Acórdão nº 1387/11.5TBBCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 31 de Janeiro de 2013

Data31 Janeiro 2013

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

I - "F… Lda." intentou a presente acção de condenação, com a forma ordinária, contra o "Banco…, S.A, alegando, em síntese, que no 1º semestre de 2008 celebrou com a ré um contrato de locação financeira imobiliária que teve por objecto um pavilhão industrial; na sequência da celebração desse contrato, um responsável da dependência de Braga do réu incentivou a autora a celebrar um outro contrato com vista a fixar a taxa de juro dentro de determinados limites/barreiras, pois a prestação paga pela autora no contrato de locação financeira estava indexada à taxa Euribor e temia-se que essa taxa continuasse a subir. Aquele responsável referiu à autora que no contrato de taxa de juro que lhe pretendia propor fixava-se um limite da taxa de juro dentro da qual a autora apenas pagava a taxa de juro prevista no contrato, ou seja 4,55%, sendo que se essa taxa aumentasse até ao limite de 5,15%, a autora pagaria sempre aquela taxa inicial de 4,55%. Caso a taxa de juro ultrapassasse aquele limite, a autora teria que pagar a taxa de juro correspondente, perdendo todo e qualquer benefício. Nesse caso, o réu poderia fazer cessar o contrato; correspondentemente, caso a taxa de juro descesse até aos 3,95%, a autora continuaria a pagar a taxa de 4,55%, retirando daí o réu um benefício de 0,60%; e, caso a taxa de juro descesse abaixo dos 3,95%, a autora teria então também o direito de fazer cessar de imediato o contrato, por forma a pagar a taxa de juro real e efectiva. Com esta explicação do réu, a autora ficou convencida que o réu podia denunciar o contrato a partir da taxa de juro dos 5,15% e a autora, por sua vez, também o poderia fazer a partir dos 3,95%, e só por isso aceitou celebrar com o réu o referido contrato, o que aconteceu em 8/8/2008. Acresce que o contrato em causa foi apresentado à autora antecipadamente redigido pelo réu, com as condições que o réu aí pretendeu colocar; a autora apenas se limitou a assinar, nada lhe tendo sido lido, nem explicado. O legal representante da autora é pessoa muito simples, que tem apenas a instrução básica e nunca tinha contratado qualquer operação bancária especial ou complexa, sendo certo que nunca a autora se apercebeu que o contrato que assinava poderia acarretar qualquer risco e, consequentemente, a perda de valores significativos. Acontece que a partir do mês de Janeiro de 2009 a taxa de juro começou a descer a um ritmo acelerado, ultrapassando o limite de 3,95% e, em 29/6/2009, o réu debitou à autora o total de € 6.660,63. Nessa altura, a autora comunicou ao réu que pretendia imediato fim ao contrato, tendo o réu esclarecido que para o fazer teria de pagar um valor superior a € 50.000,00.

Mais alega a autora que crise económica e financeira que se instalou a partir de 15/9/2008, fez descer deforma acentuada as taxas de juro, pelo que o contrato celebrado sofreu um grande e repentino desequilíbrio, sendo certo que as circunstâncias que despoletaram a descrita crise financeira e económica não eram de modo algum previsíveis e, por isso, não podiam estar cobertas pelos riscos próprios do contrato.

Assim, a referida alteração anormal das circunstâncias permitirá sempre à autora pedir a resolução do contrato de taxa de juro em discussão nestes autos.

Com estes fundamentos, a autora pede que se declare nulo e de nenhum efeito o contrato objecto desta acção, condenando-se o réu a restituir a quantia de € 44.709,38, acrescida dos juros de mora que se vencerem a partir da citação; caso assim não se entenda, que se anule o contrato de swap de taxa de juro por erro na transmissão da declaração e erro sobre o objecto do negócio ou, caso assim não se entenda, que se declare resolvido o contrato por alteração anormal das circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar e, em qualquer um dos casos, ordenando-se a restituição à autora da quantia de e 44.709,38, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento.

