Acórdão nº 114/16.5T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelPEDRO DAMI
Data da Resolução18 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. RELATÓRIO Recorrente(s):- Maria e marido Eduardo; Recorrido(a)(s): Alzira.

    *Maria e marido Eduardo, intentaram a presente acção declarativa com processo comum contra Alzira, Manuel e mulher Alberta, pedindo que os Réus sejam condenados a: a. Reconhecer que a Autora mulher é dona e possuidora do prédio descrito nos arts. 4º a 7º; b. Reconhecer que tal prédio tem a configuração assinalada a amarelo fluorescente na planta junta sob o n.º 4 e n.º 8; c. Reconhecer que o seu direito sobre o caminho acima identificado é de mera servidão de passagem, sendo esta restrita a peões, animais e veículos agrícolas (ou seja, não permite nem admite a passagem de veículos motorizados, sejam de passageiros sejam de mercadorias) e d. Reconhecerem a extinção da servidão aludida nos autos por desnecessidade, ou, caso o assim não se entenda, pelo seu não uso no que toca ao uso não pedestre.

    Alegam para tanto, em apertada síntese, que são donos e legítimos possuidores do prédio que descrevem no art. 1º, da petição inicial, o qual tem a configuração da planta que anexam; que pelo logradouro do seu prédio urbano está constituída uma servidão de passagem, por usucapião a favor do prédio dos Réus; que tal servidão deixou, há mais de 20 anos, de ser usada, excepto para uso a pé; que ainda que assim não se prove, tal servidão mostra-se, hoje em dia, ser desnecessária por ter o prédio outras entradas, sendo uma delas uma garagem para viaturas automóveis e outra uma entrada pedonal; acresce que, nesta entrada pedonal os Réus poderão, sem custo elevado, proceder à abertura de uma entrada para veículos.

    Juntaram documentos e arrolaram testemunhas.

    Os Réus contestaram, impugnando a matéria alegada pelos Autores, nomeadamente, a existência de uma servidão; alegam ainda, caso se conclua que a dita servidão exista, que a mesma ainda é útil e necessária ao prédio em questão, sendo certo, por outro lado, que não se mostra exequível a obra de abertura de nova entrada que os Autores propõem.

    Juntaram documentos e arrolaram testemunhas.

    *Foi proferido despacho saneador, fixado o valor da causa, identificado o objecto do litígio e enunciads os temas da prova (cfr. fls. 116).

    *Realizou-se a audiência de julgamento, com observância de todas as formalidades legais.

    *Na sequência foi proferida a seguinte sentença: “III. DECISÃO Pelo exposto, decido julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência: 1. Condeno os réus a reconhecerem o direito de propriedade dos autores sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o número ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., composto por casa de habitação, com logradouro, sito na Rua … (anteriormente Lugar …), da freguesia de ..., do concelho de Fafe 2. Absolvo os réus dos restantes pedidos contra si formulados…”.

    *É justamente desta decisão que os Autores/Recorrentes vieram interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “CONCLUSÕES: 1.ª Foi dada como provada a existência do prédio dos AA com a configuração que dele consta quer na certidão da inscrição dele no registo predial quer do teor da respectiva matriz: prédio urbano composto por casa de habitação, com logradouro, sito na Rua ... (anteriormente Lugar ...), da freguesia de ..., do concelho de Fafe, a qual confronta a Norte com Emília, a Poente com os aqui Réus, a Sul e a Nascente com caminho público; 2.ª Os art.ºs 7.º e 8.º do Código do Registo predial estabelecem a presunção ilidível de que os factos registados existem com a titularidade e pela forma como estão descritos no registo predial e que se assim não for a impugnação judicial deles deve ser acompanhada com o pedido de cancelamento de registo.

    1. Os Réus não ilidiram esta presunção, nem fizeram acompanhar a impugnação (que fizeram genericamente) da existência, forma e dimensões do logradouro do prédio dos Autores do pedido do cancelamento do registo.

    2. A certidão predial e a certidão do teor matricial atestam e tornam público que o prédio dos Autores tem um logradouro com a área de 23m2.

    3. A inspecção judicial ao local da questão, cuja acta se encontra entranhada nos autos, não revelou que a preocupação do douto julgador tenha sido a de determinar a existência, localização e área do logradouro da casa dos Autores.

    4. Pelo menos da inspecção ao local, constante da referida acta de audiência realizada em 2 de Março de 2017, resulta que da descrição feita, dela não se afere com exactidão a existência dessa preocupação.

    5. A acta refere a existência de parcela de terreno “ladeada pela casa dos autores, do lado oposto pela casa de uma irmã da autora e ao fundo por duas casas dos réus”.

    6. que “A entrada para a casa dos réus é feita por um portão com cerca de 2,70 metros, pelo qual se acede a um pequeno logradouro da sua casa de habitação.” 9.ª que “nas traseiras da casa de habitação dos réus, no rés-do-chão ou cave, existe uma garagem pela qual se pode aceder ao interior da casa”.

