Acórdão nº 103791/11.3YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelHIGINA CASTELO
Data da Resolução15 de Dezembro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO B., Lda, entretanto declarada insolvente, intentou ação contra C., peticionando (em p.i. aperfeiçoada) a condenação do Réu no pagamento da quantia de € 34.432,04, acrescida de juros moratórios comerciais vencidos e vincendos, calculados desde 06/03/2011, até efetivo e integral pagamento. Alegou ter celebrado com o Réu contrato de empreitada, tendo cumprido a sua prestação de realização da obra encomendada, mas não tendo o Réu pago integralmente o preço acordado e faturado.

O Réu sustentou não ser devida qualquer quantia por a Autora não ter terminado a obra em devido tempo, além de ter realizado os trabalhos com defeitos, o que lhe causou prejuízos.

Os autos seguiram os normais trâmites, vindo, após julgamento, a ser proferida sentença que julgou a ação totalmente improcedente e absolveu o Réu do pedido.

Com tal sentença não se conformou a Autora, que recorreu, concluindo nas suas alegações de recurso: «A- A decisão revidenda padece de nulidade, nos termos do disposto na al. d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, por omissão de pronúncia, na medida em que, não obstante ter indicado como “Objeto do Litígio” a apreciação “Da validade da denúncia do contrato pelo R.” acaba por não se pronunciar sobre a validade da denúncia.

B- A decisão de facto deve ser alterada, passando a constar do elenco dos factos provados que o Réu, através de missiva datada de 21.01.2011, que aquela recebeu, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, o Réu denunciou o contrato de empreitada que havia celebrado com a A., tendo retirado a obra à A, C- Devendo deixar também de fazer parte da matéria de facto provada o vertido na alínea o) a partir de “continuando”.

D- Não deve fazer parte do “Objeto do Litígio” apreciar “Do abandono da obra por parte da A. antes de terminados os trabalhos acordados”, na medida em que abandono sugere saída voluntária, e tal nunca foi alegado pelo Réu, antes pelo contrário, o que ele sempre alegou foi que a obra não foi concluída nem entregue pela A. porquanto ele decidiu retirar-lha e denunciou o contrato de empreitada por carta, em face de alegadas demoras e incompetências técnicas – itens 28, 29 e 36 da contestação, art.º 13, 14 e 19 da Base Instrutória e documento 2 da contestação.

E- A denúncia do contrato de empreitada levada a cabo pelo Réu configura uma resolução ilícita, porquanto, conforme resulta da própria carta de denúncia, essa é a primeira vez que ele está a denunciar os defeitos à A. e nem lhe pede a sua eliminação/reparação, nem a interpela para o efeito, antes denunciando imediatamente o contrato, ao arrepio do que preceitua o art.º 1221.º do CC, razão pela qual, a este respeito, a A. não se encontrava em incumprimento definitivo, não podendo o Réu resolver o contrato, tendo-o resolvido ilicitamente, tal corresponde a uma desistência do contrato, prevista no art.º 1229.º do CC, tendo o dever de indemnizar a A. pelo dinheiro que deixou de ganhar por não poder concluir as obras.

F- A mesma denúncia, no que toca ao prazo, configura uma resolução ilícita, na medida em que, como reconhece a decisão em crise, o R., antes de enviar a carta de denúncia, não interpelou a A. formalmente para a mora, situação que tem a mesma consequência que a vertida na conclusão anterior.

G- Em sede de Réplica a A. alegou a resolução ilícita do contrato, logo, a desistência do contrato de empreitada prevista no art.º 1229.º do CC e fundamentou o seu direito a ser indemnizada ainda que os trabalhos não tivessem sido concluídos.

H- De todo o modo mesmo que se entenda que a A. não tenha invocado como causa de pedir a desistência do contrato, nem tenha formulado o seu pedido com base nessa desistência, tendo em consideração o que preceitua o artº 1229º do CC, ela pode ver-se ressarcida, nesta ação, das quantias que diz estarem em dívida.» O Réu contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.

Foram colhidos os vistos e nada obsta ao conhecimento do mérito.

