Acórdão nº 1724/15.3T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução15 de Novembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO Os autores M. D.

e esposa M. M., intentaram, em 19-10-2015, no Tribunal de Vila Real, acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra os réus L. B.

e A. C.

.

Pediram que, em consequência da prova e sua procedência:

  1. Sejam os Réus condenados a demolir a parede que construíram indevidamente no seu prédio – como descrito nos artigos 7º e 9º, bem como desmontar e retirar o painel descrito nos artigos 15º, 16º e 17º, às suas custas e no prazo máximo de 30 dias após trânsito em julgado; b) Sejam os Réus condenados a efectuar as obras necessárias, no lado poente, para evitar a infiltração de águas para o interior da adega/arrecadação do prédio dos Autores; c) Absterem-se os Réus da prática de qualquer ato que impeça ou diminua a utilização da servidão de vistas, luminosidade e ventilação por parte Autores; d) Serem os Réus condenados a pagar aos Autores todos os prejuízos patrimoniais que se liquidarem em execução de sentença; e) Serem os Réus condenados a pagar uma indemnização por danos morais aos Autores, não inferior a 3.000,00 (três mil euros), com juros moratórios à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

    Invocaram, como causa de pedir, violação dos seus direitos reais de propriedade e de servidão.

    Sumariamente, alegaram, como fundamentos, que: (i) são “donos e legítimos possuidores” de uma casa de habitação, composta de rés do chão (que funciona como adega e arrumos e está soterrado), primeiro andar e um sótão (estes com duas varandas e uma janela em cada um); (ii) na mesma rua ((...), em (...)), existe um prédio urbano, de que “são donos e legítimos possuidores” os réus, o qual confronta a norte e a poente com os autores; (iii) imediatamente ao lado e a confinar com a sua habitação, há uma habitação propriedade dos réus; (iv) estes, há cerca de cinco anos, no topo sul do seu prédio, construíram uma parede de blocos e betão, desde o 1º andar até à cornija do sótão, sem licenciamento administrativo “prejudicando assim todas as habitações que se seguem” e, com tais “obras de alteração”, pondo “em perigo grave a segurança pública” e os “habitantes das mesmas” e dos “transeuntes” [itens 7º a 9º, da petição]; (v) durante o dia 17-07-2015, os réus cravaram, no solo, do lado poente, junto à parede dos autores, dois pilares, em ferro, verticais, distando cerca de 1,20 entre si e com 5 metros de altura a partir do solo (nível do 1º andar), lado poente, até à cornija do prédio dos autores; (vi) nesses pilares fixaram horizontalmente chapas metálicas, de forma rectangular, assim levantando “uma construção na frente das janelas do 1º andar e sótão do prédio dos autores, um painel tipo sinalização vertical de informação que se encontra nas vias de circulação, com cerca de cinco metros de altura por 1,20 m de largura”; (vii) tal painel e a dita parede “prejudicam a servidão de vistas dos autores”, “o painel vedou completamente as janelas”, deixando os autores de “ter iluminação natural e ventilação para o 1º andar e sótão” [itens 15 a 18, da petição]; (viii) os ditos pilares provocam infiltrações de água para a adega; (ix) foi ordenada a demolição da parede pela Câmara e os réus foram advertidos pela respectiva fiscalização de que “a construção da parede colidia com o direito de servidão de vistas, iluminação e ventilação do 1º andar e sótão dos autores”; (x) sempre os autores, desde 1979, e a anterior proprietária até 1978, vêm usando a “servidão de vistas, bem como luminosidade e ventilação do seu prédio”, em termos integrantes de usucapião (“há mais de 35, 40 ou até 60 anos”) [itens 28 e 29 da petição]; (xi) com a sua conduta, os réus prejudicaram os autores, causando-lhes danos indemnizáveis .

    Juntaram a caderneta predial e fotos ilustrativas (inclusive, das duas janelas, a fls. 18).

    Em contestação, os réus questionaram o valor da causa; impugnaram a factualidade alegada, dizendo que agiram licitamente e nenhum dano sofreram os autores, acrescentando que nenhuma varanda tem o prédio destes dando para a via pública ou para o seu prédio; só aquele efectivamente tem escadas e varanda, pelo que a parede erigida no topo sul desta, além de lícita, destinou-se apenas a “impedir os olhares indiscretos dos autores a partir de sua casa”; não há qualquer conexão entre as eventuais infiltrações e os pilares ou chapas; nenhuma servidão de vistas beneficia o prédio dos autores sobre o quintal dos réus; “as duas aberturas existentes no 1º andar e sótão… constituem meras frestas ou óculos para luz e ar” e nunca os autores as utilizaram para ver através delas; “a sua abertura apenas foi autorizada” pelo pai do réu para “iluminação e arejamento”; os então donos do prédio hoje dos autores aceitaram tal condição e, quanto à do 1º andar, aberta em 1979/1980, logo a “frestaram”; esta é “em forma de janela”, “com largura de 60 cm, encontra-se a mais de 1,80m de altura, a contar do solo e é provida de 4 barras fixas de ferro, distando 12 cm entre si” [itens 22º a 25º]; a do sótão, aberta em 1984/1985, apesar de não “frestada ou gradeada” (contra o compromisso assumido), nunca teve qualquer outra finalidade senão “a de permitir a iluminação e arejamento do sótão em causa”, até porque no quintal da casa dos réus havia uma figueira cuja ramagem impedia as vistas e devassa [itens 28º e 29º].