O réu contestou, alegando que a celebração do contrato foi precedida de vários contactos entre autora e réu, com inúmeras trocas de correspondência, e uma reunião onde foram explicadas à autora as vantagens e desvantagens da cobertura da taxa de juro, com a proposta de várias soluções; acresce que o legal representante da autora sempre se fez acompanhar de alguém que se apresentava como assessor para estas matérias. Mais alega que o contrato de swap em questão cobre, nos seus precisos termos, o risco de variação de taxa de juro, mas não defende a autora de qualquer variação da taxa de juro, pelo que a ré impugna tudo o que a autora alega em contrário, defendendo que nunca fez crer à autora que esta poderia denunciar o contrato a partir dos 3,95%. Mais defende o réu que atenta a natureza do contrato de swap, o risco de alteração das taxas de juro não pode ser excluído do contrato, razão pela qual deve improceder o pedido de resolução por alteração das circunstâncias. Mais alega que a autora aceitou as consequências benéficas do contrato que agora pretende declarar nulo, pelo que a sua conduta excede os limites impostos pela boa-fé e pelos bons costumes, representando um grosseiro exercício do direito na modalidade de venire contra factum proprium.

A ré conclui pela improcedência da acção e pede a sua absolvição do pedido.

A autora replicou sem novidade.

Os autos prosseguiram e foi então proferida sentença na qual se decidiu: Pelo exposto, julgo a acção procedente e, em consequência, declaro a resolução do contrato de swap de taxa de juro com barreira celebrado pelas partes, condenando o réu a restituir à autora a quantia de € 44.709, 38 acrescida dos juros de mora que se vencerem desde a citação até efectivo cumprimento.

Inconformado o réu interpôs recurso, cujas alegações terminam com as seguintes conclusões: I. A sentença de que ora se recorre enferma de erro de julgamento, designadamente por incorrecta aplicação e interpretação de normas jurídicas, maxime do art. 437.º do Código Civil (doravante, o CC); II Na parte em que procede à resolução do contrato de SWAP por alteração das circunstâncias, a decisão de que ora se recorre a) assenta numa aplicação forçada - e portanto, necessariamente indevida - ao caso Sub Júdice do instituto da alteração das circunstâncias, previsto e regulado no art. 437.º e segs. do Código Civil; b) desconsidera o facto de estar em causa a resolução de um contrato de execução periódica, do qual resulta a exclusão das prestações já realizadas entre as partes do âmbito de eficácia da resolução; iii. A subsunção do acervo factual dado como provado, ao conjunto de pressupostos de cujo preenchimento depende a aplicação do instituto da alteração das circunstâncias, é inadequada e revela, portanto, uma incorrecta apreensão pelo tribunal a quo da configuração financeira do contrato de SWAP que subjaz aos presentes autos; iv. A afirmação de que a “repentina e acentuada descida da taxa de juro, como consequência da já mencionada crise financeira e económica, que não era de modo algum previsível, reflectisse directa e intrinsecamente no contrato de swap de taxa de juro, que tinha precisamente na sua essência e base a taxa de juro” (mantenha-se, ou não, apesar da impugnação a que se procedeu, o ponto 36 da matéria de facto dada como provada), deve ser entendida cum grano salis; v. A “essência” do contrato de SWAP reside no risco subjacente à variação da taxa de juro; vi. Qualquer variação – seja ela ascendente ou descendente – da taxa de juro, e independentemente do que a motivou, não pode, por isso, deixar de considerar-se abrangida pelo álea (ou risco) própria do contrato de SWAP; vii. Sendo essa variação que, por referência às barreiras – de valor de taxa de juro – acordadas entre as partes, irá ditar a maior ou menor onerosidade do contrato para cada uma delas; viii. O SWAP de taxa de juro é um tipo contratual marcadamente aleatório e a principal consequência da classificação do contrato de SWAP na categoria dos contratos aleatórios é a não aplicação do regime do 437.º do Código Civil sobre resolução com base na alteração das circunstâncias, em face de uma inesperada e grave evolução, para uma ou outra das partes, das taxas adotadas como referentes do contrato de SWAP celebrado; ix. Não deverá ser considerada como alteração das circunstâncias para efeitos do art. 437.º do Código Civil uma qualquer e inesperada reviravolta nas taxas de juro ou câmbio de mercado, pois neste caso a alteração verificada encontra-se abrangida pelo risco inerente e pela própria finalidade do negócio; x. Do teor do contrato de SWAP dos autos resulta claro e inequívoco que o risco de variação descendente da Euribor - independentemente da extensão dessa variação - foi expressa e contratualmente assumido pelas partes; xi. Qualquer variação da Euribor 3 meses abaixo da barreira contratada de 5,15% representa a concretização do risco a que as partes do contrato de SWAP se sujeitaram por via da respectiva...

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