Acórdão nº 1747/10.9TBVRL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelISABEL SILVA
Data da Resolução03 de Novembro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I - HISTÓRICO DO PROCESSO 1. Em ação instaurada em 17/07/2010, que recebeu o nº 1160/10.8TBVRL, por B. e o marido C. contra D., E., F., e esposa G., pretendiam os Autores que lhes fosse reconhecido o direito de preferência na compra de metade de determinado prédio rústico vendido pelo 1º e 2ª Réus aos 3ºs Réus, substituindo-os na compra, ordenando-se o cancelamento na Conservatória do Registo Predial do registo efetuado a favor dos 3º Réus.

Alegaram os Autores, em resumo, serem comproprietários do dito prédio, na proporção de metade, com o Réu D., sendo a Ré E. usufrutuária; que, em 2009, estes Réus venderam ao F. a quota de 1/2 do direito de propriedade referente ao dito prédio, bem como o direito de usufruto, sem que lhes tivesse dado o direito de preferência, nem comunicado as condições do contrato.

Apenas contestou o réu F.. Para além de impugnar a factualidade alegada, excecionou com o uso anormal do processo, com a caducidade do direito de ação, a renúncia ao direito de preferência e a simulação quanto ao preço de alienação dos direitos de propriedade e de usufruto.

Em reconvenção, a título subsidiário, deduziu pedido de condenação dos Autores a pagar-lhe € 8.900,00, correspondente ao diferencial entre o montante depositado pelos autores e o preço por ele efetivamente pago.

Os Autores ainda replicaram.

Os réus E. e D. apenas requereram a suspensão da instância até à prolação da decisão definitiva a proferir no processo n.º 1747/10.9TBVRL, que por eles havia sido instaurada em 18/11/2010, contra F., e esposa G..

Em 20/12/2011 foi determinada a apensação da ação nº 1160/10.8TBVRL ao processo n.º 1747/10.9TBVRL.

Em 28/02/2012 foi declarada a suspensão da instância quanto à ação nº 1160/10.8TBVRL até se mostrar decidida a causa que corria termos no processo n.º 1747/10.9TBVRL.

Por despacho proferido em 15/10/2014, foi julgada deserta a instância no processo n.º 1747/10.9TBVRL, por falta de iniciativa processual, exceto no tocante à ação nº 1160/10.8TBVRL.

Retomando os autos da ação nº 1160/10.8TBVRL o seu curso, foi proferido despacho saneador, no qual se julgou inadmissível a reconvenção e se selecionou a matéria de facto pertinente.

Realizada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que decidiu: «

  1. Reconhecer aos autores B. e C. o direito a preferirem aos réus F. e G. na transmissão efectuada por D., no acto notarial identificado no facto provado n.º 4, de metade do direito de propriedade relativo ao prédio rústico sito na freguesia de …, inscrito na matriz predial sob o artigo …, condenando-se os indicados réus a reconhecê-lo; b) Julgar improcedente o pedido de reconhecimento formulado pelos autores B. e C. do direito a preferirem aos réus F. e G. na transmissão efectuada por E., no acto notarial identificado no facto provado n.º 4, do usufruto referente a metade do direito de propriedade relativo ao prédio rústico sito na freguesia de …, inscrito na matriz predial sob o artigo …, absolvendo-se os indicados réus de tal pretensão; c) Determinar a substituição dos réus F. e G. pelos autores B. e C. na escritura pública identificada no facto provado n.º 4, quanto à alienação efectuada pelo réu D. e, consequentemente, considera-se transmitida a favor dos autores a quota identificada em a); d) Cancelar os registos efectuados a favor dos réus F. e G., quanto ao imóvel identificado no facto provado n.º 1, na sequência da aquisição indicada em a);» 2. Inconformados, vêm os Autores apelar para este Tribunal da Relação, formulando as seguintes CONCLUSÕES: «1)- A Ação de preferência instaurada pelos AA. deveria ter sido julgada totalmente procedente, face aos documentos juntos aos autos e à matéria de facto provada.

    2)- Os AA., são consortes do direito de usufruto, na proporção de metade (1/2), com a R. E., sendo contitulares ou consortes de direitos reais sobre o prédio rústico inscrito na matriz rústica da Freguesia de …ob o artº … pois os AA. eram co-usufrutuários do prédio rústico, na proporção de metade (1/2), com a R. E. e eram comproprietários, da nua propriedade, na proporção de metade (1/2), com o Filho desta, o R. D., porque o direito de compropriedade de metade dos AA. era pleno, o que resulta da certidão do registo predial junta com a P.I.

    3)- O artº 1403º do Código Civil define a compropriedade, mas o artº 1404º do C.Civil, prescreve que “As regras da compropriedade são aplicáveis, com as necessárias adaptações, à comunhão de quaisquer outros direitos, sem prejuízo do disposto especialmente para cada um deles”.

    4)- Pelo que o direito de preferência legal, no caso de venda do co-usufruto, como é a situação também nos autos, está expressamente prevista neste artº 1404º do C.C., não sendo caso omisso, como por lapso manifesto constou da douta Decisão proferida, o que deverá ser retificado.

