Acórdão nº 218/10.8TBMNC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Janeiro de 2016
Magistrado Responsável | MARIA CRISTINA CERDEIRA |
Data da Resolução | 14 de Janeiro de 2016 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO X... e mulher M... apresentaram-se à insolvência, formulando, ainda, o pedido de exoneração do passivo restante, nos termos do disposto nos artºs 235º e seguintes do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante CIRE).
Por sentença proferida em 14/05/2010 foi declarada a insolvência dos requerentes (fls. 44 a 47).
Em 6/07/2010, o Sr. Administrador da Insolvência elaborou Relatório nos termos do artº. 155º do CIRE, no qual se pronunciou favoravelmente sobre o pedido de exoneração do passivo restante (fls. 114 a 120).
Na Assembleia de Credores para apreciação do Relatório realizada em 13/07/2010, os presentes pronunciaram-se sobre o pedido de exoneração do passivo restante nos seguintes termos: o Sr. Administrador da Insolvência propôs a imediata liquidação do activo e reiterou a posição de concessão da exoneração do passivo restante já expressa no seu Relatório, sendo que os credores presentes E..., G..., S.A. e J... Lda. não se pronunciaram sobre o pedido de exoneração do passivo restante (fls. 144 e 145).
Nessa diligência realizada em 13/07/2010 foi proferido despacho que admitiu liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante, nos seguintes termos [transcrição]: «No que respeita ao pedido apresentado pelos insolventes, atenta a posição expressa pelo Sr. Administrador e não havendo qualquer motivo para indeferimento liminar, nos termos do disposto no art.º 239º, nº l do C.I.R.E., admite-se liminarmente o mesmo.
Determina-se ainda que seja dado integral cumprimento ao disposto no nº 2 do art.° 239° do mesmo código.
Além disso, uma vez que não existe qualquer outro pedido de esclarecimento determina-se que, tal como sugerido pelo Sr. Administrador, o processo siga os demais termos descritos na Lei (art.° 158° e seguintes do C.I.R.E.).» Em 8/03/2011 vieram os insolventes requerer que fosse entregue ao Fiduciário o montante mensal de € 75, tendo em consideração os rendimentos que auferem e o valor que necessitam para viver e fazer face às despesas comuns do casal e dos seus três filhos menores, necessitando um deles de educação e cuidados especiais (fls. 171 a 174).
Notificados o Administrador da Insolvência e a Comissão de Credores, estes nada vieram dizer, tendo em 2/06/2011 sido proferido o seguinte despacho [transcrição]: «FIs. 171 a 177: Nada a determinar, uma vez que no despacho inicial proferido sobre a exoneração do passivo restante, já foi ordenado o cumprimento do disposto no n.° 2 do art. 239° do C.I.R.E., constando do n.° 3 do mesmo preceito o elenco dos rendimentos que integram o rendimento disponível.
Notifique.» Por requerimento apresentado em 15/06/2013, vieram os insolventes pedir, face ao agravamento da sua situação financeira, que fosse autorizada a dispensa de entrega de qualquer montante ao Fiduciário até ao final do ano de 2013, ao qual o Administrador da Insolvência não se opôs (fls. 298, 299 e 308), tendo tal pretensão dos requerentes sido deferida por despacho de 3/07/2013 (fls. 312).
Em 19/12/2014 a Mª Juíza “a quo” proferiu despacho a determinar que o Administrador da Insolvência desse pagamento aos credores em função do mapa de rateio que foi elaborado e não sofreu qualquer reclamação, e a declarar encerrado, após a realização do rateio final, o presente processo de insolvência (fls. 369 e 370).
Em 6/02/2015 foi proferido o seguinte despacho [transcrição]: «Verifico agora pela análise do despacho de fls. 145 que foi admitido o pedido de exoneração do passivo restante apresentado pelos devedores, não se tendo, porém, fixado o valor do rendimento isento de cessão.
Assim, decido isentar da cessão o valor correspondente ao de um salário mínimo nacional por cada devedor.
Notifique, incluindo o fiduciário designado que deverá, oportunamente, dar cumprimento ao disposto no art. 240.°, n.° 2, do CIRE.
Atente-se que o período de cessão se deverá contar por referência à data do encerramento do processo (cfr. art. 239.°, n.° 1, do CIRE).» Em 18/02/2015 vieram os insolventes requerer a exclusão da cessão da totalidade do seu rendimento disponível, que ultrapassa em pouco 3 vezes o salário mínimo nacional, alegando, para tanto, que o insolvente marido desde Maio de 2013 se encontra incapacitado para o trabalho, auferindo apenas o subsídio de doença no montante de € 375,90 e a insolvente mulher aufere o salário base ilíquido de € 1 982,40 (a que corresponde a quantia líquida de aproximadamente € 1 316,89), o que perfaz o montante global líquido mensal disponível para o agregado de € 1 702,79; têm 3 filhos, dois dos quais são menores, sendo um deles portador de trissomia 21, o que acarreta mensalmente elevadas despesas com consultas médicas, tratamentos médicos e terapêuticos e deslocações, encontrando-se o filho maior a frequentar o Curso de Engenharia ... na Universidade do Porto, cabendo aos insolventes assegurar, para além da renda da casa que o filho partilha com um colega, implicando para ele um encargo mensal de € 225, as despesas básicas para ele prosseguir os seus estudos de cerca de € 300 por mês.
Caso assim não se entenda, requerem que seja mantida e fixada a quantia mensal de € 75 que têm vindo a entregar mensalmente ao Fiduciário (fls. 435 a 447).
Notificado o Administrador da Insolvência e os credores, estes nada vieram dizer, tendo a Mª Juíza “a quo”, em 9/04/2015, proferido o seguinte despacho [transcrição]: «Fls. 436 e ss.: Considerando o silêncio dos credores e que, da análise das certidões de fls. 485 e ss., resulta demonstrado que os devedores têm três filhos, facto não atendido no despacho de fls. 428, decido elevar o rendimento isento de cessão para 1,75 salários mínimos nacionais por cada devedor.
Notifique.» Inconformados com tal decisão, os insolventes dela interpuseram recurso, extraindo das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]: 1. Vem o presente recurso interposto do douto despacho que decidiu isentar aos devedores o valor de 1,75 salários mínimos nacionais por cada um, em sede de exoneração do passivo restante, e que omitiu pronúncia quanto ao facto de aos mesmos ter vindo a ser apreendida, para entrega ao Fiduciário nomeado nos autos, parte do salário e isto desde Julho de 2011.
-
Nos termos do disposto no n.º 3, al. b) do art.º 239.° do CIRE, considera-se que integram o rendimento disponível todos os rendimentos que advenham a qualquer título ao devedor, com exclusão do que seja razoavelmente necessário para assegurar o sustento minimamente digno do devedor e do seu agregado familiar, não devendo exceder, salvo decisão fundamentada do juiz em contrário, três vezes o salário mínimo nacional.
-
O agregado familiar dos Recorrentes é composto pelos insolventes e seus 3 filhos, dois dos quais são menores e um destes, D..., com necessidades educativas e cuidados especiais, de natureza permanente, em virtude de ser portador de trissomia 21; condição esta que acarreta elevadas despesas mensais com tratamentos médicos e terapêuticos.
-
Acresce que, naturalmente, os Recorrentes necessitam de dispor de recursos básicos para viver e fazer face às despesas comuns mensais de um casal, nomeadamente, com a educação do outro filho menor, e do filho que, sendo maior, não aufere quaisquer rendimentos, encontrando-se a frequentar o ensino superior na Universidade do Porto e na condição de deslocado.
-
Considerando-se a dimensão do agregado familiar e sua especificidade, os seus rendimentos e as suas despesas, entende-se estar devidamente justificada a exclusão de um valor superior ao fixado - de 3 vezes o salário mínimo nacional, conforme consagrado no art.º 239.° n.º 3, al. b) do CIRE; pois tal afigura-se absolutamente necessário para assegurar o sustento minimamente digno dos devedores e respectivo agregado familiar.
-
A ponderação a efectuar, face aos interesses dos credores, não pode desconsiderar a garantia do mínimo necessário ao sustento digno do devedor e do seu agregado familiar, sob pena de se ferir a dignidade da pessoa humana, princípio fundamental e constitucionalmente consagrado (1.º da Constituição da República Portuguesa)! 7. Porquanto, na verdade e em bom rigor, os Recorrentes necessitam da totalidade do seu rendimento líquido disponível.
-
Assim, com o douto suprimento, sempre se impõe proceder à elevação do rendimento isento de cessão para um valor nunca inferior a 5 SMN pelo casal; isto sem prejuízo, naturalmente, de alterações futuras que porventura se verifiquem nos seus rendimentos ou despesas.
-
Sendo certo que, e sem prescindir, os Recorrentes, face à sua situação económico-financeira, compreendem a manutenção do montante que, de há longa data, lhes vêm sendo retido.
-
A imposição, em termos de retenção, de qualquer valor superior, nas presentes condições, não deixará de afetar a subsistência e dignidade do agregado familiar.
-
De todo o modo, no caso de insolvência de um casal, o rendimento a ceder não será fixado individualmente, mas sim e sempre em comum.
Acresce que, 12. Os Recorrentes desde Julho de 2011 que permanecem no período de cessão de...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO