Acórdão nº 704/12.5TTVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelALDA MARTINS
Data da Resolução12 de Julho de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Relatório B… intentou acção declarativa de condenação, com processo especial emergente de acidente de trabalho, contra Companhia de Seguros C…, S.A. e D…, Empresa de Trabalho Temporário, S.A., pedindo a condenação das RR. no pagamento: - da pensão a calcular de acordo com a IPP que vier a ser fixada pela junta médica; - de € 8,00 de deslocações a tribunal e actos médicos; - de € 33,86 de despesas de farmácia; - de € 380,20 de despesas hospitalares; - de € 254,00 de despesas com aquisição de óculos.

As RR. apresentaram contestação.

Foi proferido despacho saneador, fixada a factualidade assente e organizada a base instrutória.

Procedeu-se à realização de audiência de julgamento, no termo da qual foi proferido despacho de decisão da matéria de facto constante da base instrutória.

No apenso próprio, foi decidido que o A. se encontra curado com uma IPP de 2%.

Seguidamente, pelo Mmo. Juiz a quo foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «Assim, e face a tudo o exposto, decide-se: Condenar a R. seguradora a pagar ao A. o capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia de €123,66, com início no dia 15/9/2011, bem como €8,00 de despesas de transportes, €33,86 de despesas de farmácia e €17,20 de taxas moderadoras; Condenar a R. empregadora a pagar ao A. o capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia de €61,14, com início no dia 15/9/2011; Condenar ambas as RR. no pagamento de juros de mora, nos termos supra referidos.

Custas pelas RR. na proporção da respectiva responsabilidade.

Valor da causa: €3.070,56.» A R. Seguradora, inconformada, interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões: «I. Da fundamentação do tribunal recorrido decorre que este optou por uma interpretação estritamente formalista e, assim, incorrecta do plasmado no artigo 8º da Lei 98/2009, de 4 de Setembro, demitindo-se da função de julgador, enquanto intérprete das normas plasmadas nos preceitos em apreço e respectiva subsunção dos factos a tais normas.

  1. Ao contrário do sustentado pelo tribunal recorrido, a defesa da recorrente não assentou na mera inexistência de relação de causalidade entre o trabalho do sinistrado e o evento descrito nos autos.

  2. Conforme bem resulta do alegado nos artigos 19º a 28º da contestação da ora apelante - que aqui se reitera -, sustentou esta, ali, que o evento em apreço não configurou, pois, um qualquer acidente de trabalho, sendo antes decorrente de uma brincadeira entre dois trabalhadores, na qual o apelado participou de livre e espontânea vontade, sem qualquer nexo causal com a actividade profissional dos trabalhadores, a qual nem sequer estavam a desenvolver naquele momento, IV. e sem qualquer nexo com a relação laboral estabelecida entre o trabalhador, aqui apelado, e a entidade patronal ou o risco de autoridade exercido por esta sobre aquele, sendo que ocorreu no local de trabalho como poderia ter ocorrido em qualquer outro local.

  3. O sustentado pela apelante na sua contestação – e que ora mantém -, é que a brincadeira voluntariamente desenvolvida pelo sinistrado com outro trabalhador não teve qualquer nexo com a relação laboral estabelecida entre o trabalhador, aqui apelado, e a entidade patronal ou o risco de autoridade exercido por esta sobre aquele, subtraindo, assim, o evento ao controlo e autoridade patronal, e impedindo, dessa forma, que o mesmo preenchesse, como não preencheu, os pressupostos de qualificação legal como acidente de trabalho.

  4. Na verdade, o evento em apreço não pode ser apreciado de forma absolutamente formalista, como o faz o tribunal recorrido, que, observando um evento no local de trabalho, em tempo de trabalho e nexo entre o evento descrito e a lesão alegada, dá, tout court, como preenchido o conceito legal de acidente de trabalho.

  5. Admitindo como correcto um comportamento do apelado e colega que não reveste qualquer ligação ao conceito de acidente de trabalho, nem o legislador, certamente, quis englobar tal tipo de situações nesse mesmo conceito VIII. Omitindo o tribunal recorrido qualquer pronúncia quanto ao nexo do evento em apreço com a relação laboral estabelecida entre o trabalhador, aqui apelado, e a entidade patronal ou o risco de autoridade exercido por esta sobre aquele, quando foi precisamente esse nexo que a recorrente afirmou não existir, sendo o mesmo necessário para se poder concluir pela existência de um acidente de trabalho.

  6. Do sustentado pelo Supremo Tribunal de Justiça resulta que para o preenchimento da definição legal de acidente de trabalho exige-se a verificação de um elemento espacial (em regra, o local de trabalho) e de um elemento temporal (que em regra se reconduz ao tempo de trabalho) que expressem uma adequada conexão com a prestação laboral, nexo que se “preenche sempre que o trabalhador se encontre naquele local, naquele momento e naquelas circunstâncias em virtude do seu trabalho.

  7. ... Ora, na situação em apreço o sinistrado envolveu-se com outro colega, voluntariamente, numa brincadeira de atirar rolamentos um ao outro, acabando um deles por atingir o sinistrado e provocar as lesões em causa nos autos.

  8. Pelo que, tal conduta implica necessariamente que a causa do dano não estava incluída dentro de uma certa zona de riscos de alguma forma ligados à prestação de trabalho, uma vez que o recorrido nem sequer estava a executar tal prestação de trabalho no momento que deu origem às lesões invocadas, subtraindo-se, com tal conduta, o sinistrado ao controlo e autoridade da sua entidade empregadora ou patronal, pelo que ao risco de autoridade exercido por esta sobre aquele, dado que a mesma não se inseria, como é facto notório, nas funções a serem por si executadas na sua actividade laboral.

  9. Isto é, com a sua conduta, o recorrido colocou-se “ao lado” da relação laboral estabelecida com a sua entidade patronal, ainda que estivesse em local e tempo de trabalho.

  10. Antes tendo sido o próprio recorrido, em virtude da sua conduta, a criar o risco que depois, previsivelmente, veio a concretizar-se, não tendo o mesmo decorrido de qualquer circunstância relacionada com a relação laboral existente entre o recorrido e a sua entidade patronal.

  11. De tudo o exposto resulta, assim, ao...

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