Acórdão nº 1511/11.8TBGMR-E.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelMOIS
Data da Resolução17 de Janeiro de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO Apelante: A…, SA (credora).

Apelados: B…, Lda (insolvente), Ministério Público, C…- Sucursal Portuguesa (credora).

Tribunal Judicial de Guimarães - 5.º juízo cível 1. Por sentença proferida em 22.08.2012, foi recusada a homologação do plano de insolvência relativo a B…, Lda aprovado pela assembleia de credores, por violação não negligenciável de normas aplicáveis ao seu conteúdo, in casu, os art.ºs 30.º n.ºs 2 e 3 da Lei Geral Tributária, alterada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31.12 e 196.º do CPPT, na parte em que prevê o perdão de juros de créditos tributários e da Segurança Social, o pagamento em prestações em moldes não admitidos por lei (art.º 196.º do CPPT) e não prevê a prestação de garantia idónea (ao contrário do previsto no art.º 199.º do CPPT).

  1. Inconformada, veio A…, SA interpor recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões que se transcrevem: 1ª - A decisão em crise fez uma errada aplicação e interpretação do disposto no artigo 30.º n.º 3, da LGT, com a alteração que lhe foi introduzida pelo artigo 125.º, da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, razão pela qual não pode manter-se.

    1. - As alterações legislativas introduzidas pela Lei n.º 55-A/2010, de 31/12 (quer no seu art. 125.º quer na redação atribuída ao n.º 3 do art. 30.º da LGT) não impõem que se considere que as disposições do CIRE possam ser interpretadas no sentido de que os créditos tributários não são disponíveis e que, nessa medida, não pode ser homologado um plano de insolvência em que esteja incluído um perdão ou qualquer redução de um crédito tributário.

    2. - As alterações legislativas introduzidas pela Lei n.º 55-A/2010, de 31/12 (quer no seu art. 125º quer na redacção atribuída ao n.º 3 do art. 30.º da LGT) não contendem com os argumentos e fundamentos da Jurisprudência maioritária anteriormente fixada que considera que, não obstante o disposto no n.º 2 do art.º 30.º da LGT, nos art.ºs 196.º e 199.º do CPPT e no DL 411/81, de17.10, o regime das dívidas à Administração Fiscal e à Segurança Social se sujeitava à decisão dos credores na aprovação do Plano de Insolvência, permitindo-se, assim, a modificação dos seus créditos, isto porque: a) face à natureza especial do Processo de Insolvência e à filosofia geral da lei no sentido de privilegiar a recuperação das empresas, têm-se por derrogáveis as normas dos regimes previstos em normas legais, designadamente de carácter tributário; b) as normas imperativas de carácter tributário, designadamente no que toca à sua indisponibilidade e concessão de moratórias no seu pagamento, servem mormente para impor à Administração Fiscal e da Segurança Social o cumprimento dos procedimentos normais para que foram criadas; c) não tendo o legislador, no art.º 196.º n.º 2 do CIRE, excluído da auto-regulação no plano de insolvência os créditos fiscais do Estado e da Segurança Social, só pode entender-se que o plano de insolvência pode afetar estes créditos; d) as normas tributárias, mesmo sendo de caráter público e imperativo, “têm o seu campo de aplicação na relação tributária, em sentido estrito, não encontrando apoio no contexto do processo especial como é o processo de insolvência, onde o Estado deve intervir também com o fito de contribuir para uma solução, diríamos, de olhos postos na insolvência, se essa for a vontade dos credores, numa perspetiva ampla de auto-regulação de que a desjudicialização” - Ac. STJ de 13/01/2009, processo 08A3763, disponível in www.dgsi.pt; 4ª - As normas tributárias relativas à indisponibilidade dos créditos da Administração Tributária e da Segurança Social têm o seu âmbito de aplicação limitado às relações jurídico-tributárias estabelecidas entre aqueles e os contribuintes e regulam estritamente a actuação da Administração Tributária e da Segurança Social nessas estritas relações, não sendo aplicáveis ao processo de insolvência, e isto porque: a) a LGT apenas “regula as relações jurídico-tributárias”, considerando-se “relações jurídico-tributárias as estabelecidas entre a administração tributária, agindo como tal, e as pessoas singulares e coletivas e outras entidades legalmente equiparadas a estas.” - cfr. art. 1.º da LGT - pelo que qualquer disposição nela prevista, designadamente aquelas que foram introduzidas pela Lei n.º 55-A/2010, não contende manifestamente com o previsto na legislação especial do CIRE; b) a alteração introduzida pelo n.º 3 do art.º 30.º da LGT reconduz-se à indisponibilidade dos créditos tributários a que alude o n.º 2 do mesmo artigo, sendo que esta apenas diz respeito à relação tributária estabelecida entre o Estado e os contribuintes; c) o art. 125.º da Lei n.º 55.º-A/2010 dita apenas que tal indisponibilidade (repete-se, no âmbito das relações entre o Estado e os devedores prevista no n.º 2 do art. 30º da LGT) verifica-se igualmente nos processos de insolvência, daí não decorrendo senão que a Administração Tributária e a Segurança Social está impedida de dispor livremente do seu crédito também nos processos de insolvência, tal como sucede nos procedimentos e processos tributários; d) da letra da Lei n.º 55.º-A/2010 não resulta que a mesma se sobrepõe ao que mostra legislado em legislação especial (CIRE).

    3. - A indisponibilidade do crédito tributário a que alude o n.º 2 do art. 30.º da LGT significa apenas que a administração tributária não pode dispor livremente desse crédito, isto é prevê um limite legal à atuação da administração tributária, no sentido de não poder ela própria, por mero ato administrativo tributário, conceder moratórias, renunciar ao pagamento ou alterar as condições de pagamento das dívidas tributárias, mas tal não significa que, mesmo não o aceitando, não se submeta às regras especiais do processo de insolvência e mormente à decisão maioritária dos credores.

    4. - A alteração legislativa levada a cabo na LGT não se repercutiu em qualquer alteração legislativa no CIRE, pelo que se tem de entender que o CIRE mantém o seu campo de aplicação integral e estabilizado, aplicando-se, sem quaisquer restrições aos créditos do Estado.

    5. - A interpretação a atribuir quer ao n.º 3 do art. 30.º da LGT, quer ao art.º 125º da Lei .º 55-A/2010, não pode ser outra senão aquela de que o legislador não pretendeu com as mesmas inverter os princípios previstos no CIRE quanto à aprovação e homologação de um Plano de Insolvência e fazer sobrepor tais normas ao regime legal especial do CIRE, até porque interpretação contrária sempre seria contra legem, e isto porque: a) do texto do n.º 3 do art. 30.º da LGT e do art. 125º da lei n.º 55-A/2010 não resulta um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso, de que o legislador pretendia extrair efeitos da indisponibilidade do crédito que fossem para além da relação jurídica tributária - cfr. n.º 2 do art.º 9.º do Código Civil – desde logo porque a LGT limita-se a regular a atuação da Administração, pelo que é impossível retirar da letra da lei inserta em tal diploma legal que o legislador quisesse extrapolar os efeitos que o próprio Diploma tem; b) face à vastíssima Jurisprudência existente a propósito do...

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