    Juntaram fotos anteriores às obras.

    Foi ordenado o prosseguimento dos autos, com dispensa de audiência prévia (fls. 40).

    Desencadeou-se oficiosamente incidente de verificação do valor da causa e, para sua decisão, ordenou-se e realizou-se peritagem, vindo aquele a ser fixado conforme fls. 73 (alterado de 45.000€ para 74.500€), em consequência disso transitando os autos para a Instância Central da Comarca.

    Nesta, dispensou-se, de novo, a audiência prévia, proferiu-se saneador tabelar, enunciaram-se genericamente o objecto do litígio e a temática a provar, apreciaram-se os requerimentos de prova, ordenaram-se diligências e marcou-se o julgamento (fls. 79).

    Realizou-se, então, a audiência final (16-03-2017), nos termos e com as formalidades descritas na acta respectiva (fls. 102 a 109), nela tendo sido inquiridas oito testemunhas arrolados pelos autores e cinco pelos réus e, no fim, indeferida a requerida inspecção ao local.

    Por sentença de 02-05-2017 (fls. 110 a 117), a acção foi julgada improcedente e os réus absolvidos dos pedidos.

    Na sequência do apelo em recurso dirigido pelos autores a esta Relação, por acórdão de 02-11-2017 (inserto a fls. 153 a 183 e cujo teor aqui se dá por reproduzido), foi, além do mais, decidido anular a decisão em 1ª Instância proferida sobre a matéria de facto quanto aos pontos naquele indicados.

    Devolvidos os autos à 1ª Instância, foi aí ordenada a realização de perícia, cujo relatório está junto a fls. 198-204.

    Na audiência reaberta, conforme acta (fls. 207) apenas foram produzidas alegações.

    Com data de 11-05-2018 (208 a 224) foi proferida a nova sentença, na qual se voltou a julgar a acção totalmente improcedente e a absolver os réus dos pedidos.

    Os autores não se conformaram e, de novo, apelaram em recurso dirigido a esta Relação (fls. 226 a 235), alegando e apresentando as seguintes conclusões: “1º O presente recurso tem por objetivo não apenas a interpretação e aplicação da lei aos factos dados como provados, como também a reapreciação da prova produzida, documental e testemunhal (gravada), tendo em vista a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, em consonância com o disposto no art.º 662.º do CPC.

    1. A matéria de facto impugnada encontra-se plasmada nos números 4 alíneas a) e b) dos factos provados e nos números 11, 14 e 15 dos factos não provados, na medida em que se considera que a mesma, ao ser dada resposta parcialmente positiva aos factos do número 4 alíneas a) e b) e, bem assim, resposta negativa aos factos 11, 14 e 15, foi incorretamente decidida.

    2. Devendo, outrossim, merecer resposta positiva os factos dos números 11, 14 e 15 e, resposta totalmente positiva os factos do 4 alínea a) e b), no sentido de se concluir que, as janelas existentes na fachada virada a poente do prédio em questão, têm caraterísticas de janelas, com uma altura do sobrado ao parapeito das janelas de 1,47 metros e 0,81 metros, o que releva para efeitos do disposto no artigo 1363º, para servidão de vistas, uma vez que estão a altura inferior a 1,80 metros, e numa das suas dimensões é superior a 0,15 metros, ou seja, superior a 15 centímetros.

    3. Tal resultando, por forma inarredável, da análise critica e alicerçada nas mais elementares regras da experiência comum, quer da prova documental junta aos autos, nomeadamente, a fls. 16 – 18, quer da prova testemunhal produzida em Audiência de julgamento, quer da prova por confissão dos RR., nos artigos 22º, 23º, 24º da contestação, bem com do relatório pericial a fls. 198 – 204 dos autos, que caracteriza e define as aberturas como janelas e com a indicação da altura do sobrado ao parapeito, 1,47 metros e 0,81 metros, medidas que o tribunal omitiu e não considerou como factos provados (nº 4, alínea a) e b) dos factos provados).

    4. Sendo que, se corretamente analisada e valorada, determinam decisão diversa daquela que merecera os mencionados pontos da sentença em crise, como se alcança da transcrição de algumas passagens e sínteses de depoimentos, aqui dados por reproduzidos para legais efeitos.

    5. Razão pela qual e, v.g. do art.º 662.º do PCP., deverá a decisão recorrida, no que tange à matéria de facto impugnada, ser alterada por esse Venerando Tribunal, com o inerente consuetudinário jurídico, uma vez que os elementos de prova carreada para o processo impõem decisão diversa.

    6. Para além de que, a omissão por falta de análise critica às provas relativamente à construção pelos RR, da parede da fachada nascente do prédio do AA, ao não se pronunciar pelo pedido de demolição da mesma, é determinante da nulidade da sentença, conforme decorre do disposto no art.º 615º alíneas b) e d) do CPC.

      ...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT