Acórdão nº 470/15.2T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelMANUELA FIALHO
Data da Resolução15 de Março de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Guimarães: B., residente na Rua …, autora na ação comum em epígrafe, que move contra C., S.A., não se conformando com a sentença proferida nos autos, que julgou a presente ação totalmente improcedente por não provada e absolveu a ré do pedido, vem dela interpor Recurso.

Pede que a sentença seja revogada e condenada a ré na totalidade do pedido.

Fundamenta e após conclui como segue: 1.ª - O Tribunal de primeira instância pronunciou-se sobre a questão seguinte: da ilicitude da decisão unilateral da ré de pagar à autora o subsídio de refeição através do cartão eletrónico da marca “Euroticket à la card” e, se assim se entender, quais as consequências de tal ilicitude.

  1. - Por sentença proferida pelo Tribunal a quo, foi julgada a ação proposta pela recorrente totalmente improcedente, por não provada, e absolvida a recorrida do pedido.

  2. - A recorrente impugna a decisão do Tribunal a quo relativa à matéria de facto, por incompleta, na medida em que não contemplou factos que deveriam ter sido dados como provados, em resultado da posição assumida pelas partes nos articulados, pelo que deve ser aditada à matéria de facto provada a seguinte: R) O subsídio de refeição pago em dinheiro superior a € 4,27 está sujeito a tributação fiscal (IRS), como rendimento do trabalho dependente, e a contribuição social (Taxa Social Única), no regime geral dos trabalhadores por conta de outrem.

    1. E é considerado na base de cálculo das prestações a receber pela autora a título de subsídio de baixa por doença, subsídio de desemprego, pensão de reforma por velhice ou invalidez, reparação de acidente de trabalho ou doença profissional, e outras prestações sociais próprias dos trabalhadores assalariados.

  3. - A recorrente aceita a demais matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo, designadamente: B) A autora foi admitida ao serviço da ré em 5/11/1973 […].

    1. O subsídio de alimentação, desde o início da relação entre as partes, sempre foi pago à autora pela ré em dinheiro, mês a mês, incluído no salário mensal e discriminado na folha de vencimentos mensais.

    2. Em finais de Março/princípios de Abril de 2014, a ré decidiu unilateralmente e informou verbalmente a autora de que, a partir do mês de Abril de 2014 inclusive, o pagamento em numerário do subsídio de alimentação devido mensalmente seria substituído por um crédito em montante equivalente num cartão eletrónico, que passaria a ser fornecido para o efeito e carregado em cada mês com o valor correspondente ao subsídio de refeição.

    3. O mencionado cartão, da marca “Euroticket à la card”, seria titulado em nome da autora e da ré, emitido pelo “Banco…, S.A.” em parceria com a “E…” e só poderia ser utilizado pela autora no pagamento de despesas em restaurantes, supermercados e outras lojas de produtos alimentares que aceitassem esse cartão.

    4. A autora manifestou imediatamente, de modo verbal, a sua discordância da decisão da ré.

    5. Instada pela ré, várias vezes, a conformar-se com o dito pagamento do subsídio de alimentação por cartão, a autora manteve a recusa, afirmando que não aceitava aquela alteração e queria continuar a receber em numerário. […] L) A ré procedeu ao pagamento do vencimento do mês de Abril de 2014, na data de 29/04/2014, oferecendo o valor do subsídio de alimentação devido (€ 114,40, correspondentes a 22 dias de serviço completo à razão de € 5,20 cada um) através de um crédito em montante equivalente carregado no referido cartão.

    6. A autora reiterou a recusa de aceitação desse cartão e a ré, por sua vez, redarguiu que ou a autora recebia o subsídio através do cartão ou não o recebia, pelo que a autora efetivamente não recebeu o montante devido a título de subsídio de alimentação. […] P) A autora manteve a não aceitação do cartão eletrónico como pagamento do subsídio de alimentação e a ré descontou nos recibos de vencimentos da autora o valor mensal dos subsídios de alimentação e recusou pagar-lhe em numerário.

    7. A autora recusou aceitar em mão o aludido “Cartão Refeição” em substituição do pagamento em dinheiro do subsídio de alimentação, pelo que ainda não recebeu os montantes que lhe são devidos a título de subsídio de alimentação dos meses de Abril a Dezembro de 2014.

  4. - O presente recurso visa também matéria de direito, nos termos do art. 639.º, n.º 2, do CPC.

  5. - A retribuição é um elemento essencial do contrato de trabalho, como consta da noção legal deste – art. 11.º do CT.

  6. - O art. 127.º, n.º 1, al. b), do CT impõe como dever da recorrida o pagamento pontual da retribuição da recorrente.

  7. - O art. 129.º, n.º 1, al. d), do CT proíbe à recorrida diminuir a retribuição da recorrente.

  8. - Do conceito de retribuição fazem parte o vencimento base e o subsídio de alimentação, porque prestação regular e periódica paga diretamente em dinheiro, em contrapartida do trabalho da recorrente – art. 258.º do CT.

  9. - Segundo os arts. 258.º e ss. e 276.º e ss. do CT, a recorrida não pode substituir prestações remuneratórias em dinheiro por prestações doutra forma, sem o acordo da recorrente.

  10. - O mesmo resulta do disposto no art. 406.º, n.º 1, do Cód. Civil: o contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se por mútuo consentimento dos contraentes.

  11. - A recorrente não consentiu em que fosse substituída ou compensada a verba pecuniária do subsídio de alimentação por prestações doutro tipo, que não o pagamento na totalidade em numerário e como sempre acontecera desde o início da relação contratual entre as partes.

  12. - A recorrida quer impor um modo de pagamento do subsídio de alimentação que não permite à recorrente dispor livremente do que é seu por direito, legal e contratual.

  13. - O cartão “Euroticket à la card” não é de utilização universal, só pode ser empregado nos estabelecimentos comerciais aderentes e que tenham o código de atividade fiscal do ramo alimentar, e não pode ser usado para proceder ao levantamento do seu saldo em numerário ou sua transferência bancária, numa caixa automática “ATM”.

  14. - A recorrente ficará prejudicada com a decisão unilateral da recorrida, pois, em face das novas regras introduzidas pelo Orçamento de Estado de 2014, enquanto o subsídio de refeição pago em dinheiro superior a € 4,27 está sujeito a tributação fiscal (IRS), como rendimento do trabalho dependente, e a contribuição social (Taxa Social Única), no regime geral dos trabalhadores por conta de outrem, o subsídio de refeição pago através de cartão eletrónico e cujo montante diário não exceda € 6,83 fica isento de IRS e contribuições obrigatórias para a Segurança Social (TSU) – respetivamente, art. 2.º, n.º 3, al. b), 2), do Código do IRS, e art. 46.º, n.º 2, al. l), e n.º 3, do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.

  15. - Donde, a recorrente verá reduzidas as prestações a receber a título de subsídio de baixa por doença, subsídio de desemprego, pensão de reforma por velhice ou invalidez, reparação de acidente de trabalho ou doença profissional, e outras prestações sociais serão correspondentemente reduzidas, pois todas elas têm como base de cálculo as folhas de remunerações entregues na Segurança Social e sujeitas a descontos legais.

  16. - As duas conclusões antecedentes reforçam que o subsídio de alimentação pago pela recorrida à recorrente, no valor diário de € 5,20, tem a natureza jurídica de retribuição.

  17. - Tanto é retribuição que, se a recorrente não prestar serviço num dia em que deveria comparecer no local de...

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