Acórdão nº 227/16.3T8CBT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA AM
Data da Resolução07 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

O. F.

intentou a presente ação contra F. A.

, pedindo, a final, o seguinte: A) Declarar-se que tendo o divórcio sido proferido em 24-09-2008 por decisão transitada em julgado, a relação dos bens a partilhar só pode e deve incluir os bens comuns das partes - activo e passivo - que existiam nessa data (24-09-2008) e não operações anteriores ou posteriores; B) Declarar-se que a quantia de 1.052,61€ (verba 1. Da relação de bens) encontra-se na posse do réu desde 14.1.2008; C) Declarar-se que a verba 2. da relação de bens terá de ser excluída por não se tratar de um bem comum existente à data do divórcio, nem se encontra na posse da autora; D) Condenar-se o réu a relacionar os bens imóveis identificados na verba 3 da relação de bens, em espécie ou pelo seu valor à data do divórcio, já que foram vendidos posteriormente ao divórcio, a 13-08- 2009; E) Deverá declarar-se que a autora não se encontra na posse do montante de 51.500,00€ (verba 3 da relação de bens); F) Deverá ainda condenar-se o Réu a relacionar os seguintes bens comuns (na sua posse): 2 fios de ouro a que atribui o valor global de 240,00€; 1 relógio a que atribui o valor de 100,00€; Várias pulseiras de ouro, oferecidas por amigos, a que atribui o valor global de 200,00€; 2 alfinetes de ouro a que atribui o valor de 100,00€; Serviço de jantar, de café e de chá da marca SPAL e enxoval de solteira da reclamante a que atribui o valor global de 1.000,00€; 2 colchas, lençol e toalha, tudo em linho, a que atribui o valor de 700,00€; Várias toalhas bordadas à mão no valor de 150,00€; Diversos objectos de adorno e estanho vista alegre e cristal a que atribui o valor de 250,00€; G) Requer-se ainda que seja relacionada a dívida à Banco A, decorrente do empréstimo contraído pelas partes para compra do imóvel relacionado no ponto 16 de Imóveis da relação de bens, pelo seu montante à data do divórcio, devendo portanto o R. ser condenado a corrigir a verba 1 do passivo; H) Deverá ser o réu condenado a fundamentar as verbas 2 e 3 do passivo quanto ao tipo, origem e data e às entidades bancárias correspondentes; I) Deverá ser o réu condenado a reconhecer que o pagamento das verbas 2 e 3 do passivo foi feito pela autora posteriormente ao divórcio; J) Deverá ser o réu condenado a excluir a verba 4 do passivo da relação de bens pois tal verba não pertence ao universo dos bens comuns a partilhar, apenas poderá ser sujeita a um processo de prestação de contas entre as partes; K) Termos em que o réu deverá ser condenado a rectificar a relação de bens que apresentou nos termos sobreditos, com todas as consequências legais; Para o efeito, alegou, em suma, que foi casada com o Réu, tendo esse casamento sido dissolvido por divórcio decretado em 24.9.2008.

Mais alegou que corre termos um processo de inventário para partilha de bens em consequência de divórcio no Cartório Notarial de Celorico de Basto da Dra. A. F., tendo a Autora apresentado reclamação à relação de bens apresentada nesses autos pelo ora réu (ali cabeça de casal), tendo determinadas questões controvertidas sido remetidas para os meios comuns e nessa sequência intentou a presente ação, terminando com os aludidos pedidos.

* O Réu contestou pugnando pela improcedência da ação.

* Findos os articulados foi então proferida a seguinte decisão: “…Face ao exposto, julga-se a presente acção contra o Réu F. A. manifestamente improcedente, sendo o mesmo absolvido dos pedidos formulados pela Autora O. F.…”.

* Não se conformando com a decisão proferida, dela veio a A. interpor o presente recurso de Apelação, apresentando Alegações e formulando as seguintes Conclusões: “I. O teor da decisão final proferida na audiência prévia (com valor de sentença) não se encontra em conformidade com os normativos de Direito aplicáveis in casu e contraria os factos alegados pela autora na sua petição inicial e documentação junta aos autos.

  1. Quer o tribunal a quo fazer crer que a apelante, na sua petição inicial, limitou-se a enunciar direitos e a formular pedidos, sem substracto fáctico.

  2. Somos forçados a discordar em absoluto da posição do tribunal recorrido, pois a autora/apelante na sua p.i. expôs os factos que servem de fundamento à acção, devidamente alicerçados em prova documental: certidão de assento de casamento; comprovativo de ter intentado a acção de inventário para partilha de bens em consequência do divórcio; relação de bens apresentada pelo réu no processo de inventário; reclamação da autora da relação de bens apresentada pelo réu; despacho da Exma "Sra. Notária AF que determinou a remessa de questões concretas e individualizadas, atenta a sua complexidade, para os meios comuns (decisão que está na origem da presente acção); comprovativo bancário de que o réu procedera ao levantamento da quantia de 1.052,61€ e que ficou na sua posse; escritura notarial datada de 13-08-2009 de venda de bens imóveis; 2 cheques à ordem de cada um dos membros do ex-casal, após liquidação do crédito hipotecário existente, para prova da posse do produto da venda dos bens imóveis.

