova.

Realizada tal diligência não foi possível a conciliação das partes.

Seguiu-se despacho a fixar o valor da oposição em 94.016,80 €, montante igual ao da execução, posto que a eventual procedência da oposição implicará a extinção de toda a execução.

Após, o Mmº Juiz proferiu o seguinte DESPACHO: Entendo que os autos contêm já os elementos necessários à decisão de mérito, pelo que faculto aos Exs. Mandatários a discussão sobre os aspectos factuais e jurídicos da causa, tendo aqueles reiterado os argumentos já expendidos nos respectivos articulados.

Seguiu-se saneador/sentença que julgou a total improcedência da presente oposição, ordenou o prosseguimento da execução com custas pelas opoentes.

Inconformados com a sentença as oponentes apresentam recurso que encerram com as seguintes conclusões: 1. Após apuramento da factualidade processual e à revelia das normas jurídicas aplicáveis entendeu o Exmo. Juiz a quo absolver a Recorrida.

  1. Houve, pois, ofensa de lei pelo tribunal a quo mediante a violação de normas jurídicas, merecendo o douto despacho-sentença em crise censura.

  2. Deste modo, conclui-se que, na realidade, o Exmo. Juiz a quo DESPREZOU as razões de facto e direito expressas pelas ora recorrentes, no que diz respeito a três questões essenciais: quanto ao vencimento das obrigações tidas como solidárias, quanto à interpelação admonitória e face ao Abuso de Direito verificado.

  3. Acontece que, da leitura da douta decisão ora em crise, denotaram as Recorrentes que existe uma questão prévia que se impõe antes de mais, a qual diz respeito à vontade real das partes na fixação da cláusula 16.ª do contrato de mútuo.

  4. Na verdade, face à fundamentação da Recorrida de resolução dos contratos e vencimento de todas as obrigações decorrentes em virtude da insolvência de um dos codevedores, o douto Tribunal a quo entendeu que esta se encontra explicitamente prevista no contrato de mútuo - enquanto contrato que pode ser conformado pelas partes – pois que se encontra estabelecido, na sua cláusula 16.º, que a Recorrida poderia pôr termo ao contrato e exigir o integral reembolso se o mutuário se tornar insolvente; acrescendo na cláusula 17.º que as partes aceitam o contrato de mútuo com as condições nele estabelecidas.

  5. Porém, acreditamos que o douto Tribunal recorrido interpretou erradamente o clausulado e as suas consequências legais sobre os restantes codevedores, na medida em que entendeu que a não verificação da solidariedade da dívida levaria a que os restantes codevedores ficariam libertos da sua restituição e que essa limitação colocaria em causa o direito do credor em exigir o reembolso integral da dívida.

  6. Acontece que, no que à vontade real das partes diz respeito, refira-se que o clausulado contratual não traduz a vontade real das mesmas, porquanto nunca as Recorrentes tiveram conhecimento integral e informado da cláusula 16.º do contrato de mútuo dado à Execução.

  7. Tanto assim é que as Recorrentes, aquando da insolvência do irmão das mesmas – anteriormente também mutuário deste contrato – desde logo encetaram contactos e negociações com a Recorrida no sentido de adquirirem a quota-parte do mesmo e adjudicarem para si mesmas a dívida correspondente, tal como se encontra comprovado nos autos com os documentos relativos às missivas enviadas à Recorrida; tendo sido as Recorrentes a entrar em contacto com a Recorrida para questionar sobre como iriam processar a insolvência do mutuário e como iriam exigir o reembolso da quota-parte do mesmo.

  8. De facto, na leitura das Recorrentes, a cláusula 16.º somente refere um mutuário e a exigência daquilo que lhe for devido quanto a esse mutuário, sendo que esta leitura não é de todo despicienda de sentido pois que se refere diretamente «o direito de pôr termo ao contrato e exigir o integral reembolso daquilo que lhe for devido (…) se o mutuário se tornar insolvente».

  9. Ora, a própria atuação das Requerentes aponta nesse sentido, desde logo por terem diretamente manifestado a vontade de adquirir a quota-parte do mutuário insolvente e, desse modo, mantendo o integral cumprimento do contrato, pelo que as Recorrentes agiram conforme a interpretação normativa e a perceção que as mesmas fizeram da cláusula contratual em causa o que, verificando-se agora que tinha um sentido diverso daquele que as mesmas acharam ter declarado, mais não podemos concluir de que se trata de um caso de Erro na Declaração, conforme exposto no artigo 247.º do C.C..

  10. Na verdade, somente agora as Recorrentes tiveram pleno conhecimento das consequências nefastas que a cláusula contratual em causa trouxe às mesmas – tal como foi interpretada pelo douto Tribunal recorrido.

  11. Ora, o erro na declaração existe quando, não intencionalmente –a vontade declarada não corresponde a uma vontade real do autor, existente, mas de sentido diverso, daí derivando um erro que faz faltar no autor do ato a consciência do seu significado objetivo, provocando uma discrepância entre este e a ideia que ele dele faz, tal como exposto no douto acórdão do Supremo Tribunal de Justiça datado de 15.05.2012.

  12. Efetivamente, se as Recorrente tivessem pleno conhecimento de que a cláusula 16.º do contrato de mútuo pressupunha que a insolvência ou outra situação semelhante quanto a um dos mutuários acarretaria a resolução do referido contrato e o direito de exigir o cumprimento integral da obrigação a qualquer um dos restantes mutuários, nunca as Recorrentes tinham assinado o contrato sem mais, nem mantido a cláusula nos termos expostos.

  13. Acresce que, aquando das negociações junto da entidade bancária recorrida, as Recorrentes e Insolvente várias vezes salientaram que pretendiam que o contrato fosse mantido em quotas-partes, desde logo porque são irmãos entre si e cada um responsabilizar-se-ia pela respectiva quota-parte, caso houvesse algum contratempo que pusesse em causa o contrato.

  14. Assim, as Recorrentes entenderam que a cláusula ora em crise exprimia a vontade real das mesmas - sendo que agora verificam que esse não foi o caso – tendo atuado conformemente, em particular pretendendo adquirir a quota-parte do irmão insolvente, quer através de uma reestruturação do crédito integral quer através do aumento das garantias creditícias sobre o referido contrato, pelo que, face ao exposto deve ser o contrato de mútuo em causa declarado anulado na parte que se encontra viciado, nos termos do disposto nos artigos 292.º e 247.º do C.C.

  15. Sem prescindir, e no que diz respeito à primeira das questões essenciais trazidas à colação pelas Recorrentes, entendeu o douto Tribunal recorrido que a não verificação da solidariedade da dívida levaria a que os restantes codevedores ficariam libertos da sua restituição e que essa limitação colocaria em causa o direito do credor em exigir o reembolso integral da dívida, aplicando os termos do artigo 237.º, 2.ª parte do C.C., ou seja, em caso de dúvida quanto à declaração negocial, a solução quanto ao equilíbrio das prestações é favorável, sem mais, ao credor.

  16. Todavia, o douto Tribunal a quo olvidou outro critério para interpretar a vontade negocial das partes, em especial a boa-fé, tal como se encontra exarado no artigo 239.º C.C., pelo que desde logo o tribunal recorrido devia ter tido em conta esse critério na avaliação das vontades negociais em crise, em especial face à prova efetuada nos autos, nomeadamente a vontade das Recorrentes em manter o cumprimento prestacional – que somente não prosseguiu porque a Recorrida impediu que as Recorrentes continuassem...

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