Acórdão nº 298/12.1TBAVV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Outubro de 2013
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 15 de Outubro de 2013 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os Juízes na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães * 1.Relatório. M.., D.. e M.., intentaram acção declarativa de condenação, na forma ordinária, contra ..Companhia de Seguros, S.A, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhes a quantia total de 120.000,00 € , acrescida de juros à taxa legal, vencidos desde a citação e vincendos até ao efectivo e integral pagamento, sendo ela/quantia devida a título de ressarcimento do dano não patrimonial próprio que sofreram com a morte do marido e pai, respectivamente, sendo a mesma devidamente repartida por todos, e cabendo €50.000,00 para a 1ª R. e €35.000,00 para cada um dos restantes AA.
Para tanto , alegaram os AA, em síntese, que : - No dia 08 do mês de Novembro do ano de 2011, em caminho Municipal de Arcos de Valdevez, ocorreu um acidente de viação com um tractor agrícola e em consequência do qual faleceu J.., sendo que os aqui AA. são , respectivamente, a ex-cônjuge viúva e os filhos da vítima falecida; - O acidente referido verificou-se quando o J.. , ao conduzir o tractor agrícola indicado, e ao descrever com ele uma curva, entrou em despiste, subindo o tractor uma barreira em rampa, acabando por se voltar e ficando voltado com as rodas para cima, e , tendo o condutor ficado debaixo do tractor, sofreu então diversos ferimentos, acabando em consequência dos mesmos por falecer; - Ora, porque à data do acidente o veículo tractor estava seguro na Ré Seguradora, garantindo o contrato de seguro a responsabilidade civil pelos danos emergentes de acidente de viação e, de entre os danos cobertos, incluem-se os danos de natureza não patrimonial próprios dos AA.,deve portanto a Seguradora indemnizar os danos morais que sofreram em consequência da morte de seu marido e pai, no acidente supra descrito.
1.1.- Após citação, a Ré Seguradora apresentou contestação, defendendo-se no essencial por impugnação e sustentando que , tendo o acidente ocorrido em razão de conduta do próprio segurado/falecido, não está sequer constituída na obrigação de indemnizar, pois que, no âmbito do contrato de seguro, apenas se obrigou ao pagamento das indemnizações devidas pelas lesões corporais ou materiais causadas a terceiros pelo tractor por aquele conduzido.
Ora, conclui a Seguradora, tendo o sinistrado sido o único culpado na produção do acidente que o vitimou, e porque não é sequer imaginável que, tirando as situações de existência de seguro de acidentes pessoais, o seguro de responsabilidade civil - destinado a conferir cobertura aos danos causados a terceiros por um veículo terrestre a motor - possa conferir de igual modo cobertura aos danos sofridos pelos herdeiros do condutor cuja actuação foi, sem qualquer contribuição de outrem, causadora da sua própria morte, deve a acção improceder.
1.2.- Apresentando os AA a réplica, seguiu-se a prolação do competente despacho saneador ( com dispensa da realização da audiência preliminar ), a fixação da matéria de facto assente e a organização da base instrutória da causa, procedendo-se finalmente à audiência de discussão e julgamento .
1.3.- Porque em sede de audiência de discussão e julgamento acordaram as partes no tocante à factualidade provada ( no âmbito de toda a incluída na base instrutória), e conclusos ao autos para o efeito, proferiu de seguida o tribunal a quo a sentença, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor: “(…) DECISÃO Pelo exposto decide-se julgar a presente acção totalmente improcedente e em consequência absolve-se a R. do pedido.
Custas pelos AA.
Registe e notifique.” 1.4. - Inconformado com a decisão/sentença indicada em 1.3., da mesma apelaram então os autores, apresentando os recorrentes na respectiva peça recursória as seguintes conclusões:
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A única questão a decidir nos presentes autos, face à inequivocidade dos danos sofridos pelos autores, é a de saber se estes, na qualidade de cônjuge e filhos do tomador do seguro e condutor do veículo que faleceu em consequência de acidente de viação ocorrido por sua culpa exclusiva, têm direito a uma indemnização, por danos próprios, como compensação pela tristeza, desgosto e sofrimento que aquela morte lhes causou.
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Está em discussão nos autos um contrato de seguro, titulado pela apólice nº 605933088, celebrado por J.., com a Ré “..Companhia de Seguros,S.A, mediante o qual aquele primeiro, na qualidade de proprietário do tractor agrícola de matrícula ..-TZ, transferiu para a ré a responsabilidade civil por danos causados a terceiros pela circulação deste veículo.
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Com o devido respeito por entendimento contrário, entendem os autores que atento o disposto nos artigos 496.º, n.º 2 e 4 e 499.º, ambos do Código Civil, e no artigo 14.º, n.º 1 do Dec. Lei 291/2007, impõe-se concluir que o cônjuge e filhos do condutor do veículo seguro revestem a qualidade de terceiros, assistindo-lhes o direito de exigir da ré seguradora indemnização pelos danos próprios, de natureza não patrimonial, sofridos com a morte daquele condutor.
Com efeito, d) Como se discorre no douto acórdão desta Relação de 07/02/2012, processo1210/11.0TBVCT.G1, disponível in www.dgsi.pt, a primeira Directiva 72/166/CEE do Conselho, de 24 de Abril de 1972, a segunda Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983, a terceira Directiva 90/232/CEE do Conselho, de 14 de Maio de 1990 e a quinta Directiva 2005/14/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Maio de 2005, limitaram-se a prever disposições mínimas para o tipo de danos pessoais e patrimoniais que devem ser cobertos pelo seguro e para as pessoas lesadas que têm direito a indemnização.
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Neste contexto, os Estados-Membros da União Europeia são obrigados apenas a garantir que o direito nacional esteja conforme às disposições destas directivas e assegure o seu efeito útil, tendo competência para alargar o âmbito da cobertura do seguro, desde que não coloque em causa o efeito útil das directivas.
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A problemática de saber se os danos próprios sofridos pelos familiares do condutor em consequência da morte deste estão, ou não, abrangidos pela cobertura do seguro obrigatório há-de ser resolvida no seio do direito interno de cada Estado-Membro.
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Ora, atento o disposto nos artigos 496.º, n.º4 e 499.ºdo Código Civil e no artigo 14.º, n.º 1 do Dec. Lei 291/2007, de 21 de Agosto, impõe-se concluir que o cônjuge e descendentes do condutor do veículo seguro, revestem a qualidade de terceiros, assistindo-lhes, por isso, o direito de exigirem da ré seguradora indemnização pelos danos próprios, de natureza não patrimonial, sofridos com a morte daquele condutor.
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Provados os danos dos autores, como bem resulta dos pontos 20 a 31 dos factos provados, revela-se justo e adequado, como compensação pelos danos não patrimoniais próprios sofridos pelos autores, a quantia de 120.000,00 €, sendo 50.000,00 € para o cônjuge e 35.000,00€ para cada filho.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, em conformidade com as conclusões que antecedem, assim se fazendo a habitual JUSTIÇA.
1.5.- Contra-alegando, veio a Ré Seguradora sustentar não impender sobre si qualquer obrigação de indemnizar os apelantes, razão porque deve ser negado provimento ao recurso interposto pelos Autores, com o que se fará, JUSTIÇA.
\ * Thema decidendum Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões ( daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória , delas não constando, têm de se considerar decididas e...
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