Acórdão nº 185/10.8TBPTL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Fevereiro de 2016

Data11 Fevereiro 2016

ACÓRDÃO DA 2ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – RELATÓRIO 1. CONSTRUÇÕES J & FILHOS, LDA., intentou acção declarativa, sob a forma de processo sumário, contra AUTO P, LDA., e R, UNIP., LDA., pedindo que seja decretada a resolução do contrato celebrado entre a A. e as RR. e, em consequência, que se condene as mesmas a pagarem-lhe solidariamente: a) O valor de 1.817,97 € referentes ao preço do motor e seu transporte; b) Os juros vencidos sobre tal importância, à taxa legal, que computam 113,76 €; e c) Os juros vincendos a igual taxa, até integral pagamento; d) A indemnização inerente a 350 dias de paralisação do veículo, no valor de 3.500,00 €; e e) Os juros à taxa legal, sobre a quantia referida na alínea anterior, contados da citação e até integral pagamento; 2. Para tanto, invoca, em síntese, que: - é proprietária de um veículo ligeiro misto, marca “Opel”, modelo “Campo”, que está destinado ao serviço de transporte de trabalhadores e materiais para e das obras que lhes estão confiadas; - no mês de Julho de 2008 o motor do aludido veículo sofreu uma grave avaria; - o sócio gerente da A., através de um seu conhecimento em Lisboa, conseguiu encontrar um motor usado compatível, propriedade das ora rés, tendo acabado por adquiri-lo a estas pelo preço de 1.500.00 €, acrescido do valor do transporte até Ponte de Lima, que ascendeu à quantia de 317.97 €.

Acrescenta que o motor foi entregue na oficia onde se encontra o veículo, no dia 31/07/2008, que no dia seguinte e antes de proceder à sua montagem no veículo, foram efectuados testes ao motor, dos quais se concluiu que o motor não estava em condições de funcionamento, e que tendo o representante da A. entrado logo em contacto com as RR., informando-as das avarias detectadas no motor, estas aceitaram as referidas avarias, prontificando-se a proceder à substituição do motor.

Alega ainda que as RR. vieram buscar o motor no dia 4 ou 5 de Agosto de 2008, assumindo os defeitos e avarias do motor que venderam à A., mas que jamais procederam à substituição do mesmo, mantendo em seu puder o que lhe haviam vendido.

Deste modo, invocam o direito à resolução do contrato, com as legais consequências, e o direito à indemnização pelos danos decorrentes da imobilização do veículo.

  1. Regularmente citada, a 1ª R. AUTO P, LDA., admitindo a venda o motor, contestou que o mesmo padecesse de quaisquer defeitos, a denúncia destes e seu reconhecimento, bem como o levantamento do motor.

    Relativamente à 2ª R. R, UNIP. LDA., a A. veio desistir da instância, o que foi homologado por despacho de fls. 41.

    Foi elaborado despacho saneador, com selecção da matéria de facto assente e controvertida.

  2. Instruído o processo procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, após o que foi elaborado o despacho de resposta à matéria de facto (cf. fls. 135 a 140) e proferida sentença, na qual, “por caducidade da respectiva acção”, decidiu-se julgar improcedente a acção, absolvendo-se a R. dos pedidos.

