Acórdão nº 2696/09.9TBBCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Novembro de 2013

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução25 de Novembro de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes na 2ª Secção CÍVEL Do Tribunal da Relação de Guimarães * 1.Relatório. F..,SA, com sede de Barcelos, Braga, veio intentar acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra R.., SRL, com sede em Bucareste, na Roménia, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de € 864.673,50, relativo ao fornecimento de mercadorias.

Para tanto alegou, em síntese, que : - Nos anos de 2004 a 2006, vendeu e entregou à demandada diversa mercadoria de vestuário da marca Riverwoods, tendo a mesma sido entregue à Ré, e tal como de resto foi acordado/convencionado entre ambas, nas instalações da autora de Vila Nova de Famalicão, isto até Setembro de 2005 , e de então em diante, da Trofa; - Na sequência do referido, e porque ademais acordaram as partes em submeter a compra e venda indicada ao regime do incoterm EXW, a Ré levantou as mercadorias que a autora lhe vendeu, o que fez nas datas e nos locais acordados, procedendo ela mesma por sua conta e risco à sua expedição de Portugal para a Roménia; - Não obstante, não procedeu a Ré ao pagamento das facturas que a autora emitiu, e isto apesar das diversas interpelações para o efeito; 1.1. - Citada a Ré, veio a mesma apresentar contestação, deduzindo defesa por impugnação e excepção , sendo que no âmbito desta última veio arguir a excepção de incompetência absoluta do tribunal para conhecer da acção, aduzindo para tanto que em razão de regra de competência internacional aplicável ao caso, é antes na Roménia que a acção deveria ter sido proposta.

1.2.- Após a designação de dia para a realização de uma audiência preliminar, veio a diligência a ser dada sem efeito, atravessando nos autos o Exmº Juiz titular decisão que, conhecendo da excepção dilatória arguida pela Ré na respectiva contestação, declarou o tribunal internacionalmente incompetente para o conhecimento do pedido formulado, e , consequentemente, absolveu a Ré da instância , ao abrigo do disposto nos artºs 101º, 102º ,103º e 105º, n.º 1, todos do C.P.C.

1.3.- Entretanto, porque os pretensos créditos da autora foram cedidos às sociedades H.., SA, N.., SA, S.., Lda, A.. e J.., passaram os presentes autos - na sequência de incidente de habilitação - a prosseguir termos com todas as referidas “entidades” na posição de autores, sem substituição da autora primitiva.

1.4.- Notificados da decisão indicada em 1.2., atravessaram nos autos os AA H.., SA, N.., SA, S.., Lda, A.. e J.., instrumento de interposição de apelação, o que fizeram aduzindo as seguintes conclusões: 1. O requerimento redigido em língua estrangeira junto aos autos pela R. acompanhado de uma tradução particular sem qualquer valor oficial não pode ser julgado admissível como contestação e não corresponde à prática de um acto processual legal.

  1. Entender diferentemente como se fez na decisão em crise (e, segunda na mesma se alega, numa putativa decisão implícita) viola o nº 1 do Art. 139º CPCiv. que exige que nos actos judiciais se use a língua portuguesa, pelo que deve tal alegada contestação ser desentranhada dos autos.

  2. E, tendo já sido junta aos autos procuração forense passada pela R. a Ilustre mandatário judicial, devem considerar-se confessados os factos articulados pela A. e julgar-se por força de sentença constituída apenas por parte decisória, precedida de identificação das partes e de fundamentação sumária do julgado - cfr. nº 1 e 3 do Art. 484º CPCiv..

  3. O requerimento da R., além disso, não é articulado, violando o nº 2 do Art. 151º CPCiv.

  4. Não trazia duplicados, violando o Art. 152º do mesmo diploma.

  5. E, por fim, não veio acompanhado de comprovativo do pagamento prévio de taxa de justiça.

  6. Perante tudo isto aceitar que tal documento possa valer como contestação acarreta errada interpretação e por isso violação dos invocados preceitos legais assim como do Art. 486º-A CPCiv..

  7. Mais: ocorre nulidade da Douta decisão em crise já que nem sequer conheceu de todos os fundamentos invocados pela Apelante para que a dita “contestação” fosse desconsiderada e desentranhada dos autos, maxime, o não pagamento prévio da taxa de justiça e o facto de não ser articulada – cfr. al. d) do nº 1 do Art. 668º CPCiv..

  8. Deve, por isso, ser tal documento desentranhado dos autos e proferida decisão de mérito, considerando assente a factualidade alegada pela Apelante.

  9. De todo o modo, a decisão de mérito da causa é, também ela, errada por violadora da lei.

  10. Desde logo viola o princípio da cooperação plasmado no Art. 266º CPCiv assim como os poderes-deveres de usar de direcção do processo e do inquisitório, consubstanciando uma verdadeira decisão surpresa.

  11. O que acarreta violação de tais preceitos e do Art. 265º nº 1, 2 e 3 CPCiv.

  12. Antes devendo o Tribunal, ainda que fosse aceitável o seu entendimento – e crê-se que não é – convidado ou dado oportunidade à A. de fazer a prova da sua acção, designada e eventualmente, juntando aos autos o documento que, na opinião do próprio Tribunal, o faria decidir de modo distinto.

  13. Não existindo como não existe tal documento escrito existem todavia as 19 facturas juntas as autos e em que constam expressamente os seguintes dizeres: Condições de venda: EXW Trofa 15. Dizeres que, como é evidente, expressam que o contrato (ou contratos) de compra e venda de mercadoria celebrado entre as partes ficou(aram) expressamente sujeito(s) ao regime do INCOTERM EXW, conforma consta, literalmente das competentes facturas.

  14. Tais documentos não podem, por isso, valer com um sentido diferente, designadamente o atribuído pelo Tribunal, que contra toda a lógica, e apenas porque existe referido um local de destino, cria para a vendedora, contra o que expressamente foi acertado como condição de venda, uma obrigação de entrega em Bucareste, na Roménia.

  15. Violando e contrariando não só o acordado e sempre praticado entre as partes como o que consta dos únicos documentos que titulam as relações comerciais entre as mesmas - as facturas dadas à cobrança nestes autos.

  16. É sabido e unanimemente aceite pela Doutrina e Jurisprudência que os Incoterms são regras criadas pela Câmara de Comércio Internacional, significando o incoterm EXW (ex works) que a mercadoria é entregue no estabelecimento do vendedor, em local designado, recebendo-a o comprador no local da produção, na data combinada.

  17. O que foi expressamente alegado, tendo-se vertido na PI que a Ré sempre recebeu os bens comprados nas instalações da A., inicialmente as sitas na Rua do Progresso, lote 8, Vilarinho das Cambas, Vila Nova de Famalicão e, posteriormente, após Setembro de 2005, na Rua das Cavadas, 161, Trofa.

  18. O Local de destino não é nem nunca foi o local de entrega pela A. à R..

  19. Nem sequer a R. se atreveu a alegar no seu ilegal requerimento que a A. se obrigara a entregar as mercadorias na Roménia, em Bucareste, na sua loja.

  20. O levantamento das mercadorias nas instalações da A. ficava a cargo da R., que tratava ainda do seu despacho e transporte para Bucareste, algo a que a A. era alheia.

  21. Para além de decidir contra a letra e sentido das únicas declarações negociais válidas (e conhecidas) quanto ao que as partes consagraram como condições de venda, ao dizer que o contrato até à data não foi junto aos autos pela A. e seus sucessores (sic) o Tribunal a quo assumiu que caso existisse nos autos documento que titulasse o dito contrato o mesmo alteraria o sentido da sua decisão.

  22. Assim, proferir saneador sentença sem convidar a parte a juntar o documento e sem fazer sequer julgamento, impedindo a cabal instrução do processo é uma decisão surpresa que acarreta violação do nº 2 do Art. 265º, da al. a) do nº 1 do Art. 508º e do nº 4 do Art. 510º, todos do CPCiv..

  23. Acarretando ainda violação dos Arts 236º e 238º CCiv, por dar às facturas e declaração negocial nas mesmas vertidas um entendimento que é estranho à sua letra e ao sentido que uma pessoa normal daria à expressão condições de venda EXW Trofa, como, de resto, se ensina no Douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de Acórdão 26-04-2007 invocado em que se diz claramente que A cláusula "EXW" aposta em documento respeitante ao sobredito contrato significa que a única responsabilidade do vendedor é tornar os bens disponíveis nas suas instalações, não sendo responsável pelo carregamento dos bens no veículo fornecido pelo comprador, a não ser que o contrário tenha sido acordado, suportando o comprador, inteiramente, os custos e o risco envolvidos no transporte dos bens das instalações do vendedor para o destino desejado.

  24. Atento o exposto, a decisão em crise, violou ainda a alínea b) do nº1 do artigo 5º do o Regulamento (CE) nº 44/2001, do Conselho, de 22.12.2000 que enuncia que “o lugar do cumprimento da obrigação será...

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