Acórdão nº 5590/12.2TBBRG-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Junho de 2013
Magistrado Responsável | MANUEL BARGADO |
Data da Resolução | 13 de Junho de 2013 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO B…, Lda., foi declarada insolvente por sentença de 10.08.2012.
Por apenso ao processo de insolvência veio aquela deduzir incidente de aprovação de plano de pagamentos.
Em assembleia de credores e por escrito, depois dessa assembleia, com 68,57% dos votos, foi aprovado o plano de insolvência apresentado pela Sr.ª administradora da insolvência.
O Ministério Público, em representação do credor Fazenda Nacional, opôs-se à homologação do plano de insolvência.
O plano prevê, no que se refere aos créditos da Fazenda Nacional, créditos privilegiados, o seguinte: a) pagamento da totalidade do capital e juros, à taxa de 4%, em 120 prestações mensais, iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira no mês posterior à aprovação do plano de insolvência.
Por sentença proferida em 12.03.2013, foi recusada a homologação do plano de insolvência com o fundamento de que contra a vontade do Estado, não é possível reduzir ou extinguir créditos tributários em plano de insolvência, como sucedia com o plano apresentado e aprovado pelos demais credores.
Inconformada com o assim decidido, recorreu a insolvente, que encerrou a respectiva alegação com extensas conclusões que a seguir se transcrevem: «I.- Vem o presente Recurso interposto do despacho de não homologação proferido no dia 12 de Março de 2013, no âmbito do processo de insolvência, pela Recorrente nos presentes autos.
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Andou mal o Tribunal a quo na interpretação, selecção e determinação dos normativos relevantes para a fixação do seu entendimento, assim se justificando as presentes alegações.
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Na prática, o Tribunal a quo valorou sobretudo o voto do M.P. em representação da Fazenda Nacional, em detrimento dos votos dos demais credores incluindo o da Segurança Social (em representação do mesmo credor ESTADO) que aprovaram o Plano de Insolvência apresentado e submetido pela Sr.ª Administradora de Insolvência.
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Em suma, e salvo sempre o devido respeito que, naturalmente, lhe merece, entende a Recorrente que a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª Instância e que ora se sindica não procedeu à correcta aplicação da lei e, muito menos, à adequada apreensão e interpretação dos normativos em apreço e à certeira subsunção à matéria de facto, atentas as condições previstas no Plano de Insolvência oferecidas pelo Recorrente.
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Conforme consta da fundamentação do despacho de não homologação, entendeu, aquele Tribunal, que estariam a ser violadas normas aplicáveis com carácter imperativo, designadamente os artºs 30º e 36º da LGT, bem como o artº 196º do CPPT.
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Vigorando o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários em termos absolutos, a Segurança Social em representação do credor Estado, não poderia ter concedido moratória ao abrigo do artº 36º da LGT, uma vez que as contribuições para a Segurança Social enquadram-se na categoria de tributos, pelo que seriam abrangidos pela proibição imposta por aquele princípio.
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O que demonstra de per si, que aquele princípio deverá ser alvo de uma interpretação restritiva, pois, uma vez chamados a pronunciarem-se quanto aos respectivos créditos, a Segurança Social e a Fazenda Pública Nacional representada pela Digníssima Magistrada do M.P., perfilham posições diferentes.
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Face ao exposto, deverá concluir-se que no âmbito do processo de insolvência, o princípio da indisponibilidade do crédito tributário deverá ter um alcance mitigado, atentas as especificidades próprias do regime da insolvência.
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Por essa mesma razão, e conforme foi referido supra, deverá atender-se ao princípio da igualdade entre credores, respeitando a aprovação do Plano de Insolvência, sem atribuir nenhum benefício a nenhum credor em especial.
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Resulta da leitura do n.º 2 do artº 30º da LGT. que o crédito tributário pode ser reduzido ou extinto, desde que seja respeitado o princípio da igualdade e da legalidade tributária e, nessa medida, nada obstará à homologação de um Plano de Insolvência que inclua essa redução ou extinção.