  3. Inconformada recorreu a R., pugnando pela alteração da decisão, nos termos e com os fundamentos seguintes: 1.ª A fl. 4 da decisão sobre a matéria de facto, o Mmo. Juiz “a quo” afirma que “(…) enquanto à luz das regras da experiência se afigure fortemente verosímil que a autora tenha efectivamente dado conta dos defeitos ao vendedor (…)”; 2.ª Tal afirmação parece-nos insofismável da sua convicção, no sentido de considerar e ter assente que, de facto, a denúncia foi efectuada, não obstante, na sua decisão, assim não ter vindo a considerar; 3.ª A verdade é que o motor fornecido pela ré e recorrida não se encontrava em condições de funcionamento, como se demonstrou pelos testes que se fizeram antes de o montar no veiculo a que se destinava (n.º 10 dos factos provados, fl. 4 da sentença); 4.ª Verdade é também que a ré jamais entregou à autora um outro motor de substituição, o que determinou que a viatura na qual deveria ser montado ficou sem circular desde 01 de Setembro de 2008 (nºs. 11 e 12 dos Factos Provados, fl. 4 da sentença); 5.ª Do conjunto destes factos terá resultado, salvo erro de entendimento, a convicção do Mmº Juiz expressa pela afirmação de que considera fortemente verosímil que a autora tenha efectivamente dado conta dos defeitos ao vendedor, pese embora a decisão proferida não corra nesse sentido, o que foi fatal para a pretensão deduzida; 6.ª Existe, pois, quanto a nós e salvo o devido respeito, contradição entre os fundamentos e a decisão ou, pelo menos, a mesma contém a aludida obscuridade que a torna ininteligível; 7.ª Mas considera, também, o Mmº Juiz, que a primeira testemunha, SMAML (…) atestou que, passados alguns dias, veio um camião levantar o motor – vide fl. 4 da decisão sobre a matéria de facto; 8.ª Ora, considerando-se atestado tal facto, dele emergem necessariamente outros, de eminente importância para a decisão da causa, que são os seguintes:  Que a denúncia foi, na realidade, efectuada pela autora (por isso vieram recolher o motor);  Que não teria sentido ao abrigo das regras da experiência comum, que a mesma denúncia tenha sido efectuada junto de pessoa diversa da ré vendedora; e,  Que a denúncia foi efectuada mal se detectou a avaria do motor, o que decorre do facto de a sua recolha ter ocorrido apenas uns dias depois da sua entrega; 9.ª A resposta ao quesito 10º da Base Instrutória não poderá ser a de “Não provado”, mas sim outra em que se refira, por exemplo, “Provado que uns dias após a entrega do motor, um camião veio recolhê-lo”; 10.ª De tudo resulta que se demonstrou que a Autora efectuou a denúncia a que se refere o art. 916º do Cód. Civil, pelo que, não se verifica a caducidade da acção e a sua consequente improcedência com os fundamentos invocados na sentença recorrida e isto, não obstante a acção só ter sido apresentada em juízo em 19.02.2010, isto é, após o decurso do prazo de seis meses contados da denúncia, previsto no art. 917º do Cód. Civil; 11.ª É que, tendo como certo que a denúncia foi efectuada pela compradora à vendedora e que foi esta que recolheu o motor num dos dias seguintes, significa que aceitou a falta de conformidade (por isso o recolheu), o que impediu a verificação da caducidade, de harmonia com o disposto na parte final do nº 2, do art. 331º, do Cód. Civil; 12.ª A definição de consumidor a que se refere a al. a) do art. 1º B do Decreto-Lei nº 67/2003 de 08/04, deve ser entendida no sentido de que está em tal condição todo aquele que não adquira o produto com vista a retirar dele um benefício comercial, uma mais valia, um lucro. Isto é, todo aquele que, numa palavra, é o consumidor final do produto adquirido; 13.ª Ora, foi precisamente nessa qualidade de consumidor final, que a A. adquiriu o motor à ré, pese embora para o incorporar num veículo afecto à sua actividade, mas não para obter dele qualquer lucro, beneficio ou mais valia; 14.ª O que significa que, ao contrato de compra e venda celebrado entre recorrente e recorrida, é aplicável a disciplina do Decreto-lei nº 67/2003, de 08/04, tendo-se aqui por reproduzido tudo o que atrás se disse quanto à denúncia da falta de conformidade efectuada pela recorrente à recorrida; 15.ª Do que, a autora dispunha do prazo de dois anos, previsto no nº 3, do art. 5º A, do predito diploma, para instaurar a correspondente acção, prazo que, como se vê, foi observado.

    16.ª A douta sentença recorrida, padece do vício da nulidade, de harmonia com o disposto na al. c), do nº 1, do art. 615º, do CPC (ver conclusão 6ª supra), bem como, viola as disposições dos arts. 913º e seguintes do Cód. Civil e do Dec. Lei nº 67/2003, de 08/04.

    TERMOS EM QUE E nos demais de direito que V. Exªs., Venerandos Desembargadores, melhor e doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via disso, ser revogada a sentença proferida, substituindo-a por outra que condene a ré e recorrida nos pedidos formulados, com as legais consequências.

  4. ...

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