  3. A Mma Juíza do tribunal recorrido considerou ainda que a autora/apelante não identificou as verbas de que fala na petição inicial, o que é falso, como se demonstrou com a transcrição de alguns artigos da petição inicial nestas alegações de recurso.

  4. Com base nos factos contidos na p.i e na contestação seria possível decidir-se a comunhão de determinados bens e daí inferir-se a inclusão, ou não, desses na relação de bens (onde só se relacionam os bens comuns e não os próprios), assim como determinar os montantes recebidos por cada uma das partes pela venda de bens imóveis comuns do casal, constatar a sua aquisição na constância do casamento em regime de comunhão de adquiridos, a sua alienação em data posterior ao divórcio, determinar a localização do produto da venda dos bens e respectiva posse dos bens móveis e imóveis. Note-se que as partes, nos seus articulados, quanto aos bens imóveis em discussão nesta acção, admitem que são bens comuns, nunca puseram em causa a comunhão de tais bens imóveis, aceitando-a explicitamente.

  5. A Mma Juiza a quo considerou que não poderia conhecer dos pedidos por estes serem ininteligíveis, absolvendo por isso o réu dos pedidos formulados pela autora/apelante.

  6. Ora, nos termos do artigo 186.° nº 2 a) do C.PC., quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir tal determina a ineptidão da petição inicial.

  7. A ineptidão da petição inicial toma nulo todo o processado e impede o conhecimento do mérito, determinando a absolvição da instância e não a absolvição do pedido, ao contrário do que a Mm." Juíza a quo sustentou na sentença proferida.

  8. Todavia, ao contestar, defendendo-se apenas por impugnação, o réu demonstrou interpretar convenientemente os factos alegados na petição inicial, impossibilitando a verificação da ineptidão da p.i por ininteligibilidade ou falta de pedidos, tendo de se considerar tal nulidade, a existir, sanada - art 186.° n." 3 C.P.C.

  9. Poderia a Mm." Juíza, com base na matéria de facto da p.i. e da contestação e documentação junta aos autos decidir do mérito da acção no sentido de procedência de todos (ou alguns) dos pedidos formulados pela autora/apelante, ou o prosseguimento dos autos para produção de prova, realização de audiência de julgamento e prolação, a final, de decisão.

  10. Todavia, descortinando qualquer imprecisão ou irregularidade na exposição ou concretização dos factos necessários à procedência da acção, tal seria sempre sanável através de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial - artigo 590.° nº 2 a) e b) do CPC - sendo que, a autora/apelante poderia, querendo, clarificar o pedido ou os pedidos efectuados e ainda requerer a ampliação do pedido- 265.° n." 2 e 3 C.P.C.

  11. A Mm." Juíza a quo limitou-se a não querer decidir a causa em concreto, absolvendo o réu dos pedidos, utilizando para o efeito argumentação consubstanciadora da ineptidão da petição inicial por ininteligibilidade ou falta do pedido ou causa de pedir.

  12. O que constitui causa de nulidade do despacho saneador com valor de sentença, nos termos previstos no art. 615.° nº 1 c) do CPC, uma vez que os fundamentos utilizados pelo Tribunal recorrido (desde logo a ineptidão da p.i. por ininteligibilidade ou falta dos pedidos) estão em oposição com a decisão de absolvição dos pedidos (tal excepção, caso se verificasse, o que não se concede, determinaria a absolvição da instância, não sendo possível a decisão de mérito).

  13. Para além disso, pelo que foi exposto, a sentença será ainda nula por o juiz deixar de pronunciar-se sobre questões que deveria apreciar - 615.° nº 1 d) do CPC.

  14. Uma leitura atenta dos artigos da petição inicial da autora que se transcreveram nas presentes alegações, para prova do alegado, bem como da contestação do réu, permite concluir que os factos que a autora/apelante quer fazer derivar o direito em litígio estão suficientemente individualizados na petição, a recorrente articulou factos constitutivos dos direitos invocados, suportados por prova documental não impugnada pelo réu, não existindo qualquer fundamento legal ou factual pra a Mm" Juíza do tribunal a quo ter proferido em audiência prévia decisão de mérito de absolvição do réu do pedido.

  15. o tribunal a quo entendeu, inclusivamente, não ser possível o convite ao aperfeiçoamento previsto nos artigos 590.° e 591.° do CPC., negando à autora, por esta via a concretização do direito constitucional do acesso à justiça.

  16. Os pedidos formulados pela autora não são manifestamente improcedentes. Se a Exm." Sra. Notária não decide questões - que individualizou e considerou complexas - no âmbito do processo de inventário para partilha de bens na sequência do divórcio (designadamente pela limitação de meios de prova de que se dispõe no processo de inventário) e remeteu tais questões para os meios comuns - e por isso a autora/apelante intentou a presente acção, para decisão dessas questões, no Tribunal - também a Mm." Juíza não vai decidir...

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