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Ainda que invocada a violação do princípio da igualdade entre contribuintes, há que atender a que o princípio da igualdade impõe um tratamento igualitário para o que, de per si, é igual; um tratamento desigual para o que é desigual.
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Não pode a Recorrente conformar-se com a interpretação daqueles normativos, na medida em que o sujeito passivo insolvente, ora Recorrente, não tem capacidade económica idêntica a qualquer outro contribuinte e, nessa medida, pugna por um tratamento diferenciado.
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As discriminações positivas são consentidas pelo princípio da igualdade e foi, por essa razão, que se consagrou um regime especial no CIRE.
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Nas relações entre a Administração Tributária e os contribuintes, e já não no âmbito do concurso de credores desencadeados nos processos de insolvência, existindo incapacidade para liquidar todos os créditos e vigorando o princípio da igualdade entre credores citado supra, o Estado não pode lograr obter um tratamento diferente, por que privilegiado, quando comparado com os demais credores da Insolvente, fazendo assim recair sobre estes todo o esforço de recuperação da Entidade Insolvente.
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O CIRE prevê a vinculação dos credores a um plano de insolvência, desrespeitado na situação sub judice.
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Tendo sido aprovado por 68,57% dos credores o Plano de Insolvência, nos termos do artº 212º do CIRE, entende a Recorrente, que estariam reunidas as condições para a sua homologação.
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Pelo que, andou mal o Tribunal a quo, no que concerne à apreciação jurídica da decisão em crise ao desconsiderar a aprovação do Plano de Insolvência pelo quórum exigido.
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Devendo, em conformidade, ser alterada a decisão do Tribunal a quo.
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No que tange ao domínio constitucional, invoca a Recorrente, a violação do disposto no artº 112º da CRP, na exacta medida em que há uma derrogação operada por uma lei geral (LGT designadamente o artº 30º) de uma lei especial, CIRE.
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Em consonância com aquele postulado, Lei e Decreto-Lei têm o mesmo valor hierárquico, pelo que não poderá prevalecer a primeira sobre a segunda, ou vice-versa; XXI.- Por outro lado, com recurso à interpretação teleológica imanente à disciplina do Plano de Insolvência e ao argumento da unidade do sistema jurídico, facilmente se conclui no sentido da sobreposição da primeira norma (CIRE) sobre a segunda (LGT), nos termos do artº 9º do CC.
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Acresce, o princípio segundo o qual lei especial prevalece sobre lei geral é manifestamente violado, pois não resulta da leitura do preceito vertido no artº 30º nº 3 da LGT a intenção inequívoca do Legislador no sentido de sobrepor as normas de natureza tributária às normas reguladoras da insolvência.
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Tanto mais que, tendo aditado o nº 3 ao artº 30º da LGT conservou disposições como os artºs 97º e 196º do CIRE, colocando na discricionariedade dos credores a aprovação do Plano de Insolvência, que contemple a reestruturação de créditos.
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Paralelamente, invoca a Recorrente a violação do artº 13º da CRP que consente na existência de discriminações positivas.
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As normas vertidas no CIRE visam dispensar um tratamento diferenciado, para uma situação tida por anómala porque diferente, à Recorrente, que não dispõe de capacidade económica para satisfazer os compromissos assumidos.
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Entende serem estas medidas de diferenciação materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança jurídica, da proporcionalidade, da justiça e da solidariedade e não se baseiem em qualquer motivo constitucionalmente impróprio.
Em suma, quando houver um tratamento desigual, impõem uma justificação material para a desigualdade, pois é patente que, quer o fim, quer os critérios do tratamento desigual têm de estar em conformidade com a Lei Fundamental.
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Com efeito, a situação da Insolvente, ora Recorrente, preenche os requisitos impostos por aquele imperativo constitucional e não infringe o princípio da igualdade entre contribuintes, porquanto, dispensa um tratamento diferente a uma situação diferente.
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Concluindo, o respeito pelo princípio da...
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