Objeto do recurso Sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, são as conclusões das alegações de recurso que delimitam o âmbito da apelação (arts. 635, 637, n.º 2, e 639, n.ºs 1 e 2, do CPC).

Tendo em conta o teor daquelas, cabe apreciar: A. Se a sentença é nula por não se ter pronunciado sobre a «validade da denúncia».

  1. Se a matéria de facto deve ser alterada, passando dela a constar o teor da carta de 21/01/2011, e omitindo-se o vertido na alínea o) a partir de «continuando».

  2. Se o «abandono da obra» deve excluir-se do objeto do litígio, por não terem sido alegados pelas partes factos conducentes a tal conceito.

  3. Se a carta de 21/01/2011 configura uma resolução ilícita por os defeitos não terem sido previamente denunciados e por a Autora não ter sido previamente interpelada para por fim à alegada mora.

  4. Se, a entender-se que o Réu desistiu do contrato de empreitada ao abrigo do disposto no art. 1229 do CC, a Autora tem direito ao pedido a título de indemnização, com fundamento na mesma norma.

    1. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Estão provados os seguintes factos (que são os selecionados na sentença da 1.ª instância, com as alterações das alíneas f) e o) requeridas pela Recorrente e deferidas nos termos expostos em III.B.): a) B., Lda. foi declarada insolvente no âmbito do processo n.º 1233/11.0TJVNF, que corre termos no 1.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão, no dia 12/05/2011, e tinha como objeto social a elaboração e execução de projetos de remodelação e decoração, dedicando-se, além do mais, a diversas atividades de construção civil.

      1. No âmbito da sua atividade comercial, aquela sociedade foi contratada pelo R., no verão de 2010, para executar obras de remodelação de um apartamento sito na R. … V.N.Famalicão.

      2. As obras de remodelação do apartamento do réu seriam executadas de acordo com o orçamento n.º 20100014 de 27/07/2010, por aquela elaborado.

      3. O preço acordado foi de um total de € 57.800,00, a ser pago do seguinte modo: - € 17.340,00 (correspondente a 30% do preço total na data de assinatura do contrato); - € 23.120,00 (correspondente a 40% do preço total a meio da obra); - € 17.340,00 (correspondente a 30% do preço total no final da obra).

      4. O R. apenas procedeu ao pagamento da quantia de € 40.460,00, correspondente aos dois 1.ºs pagamentos referidos.

      5. Em 21/01/2011, o réu dirigiu à autora uma carta registada, que esta recebeu no dia 25 do mês de janeiro, da qual, além do mais, consta: «Inexplicavelmente neste momento tais obras não estão concluídas e as executadas enfermam de vícios que não permitem ser dadas como integralmente executadas e recebidas.

        (…) Na verdade os transtornos, incómodos, privações e prejuízos materiais para mim e m/ família decorrentes de incumprimento do prazo por si só justificam a denúncia do contrato. Acresce que de facto a incompetência técnica e vícios notórios na execução da empreitada os quais numa primeira abordagem consistem em (…) [segue-se o elenco de 12 vícios] Por último, espero, ocorreram duas inundações (…) que afetaram condóminos vizinhos (…).

        Essas inundações resultaram do entulho que depositaram no terraço (…).

        Vim também a apurar, agora, que Vª Exªs confiaram a chave da casa a estranhos (…) bem sabendo que a casa tinha dentro dela bens guardados, alguns dos quais desapareceram (…).

        Assim, pela presente informo que decidi denunciar o contrato de empreitada, tomar posse da obra de imediato e proceder ao seu acabamento.

        Em ordem a proceder à medição dos trabalhos executados e proceder ao exame dos defeitos que anunciei convido Vª Exª a comparecer na obra no dia 25 do corrente mês pelas 16,00 horas para elaborar um auto de medição e peritagem.

        (…)».

      6. Do relatório elaborado resulta que os trabalhos realizados pela autora foram avaliados em € 34.900.

      7. A B., Lda e o R. C. subscreveram, em 10/08/2010, o acordo denominado “Contrato de adjudicação de obra para decoração de habitação (apartamento) situada na Rua…, em V. N. Famalicão”, junto a fls. 158, cujo teor se dá por integralmente...

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