    5)- Neste sentido, e seguindo a anotação do artº 1404º do C.C., em Código Civil anotado, vol. III, de Pires de Lima e Antunes Varela, 2ª ed., pág. 350, os Insignes Professores escreveram: “2. A regulamentação da compropriedade como figura paradigmática da comunhão justifica-se plenamente, pois é em relação ao domínio, especialmente sobre coisas imóveis, que as situações de contitularidade de direitos surgem com mais frequência e assumem maior importância”.

    6)- “(…) o artigo 1404º manda aplicar subsidiariamente as regras da compropriedade à comunhão de quaisquer outros direitos”.

    7)- “Entre os casos de comunhão assumem especial relevo a contitularidade de direitos reais, (…)”, “No primeiro grupo, além do co-usufruto, do co-uso ou habitação, (…) da co-superfície, figura a compropriedade intelectual”.

    8)- “3. Entre os efeitos do regime subsidiário instituído pelo artigo 1404º destacam-se a aplicação do direito de preferência (arts. 1409º e 1410º)”.

    9)- Pelo que as regras da preferência legal aplicáveis á venda de ½ do direito de nua compropriedade aplicam-se por força deste dispositivo legal à venda de ½ do co-usufruto, pelo que o direito de preferência legal dos AA. na sua compra, abrange ambos os direitos, e consequentemente, por se verificarem os demais pressupostos, sobre ambos os direitos dos RR. vendedores, lhes deverá ser reconhecido o direito preferência aos AA.

    10)- O escopo legal imanente á preferência legal, com regime imperativo, e visando impedir que com a entrada de Terceiros se frustrem os fins unitários de exploração e rentabilização da exploração para a titularidade singular, sendo até o direito que é hierarquicamente o 1º na preferência, quando se é consorte, sairia assim totalmente gorado.

    11)- Também em idêntico sentido, em anotação ao artº 1404º do C.Civil, Abílio Neto e Herlander Martins, 5ª ed., 1984, pág. 773, escreveram: “A aplicação das regras da compropriedade à comunhão de quaisquer outros direitos tem importância, designadamente para efeitos do direito de preferência.” (…), o qual invoca Mota Pinto, em Direitos Reais, pág. 252.

    12)- Aliás as regras da compropriedade são referenciais para outros direitos, nomeadamente o de preferência. Neste sentido, a propósito da análise do direito de preferência, em Direito Civil, Reais, Coimbra Editora, 4ª ed., do Prof. José de Oliveira Ascensão, na pág. 513 e ss. o mesmo refere: “As preferências legais resultam automaticamente da verificação de dadas situações, e vêm reguladas a propósito de cada uma delas. São típicas. A figura-padrão continua a ser o direito de preferência do comproprietário.” 13)- “Estas preferências são em extremo numerosas na lei portuguesa, muito mais do que em qualquer outra ordem jurídica que conheçamos. Normalmente, surgem em hipóteses de sobreposição de direitos reais. Além da existente na comunhão, temos a preferência do arrendatário comercial e assim por diante”.

    14)- Além disso, o direito de co-usufruto da Vendedora E. já se extinguiu, no exato momento da venda da respetiva metade, em simultâneo com a venda de metade da nua propriedade por porte do R. D., pois nesse exato momento reuniu-se a metade do co-usufruto com a metade da nua compropriedade, no mesmo Adquirente, como resulta do artº1476º, nº 1, al. b) do Código Civil.

    15)- Direito agora que de plena compropriedade de metade, ou seja, reunindo a metade do co-usufruto da R. E., com a metade da nua compropriedade do R D., e que por prelação, preempção ou preferência asiste aos AA.

    16)- Porque os AA. eram os comproprietários plenos da outra metade do imóvel, ou seja, a A. B. era consorte ou contitular de metade do usufruto com a R. E. e consorte de metade da nua compropriedade ou da raiz com o R. D..

    17)- Direitos que ambos se reuniram, no momento das duas vendas simultâneas, dando-se a respetiva extinção do co-usufruto e o direito de preferência dos AA. Na aquisição da plena metade ou compropriedade do referido prédio rústico objeto da Ação.

    18)- Situação que demanda e justifica a preferência legal que a Lei justamente lhes concede, nos supra citados incisos legais e deveria ter conduzido ao reconhecimento e condenação dos RR. nos pedidos formulados pelos AA. nos seus precisos termos.

    19)- Este artº 1404º do C.C. é a norma jurídica expressa para a situação em apreço, a qual por sua vez manda aplicar as regras da compropriedade, norma que existe no nosso ordenamento jurídico e devia ter sido aplicada e que só por mero lapso ou erro manifesto o não terá sido.

    20)- Com o devido respeito, o douto Acórdão citado na douta Sentença, refere-se à inexistência do direito legal de preferência do usufrutuário, no caso de venda da raiz ou nua propriedade, que não é o caso versado nos autos e por isso inaplicável.

    “I - O usufrutuário não goza do direito de preferência na venda ou dação em cumprimento do prédio sobre o qual incide o usufruto.

    II - As situações de preferência legais resultam directamente da lei e dada a sua natureza de direito real não é lícito fazer qualquer aplicação analógica a respeito de casos omissos.” 21)- O caso dos autos não é uma situação omissa na lei, pois se lhe aplica por...

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