Acórdão nº 337/12.6TBVVD.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Março de 2013

Magistrado ResponsávelMARIA DA PURIFICA
Data da Resolução04 de Março de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Relatório A presente acção declarativa constitutiva, com processo comum ordinário foi intentada por M… casada, residente na Rua… , Vila Verde, contra J…, solteiro, residente Lugar da…, Vila Verde pedindo que a autora seja reconhecida como filha do réu para todos os efeitos legais.

Para fundamentar este pedido alegou em síntese que "A mãe da autora conheceu o réu no ano de 1955 quando foi trabalhar como criada para a casa do Srº Z… e de Dona M….

Cerca de dois anos depois começaram a namorar, tendo na altura a mãe da autora 18 anos e o réu 22.

Este namoro era do conhecimento dos patrões, das filhas destes e dos vizinhos e da irmã da mãe da autora.

Por volta do ano de 1966 o patrão da mãe da autora ficou bastante doente tendo ido morar para a cidade de Braga com a esposa e filhas.

A mãe da autora ficou a morar sozinha na casa dos patrões para tomar conta da mesma bem como dos animais domésticos Como não havia mais ninguém em casa o réu por vezes dormia lá, tendo o réu e a mãe da autora mantido relações sexuais de cópula com frequência.

A partir dessa altura (ano de 1966) e até ao momento em que a mãe da autora descobriu que estava grávida ( Julho de 1968) esta manteve exclusivamente relações sexuais com o réu. Tendo a autora nascido a 24 de Dezembro de 1968.

Ao longo dos anos e apesar da insistência da autora a sua mãe nunca lhe revelou a identidade do pai.

Há cerca de 3 anos a mãe da autora sofreu acidente vascular cerebral que lhe afectou a capacidade de locomoção.

No início de 2010 a mãe da autora necessitou de um documento que havia desaparecido. Devido à dificuldade de locomoção a autora na procura do documento encontrou numa gaveta da cómoda do quarto da mãe a fotografia de um homem.

Intrigada com o achado e perturbada pelas semelhanças físicas que constatou ter com o homem retratado na foto perguntou á mãe de quem se tratava.

Ao ver-se confrontada com a foto e com as perguntas da filha a mãe da autora acabou por confessar que o homem retratado era o pai da autora.

A mãe da autora só com o réu manteve relações sexuais".

O R. J…, veio, na contestação por si apresentada, arguir a excepção caducidade do direito de acção da A., pelo decurso do prazo de 10 anos previsto pelo nº 1 do artº 1817º, aplicável por remissão do artº 1873º, ambos do Cód. Civil, alegando, em suma, que o direito de a A. intentar a acção se encontra extinto, por caducidade, desde 1986, designadamente desde a data em que perfizeram 10 anos sobre a maioridade daquela.--- Replicando, veio a A., face ao alegado pela contraparte, pugnar pela improcedência da invocada excepção peremptória, designadamente defendendo, na esteira de alguns arestos da jurisprudência dos Tribunais superiores, que o artº 1817º, nº 1 do Cód. Civil, na redacção dada pela Lei nº 14/2009, aplicável ex vi do artº 1873º, ambos do Cód. Civil, continua a contraria o constante nos artºs 18º, nº 3, 26º e 36º, nº 1 da CRP, sendo, por isso, materialmente inconstitucional.--- Seguiu-se a prolação de despacho saneador-sentença com o seguinte teor final "Em face do que – e face ao juízo de não inconstitucionalidade - haverá que concluir pela aplicação da norma em questão – artigo 1817.º, n.º 1 do Código Civil – julgando procedente a excepção da caducidade, nos termos em que a mesma foi invocada, pelo decurso do prazo de 10 anos posteriores à maioridade ou emancipação da investigante, o que se decide em conformidade e, em consequência, absolve-se o Réu do pedido contra si formulado.--- Custas pela Autora.--- Registe e notifique".--- Apelou a Autora, concluindo do seguinte modo as suas alegações de recurso: I-A nova Lei 14/2009 de 1 de Abril, ao fixar um prazo de dez anos para além da maioridade ou a emancipação para a interposição da acção de investigação, é manifestamente inconstitucional.

II- E é manifestamente inconstitucional, por a mesma vir ao arrepio e contra aquele que já é o entendimento pacifico da mais hodierna concepção do direito à identidade pessoal, que inclui, não apenas o interesse na identificação pessoal, na não confundibilidade com os outros e na constituição daquela identidade, como também, enquanto pressuposto para esta auto- definição, o direito das próprias raízes, de um direito à historicidade pessoal- Gomes Canotilho e Vital Moreira.

III- E, ao seguir literalmente esta Lei, a sentença recorrida viola claramente o entendimento consagrado no Acórdão 23/2006 de 10.1.2006, publicado no DR de 8.2.2006, I série, pags. 1026/1034, a qual se decidiu pela inconstitucionalidade com força obrigatória geral do prazo de caducidade do nº 1 do art. 1817º de C.C., implicando tal declaração a remoção da norma do ordenamento jurídico, não podendo, portanto, a mesma ser aplicada pelos tribunais( art. 204º da CRP) IV-É verdade que o referido Acordão se pronunciou sobre o art. 1817º do CC., na sua redação anterior à Lei 14/2009, no entanto, também não é menos verdade, que as razões que estão subjacentes à declaração de inconstitucionalidade referidas no citado acórdão do TC se mantêm inteiramente válidas.

V- Deste modo, não podemos concordar com a douta sentença recorrida de que a referida inconstitucionalidade não abrange a actual redação da referida disposição legal, nem podemos concordar com o entendimento do Tribunal recorrido de que o legislador actual ao aumentar o prazo da caducidade sanou a referida inconstitucionalidade.

VI- Não deixando a estipulação de um prazo mais alargado do actual 1817º nº 1, de constituir uma restrição ao conhecimento e reconhecimento da paternidade, enquanto direito fundamental.

VII- E, apesar do Réu ter direito à reserva da intimidade da vida privada e à segurança jurídica das suas relações familiares, no entanto esta...

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