    7. E, ainda, que “existe ainda nas traseiras da dita casa dos réus um portão de acesso pedonal ao logradouro da casa dos réus a que se acede por dez (10) degraus.” 11.ª Como logradouro tem de haver e da inspecção não se afere da existência de outro logradouro na habitação, integrando o prédio dos Autores, o espaço a que o auto de inspecção se refere não pode deixar de ser outro senão aquele que está em discussão nos autos.

    8. O auto dá conta da existência de outros acessos ao prédio dos Réus ao exterior e isso mesmo foi acolhido como matéria dada como provada nos pontos 1.12, 1.13 e 1.14 da douta sentença.

    9. O auto permite também concluir que qualquer servidão de passagem pelo logradouro do prédio dos autores para acesso ao prédio dos Réus é desnecessária.

    10. A simples inspecção ao local, materializada no auto que dela foi feita, permite concluir: a) Não existe no local outro logradouro que integre o prédio dos AA que não seja o que está em discussão no processo.

      1. Que o prédio dos RR dispõe de outros acessos para a via pública por onde podem passar, pessoas, veículos e animais.

      2. O logradouro descrito como integrando o prédio dos AA, quer no Registo Predial, quer na matriz, quer nos autos é o que pertence efectivamente à habitação propriedade dos Autores.

      3. Que para acesso ao prédio dos RR é desnecessária servidão de passagem pelo logradouro dos AA.

    11. A reapreciação a estas luzes, do auto de inspecção ao local faz concluir que está mal julgada a matéria dos factos 2.1 a 2.6 e 2.8 da matéria de facto dada como não provada, a qual deveria ter sido dada como matéria provada.

    12. Se assim não for, ou seja, se se entender que o auto de inspecção ao local não pode ser interpretado desta forma, então existe manifesto vicio de nulidade de sentença, porque existe oposição entre o teor do concreto meio de prova, auto de inspecção ao local, entre o concreto meio de prova certidão registral, entre o concreto meio de prova certidão matricial, por um lado e a concreta conclusão de improcedência aposta na sentença, porque aquelas colidem com esta (artigo 615º. nº. 1, alínea c) do CPC), vício este que cautelarmente também se invoca e que pode também ser arguido como fundamento deste recurso (n.º 4 do citado art.º 615º.).

    13. Também os depoimentos de parte e de testemunha, bem como as declarações de parte impõem que se dê como provada aquela referida matéria.

    14. Dão-se aqui por reproduzidas as transcrições acima feitas na alegação.

    15. A análise conjugada dos documentos acima citados, das transcrições efectuadas e das regras da experiência comum e critérios de normalidade, permite concluir que aquela matéria de facto foi mal julgada, e mal julgada de forma evidente e notória, que não cabe no mero poder de livre apreciação dela do julgador e que se justifica seja sindicada.

    16. É que o Tribunal a quo pelas regras de direito e pela apreciação criteriosa dos meios de prova acima indicados, documentos, actas e depoimentos, não podia deixar de dar como provado que: a) O prédio dos Autores tem um logradouro – aliás a própria sentença contradiz-se entre si, porque no ponto 1.1 dá como provado o logradouro e no ponto 2.1 dá-o como não provado; b) Que esse logradouro tem a área de 23m2 constante do registo e da matriz predial, documentos que fazem fé pública; c) E que ele é a parcela de terreno identificada no levantamento topográfico, por não existir outro.

    17. Os Réus na sua contestação impugnaram discursivamente os dizeres da petição por remissão para os correspondentes artigos dela.

    18. Não pediram o cancelamento do registo da existência e da área do logradouro do prédio dos Autores constante da Conservatória do Registo Predial.

    19. Cabia-lhes tê-lo feito em obediência ao disposto no art.º 8.º, n.º 2 do CRP, ao menos por pedido reconvencional.

    20. A douta sentença recorrida nenhum relevo deu a esta imposição legal.

    21. Tal como foi proferida acaba por privar o prédio dos Autores do logradouro e isto configura alteração da descrição do registo predial.

    22. Também não especifica detalhadamente porque é que decidiu contra as menções registais e matriciais.

    23. E fê-lo na ausência de qualquer prova que tenha ilidido a presunção registal e sem que tenha sequer sido pedida a alteração dele.

    24. Estes vícios integram nulidade de sentença, porque constituem a não especificação dos fundamentos de facto de que deriva a decisão e ainda porque o Tribunal a quo se fundamentou também na certidão e decidiu em desacordo com o teor dela, donde os fundamentos estarem em oposição ao julgado.

    25. No entender dos recorrentes os elementos constantes do processo, designadamente os documentais, bem como a inexistência de pedido de alteração das menções dos actos de registo, tudo conjugado com a experiência comum e ainda a existência dos factos 1.12, 1.13 e 1.14 que foram dados como provados, permitiam dar a acção como integralmente procedente e provada e consequentemente permitiam que fosse declarada a extinção de qualquer servidão de passagem sobre o logradouro do...

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